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A Extensão Universitária e a formação da pessoa
licenciada em teatro: divergências e confluências
Sidmar Silveira Gomes
Para citar este artigo:
GOMES, Sidmar Silveira. A Extensão Universitária e a
formação da pessoa licenciada em teatro: divergências e
confluências.
Urdimento
Revista de Estudos em Artes
Cênicas, Florianópolis, v. 2, n. 55, ago. 2025.
DOI: 10.5965/1414573102552025e0209
A Urdimento esta licenciada com: Licença de Atribuição Creative Commons (CC BY 4.0)
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A Extensão Universitária e a formação da pessoa licenciada em teatro: divergências e
confluências1
Sidmar Silveira Gomes2
Resumo
Ao dialogar com marcos legais relacionados à Extensão Universitária, escolhe-se refletir
sobre algumas ações de extensão que problematizam os desafios impostos pela
curricularização da extensão nos cursos de Licenciatura em Teatro, dando atenção à
Resolução CNE/CP Nº 4, de 29 de maio de 2024. Conclui-se que tal resolução, ao restringir a
execução de ações de extensão curricularizadas às instituições de Educação Básica,
evidencia um paradoxo: expande os horizontes das práticas do teatro na escola, mas tende
a limitar as experiências de formação da pessoa licenciada em teatro, impedida de
desenvolver ações extensionistas curricularizadas na educação não-formal.
Palavras-chaves
: Pedagogias do teatro. Extensão Universitária. Formação de educadores/as.
University Extension and the training of theater graduates: divergences and
confluences
Abstract
When dialoguing with legal frameworks related to University Extension, we chose to reflect
on some extension actions that problematize the challenges imposed by the curricularization
of extension in Theater Degree courses, paying attention to CNE/CP Resolution No. 4, of May
29, 2024. It is concluded that such a resolution, by restricting the execution of curricular
extension actions to Basic Education institutions, highlights a paradox: it expands the
horizons of theater practices at school, but tends limiting the training experiences of people
with a degree in theater, prevented from developing curricular extension actions in non-
formal education.
Keywords
: Theater pedagogies. University extension. Educator training.
Extensión Universitaria y formación de egresados de teatro: divergencias y
confluencias
Resumen
Al dialogar con los marcos legales relacionados a la Extensión Universitaria, optamos por
reflexionar sobre algunas acciones de extensión que problematizan los desafíos que impone
la curricularización de la extensión en los cursos de Grado en Teatro, atendiendo a la
Resolución CNE/CP 4, de 29 de mayo de 2024. Concluimos que dicha resolución, al
restringir la ejecución de acciones de extensión curricular a las instituciones de Educación
Básica, destaca una paradoja: amplía los horizontes de las prácticas teatrales en las escuelas,
pero tiende a limitar las experiencias de formación de los egresados de teatro, quienes se
ven impedidos de desarrollar acciones de extensión curricular en la educación no formal.
Palabras clave
: Pedagogías teatrales. Extensión Universitaria. Formación de educadores.
1 Revisão ortográfica, gramatical e contextual do artigo realizada por Thiago Henrique Ramari. Doutorado em
Letras pela Universidade Estadual de Maringá (UEM).
2 Pós-doutorado e Doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Mestrado e Graduação em
Artes Cênicas pela USP. Professor Adjunto do Departamento de Música e Artes Cênicas da Universidade
Estadual de Maringá (UEM). sidmar.gomes@uol.com.br
http://lattes.cnpq.br/4340498790826970 https://orcid.org/0000-0003-4177-2464
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Introdução
A Resolução do Conselho Nacional de Educação CNE/CP Nº 4, de 29 de maio
de 2024, que dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação
Inicial em Nível Superior de Profissionais do Magistério da Educação Escolar Básica,
institui que, além do cumprimento de no mínimo 400 horas de estágio obrigatório
curricular supervisionado na área de formação e atuação na Educação Básica, a
pessoa licencianda deve cumprir, no mínimo, 320 horas de Atividades Acadêmicas
de Extensão (AAE) curricularizadas, ou seja, previstas no Projeto Pedagógico do
Curso (PPC). Indica a referida resolução que as Atividades Acadêmicas de Extensão
devem ser “[...] realizadas na forma de práticas vinculadas aos componentes
curriculares: envolvem a execução de ações de extensão nas instituições de
Educação Básica, com orientação, acompanhamento e avaliação de um professor
formador da IES” (Brasil, 2024). Tal determinação, prevista no Art. 13, é
complementada pelo que segue:
§ As atividades de que trata o inciso III do caput são direcionadas à
implementação de projetos integradores de práticas educativas, visando
fomentar a integração e o diálogo entre os licenciandos, que estão em
formação, e os diversos participantes da comunidade escolar; essas
iniciativas devem dar prioridade a projetos que:
I - fomentem o protagonismo dos licenciandos, incentivando sua
participação ativa em interações com a instituição de Educação Básica;
II - promovam atividades que estimulem a interação entre os membros
da comunidade acadêmica, com o objetivo de compreender a
complexidade da prática docente;
III - iniciem diálogos formativos acerca da docência, das realidades
escolares e dos desafios enfrentados pela educação;
IV - encorajem a interdisciplinaridade dentro do contexto escolar, através
da criação de materiais didáticos que possam ser adaptados às
necessidades pedagógicas;
V - apoiem a integração entre a formação inicial e a formação continuada
dos professores das instituições de Educação Básica;
VI - estabeleçam interações com estudantes da Educação Básica e seus
familiares, promovendo uma relação mais próxima entre a instituição de
Educação Básica e a comunidade; e
VII - analisem a instituição de Educação Básica em seu contexto
territorial, incentivando a realização de ações coordenadas entre a IES e
a sociedade local (Brasil, 2024).
