1
Professor(a)-Personagem: contribuições para a
docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni
Rafael Matiuda Spinelli
Para citar este artigo:
FAZZIONI, Mateus Junior; SPINELLI, Rafaela Matiuda.
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência
com crianças na Educação Infantil.
Urdimento
Revista
de Estudos em Artes Cênicas, Florianópolis, v. 2, n. 55,
ago. 2025.
DOI: 10.5965/1414573102552025e0108
Este artigo passou pelo PlagiarismDetection Software | iThenticate
A Urdimento esta licenciada com: Licença de Atribuição Creative Commons(CC BY 4.0)
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
2
Professor(a)-Personagem:
contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil1
Mateus Junior Fazzioni2
Rafael Matiuda Spinelli3
Resumo
O presente artigo discute a presença de professores(as) especialistas na Educação
Infantil de Florianópolis e apresenta o Drama como uma abordagem potente para o
ensino e experimentação do teatro com crianças nessa etapa da Educação Básica. Por
meio da estratégia do(a) professor(a)-personagem, figuras como Sheila Enxerida e
Fortroide, proporcionam um fazer teatral em que crianças e professores(as) tornam-se
parceiros(as) de criação. Defendemos, ao longo do texto, que a presença do(a)
professor(a) de Teatro e da linguagem teatral nos NEIMs, contribui significativamente
para a ampliação das experiências expressivas e corporais das crianças.
Palavras-chave
: Drama. Professor-personagem. Educação infantil. Linguagem teatral.
NEIM do futuro.
Teacher-in-Role: Contributions to teaching children in Early Childhood Education
Abstract
This article discusses the presence of theater specialists among Early Childhood
Education teachers in Florianópolis, presenting Drama as a powerful approach to
teaching and experiencing theatre to children at this stage of Basic Education. Through
the teacher-in-role strategy, characters such as Sheila Enxerida and Fortroide provide
a theatrical experience in which children and teachers become creative partners.
Throughout the text, we argue that the presence of theatre teachers and theatrical
language in NEIMs significantly expands children's expressive and bodily experiences.
Keywords
: Drama. Teacher-in-role. Early childhood Education. Theatrical language.
NEIM of the future.
Profesor-Personaje: Contribuciones para la docencia con ninõs en la Educación Infantil
Resumen
Este artículo discute la presencia de docentes especialistas en Educación Infantil en
Florianópolis y presenta el Drama como un enfoque poderoso para la enseñanza y la
experimentación del teatro con niños en esta etapa de la Educación Básica. A través de
la estrategia del profesor-personaje, figuras como Sheila Enxerida y Fortroide,
proporcionan un montaje teatral en el que niños y profesores se convierten en socios
creativos. A lo largo del texto, argumentamos que la presencia del profesor de teatro y
el lenguaje teatral en los NEIM contribuye significativamente a la expansión de las
experiencias expresivas y corporales de los niños.
Palabras clave
: Drama. Profesor-personaje. Educación infantil. Lenguaje teatral. NEIM
del futuro.
1 Revisão ortográfica e gramatical do artigo realizada por Felipe Augusto Witthinrich Lins. Doutorado em Literatura e pós-
doutorado em Literatura pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Graduação em Letras Português pela
UFSC.
2 Doutorando e Mestrado em Artes Cênicas pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) Graduação
Licenciatura em Teatro pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). fazzionimateus@gmail.com
https://lattes.cnpq.br/8676922214902228 https://orcid.org/0000-0001-6457-655X
3 Doutorando em Artes Cênicas pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Mestrado em Educação pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Especialização em Educação a Distância pelo Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial SC (SENAC/SC). Graduação em Educação Física pela UFSC.
rafael.spinelli@prof.pmf.sc.gov.br
http://lattes.cnpq.br/6222688899271378 https://orcid.org/0000-0001-6457-655X
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
3
Introdução
O presente artigo é escrito a quatro mãos e apresenta reflexões que partem
de experiências distintas com a abordagem do Drama na Educação Infantil. O
primeiro autor atuou como professor de Teatro no Núcleo de Educação Infantil
Orlandina Cordeiro, em 2024, no contexto do projeto NEIM do Futuro. Seu
primeiro contato com o Drama ocorreu ainda na graduação em Licenciatura em
Teatro na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no ano de 2018, e desde
então vem desenvolvendo pesquisas e práticas artístico-pedagógicas com essa
abordagem, tanto no contexto escolar como na pesquisa acadêmica.
O segundo autor, por sua vez, é professor efetivo de Educação Física,
atuando desde 2011 na Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino de
Florianópolis. Em 2023 fez parte da equipe responsável pela organização da
formação continuada dos profissionais que atuariam no projeto NEIM do futuro,
trazendo formadores(as) que propunham o diálogo entre as áreas específicas e a
estrutura curricular da Educação Infantil, orientada pelo Núcleo de Ação
Pedagógica: Linguagens. O curso contou com a participação do professor Diego
de Medeiros Pereira, que trouxe importantes contribuições do campo do teatro;
da professora Sandra Cunha, com aportes da área da música; além de outros(as)
formadores(as) que colaboraram para aproximar as áreas específicas das
especificidades da atuação na Educação Infantil. Em agosto de 2023, o autor teve
sua licença de aperfeiçoamento profissional concedida, possibilitando o
afastamento das atividades laborais para dar continuidade no doutorado em
Artes Cênicas, cujo contato com o teatro e, mais especificamente, com a
abordagem do Drama, ocorreu em 2013 logo após sua entrada, em 2012, no
Grupo de Teatro Trupe da Alegria4, formado por professoras da Educação Infantil.
4 Grupo teatral formado por profissionais da Rede Municipal de Educação Infantil de Florianópolis, criado
em 2010 como parte da pesquisa de mestrado em Teatro do professor Diego de Medeiros Pereira.
Atualmente, o grupo integra uma ação de extensão vinculada ao Departamento de Artes Cênicas da
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC).
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
4
O Drama nos inspira por ser uma perspectiva experimental e processual,
algo pouco presente nas práticas teatrais escolares, e que se aproxima da
maneira como o trabalho é organizado na Educação Infantil (Pereira, 2015). Neste
contexto, destacamos a estratégia do(a) professor(a)-personagem,
experimentada durante o desenvolvimento de processos de Drama, como uma
potente possibilidade de aproximação entre professores(as) e crianças, além de
facilitar a introdução da linguagem teatral por meio de elementos como figurino,
maquiagem, voz e corporeidade.
