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A quem interessa pensar a performance?
Arte, política e educação em foco
Matheus dos Anjos Margueritte
Para citar esta resenha:
MARGUERITTE, Matheus dos Anjos. A quem interessa pensar
a performance? Arte, política e educação em foco.
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas,
Florianópolis, v. 3, n. 52, set. 2024.
DOI: 10.5965/1414573103522024e0801
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Matheus dos Anjos Margueritte
Florianópolis, v.3, n.52, p.1-8, set. 2024
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Resenha da obra
Sobre TAYLOR, Diana.
Performance.
São Paulo: Perspectiva, 2023. 200 p.
ISBN 978-65-5505-155-1
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A quem interessa pensar a performance? Arte, política e educação em foco1
Matheus dos Anjos Margueritte2
Resumo
Trata-se de uma resenha crítica do livro
Performance
, de autoria de Diana Taylor,
pesquisadora norte-americana reconhecida pelos seus estudos na área da
Performance em diálogo com questões latino-americanas. Com tradução e
apresentação de Leda Maria Martins, a obra é dividida em nove capítulos que
configuram um panorama das principais discussões sobre o tema, incluindo
perspectivas dissonantes entre si. Embora a análise da autora resida sumariamente
nos campos da Arte e da Política, esta resenha aponta para possíveis articulações
entre estes campos e a área da Educação, sobretudo a partir dos estudos de Paulo
Freire.
Palavras-chave
: Performance. Arte. Política. Educação.
Who cares about performance? Art, politics and education in focus
Abstract
This is a critical review of the book
Performance
by Diana Taylor, a North-American
researcher well-known for her studies in Performance in dialogue with Latin
American issues. Translated and introduced by Leda Maria Martins, the book is
divided into nine chapters and provides an overview of the main discussions related
to the topic, including dissonant views about it. Although the author’s analysis is
summarily situated in the fields of Art and Politics, this review points to possible
articulations between such fields and Education, drawing mainly from Paulo Freire´s
studies.
Keywords:
Performance. Art. Politics. Education.
¿A quién le importa la Performance? Arte, política y educación en foco
Resumen
Esta es una reseña crítica del libro
Performance
escrito por Diana Taylor,
investigadora estadounidense reconocida por sus estudios en el área de
Performance en diálogo con problemáticas latinoamericanas. Traducido y
presentado por Leda Maria Martins, el trabajo se divide en 9 capítulos que brindan
una visión general de las principales discusiones sobre el tema, incluidas
perspectivas contradictorias. Si bien el análisis del autor se sitúa sumariamente en
los campos del Arte y la Política, esta revisión propone articulaciones entre esos
enfoques y el área de la Educación, especialmente a partir de los estudios de Paulo
Freire.
Palabras clave
: Performance. Arte. Política. Educación.
1 Revisão ortográfica, gramatical e contextual do artigo realizada por Luzia Araújo. Doutorado e Mestrado em
Linguística Aplicada-Tradução pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Graduação em Letras
Português-Inglês pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas).
entrelinhas.edit@gmail.com http://lattes.cnpq.br/7294535946791003
2 Doutorando em Educação na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Educação pela UFPR.
Bacharel e Licenciado em Dança pela Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR).
margueritte.bio@gmail.com
http://lattes.cnpq.br/8130899003941009 https://orcid.org/0000-0003-3596-3264
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Pensar a Performance em seus diferentes sentidos e significados têm sido
um desafio instigante para quem deseja se aventurar em terrenos movediços e,
muitas vezes, contraditórios de construção de saber(es). Como um rio com muitos
afluentes, as discussões sobre/de/da Performance desaguam em diferentes áreas
do conhecimento e criam ecossistemas complexos para analisar a nossa relação
com o mundo que nos cerca.
Diana Taylor, em sua obra mais recente
Performance
(2023) convida-nos,
justamente, a mergulhar nessa correnteza, cujas águas oscilam entre o cristalino
e o turvo, o tranquilo e o agitado, o raso e o profundo e os mais infinitos espectros
que esses cruzamentos podem (re)criar.
Ao longo de 200 páginas, Taylor não apenas discorre sobre Performance, mas
exercita a premissa de que “quebrar normas é a norma da performance” (Taylor,
2023, p.77). De maneira ousada, a autora rompe com estruturas de texto, que
cristalizam e distanciam seus interlocutores, e refloresta seus escritos a partir da
presença de artistas latino-americanos, seja por meio de seus relatos ou por meio
de imagens que ampliam aquilo que nem sempre a palavra escrita dá conta.