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Assim, ao tornar-se obrigatório o cumprimento na Educação Básica de toda
a carga horária relativa à Extensão Universitária curricularizada, pelo menos dois
entraves emergem: 1) se tanto o estágio obrigatório quanto as atividades
relacionadas à curricularização da Extensão Universitária devem estar centrados
na Escola Básica, não resta espaço ao longo do percurso formativo da pessoa
licencianda em teatro para a proposição e realização de atividades artístico-
pedagógicas em campo nos contextos da educação não-formal, como ONGs,
Casas de Cultura, Associações de Bairro etc., o que resulta em intransponível
lacuna à formação profissional; 2) a dificuldade de as unidades de Educação
Básica, sobrecarregadas em suas atribuições, absorverem e gerenciarem
diversas atividades de Extensão propostas pelos diferentes cursos de licenciatura.
Inclusive, o primeiro entrave apresentado é contrário ao que dispõe a Resolução
do Conselho Nacional de Educação CNE/CES 4, de 8 de março de 2004, que
aprova as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Teatro e
outras providências. No inciso VII de seu Art. 4º, a referida resolução preconiza que,
entre as competências e habilidades conferidas ao/à graduando/a em Teatro, deve
estar a “[...] capacidade de coordenar o processo educacional de conhecimentos
teóricos e práticos sob as linguagens cênica e teatral, no exercício do ensino de
Teatro, tanto no âmbito formal como em práticas não-formais de ensino” (Brasil,
2004). Portanto, essa resolução reconhece o espaço da educação não-formal
como instância que deve fazer parte do processo formativo da pessoa licenciada
em teatro.
Vale frisar que a Resolução do Conselho Nacional de Educação CNE/CP Nº 4,
de 29 de maio de 2024, que dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Formação Inicial em Nível Superior de Profissionais do Magistério da Educação
Escolar Básica, configura-se como desdobramento da Resolução 7, de 18 de
dezembro de 2018, a qual estabelece as Diretrizes para a Extensão na Educação
Superior Brasileira e regimenta o disposto na Meta 12.7 da Lei 13.005/2014, que
aprova o Plano Nacional de Educação - PNE 2014-2024, dando outras providências.
No Art. do Cap. I da Resolução 7, podemos ler: “as atividades de extensão
devem compor, no mínimo, 10% (dez por cento) do total da carga horária curricular
estudantil dos cursos de graduação, as quais deverão fazer parte da matriz
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curricular dos cursos” (Brasil, 2018).
Para além das divergências possíveis de serem identificadas nessas
resoluções, o fato é que elas alçaram o tema da Extensão Universitária à categoria
de destaque, afirmação que o educador Moacir Gadotti parece concordar:
[...] questiona-se sobretudo a Extensão Universitária como prática
separada do ensino e da pesquisa e a própria existência de Pró-reitorias
distintas. O que é promissor nesse debate é que a questão da Extensão
Universitária está posta hoje e os caminhos estão abertos para que ela
seja revalorizada como essencial para um projeto de universidade e de
sociedade (Gadotti, 2017, p. 4).
Isso posto, este texto apresenta como objetivo geral discutir sobre a
importância da Extensão Universitária, tanto no que tange à especificidade do
ensino superior em sua relação com a sociedade, quanto no que tange à formação
acadêmico-profissional de seus/suas discentes, trazendo à baila algumas
discussões hodiernas candentes e necessárias sobre este tema. Para isso,
escolhemos como recorte temático relatar e refletir sobre ações que, ao mesmo
tempo que dialogam com, problematizam os desafios impostos pelo tema da
curricularização da Extensão Universitária no âmbito de cursos de graduação em
Artes Cênicas – Licenciatura em Teatro.
Destarte, esta reflexão relata algumas ações desenvolvidas no âmbito do
Projeto de Extensão “Entre a Escola no Teatro e o Teatro na Escola: Interações e
Pedagogias Possíveis”. Tal projeto investiga as relações entre o teatro e a escola a
partir de duas perspectivas: o tema da escola como pretexto à escrita de
dramaturgias contemporâneas e as práticas do teatro no contexto da Escola
Básica. Com orientação do Prof. Dr. Sidmar Gomes, vinculado ao curso de
Graduação em Artes Cênicas Licenciatura em Teatro da Universidade Estadual
de Maringá, as ações aqui compartilhadas foram desenvolvidas por duas discentes
bolsistas e compreenderam: 1) montagem e apresentações do espetáculo “Coro
dos Maus Alunos”, de autoria do dramaturgo português Tiago Rodrigues, em
escolas e ações de formação continuada de educadores/as; 2) planejamento e
execução da oficina “Fabulações Sobre Uma Escola Ideal”, ofertada a alunos/as do
Ensino Fundamental II do Colégio Estadual Jardim Panorama, em Sarandi/PR; e 3)
planejamento e execução da oficina “O Que Pode o Teatro na Escola?”, oferecida
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a professores/as em formação do município de Lobato/PR. Ainda que não tenham
sido ações atreladas à curricularização da Extensão Universitária, por terem
acontecido em contextos da Educação Básica, entre outros aspectos que serão
debatidos adiante, elas se alinham ao disposto na Resolução CNE/CP 4, de 29
de maio de 2024, abrindo caminhos para discutirmos se ações extensionistas
dadas somente nos contextos da Escola Básica são suficientes à formação da
pessoa licenciada em teatro.
Sobre a ideia de Extensão Universitária
O professor e pesquisador João Antônio de Paula, em seu texto “A extensão
universitária: história, conceito e propostas” (2013), apresenta a emergência da
Extensão Universitária em diferentes países, dando destaque às principais
vertentes e aos modelos de desenvolvimento adotados pelas universidades tanto
no Brasil quanto no exterior. Dessa forma, lembra-nos que a Extensão Universitária
está prevista no Brasil desde a legislação de 1931, por meio do Decreto 19.851,
de 11/04/1931, que estabeleceu as bases do sistema universitário brasileiro.