Como afirma Pereira (2020, p.39), “a estratégia ‘professor-personagem’ se
impõe como uma excelente possibilidade de mediação de saberes no processo
de exploração da linguagem teatral com crianças”. Essa estratégia tem se
mostrado fundamental em nossas experiências e práticas artístico-pedagógicas
com as crianças na Educação Infantil, pois possibilita o deslocamento da figura
tradicional do(a) docente, favorecendo a escuta, a participação e a criação de
narrativas ficcionais compartilhadas, nas quais as crianças interagem com o
conhecimento teatral de forma lúdica e significativa.
Neste artigo, propomos compartilhar dois percursos distintos que, embora
singulares, dialogam na forma como compreendem e vivenciam o Drama como
abordagem pedagógica na Educação Infantil. Ao articular teoria e prática,
apresentamos o contexto dos(as) professores(as) especialistas na Educação
Infantil de Florianópolis, o Drama como abordagem metodológica e a estratégia
do(a) professor(a)-personagem como uma possibilidade artístico-pedagógica de
atuação docente.
Acreditamos que esse movimento de escrita compartilhada amplia o
repertório sobre o Drama na Educação Infantil e, ao mesmo tempo, valoriza as
práticas dos(as) professores(as) especialistas nesta etapa da Educação Básica
que, em seus contextos, proporcionam modos sensíveis e criativos de estar com
as crianças, valorizando suas opiniões e participação. Esperamos, com isso,
contribuir para o fortalecimento de abordagens que reconheçam as crianças,
respeitando suas singularidades e seu modo próprio de perceber e se engajar no
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
5
mundo.
Defendemos, ao longo do texto, que a presença do(a) professor(a) de
Teatro, ou da linguagem teatral nos NEIMs, contribui significativamente para a
ampliação das experiências expressivas, corporais e imaginativas das crianças,
articulando-se aos princípios éticos, políticos e estéticos5 que sustentam o
trabalho na Educação Infantil.
Professores(as) especialistas na Educação Infantil de
Florianópolis: contextualizações e disputas
No ano de 2021, uma nova proposta foi apresentada para a Educação
Infantil da Rede Municipal de Ensino de Florianópolis. O Núcleo de Educação
Infantil Municipal (NEIM) Doralice Maria Dias, em diálogo com a Diretoria de
Educação Infantil (DEI), elaborou um projeto pedagógico diferenciado, que foi
acolhido pela Secretaria Municipal de Educação (SME) e resultou na
implementação do Projeto Piloto “NEIM do Futuro”. A iniciativa propunha a
inserção de diferentes profissionais de áreas específicas na Educação Infantil,
incluindo professores(as) de Artes Cênicas (Teatro), Artes Visuais, Música,
Tecnologia, inglês e Libras. Cabe lembrar que a presença de professores(as) de
Educação Física já existe na Educação Infantil de Florianópolis desde 1982.
Em 2022, a SME decidiu ampliar o projeto NEIM do Futuro para outras cinco
unidades educativas da Rede Municipal de Ensino de Florianópolis (RMEF). Para
definição das unidades, foram considerados alguns critérios, segundo a SME, tais
como: a representação das diferentes regiões do município (Norte, Centro,
Continente, Leste e Sul); unidades com um espaço físico amplo que
possibilitasse a criação de salas “makers” ou ateliês; e unidades situadas em
contextos de vulnerabilidade social, de modo a garantir que essas oportunidades
formativas fossem acessadas por crianças de diferentes realidades.
5 Nas
Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil
(BRASIL, 2009), são apresentados alguns
princípios éticos, políticos e estéticos que orientam a participação das crianças nas interações, brincadeira
e relações educativos-pedagógicas, a saber: “Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e
do respeito ao bem, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e singularidades; Políticos: dos
direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática; Estéticos: da
sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de expressão nas diferentes manifestações
artísticas e culturais” (Florianópolis, 2022, p.73).
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
6
A partir desses critérios, a Diretoria de Educação Infantil convidou cinco
unidades representadas por suas respectivas diretoras a organizarem seu
trabalho como NEIM do Futuro a partir de 2023: NEIM Morro do Horácio, NEIM
Sérgio Grando, NEIM Professora Otília Cruz, NEIM José Rodrigues Willamil e NEIM
Orlandina Cordeiro. Contudo, os critérios de escolha não foram amplamente
divulgados pela SME, o que gerou questionamentos por parte das unidades
educativas e de profissionais da Educação Infantil.
Um dos principais desafios enfrentados na implementação da proposta foi a
política de inserção dos(as) professores(as) de áreas específicas na Educação
Infantil. Esta inserção exigiu a desconstrução da lógica escolarizada tradicional,
pautada na organização por aulas disciplinares estruturadas, modelo
predominante nas demais etapas da Educação Básica. O projeto apostava na
docência compartilhada, envolvendo a integração dos(as) diferentes profissionais
da unidade na elaboração dos projetos e propostas pedagógicas.
Na Educação Infantil, a docência compartilhada, de acordo com Buss (2018),
se manifestava, historicamente, na atuação conjunta entre a professora
pedagoga e a auxiliar de sala, que, apesar das diferenças de função, carga horária
e remuneração, partilham o trabalho com o mesmo grupo de crianças e suas
famílias. Contudo, como apresentada na
Reedição das Orientações Curriculares
para Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino de Florianópolis
(2022),
Pensar a docência na perspectiva do compartilhamento significa,
sobretudo, compreendê-la nas e pelas relações sociais. Relações estas
que carregam marcas do tempo, do cotidiano, das relações de dentro e
de fora da instituição, das intencionalidades pedagógicas, de modo
permanentemente e contínuo. Uma docência compartilhada exige
colocar-se no lugar do outro com empatia para acolher as diferenças
(ainda que isso signifique, em alguns momentos, o enfrentamento de
tensões, confrontos e conflitos) o que favorece a constituição de um
processo coletivo e dialógico (Florianópolis, 2022, p. 289).
