1
Os contributos de Joana Lopes
a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Para citar este artigo:
CABRERA, Theda. Os contributos de Joana Lopes a uma
ético-poética-estética das artes da cena.
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas, Florianópolis, v. 1,
n. 54, abr. 2025.
DOI: 10.5965/1414573101542025e207
Este artigo passou pelo
Plagiarism Detection Software
| iThenticate
A Urdimento esta licenciada com: Licença de Atribuição Creative Commons (CC BY 4.0)
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
2
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena1
Theda Cabrera2
Resumo
Este artigo é um misto de relato de experiências profissionais, reflexões a posterior
e diálogo com bibliografias referentes a parte da trajetória profissional de Joana
Lopes. O artigo possui um caráter de memória de experiência vivida, de homenagem
póstuma a Joana Lopes como diretora-pedagoga ainda pouco reconhecida na
singularidade de sua carreira profissional múltipla, pioneira e precursora. Importa
aqui discutir o quanto, em seu processo criador, a ético-poética correalizada entre
pessoas pesquisadoras emergia numa estética contextualizada,
complexa
, numa
práxis
miscigenada
com enfoque transdisciplinar,
complexo
, multifatorial e
interseccional
.
Palavras-chave
: Joana Lopes. Mulheres nas artes. Teatro. Dança. Coreodramaturgia.
Joana Lopes' contributions to an ethical-poetic-aesthetics of the performing arts
Abstract
This article is a mix of a report on professional experiences, subsequent reflections
and dialogue with bibliographies relating to part of Joana Lopes' professional career.
The article has the character of a memory of lived experience, of a posthumous
tribute to Joana Lopes as a director-pedagogue who is still little recognized in the
singularity of her multiple, pioneering and precursory professional career. It is
important here to discuss how much, in its creative process, the ethical-poetics co-
realized among research people emerged in a contextualized aesthetics, complex, in
a cultural miscegenation praxis with a
transdisciplinary, complex, multifactorial
and
intersectional
focus.
Keywords:
Joana Lopes. Women in the arts. Theater. Dance. Choreodramaturgy.
Los aportes de Joana Lopes a una ética-poética-estética de las artes escénicas
Resumen
Este artículo es una mezcla de relato de experiencias profesionales, reflexiones
posteriores y diálogo con bibliografías relativas a parte de la carrera profesional de
Joana Lopes. El artículo tiene el carácter de una memoria de experiencia vivida, de
un homenaje póstumo a Joana Lopes como directora-pedagoga aún poco
reconocida en la singularidad de su carrera profesional múltiple, pionera y
precursora. Es importante aquí discutir en qué medida, en su proceso creativo, la
ético-poética corealizada entre investigadores surgió en una estética
contextualizada,
compleja
, en una praxis
mestiza
con un enfoque
transdisciplinario
,
complejo
,
multifactorial
e
interseccional
.
Palabras clave
: Joana Lopes. Mujeres en las artes. Teatro. Danza. Coreodramaturgia.
1 Revisão ortográfica e gramatical do artigo realizada por Gisélia Costa.
2 Pós-Doutoranda (financiamento Fapesp) em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Doutorado
(financiamento Capes / Fapesp). Mestrado em Artes Cênicas pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP). Bacharel. Professor Substituto no curso de Licenciatura em Arte - Teatro do IA- Unesp.
thedacabrera@yahoo.com.br
http://lattes.cnpq.br/8714571010712198 https://orcid.org/0000-0002-8066-8574
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
3
A Joana Lopes,
in memorian
, mão que me guia
silenciosa e encorajadoramente. À mestra de mestria.
Do nosso encontro, meu encontro com uma vocação.
Introdução
Este artigo é um misto de relato de experiências profissionais, reflexões a
posterior e diálogo com bibliografias referentes a parte da trajetória profissional
de Joana Lopes, quando tive a honra e o privilégio de estar sob sua orientação e
direção.
O artigo possui um caráter de memória de experiência vivida, de
homenagem póstuma a Joana Lopes como diretora-pedagoga ainda pouco
reconhecida na singularidade de sua carreira profissional múltipla, pioneira e
precursora. Importa aqui discutir o quanto, em seu processo criador, a ético-
poética correalizada entre pessoas pesquisadoras emergia numa estética
contextualizada,
complexa
, numa epistemologia na qual fazer- -refletir-desfazer-
refazer-tornar e refletir se retroalimentavam em espiral. Importa também discutir
o quanto a práxis de Joana era miscigenada, num enfoque transdisciplinar,
complexo
, multifatorial e
interseccional.