Entretanto, ressalta que o processo de institucionalização da Extensão
Universitária continua incompleto.
Com efeito, a extensão universitária no Brasil, considerada em conjunto
e numa perspectiva cronológica, pode ser vista como tendo três
grandes etapas: I) a anterior a 1964, cuja centralidade foi dada pela
campanha pela Escola Pública e pela aproximação com o movimento
das Reformas de Base, a partir de obra e de prática de Paulo Freire; II) a
etapa que vai de 1964 a 1985, polarizada pela emergência e demandas
dos movimentos sociais urbanos; III) a terceira etapa corresponde ao
período pós-ditadura e se caracteriza pela emergência de três grandes
novos elencos de demandas: 1) as decorrentes do avanço dos
movimentos sociais urbanos e rurais; 2) as que expressam a
emergência de novos sujeitos e direitos, que ampliaram o
conceito de cidadania; 3) as demandas do setor produtivo nos campos
da tecnologia e da prestação de serviços (De Paula, 2013, p. 19-20).
Continua o seu raciocínio ressaltando ser primordial o diálogo entre a
universidade e a sociedade, na tentativa de responder às demandas e expectativas
da segunda, reconhecendo-a em sua diversidade e como possuidora de valores e
culturas tão legítimos quanto os saberes eruditos. Para ele, é tarefa da Extensão
Universitária: “[...] a promoção da interação dialógica, da abertura para alteridade,
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para a diversidade como condição para a autodeterminação, para a liberdade, para
a emancipação” (De Paula, 2013, p. 20).
Tendo como sujeitos tanto docentes, discentes e técnicos/as, quanto os/as
destinatários/as das ações extensionistas, a Extensão Universitária deve, para o
pesquisador, estabelecer-se a partir do diálogo e da interação travados entre a
microssociedade constituída pela universidade e a macrossociedade que a
envolve, sendo esses os princípios que regem a Extensão Universitária brasileira
hoje:
[...] i) a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; ii) a interação
dialógica com a sociedade; iii) a inter e a transdisciplinaridade como
princípios organizadores das ações de extensão; iv) a busca do maior
impacto e da maior eficácia social das ações; v) a afirmação dos
compromissos éticos e sociais da universidade (De Paula, 2013, p. 21).
O educador Moacir Gadotti (2017) acrescenta a esta discussão o fato de que,
na prática, haveria duas vertentes de Extensão Universitária em constante
confronto: “[...] uma mais assistencialista e outra não assistencialista, ou, como
também se costuma dizer, uma prática extensionista e outra não extensionista”
(Gadotti, 2017, p. 2). Segundo sua explicação, a primeira vertente estaria
relacionada à transmissão vertical do conhecimento, espécie de serviço
assistencial que desconheceria a cultura e o saber popular. Em linhas gerais, essa
concepção estaria focada numa perspectiva unilateral, de mão única, na direção
da universidade para a sociedade. Ou seja, não se consideraria o que poderia vir
da sociedade para a universidade, seja em termos da sociedade fomentando o
ensino superior, seja em termos do próprio saber que a universidade desenvolve.
Por outro lado, a segunda vertente entenderia a Extensão como comunicação de
saberes, portanto, estaria mais próxima de uma visão não assistencialista, não
extensionista de Extensão Universitária, tratando-se de uma perspectiva
fortemente influenciada pela proposta do educador Paulo Freire de substituição
do conceito de extensão pelo de comunicação:
[...] ela se fundamenta numa teoria do conhecimento [...]. Uma teoria do
conhecimento fundamentada numa antropologia que considera todo ser
humano como um ser inacabado, incompleto e inconcluso, que não sabe
tudo, mas, também, que não ignora tudo (Gadotti, 2017, p. 2).
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Essa perspectiva dialógica estaria interessada na troca efetiva entre saberes
acadêmicos e populares, o que culminaria tanto na democratização do
conhecimento acadêmico e científico quanto na produção científica, tecnológica e
cultural inerente à sociedade.
Por sua vez, o Art. 3º da já citada Resolução Nº 7, de 18 de dezembro de 2018,
preconiza que:
A Extensão na Educação Superior Brasileira é a atividade que se integra à
matriz curricular e à organização da pesquisa, constituindo-se em
processo interdisciplinar, político educacional, cultural, científico,
tecnológico, que promove a interação transformadora entre as
instituições de ensino superior e os outros setores da sociedade, por meio
da produção e da aplicação do conhecimento, em articulação
permanente com o ensino e a pesquisa (Brasil, 2018).
O mínimo de 10% de carga horária extensionista, do total da carga horária
curricular estudantil dos cursos de graduação, deve ser organizado de acordo com
as seguintes diretrizes no que tange às concepções e práticas da Extensão
Universitária na Educação Superior:
Art. [...] I - a interação dialógica da comunidade acadêmica com a
sociedade por meio da troca de conhecimentos, da participação e do
contato com as questões complexas contemporâneas presentes no
contexto social; II - a formação cidadã dos estudantes, marcada e
constituída pela vivência dos seus conhecimentos, que, de modo
interprofissional e interdisciplinar, seja valorizada e integrada à matriz
curricular; III - a produção de mudanças na própria instituição superior e
nos demais setores da sociedade, a partir da construção e aplicação de
conhecimentos, bem como por outras atividades acadêmicas e sociais;
IV - a articulação entre ensino/extensão/pesquisa, ancorada em processo
pedagógico único, interdisciplinar, político educacional, cultural, científico
e tecnológico (Brasil, 2018).