Na Educação Infantil, conforme preconiza o conjunto de documentos
norteadores, a docência, compartilhada ou não, possui especificidades voltadas
às características singulares das crianças de 0 a 6 anos, em que educar-cuidar se
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
7
constitui como uma prática única e indissociável, sem hierarquia de importância
entre os dois aspectos. Tanto é que, na
Reedição das Orientações Curriculares
para a Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino de Florianópolis
(2022),
optou-se por retirar a conjunção “e” entre os termos (educar-cuidar),
evidenciando que não se trata de ações distintas ou separadas, mas dimensões
simultâneas e interdependentes, que se realizam nas relações cotidianas com as
crianças, permeando todas as experiências vividas no contexto educativo.
Nesse contexto, a atuação do(a) professor(a) de Teatro se integra à
dinâmica cotidiana das crianças não como uma “aula” tradicional, mas como um
convite permanente à escuta, à imaginação, à experimentação de personagens, à
produção de narrativas, ao faz-de-conta. A experiência com a linguagem teatral
se articula com o Projeto Político Pedagógico das unidades educativas e amplia a
potência das brincadeiras, valorizando as experiências das crianças e seus
modos próprios de ser e estar no mundo. Retomaremos essa dimensão no
tópico seguinte, ampliando a reflexão sobre a linguagem teatral na prática
pedagógica.
A docência compartilhada, portanto, revela-se essencial, demandando
diálogo e colaboração entre professoras pedagogas, professores(as) de áreas
específicas (como o(a) de Teatro), e auxiliares de sala, na construção de práticas
pedagógicas integradas. Nessa perspectiva, diferentes saberes se entrelaçam na
organização de propostas com e para as crianças, valorizando a
complementaridade entre os conhecimentos das áreas específicas e a
organização curricular da Educação Infantil.
A docência compartilhada, no entanto, ainda é uma perspectiva que precisa
ser constantemente debatida e repensada, que temos desafios para colocá-la
em prática e divergências em relação ao modo como ela realmente se efetiva6.
Como a organização do “currículo” da Educação Infantil se efetiva por meio dos
Núcleos da Ação Pedagógica (NAPs)7, precisamos compreender como esses(as)
6 Ver o estudo recente de Marcela Carolina Zen de Andrade (2023), que faz um trocadilho, com a música de
Zeca Pagodinho "nunca vi, nem comi, eu ouço falar" para destacar como essa perspectiva da docência
compartilhada ainda é bastante questionada, pois não se tem um entendimento de como ela se efetiva ou
o que é preciso para que ela se concretize, embora traga apontamentos importantes.
7 As Relações Sociais e Culturais, Linguagens e Natureza são os Núcleos de Ação Pedagógica (NAPs), e a
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
8
profissionais podem contribuir, a partir do conhecimento de sua área específica,
com as propostas de diversificação, ampliação e complexificação das
experiências das crianças. Esse ponto, porém, foi pouco considerado pela SME
na implementação, acompanhamento e aprimoramento do projeto NEIM do
Futuro.
Durante o desenvolvimento do projeto, os(as) profissionais envolvidos(as)
identificaram a necessidade de fortalecimento em alguns aspectos estruturais e
conceituais, como a ampliação de espaços para a organização e
desenvolvimento das propostas de teatro, dança e música; a continuidade das
formações com a contribuição das áreas específicas em diálogo com os NAPs e
as especificidades da Educação Infantil; e a garantia de tempo para o
planejamento coletivo, essenciais à efetivação da docência compartilhada.
Também foi ressaltada a importância de um acompanhamento mais frequente e
específico de assessoramento pedagógico, condizente com a complexidade da
proposta. A ausência desse suporte pode ter limitado tanto a consolidação de
práticas alinhadas aos princípios e especificidades da Educação Infantil quanto
um maior aproveitamento das possibilidades pedagógicas abertas pela presença
de profissionais de Teatro na Educação Infantil.
Vale destacar que a questão do tempo destinado ao planejamento coletivo
não é um desafio recente, mas se trata de uma demanda que se impõe desde a
implementação da hora atividade, especialmente no contexto da
complementaridade na docência entre a professora de Educação Infantil e a
professora auxiliar. Essa organização, embora avance no reconhecimento da
complexidade do trabalho pedagógico, ainda apresenta limites quando se trata
de viabilizar momentos efetivos de encontro, diálogo e planejamento conjunto
entre os(as) diferentes profissionais envolvidos(as) na organização do trabalho
pedagógico com as crianças. Essa dificuldade também é vivenciada por
professores(as) de Educação Física, que frequentemente enfrentam entraves
para participar de espaços de planejamento coletivo com as demais
profissionais, o que compromete a articulação das práticas e o desenvolvimento
Brincadeira se constitui como eixo estruturante e estruturador das propostas educativo-pedagógicas com
as crianças.
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
9
de propostas integradas. Trata-se, portanto, de uma questão estrutural que
impacta a efetivação da docência compartilhada e o fortalecimento de propostas
integradas entre os(as) profissionais.
Como consequência, o projeto foi alvo de críticas ao longo de 2024 e, sob
alegação de que “não funcionava”, foi encerrado pela SME sem uma avaliação
rigorosa ou diálogo com os(as) profissionais e as comunidades envolvidas. O
encerramento, neste sentido, representou um retrocesso e ao mesmo tempo
uma forma de a SME não se responsabilizar pelos desafios enfrentados na
implementação, pela ausência de documentação e pelo descompasso entre a
proposta e seu acompanhamento institucional, além de não levar em
consideração a perspectiva dos(as) profissionais e as propostas exitosas
desenvolvidas nas unidades.
Apesar da retirada dos(as) professores(as) de teatro da Educação Infantil, é
importante reconhecer que os conhecimentos específicos seguem sendo
fundamentais e devem fazer parte da organização e planejamento das
professoras pedagogas, ainda que muitas relatem, tanto nas formações
continuadas quanto no contexto da Trupe da Alegria, não se sentirem preparadas
para tal tarefa, em razão da limitada oferta de formação específica.
Diante disso, este artigo propõe possibilidades para o trabalho com o teatro
na Educação Infantil, tendo como eixos estruturantes as interações entre
professor(a) e crianças e as brincadeiras de faz-de-conta, por meio da vivência
de papéis. A abordagem do Drama será apresentada como uma perspectiva
teórico-metodológica potente para o desenvolvimento de propostas artístico-
pedagógicas que valorizem a linguagem teatral na Educação Infantil.