Uma hipótese é que essas miscigenações
étnico-raciais, mas principalmente filosóficas, culturais e artísticas levaram Joana
Lopes a uma senda de maleabilidade estética e a uma atitude genuinamente
decolonial
em que o processo coletivo e cocriativo ético-poético-
pedagógico/andragógico encontrasse expressão e comunicação estética coerente
com o processo e não eurocentrada e enxertada de outras estéticas alheias àquele
processo singular e temporal-historicamente orientado. Havia, nas obras de Joana,
uma maleabilidade estética que se devia ao fato de que os processos criativos, tão
imbricados na arte de viver, nas necessidades e potencialidades do grupo de
trabalho, nas singularidades das circunstâncias se fazia muito presente nas opções
estéticas, revelando-se em escolhas da encenação, dos figurinos, da trilha e dos
efeitos sonoros e no
design
de iluminação.
“Joana D’Arc Bizzotto Lopes nasceu em 14 de março de 1938, na cidade de
Belo Horizonte, MG, filha de um guarani que migrou para a sociedade das elites
brancas e se tornou militar e de uma mulher de origem nobre austríaca” (Cabrera,
Silva, 2021, p.3). Ela viveu a infância em Minas Gerais, e por volta dos anos 1950,
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
4
mudou com a família para São Paulo, onde estudou no Colégio Mackenzie e
frequentou a Escola de Bailado do Teatro Municipal de São Paulo. No Rio de
Janeiro, a partir de 1966, frequentou a Escola de Arte do Brasil e a Escola Nacional
de Teatro. No início da década de 1960 Joana atuou como professora
alfabetizadora de inspiração freiriana numa escola localizada em uma vila de
pescadores do litoral norte do estado de São Paulo, em Itaguá, Ubatuba. Em 1969,
ela foi convidada por Herbert ‘Betinho’ de Souza, fundador do movimento Ação
Popular, para apoiar uma produção teatral na região industrial do ABC da Grande
São Paulo envolvendo trabalhadores com idades entre 19 e 25 anos.
Em 1971, no Paraná, Joana Lopes realizou oficinas de teatro na Faculdade de
Filosofia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Entre 1972 e 1975, ela
lecionou na UEL, no então Departamento de Artes, na área de teatro. Entre 1972 e
1974 Joana criou o Grupum e o Teatro-Escola Pindorama:
Teatro-Escola Pindorama: uma escola de teatro e ramificação do Grupum
sediada em uma lavanderia abandonada na periferia leste de
Londrina. Seus alunos eram moradores de um conjunto [...] habitacional
[...]. A arquitetura da Cohab Pindorama inibiu a capacidade de reunião,
interação e organização de seus moradores. Quando foi concluído pela
primeira vez, não tinha instalações comunitárias. Esta lacuna foi
preenchida pelo Teatro -Escola Pindorama.
Os exercícios de teatro e movimento que o Grupum praticou com os
moradores da Cohab foram informados por uma metodologia que Lopes
desenvolveu através de suas experiências em educação popular
(Whitelegg, 2021-2022, s/p).
Esta e muitas experiências de inspiração freiriana voltadas ao ensino de
teatro propostas por Joana aconteceram entre as décadas de 1970 e 1980, em
diversas regiões do Brasil. Durante a Ditadura Militar (1964-1985), Joana Lopes
atuou primeiramente na legalidade e em seguida na clandestinidade como arte-
educadora e jornalista na nascente imprensa feminista brasileira.
O processo de elaboração das práticas cênicas ocorridas na década de 1970,
no auge da Ditadura Militar brasileira, teve alguns relatos e registros originais
confiscados e outros perdidos, o que resultou num esforço de reconstituição de
memórias reunidas por Joana ao publicar a primeira edição de
Pega teatro3,
em
3 Publicado pela primeira vez em 1981, a edição foi publicada em 1989 (ambas esgotadas) e a edição
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
5
1981, quando no Brasil eram ainda muito poucas as referências sobre teatro-
educação, bastante mescladas até aquele momento com o teatro para a infância.
Foram contemporâneos e interlocutores de Joana Lopes durante a década de 1970
Augusto Boal e Paulo Freire4 e pode-se constatar pelos relatos em
Pega teatro
a
influência de ambos (Cabrera, Silva, 2021, p. 5).