Assim, o Art. 6º, complementar ao Art. no que tange à estruturação da
concepção e da prática da Extensão na Educação Superior, apresenta que devem
ser contemplados:
I - a contribuição na formação integral do estudante, estimulando sua
formação como cidadão crítico e responsável; II - o estabelecimento de
diálogo construtivo e transformador com os demais setores da sociedade
brasileira e internacional, respeitando e promovendo a interculturalidade;
III - a promoção de iniciativas que expressem o compromisso social das
instituições de ensino superior com todas as áreas, em especial, as de
comunicação, cultura, direitos humanos e justiça, educação, meio
ambiente, saúde, tecnologia e produção, e trabalho, em consonância com
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as políticas ligadas às diretrizes para a educação ambiental, educação
étnico-racial, direitos humanos e educação indígena; IV - a promoção da
reflexão ética quanto à dimensão social do ensino e da pesquisa; V - o
incentivo à atuação da comunidade acadêmica e técnica na contribuição
ao enfrentamento das questões da sociedade brasileira, inclusive por
meio do desenvolvimento econômico, social e cultural; VI - o apoio em
princípios éticos que expressem o compromisso social de cada
estabelecimento superior de educação; VII - a atuação na produção e na
construção de conhecimentos, atualizados e coerentes, voltados para o
desenvolvimento social, equitativo, sustentável, com a realidade brasileira
(Brasil, 2018).
É importante destacar também que o Art. expõe que são consideradas
atividades de Extensão aquelas capazes de se caracterizarem como intervenções
que envolvam diretamente as comunidades externas às universidades e que se
vinculem à formação discente. O Art. 8º discorre sobre as modalidades das ações
extensionistas, as quais devem dialogar com os Projetos Políticos Pedagógicos dos
Cursos: “I - programas; II - projetos; III - cursos e oficinas; IV - eventos; V -
prestação de serviços” (Brasil, 2018).
Portanto, seja curricularizada ou não, a Extensão Universitária se configura
como uma ação importante no que tange às especificidades do Ensino Superior.
Para além de uma perspectiva meramente assistencialista, as ações extensionistas
podem se dar em diferentes modalidades programas, projetos, cursos e oficinas,
eventos ou prestação de serviços –, fomentando o protagonismo de discentes,
sob a supervisão e coordenação de docentes. Traduzem-se como incentivos
importantes para a formação profissional e para que a comunidade acadêmica
possa contribuir, em conjunto com suas comunidades de atuação, para o
enfrentamento e o encontro de soluções diante das grandes questões que
perpassam a sociedade. Assim, integrada aos outros dois pilares que sustentam
as especificidades do Ensino Superior o ensino e a pesquisa –, a Extensão
Universitária e seu caráter inter e transdisciplinar possibilitam que conhecimentos
acadêmicos possam transpor os muros da universidade, na mesma medida em
que saberes populares possam adentrá-los, em prol do desenvolvimento
econômico, ético e social da sociedade.
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Relato de uma experiência
Como dito, este texto se debruça sobre o relato e a reflexão acerca de três
experiências de Extensão Universitária dadas no contexto da Educação Básica: a
oficina teatral “O Que Pode o Teatro na Escola?”, oferecida a professores/as em
formação do município de Lobato/PR; a oficina “Fabulações Sobre Uma Escola
Ideal”, ofertada a alunos/as do Ensino Fundamental II, do Colégio Estadual Jardim
Panorama, em Sarandi/PR; e, por fim, a montagem e as apresentações do
espetáculo “Coro dos Maus Alunos”, do dramaturgo português Tiago Rodrigues.
Quando indagadas sobre as ações que gostariam de desenvolver no âmbito
do Projeto de Extensão “Entre a Escola no Teatro e o Teatro na Escola: Interações
e Pedagogias Possíveis”, as discentes extensionistas que protagonizaram tais ações
(bolsistas PIBIS e PIBEX-Fundação Araucária-CNPq-UEM) trouxeram como ponto
de partida o desejo de trabalhar com a noção de fabulação. Dessa forma, tomamos
contato com o pensamento de Saidiya Hartman (2022), escritora e acadêmica
americana cujo trabalho está focado nos estudos afro-americanos. Hartman cria
sua obra tendo como ponto de partida a noção de fabulação crítica, perspectiva
que trabalha no interstício entre ficção e não-ficção. A fabulação crítica, em sua
obra, pode ser compreendida como o modo de contar uma história a partir de um
olhar humano e atento, o qual cria possibilidades de existências plurais para figuras
homogeneizadas pelo registro histórico. Assim, Hartman parte de documentos
(fotos, notícias de jornais etc.), fabulando, em certa medida, as vidas das
personagens marginais presentes nesses materiais (mulheres negras desordeiras,
mulheres encrenqueiras e queers radicais), com o fito de criticar acontecimentos
e visões naturalizadas.
Portanto, o pensamento de Hartman, ainda que traga suas especificidades
sobre a ideia de fabulação, pareceu-nos instigante no que diz respeito ao objetivo
de fomentar a possibilidade de vislumbrarmos outros mundos e modos de
existência, mais suportáveis, éticos e capazes de reconhecer e respeitar as
diferentes formas de existir, exercício para o qual, a nosso ver, a escola se
apresenta (ou deveria se apresentar) como espaço privilegiado.
Definido o tema com o qual trabalharíamos, fabulações, foram pensados os
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encaminhamentos didático-metodológicos das duas oficinas desenvolvidas pelo
Projeto de Extensão “Entre a Escola no Teatro e o Teatro na Escola: Interações e
Pedagogias Possíveis”: a oficina de formação continuada para professores/as da
rede municipal de ensino da cidade de Lobato/PR, demanda vinda da Secretaria
de Educação de tal município, que nos procurou interessada em instrumentalizar
seus/suas educadores/as para o trabalho com a linguagem teatral, uma vez que o
município havia instituído o ensino integral e por isso necessitava de oficinas em
diferentes linguagens; e a oficina de teatro para alunos/as do Colégio Estadual
Panorama, no município de Sarandi/PR, tendo em vista refletirem sobre as
estruturas precárias de sua escola, vindas à público por meio de atos
performativos em vídeo, meses antes, organizados por uma professora de Artes e
seus/suas alunos/as. Como dito, concomitantemente a essas ações, também
desenvolvíamos a montagem e apresentações do espetáculo “Coro dos Maus
Alunos”, de Tiago Rodrigues.