A abordagem do Drama na Educação Infantil: convenções e estratégias
A abordagem do Drama para o ensino e experimentação do teatro foi
desenvolvida na segunda metade do século XX, em países anglo-saxões, a partir
de trabalhos de Dorothy Heathcote. No Brasil, essa abordagem foi introduzida
por Beatriz Cabral na década de 1990. Sua obra
Drama como método de Ensino
(Cabral, 2006) continua sendo a principal referência sobre o Drama no país,
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
10
sendo a primeira a apresentar o Drama como uma abordagem pedagógica
voltada tanto para o ensino do teatro quanto para a experimentação da
teatralidade no contexto escolar.
O Drama propõe a criação coletiva de uma narrativa dramática, na qual
crianças e professores(as) vivenciam papéis e situações dentro de um contexto
ficcional criado na sala de aula. Cada processo de Drama tem um foco de
investigação, um tema que é investigado de maneira lúdica e experimental em
diálogo com a realidade das crianças. Janiaski e Menegaz, definem a abordagem
do Drama,
[...] como uma investigação teatral em processo, em que algumas
convenções são necessárias: escolha de um pré-texto, criação de um
contexto ficcional, elaboração de episódios (compostos por uma
seleção de atividades, denominadas como estratégias) e definição dos
papéis das pessoas envolvidas (professoras/es e estudantes) (2024, p.
84).
Grande parte das atividades e situações vivenciadas e investigadas no
Drama surgem a partir do pré-texto, entendido como estímulo inicial e fonte de
referência para o desenvolvimento da narrativa. O pré-texto pode ser de
natureza diversa - textual, histórica, visual, musical, entre outras - e é utilizado
para garantir a coerência dramática e inspirar novas situações e papéis a serem
sugeridos às crianças (Pereira, 2021).
Desse modo, os pré-textos podem ser materiais mais abertos, como uma
imagem, ou mais fechados, como narrativas, histórias, contos, lendas, músicas,
entre outros. Para Cabral, o pré-texto é um “[...] pano de fundo para orientar a
seleção e identificação das atividades e situações exploradas cenicamente”
(Cabral, 2006, p.15). Contudo, mesmo que o pré-texto sirva de referência para a
experimentação dramática, a ideia não é reproduzir ou representar a história
presente neste material, mas criar situações, conflitos e papéis a partir dele.
Partindo do pré-texto, as atividades e situações dramáticas são adaptadas
de maneira a estabelecer relações entre os contextos real e ficcional, oferecendo
às crianças a “[...] oportunidade de interrogar, confrontar, enfrentar desafios,
resolver problemas, experimentar as situações e papéis e transformar os
materiais, ampliando suas experiências, desenvolvendo sua capacidade de
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
11
imaginar, criar e improvisar” (Pereira, 2021, p. 71).
Todo esse processo narrativo acontece dentro de um contexto ficcional
instaurado na sala de aula, no qual as crianças são convidadas a emergir e
vivenciar determinadas situações ficcionais. A criação do contexto ficcional é
uma das primeiras convenções do Drama, visto que todas as atividades
desenvolvidas no processo precisam acontecer dentro desse contexto de ficção.
Nesse outro espaço-tempo que é instaurado, as crianças participam de
atividades propostas a partir de estratégias dramáticas, estímulos e
materialidades, agindo como se fizessem parte desse contexto ficcional, sendo
elas próprias ou assumindo papéis e personagens. A experimentação de papéis é
uma das convenções do Drama que se relacionam com os modos de ser e estar
das crianças no mundo; esse aspecto aproxima o teatro das brincadeiras de faz-
de-conta, e apresenta possibilidades para a Pedagogia do Teatro com crianças.
Essa dimensão proposta pela abordagem do Drama mobiliza dois eixos centrais
que norteiam as propostas pedagógicas na Educação Infantil: as brincadeiras e
as interações.
Desse modo, o(a) professor(a) de teatro, apoiado na brincadeira, pode
torná-la mais complexa a cada encontro. É importante a ampliação de
repertórios artísticos por meio de vivências artísticas que investiguem o teatro
como linguagem específica e autônoma, não estando a serviço de outras
disciplinas, temáticas ou datas comemorativas.
Segundo a Reedição das
Orientações Curriculares para a Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino
de Florianópolis
,
[...] algumas práticas podem ser constituídas a partir da potencialização
das ações de imitação e das brincadeiras de faz de conta, da
estruturação de espaços em que as crianças possam investigar
elementos da linguagem teatral (corpo, voz, narrativas, personagens,
jogos, máscaras, figurinos, adereços, ambientações cênicas)
aproveitando os momentos de dramatização não direcionada que
acontecem em sua rotina. A partir de um tema ou história que tenha se
evidenciado no contexto das crianças, podemos construir contextos
ficcionais e ambientações cênicas que convidem as crianças a
explorarem seus corpos, sua imaginação e a criação de respostas
(comunicação) em forma teatral como, por exemplo, pela abordagem
do drama (Florianópolis, 2022. p. 216).
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
12
Sendo assim, o Drama se apresenta como uma abordagem potente na
Educação Infantil, pois se aproxima das especificidades das infâncias como
defendido por Pereira (2021). Desse modo, quando pensamos no ensino do teatro
com o Drama, é preciso compreender que não se trata de uma peça pensada
pelos adultos e depois reproduzida, encenada e apresentada pelas crianças em
datas comemorativas. O que está em foco no Drama é a ideia de processo, a
investigação e criação de uma narrativa dramática desenvolvida de forma
processual. Os “processos de Drama”, como costumamos chamar, são divididos
em episódios, que podem acontecer um a cada encontro/aula. Como aponta
Fazzioni (2023, p. 170-171),
[...] o processo de Drama vai sendo investigado por meio de uma série
de eventos e acontecimentos que são estruturados em forma de
episódios, nos quais a narrativa vai sendo experimentada e, ao mesmo
tempo, criada. Os episódios podem ser entendidos como unidades
cênicas que compõem o processo e que surgem a cada nova situação
ou atividade proposta. [...] A estruturação dos episódios varia de acordo
com o foco de investigação de cada sessão (cada encontro) e, também,
de acordo com o tempo disponível para o desenvolvimento do
processo, sendo assim, o tempo de cada episódio também é variado.