Neste que é seu livro mais conhecido,
Pega teatro,
Joana Lopes apresenta uma prática e reflexão sobre o
teatro-educação. Por meio das narrações de experiências dos trabalhos
que realizou nos anos 1970 com operários no ABC paulista, com uma
comunidade na periferia de Londrina e com outros grupos em São Paulo,
descreve uma metodologia de trabalho artístico-pedagógico em artes
cênicas (Cabrera, Silva, 2021, p. 5).
De volta do Paraná a São Paulo, Joana Lopes foi professora de Expressão
Dramática na Dança no Balé da Cidade de São Paulo, na gestão de Klauss Vianna.
Naquele período do início da década de 1980, Joana criou obras importantes num
momento de reabertura política: os
happenings
Cartas de mulheres brasileiras
(1982)
e
Vesperal paulistânia
(1983).
Ainda nesse período, Joana também criou como encenadora o
Tribunal
Tiradentes
(1983), ocorrido em São Paulo, sob a presidência do político e
empresário Teotônio Villela, em que se discutiram as origens, a legislação e a
filosofia da segurança nacional, o arbítrio que impunha à sociedade e suas
implicações. Isso porque no Brasil de 1983 foi decretada nova Lei de Segurança
Nacional que modificara apenas superficialmente a antiga lei promulgada durante
os anos de chumbo da Ditadura Militar, mas sem alterar em nada a Doutrina da
Segurança Nacional. A Comissão de Justiça e Paz solicitou que Joana Lopes
encenasse um tribunal para julgar a Lei de Segurança Nacional. Joana então
roteirizou e dirigiu um espetáculo histórico e político vivido coletivamente por
cerca de duas mil pessoas atores da história no Teatro Municipal de São Paulo.
Participaram, em cena, o então sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva como narrador
revisada e ampliada foi publicada em 2017. A terceira edição do livro esteve disponível para download
gratuitamente pelo link: https://www.joanabizzottolopes.com/copia-ficha-tecnica entre 2017 e 2024.
4 Em 1990 Joana Lopes realizou e registrou uma entrevista com Paulo Freire, que pode ser consultada no
link: https://www.acervo.paulofreire.org/items/026ecbb3-6df4-43fc-b0b2-1182be4fb5ed. Acesso em: 15 mar.
2025.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
6
de sua história, o jornalista e historiador Hélio Silva e a combatente política e
professora Rosalina Santa Cruz, entre outros. Havia um tratamento cênico para o
tribunal, como a iluminação de Iacov Hillel, os coros conduzidos pelo maestro
Samuel Kerr, a narração dos atores Adilson Barros e Antônio Fagundes. Em 1984
foi editado um curta-metragem que documenta a encenação, intitulado
Em nome
da Segurança Nacional5
, com argumento/roteiro de Roberto Gervitz e Renato
Tapajós e direção deste último. O curta-metragem foi financiado pela Secretaria
Municipal de Cultura da Prefeitura Municipal de São Paulo e premiado como Melhor
Filme no Festival de Oberhausen, Alemanha, em 1984. Posteriormente, o
Tribunal
Tiradentes
inspiraria a criação de outro trabalho dirigido por Lopes, o
Tribunal
Nacional dos Crimes do Latifúndio.
Joana foi convidada a criar um acontecimento
político-teatral com o mesmo
modus operandi
com que tinha criado o
Tribunal
Tiradentes.
Durante a gestão de Luiza Erundina como prefeita de São Paulo (1989-
1993), a Secretaria Municipal de Cultura, representada pela secretária Marilena
Chauí, e a Pastoral da Terra, copromoveram uma das sessões do
Tribunal Nacional
dos Crimes do Latifúndio
no Teatro Municipal de São Paulo. A encenação do
tribunal tratava dos crimes que acontecem no campo contra camponeses,
lideranças rurais e indígenas e ficam impunes, um problema infelizmente ainda
muito atual. Os dois trabalhos intitulados
Tribunal
reforçam a perspectiva
antropológica e política que marcaram o trabalho de Joana Lopes como
encenadora que envolvia em cena figuras públicas, pessoas anônimas, músicos
populares para uma plateia de cidadãos comuns, camponeses, gente que, muito
provavelmente, entrou pela primeira vez no edifício teatral de feições europeias e
imponentes do Teatro Municipal de São Paulo.
