
Dialética em jogo: experimentos com a Peça Didática Brechtiana
Marcelo Gianini
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-26, abr. 2025
provocando o caráter associal das pessoas presentes, considerado por ele
pedagógico em suas peças didáticas. Nossa encenação, ao instigar esta
perspectiva associal, fez com que, em algumas vezes, não chegássemos a uma
síntese provisória e dinâmica (a negação da negação), ficando estagnados na
antítese (a negação). Neste caso, a imediaticidade presente no todo agia de forma
impeditiva para a análise da parte, daí a necessidade da mediação dos atuantes
(Coro).
Pois a dialética não é a tentativa de se aproximar de um todo como que
de fora, de maneira esquemática e, mais uma vez, mecânica, a fim de
então compreender o fenômeno, uma vez que este, afinal, não pode ser
compreendido a partir de si mesmo. Pelo contrário, ela consiste na
tentativa, isso sim, de iluminar de tal maneira o fenômeno particular, de
se demorar junto ao fenômeno particular, de determinar o fenômeno
particular de tal modo que ele, precisamente por meio dessa
determinação em si, vá além de si mesmo, tornando-se transparente
diante daquele todo, daquele sistema dentro do qual ele encontra
unicamente seu valor relativo [Stellenwert] (Adorno, 2022, p. 115).
Houve uma exceção a confirmar a regra: a plateia do I Congresso do Fórum
Popular Universitário da Ufal, em que ocorreu o extremo contrário, pois não
conseguíamos quem advogasse contra o ser humano. Ali, no auditório repleto de
ativistas, camponeses, sem terras, sem teto, indígenas, quilombolas e de outros
movimentos sociais, foi extremamente difícil extrair opiniões contrárias à
humanidade. Com muito custo, uma pessoa, que defendia a humanidade, se
dispôs a literalmente mudar de posição na plateia e se contradizer, expondo sua
fratura. Teríamos conduzido (mediado) de forma equivocada a discussão neste dia
para aquela plateia?
Benjamin afirma que “o conceito de teatro épico (formulado por Brecht como
teórico de sua prática poética) indica, sobretudo, que esse teatro deseja um
público relaxado, que acompanha a trama com descontração” (Benjamin, 2017, p.
23), o que não correspondia às pessoas presentes naquele contexto. Ao conduzir
nossa encenação não levamos em consideração que aquela apresentação se
inseria na abertura de um fórum com explícitas intenções políticas. Assim, a plateia
era composta por militantes sociais e não por um “público relaxado”. As pessoas
ali presentes não eram espectadores comuns, individualizados, mas
representantes de seus movimentos sociais. Havia mais um dado a ser