Dessa forma, como abordar o tema da fabulação nos contextos acima
descritos? Como resposta a essa pergunta, as discentes extensionistas se
inspiraram nas experiências obtidas ao longo de suas formações no que tange às
práticas dos Jogos Teatrais (Spolin, 2001) e do Teatro do Oprimido (Boal, 2012),
tendo como objetivo a iniciação teatral tanto de alunos/as quanto de
professores/as. As fabulações foram trazidas e ressignificadas para o campo das
Artes Cênicas juntamente aos Jogos Teatrais de Viola Spolin e ao Teatro do
Oprimido de Augusto Boal.
A prática com os elementos dos Jogos Teatrais de Viola Spolin e do Teatro
do Oprimido de Augusto Boal foi o caminho que fomentou as fabulações operadas
tanto pelos/as alunos/as quanto pelos/as professores/as, como se verá adiante.
Como tratou-se de dois processos distintos, foram pensados diferentes
desdobramentos pedagógicos para esses mesmos pontos de partida teórico-
metodológicos.
O processo artístico-pedagógico desenvolvido com os/as alunos/as da Escola
Básica e conduzidos conjuntamente pelas discentes extensionistas propôs que
os/as jovens estudantes fabulassem sobre como seria uma escola ideal, e,
inerente a isso, como se daria o fim de sua escola sucateada. Essa oficina teatral
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aconteceu no Colégio Estadual Jardim Panorama, na cidade de Sarandi-PR. Trata-
se de uma escola pública e periférica, que abriga alunos/as do Ensino Fundamental
e Médio. A oficina foi realizada com alunos/as do ano do Ensino Fundamental,
ao longo de quatro semanas consecutivas.
Foram propostos jogos e dinâmicas teatrais com esses/as alunos/as, como
dito, inspirados nos legados de Spolin e Boal, para que, ao refletirem e jogarem
sobre suas realidades, os/as discentes trabalhassem os conceitos de escola
sucateada e escola ideal, a partir das fabulações críticas sobre o fim da escola
sucateada.
Entre os jogos e procedimentos desenvolvidos, podemos destacar:
Cena Objeto: A turma foi separada em grupos. Cada grupo recebeu um objeto
para se relacionar, devendo discutir sobre a função desse objeto e, em seguida,
imaginar/fabular outras funções para ele. Fabulado o objeto, o grupo deveria
pensar em um breve improviso, levando em consideração a manipulação
conjunta de tal objeto, ressignificado em sua função original. Cada grupo
apresentou seus improvisos para os demais. Uma das cenas apresentadas
aconteceu no supermercado. Foi criada a partir do objeto estojo, transformado
em uma máquina de cartão magnético. Na cena havia um conflito: a operação
de pagamento com o cartão não foi possível, pois o cartão estava com
problemas.
GIF Teatral: A partir da técnica do Teatro Jornal, de Augusto Boal, a cada grupo
de alunos/as foi dada uma notícia de jornal, com o tema da escola. Os grupos
deveriam ler e discutir as notícias, para depois pensar na criação de uma
imagem a partir de seus corpos, em formato de
GIF3
/boomerang,
explorando
algum aspecto significativo de sua notícia. Os grupos apresentaram uns aos
outros os improvisos criados e, após, fizemos uma conversa geral
compartilhando impressões. Um dos grupos realizou uma imagem em GIF
que
partiu da seguinte notícia: “Deputados cobram merenda de qualidade nas
escolas públicas”. Então, apresentaram uma manifestação estudantil em prol
de merenda escolar de qualidade. A imagem consistia em movimentos que
3 Graphics Interchange Format.
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expressavam os/as manifestantes levantando cartazes e fazendo movimentos
de ordem.
Cena Instalação: Em grupos, os/as alunos/as deveriam passear pelos ambientes
da escola observando recortes de espaços e selecionando materiais
encontrados, para, após, criarem uma cenografia/instalação com o tema
“sucateamento”. Assim, criaram dramaturgias espaciais sobrepondo desenhos,
rimas, trechos de música, mobílias, objetos, entulhos etc. Após, foi realizada
uma roda de conversa para troca de impressões e sugestões.
Jogo das Imagens de Poder: Foi iniciada uma conversa sobre autoridade e poder.
Após a conversa, em silêncio, as mediadoras pediram para que algum/a aluno/a
fosse ao espaço de jogo para compor a imagem de uma figura de autoridade.
Depois disso, pediram para que mais duas pessoas complementassem a
imagem supracitada, criando outras que se relacionassem com a primeira,
construindo relações de autoridade. Após feitas e observadas as composições,
teve início um debate, partindo de perguntas disparadas pelas mediadoras: que
autoridade é essa? Quem são as outras pessoas? Estão em posição hierárquica
maior ou menor? Depois de ouvir a pergunta, qual é o lugar que você mais
gostaria de estar nesse espaço? Qual lugar você não gostaria de ocupar nessa
imagem? Qual lugar você acredita ser o seu? Após o debate, alguém deveria
modificar a imagem conforme o que pensasse ser a situação ideal. Surgiu então
a imagem da própria hierarquia presente na escola, na qual fizeram a professora
e a diretora. Um dos alunos foi até a área de jogo e fez uma imagem de
professora. Depois veio outra pessoa e sentou-se na cadeira representando a
direção, com isso discutiu-se sobre o sistema escolar e suas hierarquias.