[...] Se o processo for desenvolvido ao longo de um tempo maior, no
qual se tem a disponibilidade de desenvolver um episódio por semana,
pode se ter um número maior de episódios e, consequentemente, mais
atividades a serem propostas em cada sessão.
O episódio é compreendido como uma sessão do Drama. Algumas
estratégias são escolhidas para a proposição de situações dramáticas que
podem se encerrar com uma nova pergunta, dúvida ou mistério para dar
prosseguimento aos próximos episódios. Segundo Fazzioni, na organização do
processo o(a) professor(a) condutor(a), organiza “[...] diferentes estratégias para
engajar os(as) participantes no processo de experimentação dramática e
desenvolver diferentes habilidades e conhecimentos. Essas estratégias balizam
as ações que serão investigadas no decorrer de cada episódio” (Fazzioni, 2023, p.
171).
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
13
Entre as estratégias que podem ser utilizadas para a proposição de um
processo de Drama, segundo Pereira, e que geralmente utilizamos em nossas
práticas artístico-pedagógicas, estão:
manto do perito; jogo de papéis;
professor(a) no papel; professor(a)-personagem; cadeira quente; narração;
recursos materiais; estímulo composto; ambientação cênica; ambientação
sonora; cerimônias e rituais; imitação; imagens e quadros congelados; registros,
entre outras
(Pereira, 2021)8.
Essas estratégias mobilizam diferentes comportamentos, posicionamentos
e improvisações das crianças diante dos desafios e mistérios propostos. A
construção coletiva de uma narrativa dramática, em torno de um ou mais temas,
com a vivência de papéis e personagens, possibilita, como destaca Cabral (2006),
que os participantes, nesse caso as crianças, se apropriem de estruturas e
conceitos teatrais enquanto se engajam na criação dramática.
Na Educação Infantil, o contato com elementos e procedimentos da
linguagem teatral pode ocorrer por meio de processos de Drama, ou ainda com
propostas que mobilizem algumas estratégias dramáticas, incentivando
“imitações de animais, sons, ações e gestos; vivência de papéis do cotidiano ou
personagens de produções audiovisuais; construção de narrativas dramáticas
pelas crianças e apreciação de histórias narradas e/ou encenadas” (Florianópolis,
2022, p. 215).
Esse engajamento das crianças em torno da criação de narrativas ou
personagens depende de vários fatores, como, por exemplo: as crianças se
envolverem em situações que estão em alguma medida relacionadas ao seu
contexto e repertório cultural; o engajamento depende também da coerência da
narrativa e das estratégias selecionadas; quanto maior for o envolvimento do(a)
professor(a) com a proposta, maior será o engajamento das crianças. Por esse
motivo, o(a) professor(a) participa de corpo inteiro. Além de organizar e produzir
as materialidades, também assume personagens como forma de fazer a
mediação e a condução da proposta. A seguir, apresentamos a estratégia do
8 Para maior conhecimento das estratégias do Drama, indicamos a leitura do livro
Que drama é esse?!?
Práticas teatrais na educação infantil
(2021) de Diego de Medeiros Pereira.
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
14
Drama denominada
professor(a)-personagem
, que mobiliza uma nova dimensão
na relação entre o(a) professor(a) e a personagem, ampliando as possibilidades
de interação com as crianças.
Encontro entre Sheila Enxerida e Fortroide: possibilidades com a
estratégia do(a) professor(a)-personagem na Educação Infantil
Durante o desenvolvimento da narrativa dramática, o(a) professor(a) atua
como mediador e parceiro da criação com as crianças, assumindo, como aponta
Heloise Vidor, o “[...] status de organizador, facilitador” (Vidor, 2008, p. 39). Nesse
contexto, cabe ao(a) professor(a) assumir múltiplas funções: articulador dos
episódios, provocador de situações e condutor do processo, mobilizando
estratégias que apresentem desafios a serem investigados cenicamente. Essas
provocações instigam as crianças a experimentarem novas possibilidades,
ampliando seus repertórios e aprofundando as discussões em torno da
experiência vivida.
Dentre as estratégias do Drama apresentadas acima, a estratégia
professor(a)-personagem é, segundo Pereira (2020, p. 395), “a que melhor
oferece condições para as profissionais, graduandas e estagiários/as realizarem
uma mediação entre o universo infantil e as propostas de experimentação de
elementos da linguagem do teatro.” Essa estratégia, denominada
teacher-in-role
no contexto anglo-saxão, foi traduzida por Cabral (2006) como professor(a)-
personagem. A tradução levou em consideração tanto a complexidade da
tradução do termo role (papel social), quanto a relação mais próxima entre
Drama e Teatro presente na perspectiva brasileira da abordagem. No entanto,
Vidor (2008) propõe uma distinção importante entre o(a) professor(a) que atua
em um papel e aquele(a) que corporifica um(a) personagem, ressaltando que
diferentes maneiras de mediação dentro do processo a partir desta estratégia.
Para Vidor (2008), a estratégia do(a) professor(a) no papel refere-se ao(a)
professor(a) que assume um papel social com o propósito de instaurar um
contexto ficcional, uma situação ou problema a ser vivenciado, centrando-se no
discurso e não em uma performance artística. Nesse cenário, ao adotar um
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
15
papel, a atuação do(a) professor(a) pode provocar novos questionamentos,
estimular opiniões, reflexões e diferentes pontos de vista sobre determinada
situação. Por outro lado, o(a) professor(a)-personagem se refere ao momento em
que o(a) professor(a) representa ou cria um(a) personagem. De acordo com
Pereira (2021, p. 87), trata-se de "[...] um ser ficcional elaborado fisicamente, com
maior caracterização, pessoalidade e consequente potencialização de elementos
teatrais”. O autor complementa esse pensamento afirmando que,
ao assumir um papel, o conteúdo da fala que ele traz e sua função
social são mais importantes que sua caracterização e o aspecto teatral
de sua performance. O foco não está na interpretação/representação
(atuação do/a professor/a como ator/atriz), mas no papel social que
ele/a assume no encaminhamento do processo dramático. [...] Os
fatores diferenciais são, portanto, o processo de criação e a
performance. O “professor personagem” traz uma caracterização mais
elaborada e exige uma maior preparação na construção do ser ficcional”
(Pereira, 2020, p. 399-400).