Ainda na seara do escrever, de se destacar o posicionamento que a
pesquisadora assume: é de seu interesse dar ênfase a certas reflexões e, para tal,
romper com aquilo que se espera de um texto acadêmico normas. Taylor
vivencia sua escrita pelas lentes da Performance e se nutre de letras garrafais,
fontes gráficas e tipográficas diversificadas, cria recortes entre imagens e palavras,
subverte as diagramações convencionais e, ao fazer isso, mobiliza não somente
conceitos, mas também nossos corpos.
Nesse sentido, a autora abre o seu livro com o capítulo “Enquadramento
[Performance]”, título que, para alguns estudiosos da área, poderia soar de maneira
pretensiosa, uma vez que a Performance parece obstinada a escapar de definições
rígidas. Contudo, concordo com Taylor sobre a necessidade de mapear os
diferentes rumos que esses estudos têm tomado, desde sua origem na década de
1960 até o presente momento, sobretudo para que não haja o esvaziamento dos
possíveis sentidos que o termo “Performance” pode assumir.
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Assim, o capítulo de abertura configura-se como um diálogo entre diferentes
vozes e perspectivas, de modo a reunir as principais discussões sobre o tema,
incluindo as vivências de artistas latinos, assim como as ideias de Richard
Schechner e Judith Butler, que estão localizados nos campos da teatralidade e da
linguagem, respectivamente.
Em suma, a autora aponta que a Performance implica um
fazer
ou um
feito
ou um
refazer
, que necessita de uma relação entre performer e público e, por esse
motivo, é “[...] radicalmente instável e dependente de seu enquadramento” (Taylor,
2023, p.57), isto é, requer uma contextualização, podendo assumir outros
significados a depender de seus interlocutores. Taylor ainda propõe que, para além
de definir o que
é
performance ou analisar os fenômenos sociais
como
performance, ou seja, como ferramenta metodológica, a Performance precisa ser
encarada como um modo de ser/estar no mundo e, portanto, como construtora
de saberes próprios – uma epistemologia.
Para fundamentar a sua teoria, os capítulos seguintes “Histórias de
Performance”, “Espect-Atores” e “Os novos usos da Performance” vão reunir
relatos de artistas e suas percepções, tanto sobre a relação de seus corpos com
as práticas propostas em seus trabalhos, quanto sobre as reverberações causadas
no público que as/os assiste, voluntariamente ou não. Nestas sessões, a
pesquisadora ênfase ao caráter político que as intervenções artísticas criadas
por performers possuem, pois, ao deflagrar questões de violência de diferentes
ordens, a Performance instaura fissuras no corpo social e cria a possibilidade de
transformação do mundo.
Na sequência, Diana Taylor reserva o capítulo “Performativo e
Performatividade” para apresentar algumas diferenças importantes entre os
conceitos que estão associados ao guarda-chuva dos estudos da Performance,
como: Performativo, Performático, Performatividade e Animativos.
De acordo com a revisão feita pela autora, a ontologia do conceito de
Performativo está nos estudos do linguista John Austin sobre a linguagem como
propositora de ações e que se desdobram na pesquisa do filósofo Jacques Derrida,
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que alertará para a necessidade de se reconhecer as convenções que, de fato,
transformam a linguagem em ação. Tendo em vista a especificidade linguística,
Taylor afirma que a palavra “Performativo” não deve ser utilizada como adjetivo de
performance(s) e que, havendo a necessidade de atribuir uma qualidade a ela(s),
o termo mais cabível seria Performático”.
Seguindo essa esteira de pensamento, o próximo conceito retomado pela
pesquisadora diz respeito à Performatividade, cuja origem estará intimamente
associada aos estudos da filósofa Judith Butler, que deslocam as contribuições
feitas por Austin e Derrida para analisar as prerrogativas de identidade de gênero.
Em outras palavras, a Performatividade em Butler discorrerá sobre os efeitos que
os discursos produzem sobre os nossos corpos, principalmente na constituição
de nossas identidades.
