
Cartas-performances para um Corpo-sem-Órgãos: uma pesquisa cartográfica com corpos que escrevem
Leomar Peruzzo
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-26, abr. 2025
Os caminhos e (des)caminhos, o roteiro prévio, bem como os desvios da
pesquisa, provocaram a reflexividade na/da/com uma prática
ressignificada e constituinte do docente-gente que ao narrar-pesquisar,
pesquisar-narrar, busca criar um movimento dialógico de reflexão,
(per)formação e constituição identitária que revelam e afirmam ou não,
um modo de ser-estar na docência.
As cartas, como gêneros discursivos, preveem uma intencionalidade de
comunicação e interação entre as pessoas, existente a milhares de séculos, sendo
utilizadas para enviar mensagens e comunicados. O ato da escrita de cartas
construiu história ao longo dos séculos, e a carta, enquanto gênero, possui três
dimensões: “Aspectos tipológicos. Domínios sociais de comunicação. Capacidades
de linguagem dominantes” (Soligo, 2007, p. 17). Neste estudo, a carta operou como
um recurso de registro, de comunicação e que está, atualmente, entre os recursos
comunicativos em desuso, diante da intensa e instantânea presença dos
aplicativos de envio de mensagens. Segundo a pesquisadora, podemos destacar
algumas características quanto ao gênero carta:
1.
Relatar
responde à necessidade de memorização e registro das ações
humanas e pressupõe representar, pelo discurso, experiências vividas,
situadas no tempo. 2.
Argumentar
responde à necessidade de discussão
de questões complexas, problemáticas controversas, temas polêmicos e
requer a tomada de posição pela defesa, refutação e negociação de
pontos de vista. 3.
Narrar
diz respeito à produção de literatura ficcional e
implica criar tramas, enredos, intrigas, no domínio do verossímil. 4.
Expor
responde à necessidade de comunicação de saberes e conhecimentos e
implica apresentar temas, conceitos, explicações, conclusões. 5.
Descrever
ações relaciona-se geralmente à necessidade de elaborar
instruções e prescrições e mobiliza a capacidade de regulação da ação
do outro (Soligo, 2007, p. 17, grifos da autora).
Nesse sentido, o ato de narrar marcas decalcadas nos corpos de
participantes, expor as memórias, descrever as superfícies sensíveis do corpo, foi
interconectado com o ato de argumentar em torno dos conceitos abordados na
pesquisa. O estudo, por conseguinte, apresentou suas linhas originais nos modos
de escrita, de registrar cartas em três momentos distintos, e no mapeamento de
encontros de corpos. O Corpo-sem-Órgãos, um corpo potente, atravessou as
cartas-performances e exigiu o olhar que vê os afetos, que identificou as linhas
sinuosas dos corpos, e reuniu as vozes que dizem sobre movências do
pensamento. A tessitura do texto foi composta por provocações que se originam