Sendo assim, o autor apresenta ideias e possibilidades para o(a) professor(a)
assumir um papel (utilizando objetos e elementos para inserir uma informação) e
para assumir um(a) personagem (com maior caracterização e relação com as
crianças). A criação do personagem requer preparação, mas não para apresentar
uma encenação acabada, e sim para sustentar um processo aberto, investigativo
e relacional.
Quando desejo apresentar alguma informação ou lançar alguma tarefa
específica, escolho um adereço/objeto que possa caracterizar um papel
óculos, chapéu, casaco, entre outras possibilidades enfatizando
aquela ação momentânea. Quando busco estabelecer uma parceria na
criação, fazer com que o ser ficcional apareça em diferentes momentos,
opto pela elaboração de um personagem com figurino completo,
melhores delineamentos na atuação e maior profundidade como um
elemento da narrativa (Pereira, 2020, p. 400).
Ou seja, na figura do(a) professor(a)-personagem, existe uma preocupação
performática, com foco no processo de criação e na performance do(a)
professor(a) ao longo da experimentação dramática. Nesse sentido, exige-se
do(a) professor(a) uma caracterização e investigação corporal, assim como uma
maior preparação para lidar com as ações, improvisações e acontecimentos.
Essa personagem, assumida pelo(a) professor(a), possui determinados objetivos
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
16
dentro de cada episódio ou do processo como um todo. Por isso, cada um
dos(as) personagens assumidos pelo(a) professor(a) adquire uma determinada
função e um determinado status no decorrer dos episódios, os quais
determinam o tipo de relação que o(a) professor(a) como personagem
estabelece com as crianças.
A estratégia do(a) professor(a)-personagem possibilita ao(a) profissional
exercer tanto o papel de mediador(a) do processo artístico-pedagógico, quanto
de parceiro(a) da criação da narrativa juntamente com as crianças. Isso porque,
como condutor da narrativa dramática, o(a) professor(a) se apoia nas
descobertas, hipóteses e criações das crianças para propor novos papéis,
personagens, perguntas e situações a serem investigadas nos episódios
seguintes, por meio da escuta e consideração das sugestões e opiniões das
crianças. Além disso, ao atuar como personagem ou papel na sala de aula,
inserido(a) em um contexto ficcional, vivenciando juntamente com as crianças
diferentes situações e acontecimentos ao longo do processo, o(a) professor(a) se
torna um parceiro da criação. Em uma narrativa que envolve uma investigação,
o(a) professor(a) pode surgir como um(a) investigador(a), detetive ou perito, que
ajuda o grupo na investigação, por exemplo. em uma aventura espacial, o(a)
professor(a) pode assumir um(a) personagem de outro planeta ou ainda um(a)
astronauta que ajuda o grupo na viagem pelo espaço. Esses exemplos nos
conduzem à apresentação de duas personagens, criadas e assumidas em nossas
práticas artístico-pedagógicas com crianças da Educação Infantil no município de
Florianópolis.
Sheila Enxerida - A investigadora, é uma professora-personagem criada para
mediar as práticas teatrais desenvolvidas tanto nas salas de aula quanto na
pesquisa de Doutorado em Artes Cênicas do primeiro autor do presente texto.
Nos trabalhos em que a personagem é assumida, as crianças são convidadas a
participar de investigações sobre diferentes mistérios. A criação da personagem
esteve pautada no interesse em discutir estereótipos de gênero e sexualidade,
por meio do corpo do professor na sala de aula, seja através de figurinos e
adereços, seja pelo corpo da própria personagem como figura feminina assumida
por um professor. Esse aspecto é discutido na tese de doutorado do autor, na
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
17
qual se investiga uma Pedagogia Dissidente do Teatro com crianças a partir do
Drama e da desconstrução de personagens e narrativas. Abaixo apresentamos
como exemplo as estratégias utilizadas no primeiro episódio do processo de
Drama: Onde está a Bruxa? desenvolvido com crianças da Educação Infantil no
ano de 2024.
Tabela 1 - Primeiro episódio do processo de
Drama Onde está a Bruxa?
(2024)
Estímulo material
O professor chega à sala com a silhueta de um corpo
desenhado em um papel kraft e um chapéu da bruxa. Conversa com as crianças
a partir da pergunta: de quem pode ser esse corpo e esse chapéu?
Professor personagem
O professor informa as crianças que conhece alguém
que pode ajudar a desvendar esse mistério. Em frente às crianças o professor
veste figurinos e adereços e se transforma em Sheila Enxerida - A investigadora.
Sheila se apresenta às crianças, analisa o corpo e o chapéu juntamente com
elas; todas são convidadas a deitar sobre o corpo para descobrir de quem pode
ser o corpo. As crianças dão sugestões e Sheila sugere ser o corpo de uma
bruxa.
Narração
Sheila conta uma história para as crianças sobre os diferentes
corpos e as histórias que cada corpo guarda. Leitura do livro Corpo, corpinho,
corpão de Mey Clerici e Ivanke.
Manto do especialista/Desenho coletivo
Sheila pergunta às crianças se elas
são especialistas em bruxas e convida as crianças para desenhar no papel com
a silhueta do corpo tudo que elas sabem sobre bruxas, as histórias, a aparência
das bruxas, os objetos, entre outros elementos bruxólicos.
Discussão
Após esse momento, em uma conversa, as crianças contam a
Sheila o que desenharam sobre as bruxas e juntos tentam encontrar uma forma
de mandar uma mensagem para a bruxa desaparecida.
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
18
Figura 1 - Sheila Enxerida no processo de Drama
Onde está a Bruxa?