Joana Lopes também se dedicou ao teatro para a infância em três produções:
dirigindo
Tomás, o louco (1982),
com texto do dinamarquês
Tossede Thomas
,
que
abordava a questão dos transtornos do espectro autista, foi apresentado em
escolas, creches e esteve em temporada no Teatro de Arena Eugenio Kusnet em
São Paulo (SP) em 1985; atuando como assistente de direção do diretor Volker
Quandt em 1984 em apresentações no Teatro Guaíra em Curitiba (PR) com o
5 Para saber mais, veja na Cinemateca Brasileira. Disponível em: https://bases.cinemateca.org.br/cgi-
bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=FILMOGRAFIA&lang=p&nextAction=lnk&exprSearch=ID=030621
&format=detailed.pft. Acesso em: 15 mar. 2025.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
7
polêmico espetáculo
Vamos transar?
que abordava a questão da sexualidade para
o público infantojuvenil; e dirigindo
A vida íntima de Laura
(1986), com texto de
José Caldas com base no livro de Clarice Lispector, apresentado em Campinas
(SP).
Na década de 1980 Joana participou da fundação do Departamento de Artes
Corporais no Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),
onde atuou como docente e pesquisadora entre 1987 e 2007. Entre 1992 e 2000
atuou também como professora visitante da Universidade de Bolonha, Itália, a
convite de Eugenia Casini Ropa, professora e pesquisadora de História da Dança,
sua grande amiga e interlocutora.
Durante a década de 1990 Joana também ministrou aulas na
Civica
Scuola di Animazione Pedagógica di Milano
, Itália, e estabeleceu forte
colaboração com a artista-educadora italiana Loredana Perissinoto e
artistas e pesquisadores na França, como o casal de mestres de dança
Françoise e Dominique Dupuy (Cabrera, Silva, 2021, p. 4).
Desde meados da década de 1980, quando entrou em contato com Maria
Duschenes6, Joana foi se tornando especialista na arte do movimento expressivo
(Sistema Laban) e nas décadas seguintes seu trabalho de pesquisadora e artista
se voltou cada vez mais à área da dança, dança/teatro e ensino-aprendizagem da
expressão dramática na dança a partir do jogo dramático, o que culminou na
elaboração da
Coreodramaturgia.
As atividades experimentais da
Coreodramaturgia foram desenvolvidas no âmbito do Gruparte Teatro Educação
de São Paulo (1970-1976); Grupum/Universidade Estadual de Londrina (1972-1974);
Universidade Estadual de Campinas (1987- 2007); Universidade de Bolonha (1994-
2000).
Entre 1993 e 2014, Joana Lopes dirigiu espetáculos que se utilizavam da
Coreodramaturgia como
Busca vida, o homem amarelo
(1993), em São Paulo, com
Milton Andrade, que recebeu o Prêmio Nascente USP naquele ano;
Jogos arcaicos
entre D. e O
. (1999), com Andrezza Moretti, Luiz Andrade e Theda Cabrera, criado
e apresentado a convite da Universidade de Bolonha em 1999 e que teve
6 Veja a entrevista com Joana Lopes para a exposição virtual MARIA DUSCHENES: Expressão da Liberdade,
gravada em 2016, em São Paulo: Depoimento Joana Lopes sobre Maria Duschenes. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=sKKYXbzp20k. Acesso em: 15 mar. 2025.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
8
apresentações em Campinas (SP);
A flor boiando além da escuridão
, com Andreia
Yonashiro, criado e apresentado a convite da Universidade de Bolonha em 2006-
2007 e que esteve em temporada em São Paulo; o espetáculo
Pra Weidt, o Velho
,
produzido pelo SESC com estreia na Bienal SESC de Dança em 2007 e que esteve
em temporada em São Paulo em 2014.
Mais recentemente, em diálogo de pesquisa com a dançarina brasileira
Andreia Yonashiro e inspiradas na concepção de Coreodramaturgia de Joana
Lopes, ambas passaram a utilizar o conceito de Coreotopologia e conceberam o
espetáculo
Eólitos
(2014)
e a base para o livro
A dança elementar
(Lopes, 2020).
Em suma, Joana Lopes foi artista da dança e do teatro, jornalista precursora
na imprensa feminista brasileira, docente-pesquisadora na universidade pública
brasileira, educadora, cofundadora e conselheira de um projeto ambientalista,
mãe, avó, amiga, vizinha, comadre. Todos esses papeis me parecia que Joana
exercia com bastante integridade, intensamente presente em cada encontro.
