
Balanços e giros de processos artístico-pedagógicos que abraçam concepções animistas
Lígia Borges
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-15, abr. 2025
pássaros, formigas. Temporalidades e espacialidades capturadas que abrem
portais para o extracotidiano almejado nas linguagens artísticas em diálogos com
cosmologias cujas percepções dialogam com o animismo. Formulação complexa,
falível às contradições, que buscará seu campo de diálogo nesse texto mais
adiante. Desde já, abraçando os encantamentos que circundam as infâncias,
busca-se uma aproximação com possíveis segredos escondidos no parque que
incialmente podem se amostrar adormecidos. Para despertá-los e acessá-los,
convocam-se balanços, giros e vertigem, na contramão de concepções
cartesianas, que preconizam a supremacia da razão. As crianças podem se revelar
mestras na ativação desse estado e seus gestos rascunham um convite, que inclui
trânsito por essências e estados.
Ainda que tecendo estes pensamentos e palavras, que aqui se apresentam,
pelo eixo que recebe a alcunha de artista-professora, papel que exerci quando
compus seu corpo docente ao longo de 7 anos, tantos de nós, nesta posição,
transitamos e nos encontramos na relação com a EMIA como crianças, adultos,
anciões, árvores, terra, casa, balanço. Metamorfoses operadas quando nos
permitimos abalar por percepções que as acolhem enquanto trânsito de vivência
possível, com frequência suscitadas pela integração entre escola e parque. Passear
pelo parque com um grupo de crianças em aliança com os encantamentos à
espreita é canal para as mutações que brotam tais como raízes e folhas.
Manifestações de silêncio e fertilidade análogos, que escondem remédios e
venenos, um canto mudo que clama travessias.
Experimento escrever como quem tece, crava com agulha no tecido, perfura
materialidade, nos rastros de uma percepção rapsódica, tensionada pela posição
de contadora de histórias. Além de Hampâté Bâ, referência presente na epígrafe
e ao longo do texto, muitas investigações já abordaram a ligação da contação de
histórias com os ofícios artesanais, destacando o ato de tecer, bordar, costurar.
Em algumas pesquisas em que trilhei nessa direção, realizei parcerias com o grupo
de bordadeiras da EMIA: bordaEMIA4. Consciente das limitações das palavras,
4 Coletivo que desde 2016 pesquisa e realiza a arte do bordado na EMIA, com a coordenação de Joana Sales,
artista visual e professora-artista da escola. Integrantes em 2023: Ana Galluzzi, Ellen Triz, Érika Passo, Eunice
de Paula, Fátima Pereira, Graça Rocha, Jaqueline Marques, Naige Naara, Rose Araújo, Sílvia Vicente, Sueli Sufevi,
Tetê Chaves, Vanusa Paula, Vera Marques e Vivi Viana.