A partir da vivência com os jogos e procedimentos elencados acima, ao
mesmo tempo em que os/as alunos/as da oficina foram se instrumentalizando
ante à linguagem teatral, também foram percebendo de forma crítica o contexto
de sua escola em termos estruturais e simbólicos. Diante disso, foi proposto então
o desafio de transformar essas experiências em um jogo de tabuleiro teatral. Ou
seja, o grupo foi desafiado a construir um jogo de tabuleiro, cujo trajeto partiria da
escola sucateada em direção à escola supostamente ideal. As demais
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informações, como tamanho do tabuleiro, quantidade de casas, objetivos, como
jogar e desafios de cada casa, foram decididas em conjunto pela turma. Cada casa
desse tabuleiro seria preenchida por algum desafio teatral, inspirado nos jogos e
procedimentos trabalhados anteriormente. Cada grupo de alunos/as definiu o que
aconteceria em pelo menos uma casa: um jogo teatral, uma instalação, um debate,
algo que envolvesse o ato fabular ou o teatro ou o sucateamento da educação.
Uma das casas, por exemplo, envolvia um campeonato de xadrez, evidenciando a
visão dos/as estudantes sobre a escola ideal. Cada captura de peça somava
pontos que poderiam ser trocados por recursos ou melhorias escolares, como
aulas de teatro, espelhos nos banheiros e mais professores/as para diminuir a
sobrecarga e, por consequência, evitar o burnout dos/as docentes. Assim, ao jogar
o jogo, esperava-se o mesmo efeito proposto pelos procedimentos explorados na
oficina: que os/as jogadores/as, ao mesmo tempo em que fossem iniciados na
linguagem teatral, olhassem de forma crítica para suas realidades escolares.
Buscou-se, assim, fomentar nesse/as jovens uma visão crítica sobre a escola e a
educação brasileira, a partir de fabulações sobre imagens da educação e da escola
ideais e (im)possíveis.
A oficina desenvolvida com educadoras da rede municipal de ensino do
município de Lobato/PR também ocorreu ao longo de quatro semanas. Foram
desenvolvidos jogos e discussões teatrais com o objetivo de instrumentalizar essas
profissionais para proporcionarem aulas de teatro na escola.
A oficina foi planejada e conduzida, conjuntamente, pelo Prof. Dr. Sidmar
Gomes e por uma das discentes extensionistas.
Em um dos encontros planejados, cujo tema foi “contação de histórias e
fabulação”, pensou-se em trabalhar com o ato fabular e as questões levantadas
anteriormente pelas professoras participantes da oficina, como a falta de
concentração e criatividade de seus/suas alunos/as. Em certa medida, todos os
exercícios exigiam fabular histórias e/ou objetos outros, como no jogo
“Apresentação por Objeto”, que consistia na apresentação pessoal a partir das
características, funcionalidades ou história de um objeto escolhido por cada
participante, objetivando fabular acerca das diferenças, semelhanças e invenções
do objeto e de si, exigindo habilidade fabular e criativa.
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Outros jogos de cunho improvisacional foram propostos envolvendo as
fabulações. Um dos jogos exigia que as professoras se organizassem em duplas e
compartilhassem alguma história pessoal. Após os compartilhamentos, as
histórias deveriam ser trocadas e apresentadas pela pessoa que ouviu, havendo a
possibilidade de fabular. Uma das histórias envolvia o romance de uma professora
com o seu atual marido, que, fabulada por outra professora, tornou-se uma
narrativa fantasiosa envolvendo príncipes e princesas. Nessa atividade, uma
professora afirmou que, assim como os/as seus/suas alunos/as, ela “não possuía
criatividade alguma”, sentindo certa dificuldade para fabular, principalmente
quando exigido que isso se desse de forma improvisada. A discente extensionista
achou esse comentário interessante, desdobrando-o em uma pesquisa sobre o
tema, conforme relatado adiante.
Além da proposição e participação em ações extensionistas, as discentes
bolsistas de Extensão Universitária também tiveram como compromissos
apresentar um relatório final de suas bolsas, relatando e refletindo sobre as ações
desenvolvidas, e confeccionar um resumo expandido, apresentado no 7º Encontro
Anual de Extensão Universitária, desenvolvido pela Pró-Reitoria de Extensão e
Cultura da Universidade Estadual de Maringá. Dessa forma, elas foram desafiadas
a vislumbrar suas experiências no âmbito da Extensão Universitária e do ensino
pela perspectiva da pesquisa.
Relacionando as duas experiências vividas – as oficinas “O Que Pode o Teatro
na Escola?” e “Fabulações Sobre Uma Escola Ideal” –, uma das discentes
extensionistas se interessou por investigar as possibilidades e possíveis estratégias
de aproximação entre estudantes e docentes no contexto de processos artístico-
pedagógicos, questionando-se: existe diferença nas atitudes entre o/a aluno/a em
formação e o/a professor/a em formação? Apresentariam os/as professores/as
em formação continuada as mesmas dificuldades que seus/suas alunos/as ao se
depararem com um objeto de estudo desconhecido? Dessas perguntas, uma outra
se apresentou: de que forma a aproximação entre professores/as e alunos/as, a
partir das práticas do teatro na escola, pode fomentar atitudes críticas dos/as
docentes diante de suas práticas pedagógicas?
A extensionista concluiu que o/a professor/a, quando volta à posição de
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aprendiz, por exemplo, em processos de formação continuada, pode ter
comportamentos e dificuldades similares aos de seus/suas discentes, fato que
os/as aproximam, uma vez que esses comportamentos e dificuldades são
reconhecidos no/a outro/a e posteriormente em si. Isso, em certa medida,
contribui também para, por meio do exercício da alteridade, a melhoria das
relações entre educadores/as e alunos/as. Colocando-se no lugar de seus/suas
alunos/as, entraves que podem dificultar os processos de ensino-aprendizagem
são percebidos pelos/as educadores/as, condição fundamental para que
estratégias pedagógicas possam ser revisadas. Nesse sentido, a perspectiva da
fabulação proporcionada pela prática da linguagem teatral foi de extrema
importância para que ocorresse essa aproximação crítica de professores/as em
direção a seus/suas alunos/as crítica, que proporcionou aos/às docentes o
exame e a avaliação das relações estabelecidas. Dessa forma, percebendo
dificuldades compartilhadas com seus/suas alunos/as no que tange a imaginar,
criar e se expressar, esses/as professores/as instrumentalizaram-se tanto no que
condiz à linguagem teatral quanto ante a tarefa de traçar efetivas estratégias
pedagógicas.
a outra discente extensionista optou por relacionar sua experiência à
frente da oficina “Fabulações Sobre Uma Escola Ideal” ao processo de montagem
e temporada do espetáculo “Coro dos Maus Alunos”, de Tiago Rodrigues, no qual
participou como atriz-criadora.