Acervo dos autores, 2024.
o Fortroide é um ser do planeta Metroide e integra um núcleo de quatro
personagens que compõem a peça teatral: Uma ajuda de outro planeta,
apresentada pela Trupe da Alegria desde 2022 em unidades de Educação Infantil
da Rede Municipal de Ensino de Florianópolis. Aproveitamos o fato de o Fortroide
ter vindo de outro planeta para criar o contexto ficcional para a experimentação
do professor-personagem na realização da pesquisa de doutorado por meio de
um processo Drama com as crianças no NEIM Celso Pamplona e no NEIM
Professora Alessandra Abdalla. Trata-se de um ser intergaláctico que chega à
Terra com uma missão especial: conhecer as crianças, observar suas formas de
ser, conviver e, sobretudo, aprender com elas as brincadeiras que vivenciam. Em
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
19
seu planeta de origem, os habitantes estão se esquecendo de brincar, e cabe ao
Fortroide levar esses saberes lúdicos de volta, contribuindo para reacender a
memória e a imaginação de seu povo. Sua presença entre as crianças mobiliza
curiosidade, cuidado e reciprocidade: ao mesmo tempo em que pesquisa e
aprende, o Fortroide pode compartilhar e provocar experiências, atuando como
mediador disponível para a escuta e para a participação das crianças na
construção de uma narrativa coletiva e significativa.
Tabela 2 - Sétimo episódio do processo de Drama
Viagem ao planeta Metroide
(2024)
Estímulo material
o professor personagem chega à sala para levar as
crianças para conhecer o planeta Metroide e traz uma mala com diversos
acessórios, figurinos e maquiagens. A professora realizou uma eleição
com as crianças, e elas escolheram o ônibus como meio de transporte.
Então, juntas, construíram um ônibus espacial para a viagem.
Experimentação de papéis
As crianças se preparam para a viagem
escolhendo e se transformando em seres intergalácticos com figurinos,
acessórios e maquiagem.
Ambientação cênica e sonora
a sala escura, com lona azul no chão e
tecidos azuis pendurados nas janelas e paredes, ar-condicionado ligado
para criar o clima frio e trilha sonora extraterrestre.
Ritual
: Antes de passarem pela porta, todas as crianças deveriam dizer
algumas palavras.
Personagens convidadas
(professoras integrantes da Trupe da Alegria)
como os seres do Planeta Metroide, apresentaram a dança dos leques, o
cheirinho especial do planeta, o carimbo da força e uma brincadeira.
Manto do especialista
: crianças como especialistas em brincadeiras
ensinaram os seres do planeta Metroide a brincar.
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
20
Figura 2 - Fortroide levando as crianças para Metroide no ônibus espacial.
Acervo dos autores, 2024.
As possibilidades são muitas e não se esgotam. Tudo depende do contexto
ficcional e do objetivo do(a) professor(a) ao assumir um papel ou personagem.
De acordo com Cabral (2006, p. 21), um papel pode assumir diferentes funções,
como:
[...] buscar auxílio e conselho; buscar informações; coordenar; desafiar;
introduzir informação” e o status que o papel pode ter é “[...] status alto:
rei, capitão, líder, treinador, diretor da escola etc.; status intermediário:
secretário, representante de alguma autoridade, membro da
comunidade ou da tripulação etc. Status baixo: pedinte, vítima,
refugiado, aprendiz, etc. (Cabral, 2006, p. 21).
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
21
Quando o(a) professor(a) assume um(a) personagem, além de possibilitar
uma apreciação estética por parte das crianças, é possível que ele(a) faça isso na
frente delas, deixando evidente quando está saindo ou entrando no(a)
personagem, para que elas percebam a teatralidade e a construção da
ficcionalidade e entrem, também, na dimensão fictícia.
[...] nos momentos em que o(a) professor(a) transita entre personagem,
papel e coordenador(a) do processo, estabelece-se a possibilidade de
as crianças perceberem a convenção teatral sendo realizada. Quando
o(a) professor coloca-se como personagem as crianças,
necessariamente, são postas no lugar de espectadoras e, depois, ele(a)
as incita a se colocarem em papéis, então as dimensões do fazer e fruir
são trabalhadas, assim como novos olhares sobre o mundo são
lançados a partir da metáfora desse mundo expressa pela
experimentação dramática (Pereira, 2021 p. 91).
O autor nos instiga a refletir sobre como esse trânsito entre os diferentes
papéis desempenhados pelo professor (professor-personagem, professor no
papel e coordenador do processo) é fundamental para que as crianças
compreendam, na prática, a linguagem teatral como uma construção coletiva e
simbólica. Ao evidenciar a convenção teatral, o professor revela às crianças que
elas estão participando de uma brincadeira de faz-de-conta estruturada, na qual
é possível entrar e sair da ficção, assumindo diferentes posturas e funções
dentro do processo. Seja como professor(a) no papel ou professor(a)-
personagem, o(a) professor(a) buscará, sobretudo, interagir com as crianças em
diferentes contextos criados, estabelecendo uma relação de parceria, na qual,
segundo Cabral (2006, p. 23), o(a) professor(a) “[...] não está para definir a cena
e tomar decisões, mas para entrar no jogo proposto pelas crianças”.
Nesse sentido, juntos, professor(a) e crianças experimentam diferentes
posturas e atitudes no processo, como, por exemplo: “Participante; Guia; Agente;
Autoridade; Relator; Imprensa; Pesquisador; Crítico; e Artista” (Cabral, 2006, p.
24-25). Essas experimentações podem gerar diferentes papéis e funções,
possibilitando que os(as) participantes e professor(a) façam uma troca ou jogo
de papéis. Além disso, outras pessoas externas ao processo (atores/atrizes ou
professores(as)) podem ser convidadas a participar como personagem
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
22
convidado(a) (Pereira, 2021) do processo, proporcionando novas descobertas ou
introduzindo novas situações, problemas e discussões. Isso porque, além de
introduzir elementos para a construção da narrativa, esses personagens podem
gerar, com suas performances, estranhamentos e desconstruções quanto às
normas sociais de gênero e sexualidade.
Compreendemos que optar pelo Drama como abordagem pedagógica na
Educação Infantil abre espaço para o diálogo com temas interdisciplinares nas
criações cênicas, ao mesmo tempo em que permite a inserção de outras
temáticas ao longo do processo. A experimentação de personagens, com suas
presenças, caracterizações, figurinos, maquiagens e outros elementos, pode
tensionar as construções sociais de gênero e sexualidade na infância, por
exemplo. Isso porque segundo Janiaski e Menegaz “a abordagem do Drama,
como experiência artística e pedagógica, se mostra como uma potente forma de
refletir acerca dos elementos teatrais e assuntos pertinentes à
contemporaneidade” (2024, p.83). Ou seja, dependendo dos objetivos do grupo e
de quem coordena o processo, o Drama pode assumir diversas perspectivas a
partir de diferentes pré-textos e temáticas, ampliando a representatividade, a
visibilidade e as discussões contemporâneas, tanto na cena quanto no cotidiano
da unidade educativa.