A finalização deste capítulo apresenta o conceito desenvolvido pela própria
autora, isto é, “Animativos”. Taylor propõe que os Animativos são “[...] a resposta
inapropriada para um enunciado performativo” (2023, p. 121), ou seja, a resposta
política que nossos corpos dão para toda e qualquer tentativa de dominação.
Trata-se do caráter revolucionário da Performance.
Esta concepção é complexificada em “Conhecer através da Performance:
cenários e simulações”, momento em a pesquisadora defenderá que a
Performance como ação implica, em alguma medida, o experimentar pelo corpo
e que este pressuposto rompe com as lógicas de dominação que recaem sobre
nós: eis aqui o viés político da Performance.
Em “Artivistas (Artistas-Ativistas) ou o que fazer?”, Taylor reúne quatro
exemplos –
H.I.J.O.S
das mães da Praça de Maio, as performances de Regina José
Galindo, os vídeos criados pelo coletivo Fulana e as ações digitais dos
Yes Men
que irão destrinchar as aproximações entre arte e ativismo e os desdobramentos
políticos que ações coletivas ou individuais, presenciais ou mediadas pela internet,
podem ter nos processos de denúncia de questões sociais.
Por fim, a autora retomará em “O(s) Futuros da Performance e em Estudos
de Performance” o conceito de Arquivo e Repertório, desenvolvido por ela em
obras anteriores, para pensar as possibilidades e os desafios de construir uma
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epistemologia que conta de se consolidar como estudo (arquivo), sem sucumbir
às experiências que se dão no/do/a partir do corpo (repertório). Para Taylor, os
estudos da Performance são, portanto, pós-disciplinares, uma vez que a própria
área implica em um constante (re)fazer.
Ao longo do livro, torna-se evidente que Diana Taylor está comprometida com
a articulação entre Arte e Política para pensar a Performance, mas e a Educação?
Embora não seja o principal campo de análise da pesquisadora, diversas
passagens da obra reiteram que a Performance é um saber, um conhecer e um
experimentar o mundo pelo próprio corpo, entendido de maneira
multidimensional. Contudo, é possível discordar de Taylor quando ela pensa a
Performance como uma forma de “[...]
transmitir
conhecimento por meio do
corpo” (2023, p. 54, destaque meu).
Como pesquisador da área da Educação, interessado nos diálogos entre Arte
e Performance em situações de criação-ensino-aprendizagem, distancio-me de
uma perspectiva que implica uma epistemologia em um processo de
transmissão
de saber. Ancoro-me em Paulo Freire e sua denúncia feita em
A Pedagogia da
Autonomia
(1996) sobre aquilo que o autor chamará de “Educação Bancária”, isto
é, uma educação pautada na transmissão de saberes de um agente detentor do
conhecimento (professor, mas que, na perspectiva de Taylor, poderia ser o
performer) para outro tábula rasa (estudante, que, em Taylor, poderia ser toda e
qualquer pessoa afetada pela ação performática). Deste modo, Freire alerta que
esse tipo de Educação, que sucumbe o diálogo, está fadada a alienar nossos
corpos.
Trago esta reflexão, pois, me parece que o uso da palavra “transmissão”
associada aos estudos da Performance, embora enrede uma via única nos
processos de criação-ensino-aprendizagem aplicadas a essa área do
conhecimento, também reforça uma visão colonialista, imperialista e patriarcal,
formas de dominação que são constantemente denunciadas pela própria Taylor
ao longo de
Performance
.
Assim, retomo o título desta resenha: a quem interessa pensar a
Performance? Ora, fica evidente que Taylor direciona sua obra para artistas,
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pesquisadores e entusiastas do assunto que desejam compreender os mundos
criados pela Performance. Vou adiante e digo mais: frente à insuficiência deste
mundo em que vivemos em abarcar a diversidade que o compõe, interessa não
somente pensar, mas vivenciar a Performance, todas/es/os nós que micro ou
macroscopicamente estamos interessadas/es/os na construção de projetos de
sociedade mais justos e inclusivos, seja por meio da Arte, da Política, da Educação
ou dos infinitos afluentes desse
flume.
Referências
FREIRE, Paulo.
Pedagogia da autonomia:
saberes necessários à prática educativa.
25. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
Recebido em: 29/07/2024
Aprovado em: 11/08/2024
Universidade do Estado de Santa Catarina
UDESC
Programa de Pós-Graduação em Teatro
PPGT
Centro de Arte CEART
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas
Urdimento.ceart@udesc.br