Em “Coro dos Maus Alunos”, texto escrito no ano de 2008 pelo dramaturgo
português Tiago Rodrigues, é apresentada a chegada de um novo professor de
Filosofia para uma turma de jovens alunos/as. Tal professor, de idade avançada,
mas de espírito jovem, causa estranhamento de pronto entre os/as estudantes ao
pedir que defendam coisas que lhes parecem absurdas, como insultá-lo.
Paulatinamente, o estranhamento inicial vai tomando outros contornos. O
entusiasmo dos/as alunos/as começa a despertar a desconfiança da direção da
escola, a qual resolve abrir um inquérito para investigar as atitudes do professor.
A montagem, integrante das ações do Projeto de Extensão “Entre a Escola no
Teatro e o Teatro na Escola: Interações e Pedagogias Possíveis”, cumpriu
apresentações em programas de formação continuada de educadores/as, além de
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ser apresentada ao público em geral.
O princípio que norteou os trabalhos dessa montagem foi o processo
colaborativo, entendido como
[...] um processo de criação que busca a horizontalidade nas relações
entre os criadores do espetáculo teatral. Isso significa que busca
prescindir de qualquer hierarquia pré-estabelecida e que feudos e
espaços exclusivos no processo de criação são eliminados (Abreu, 2004,
p. 1).
Dessa forma, foram realizados jogos teatrais, aquecimentos, debates e
ensaios tendo em vista a construção do espetáculo, incluindo trabalho com o texto
em mãos, mas, sobretudo, colaborações dos/as atores/atrizes para a criação das
cenas.
A discente extensionista relata que de sua perspectiva como docente-atriz e
propositora desses processos, tanto na oficina, acontecida na escola, quanto nos
ensaios do espetáculo, acontecidos nas dependências da Universidade Estadual
de Maringá, percebeu o ato de rebeldia inerente a essas duas espacialidades e
contextos. Complementa expondo que quando propôs sua composição para a
personagem Síbia, presente na dramaturgia de “Coro dos Maus Alunos”, o processo
que estava vivendo na oficina ministrada na escola foi extremamente importante.
Síbia é uma adolescente que grafita as paredes da escola, fazendo desenhos nos
banheiros, no laboratório e na parede ao do muro, incluindo nesses desenhos
suas indignações. A discente extensionista relata ter encontrado na corporeidade
dos/as estudantes presentes na oficina, bem como nas estruturas da escola na
qual a oficina aconteceu, inspiração para a criação de seu papel. Na escola
também havia desenhos e pichações nas paredes das salas de aulas e do pátio,
evidenciando que isso faz parte desse espaço. Imbuída disso, pôde levar essas
sensações para a cena e para a corporalidade e a materialização do ato de pichar,
integrantes das ações cênicas de Síbia. Para além disso, em dado momento da
encenação, a docente-atriz tinha que desenvolver uma coreografia utilizando uma
cadeira. Esse objeto, tão presente na sala de aula, na montagem do espetáculo
tornou-se elemento chave da cenografia, adquirindo outras formas e subtextos,
carregando sentimentos, indignações etc. Cadeiras estiveram presentes também
na ocasião da proposição do jogo de instalação, por meio do qual os/as estudantes
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realizaram diversas composições espaciais a partir de cadeiras, expressando suas
indignações sobre a escola precarizada. Ao observar a instalação, a docente-atriz
percebeu fortes expressões nas formas criadas pelos/as alunos/as ao utilizarem
essas cadeiras, carregando essas sensações e parte das imagens observadas para
a sala de ensaios e para a composição das ações e intenções de sua personagem
Síbia, que também compartilhava da mesma indignação denunciada pelos/as
alunos/as participantes da oficina.
Conclui a discente extensionista que o processo vivido na oficina na escola
movimentou cargas criativas, psicológicas e emocionais que foram carregadas pela
docente-atriz para a sala de ensaios, culminando em um processo criativo e cênico
vivo e orgânico, revelador de muitas Síbias na realidade da escola pública.
Não menos importante foram as apresentações do espetáculo “Coro dos
Maus Alunos” para educadores/as e público em geral. As discentes extensionistas,
como dito, participaram da montagem como atrizes-propositoras. Ao final de cada
sessão do espetáculo, foi travado um breve bate-papo com o público presente,
tendo em vista refletirmos sobre os efeitos da apresentação. Ao longo desses
momentos, surgiram reflexões dos/as educadores/as relativas às diversas
questões que atravessam a prática docente na Escola Básica atualmente, entre
elas: o quão difícil é empreender didáticas e metodologias de trabalho inovadoras,
dadas as resistências encontradas em todas as instâncias que envolvem as
escolas, bem como as amarras institucionais e legais; o tema da violência (discente
e docente) presente no cotidiano escolar; a vigilância constante que recai sobre
educadores/as e, não raro, culmina em sanções não fundamentadas, entre outras.
Sobre a Emergência de um Paradoxo
Pelas reflexões e ações tidas e descritas, pode-se concluir que a Extensão
Universitária é fundamental para que possamos nos engajar com as comunidades
locais, tendo a oportunidade, como integrantes de uma instituição de ensino,
produtora de saberes e conhecimentos científicos, de identificar suas
necessidades específicas e colaborar na busca por soluções inovadoras e eficazes,
compartilhando experiências e práticas, a partir de um processo dialógico de
construção de conhecimento. Ao mesmo tempo, por meio dos saberes populares
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inerentes às realidades dessas comunidades, elas também contribuem de forma
significativa para o desenvolvimento das práticas e das relações entre Pesquisa,
Ensino e Extensão no interior da universidade aspecto possível de ser observado
pelas ações aqui descritas.