Considerações finais
Tendo em vista as discussões apresentadas, compreendemos que as
práticas com o Drama transitam entre o ensino e a experimentação do teatro,
constituindo-se como um processo artístico-pedagógico que investiga as
dimensões cênicas, dramáticas e corporais da linguagem teatral. A dimensão
cênica se manifesta na mobilização e apropriação, por parte das crianças, de
elementos do fazer teatral e das funções da cena. A dramática emerge quando
são convidadas a experimentar papéis e criar personagens, agindo como se
fossem outra pessoa ou seres. a corporal atravessa todo o processo, pois
envolve o fazer com o corpo e no corpo, a partir da investigação de outras
possibilidades expressivas, vocais e gestuais, tanto por parte das crianças como
também dos(as) professores(as).
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
23
Essa perspectiva do Drama estabelece uma relação com as múltiplas
linguagens expressivas das crianças durante a experimentação, pois a
comunicação das crianças se faz no encontro entre o real e o imaginário, o dito e
não dito, gestos e silêncios, os olhares e as ações que compõem os seus modos
de expressão e presença no mundo.
Desse modo, defendemos o Drama como uma possibilidade para que o
Teatro, na Educação Infantil, seja vivido e experienciado pelas crianças, e não
apenas representado para elas ou por elas. Trata-se de uma proposta que
convida as crianças para uma investigação que evoca os elementos e
materialidades teatrais, compreendendo-as como criadoras de culturas.
Para que essa vivência aconteça de maneira significativa, é fundamental que
o(a) professor(a) esteja junto, em criação com as crianças, assumindo papéis e
personagens, e se deixando atravessar pelo jogo cênico. O Drama, neste sentido,
oferece a possibilidade de coautoria, em que professores(as) e crianças
partilhem o processo imaginativo e criativo, investindo em um fazer teatral que
se constrói no encontro e em processo.
Nas experimentações que temos desenvolvido com a linguagem teatral na
Educação Infantil, reafirmamos que o Drama oferece possibilidades potentes e
expande o que se entende por teatro nos espaços educativos. Ele possibilita
romper com estereótipos e modelos prontos, propondo novas possibilidades,
conceitos e relações possíveis de serem tecidas com as crianças.
O Drama se caracteriza como uma proposta que possibilita o envolvimento
das crianças na construção de narrativas, aguçando a imaginação e evocando
suas experiências e seus repertórios corporais e artísticos por meio de um
processo de investigação cênica, dramática e criativa. A estratégia do(a)
professor(a)- personagem, nesse contexto, revela-se uma alternativa potente
para mediar esses processos de forma lúdica, inventiva e participativa.
Por fim, compreendemos que é importante que cada professor(a) construa
e cultive um repertório pessoal de personagens. Nem sempre é necessário
inventar algo novo. Muitas vezes, investir em personagens criados, que fazem
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
24
parte do acervo do(a) professor(a), pode dar origem a novas experiências e
caminhos com as crianças. Personagens como Sheila Enxerida e Fortroide, por
exemplo, não se limitam a aparecer em uma única proposta realizada com as
crianças. Dependendo da ideia e do que se propõe, essas personagens sempre
podem retornar como uma alternativa, uma estratégia a qual o(a) professor(a)
pode recorrer para desenvolver sua prática artístico-pedagógica, instaurando um
espaço-tempo de criação compartilhada com as crianças
Referências
BUSS-SIMÃO, Márcia; ROCHA, Eloisa Acires Candal. Docência na educação
infantil: uma análise das redes municipais no contexto catarinense.
Revista
Brasileira de Educação
, v. 23, 2018. DOI: https://doi.org/10.1590/S1413-
24782018230021.
CABRAL, Beatriz Ângela Vieira.
Drama como método de ensino
. São Paulo:
HUCITEC, 2006.
FAZZIONI, Mateus J.
Deixem as crianças brincar!
O ensino do teatro na
visibilização e acolhimento das crianças em dissidência. Dissertação (Mestrado
em Artes Cênicas) Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis,
2023.
FLORIANÓPOLIS (SC).
Reedição das Orientações Curriculares para a Educação
Infantil da Rede Municipal de Ensino de Florianópolis
. Florianópolis, SC:
Secretaria Municipal de Educação, 2022.
JANIASKI, Flávia; MENEGAZ, Wellington. AS BRUXAS DE SALEM: a abordagem do
Drama e o Ensino de Teatro.
Carderno GIPECIT
, ano 28, n. 52, Salvador, 2024.
PEREIRA, Diego de Medeiros.
Drama na Educação Infantil: experimentos teatrais
com crianças de 02 a 06 anos. 2015.
293f. Tese (Doutorado em Teatro)
Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, 2015.
PEREIRA, Diego de Medeiros. “Professor personagem” como estratégia de
mediação para o ensino do Teatro na Educação Infantil.
ouvirOUver,
Uberlândia,
v. 16, n. 2, p. 392–405, 2020. DOI:10.14393/OUV-v16n2a2020-53887.
PEREIRA, Diego de Medeiros.
Que drama é esse?!? Práticas teatrais na educação
infanti
l. São Paulo: Hucitec, 2021.
Professor(a)-Personagem: contribuições para a docência com crianças na Educação Infantil
Mateus Junior Fazzioni | Rafael Matiuda Spinelli
Florianópolis, v.2, n.55, p.1-25 ago. 2025.
25
VIDOR, Heloise Baurich. O professor assume um papel e traz, por que não, um
personagem para a sala de aula: desdobramentos do procedimento teacher. In
role no processo de drama.
Urdimento
Revista de estudos em artes Cênicas,
v.01, n. 10, p.13-21, Florianópolis, 2008.
Recebido em: 10/06/2025
Aprovado em: 29/07/2025
Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC
Programa de Pós-Graduação em Artes CênicasPPGAC
Centro de Arte, Design e Moda CEART
Urdimento Revista de Estudos em Artes Cênicas
Urdimento.ceart@udesc.br