Da mesma forma que as oficinas destinadas a educadores/as e alunos/as da
Educação Básica proporcionaram a iniciação teatral de adultos/as e jovens,
instrumentalizando-os/as para os meandros da linguagem teatral, suas
expressividades e potencialidades diante de leituras e formas de atuação na escola
e no mundo, também possibilitaram, por meio do diálogo e da troca com grupos
exógenos à universidade, que estudantes extensionistas futuras professoras,
juntamente com seu professor orientador –, ao conhecerem outras realidades,
seus contextos, formas de organização, embates e potências, pudessem refletir
sobre suas práticas, construindo metodologias de trabalho e abordagens que
levassem em consideração esses saberes e demandas.
Em contato com tais comunidades e suas realidades, as discentes
extensionistas, a partir das respostas e atitudes das pessoas participantes das
oficinas, puderam desenvolver uma metodologia de trabalho inspirada na noção
de fabulação crítica, em diálogo com os Jogos Teatrais de Viola Spolin e o Teatro
do Oprimido de Augusto Boal. Além disso, puderam refletir sobre suas próprias
práticas, recebendo das comunidades com as quais atuaram, a partir de seus
conhecimentos e visões de mundo, pistas e possíveis respostas para suas
indagações acadêmicas: uma, sobre os caminhos de aproximação entre discentes
e docentes; outra, sobre as possíveis relações entre a sala de ensaios e a sala de
aula, ou seja, os acontecimentos criativos da sala de aula, a partir da proposição
de uma oficina artística, como fonte de inspiração para a criação da atriz em
processo de montagem de um espetáculo teatral.
Portanto, tratou-se de um processo de retroalimentação, de deslocamentos
recíprocos e mudanças em prol da construção conjunta de saberes e práticas,
manifestados na comunidade acadêmica por meio da interação entre Pesquisa,
Ensino e Extensão, e nas comunidades locais em nosso caso, parcelas da Escola
Básica –, pela reflexão e transformação de cotidianos e suas relações.
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Isso posto, as discussões acima reafirmam a importância do processo de
curricularização da Extensão no Ensino Superior não somente para o fomento à
formação acadêmico-profissional e cidadã das pessoas envolvidas, mas sobretudo
para o desenvolvimento da sociedade como um todo.
Nesse sentido, vale ressaltar, no que tange à formação da pessoa licenciada
em teatro, que são importantes ações extensionistas dadas no âmbito da
Educação Básica, conforme previsto na Resolução CNE/CP Nº 4, de 29 de maio de
2024, pois elas expandem os horizontes de atuação das práticas do teatro na
escola para além das aulas de Arte e das ações curriculares – instâncias comuns
para a atuação no contexto dos Estágios Curriculares Supervisionados. Por
exemplo, além das aulas de Arte, de acordo com a Resolução CNE/CP Nº 4, de 29
de maio de 2024, as práticas do teatro na escola podem encontrar espaço a partir
da proposição de ações extensionistas interessadas na criação de materiais
didáticos, na formação inicial e continuada de professores/as, na interação entre
estudantes, familiares e comunidades locais, entre outras.
As oficinas “Fabulações Sobre Uma Escola Ideal” e “O Que Pode o Teatro na
Escola?”, juntamente com as apresentações do espetáculo “Coro dos Maus
Alunos”, ao abrangerem docentes e discentes da Educação Básica, configuraram-
se como ações que, além de incentivarem o protagonismo dos/as licenciandos/as,
fomentando sua participação ativa em interações com a instituição da Educação
Básica, promoveram atividades que estimularam a interdisciplinaridade e a
interação entre os/as membros/as da comunidade acadêmica. Nessa toada,
permitiram a reflexão sobre as complexidades da prática docente, das realidades
escolares e dos desafios da educação, promovendo a integração entre a formação
inicial e a formação continuada dos/as professores/as das instituições de
Educação Básica (Brasil, 2024).
Entretanto, da forma como está posta a Resolução CNE/CP 4, de 29 de
maio de 2024, restringindo a execução de ações de extensão curricularizadas
apenas às instituições de Educação Básica, é dada vazão à emergência de um
paradoxo. Ao mesmo tempo em que tal resolução fomenta a expansão dos
horizontes de atuação das práticas do teatro no contexto das comunidades
escolares, ela tende a limitar os horizontes de formação da pessoa licenciada em
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teatro, impedida de desenvolver ações extensionistas curricularizadas em outros
contextos, por exemplo, da educação não-formal. Esse último aspecto, de certa
forma, contraria a própria noção de Extensão Universitária como ação abrangente,
como possibilidade de diálogo amplo entre a universidade e outros setores da
sociedade, entendidos como espaços de diversidade, constituídos por pluralidades
de contextos e práticas.
Pelo exposto, a sugestão que se faz é que a Resolução CNE/CP 4, de 29
de maio de 2024, seja flexibilizada, quiçá por meio da divisão de carga horária
mínima prevista de curricularização da Extensão Universitária entre ações
desenvolvidas no contexto da educação formal e não-formal, que a atuação
nesse último contexto é fundamental à formação integral da pessoa licenciada em
teatro, conforme demonstram os trabalhos de Almeida, Azevedo-Martins e Nunes
(2013); Laranjeira e Teixeira (2008); Soares (2011); Nogueira (2008); Marques,
Concílio, Silveira e Machado (2020); entre tantos outros.
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Universidade do Estado de Santa Catarina
UDESC
Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas
PPGAC
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Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas
Urdimento.ceart@udesc.br