Sempre no caminho de abrir-se a outra pessoa, exercer alteridade. Joana tinha o
dom de reunir pessoas ao redor de um projeto, realizando encontros multietários
com pessoas de profissões diferentes, de origens sociais e culturais diversas e
favorecer que descobrissem juntas uma meta comum. Na convivência com Joana
ficava enfatizada constantemente a busca de “vibração com o outro [...], da
experiência viva”, de incentivo e de acolhimento a uma “irrupção (inesperada) do
outro, do ser-outro-que-é-irredutível-em-sua-alteridade” (Skliar, 2010, p. 149).
Joana buscava os caminhos aparentemente tortuosos de ir lento, porém
seguir caminhando juntos, indo direto ao cerne das coisas, mesmo ainda com
aparentes digressões que, para ela, nunca eram encaradas como digressões e sim
como desejos a manifestar, perguntas balbuciadas que mereciam tomar voz e
corpo.
Uns determinados dias...
Na carreira como docente-artista na Unicamp, Joana Lopes foi a criadora e
coordenadora do Grupo Interdisciplinar em Teatro e Dança (GITD Unicamp), grupo
associado ao Núcleo Interdisciplinar de Comunicação Sonora (NICS Unicamp).
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
9
Fundado em 1993, o Grupo Interdisciplinar teve como principais linhas de pesquisa
o
Jogo dramático
(de acordo com a teoria das fases evolutivas do
Jogo dramático
,
de Joana Lopes) e o
Movimento expressivo
(de acordo com a
Teoria do Espaço
,
de Laban). A
Coreologia
labaniana e a
Teoria dos jogos
de Caillois (Caillois, 1990)
são as referências principais herdadas pela
Coreodramaturgia
. Porém, vários
outros pensadores influenciavam diretamente os trabalhos, tais como o filósofo
marxista, escritor, teórico político, jornalista, crítico literário, linguista, historiador e
político italiano Antônio Gramsci (1891-1937) e o dramaturgo, poeta, encenador
diretor-pedagogo alemão Bertolt Brecht (1898- 1956).
Em 1997, quando era aluna de graduação no curso de Bacharelado em Artes
Cênicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) tive a oportunidade de
cursar uma disciplina ministrada pela Profa. Joana Lopes. Em seguida, passei a
atuar entre 1998 e 2001 como atriz-pesquisadora do Grupo Interdisciplinar em
Teatro e Dança (GITD)/Núcleo de Comunicação Sonora (NICS Unicamp) sob
orientação da Profa. Joana Lopes, quando entrei em contato com várias das
referências da pesquisa da
Coreodramaturgia
. Participei da pesquisa
coreodramatúrgica do espetáculo
Jogos arcaicos entre D. e O.
que foi apresentado,
entre outros locais, no Teatro San Martino, em Bologna, Itália, na programação do
evento
L’Ombra dei Maestri: Rudolf Laban
, promovido pelo
Dipartamento di Musica
e Spetacolo da Universitá degli Studi di Bologna
, Itália, em 1999, sob curadoria e a
convite de Eugenia Casini Ropa.
Joana Lopes processou várias influências artísticas e da educação somática
de modo a criar um sistema integrado que permite ao ator-dançarino uma
aproximação dinâmica com o texto dramático literário: a
Coreodramaturgia.
A
Coreodramaturgia
é um
Sistema de escritura cênica para atores, atores-bailarinos, performers,
arte-educadores. Conceito que nasceu da pesquisa denominada ‘Do
Movimento à Palavra, da Palavra ao Movimento’. Aplicado na criação
dramatúrgica do Teatro-Dança e nos eventos de Arte do Movimento.
Define-se como contribuição à Coreologia de Rudolf Laban e é fundado
nos princípios elementares desta teoria. Estilisticamente configura-se
como neoexpressionismo e designa uma obra de perfil interdisciplinar
(Rengel, 2001, p. 39).
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
10
Citarei dois diretores-pedagogos que, partindo do enfoque
do texto dramático
literário à ação
ampararam a pesquisa no Grupo Interdisciplinar em Teatro e
Dança: o cantor e ator francês que ministrava cursos de Estética Aplicada François
Delsarte (1811-1871) e o dançarino, coreógrafo, teatrólogo, musicólogo, intérprete,
que estudou inicialmente com um discípulo de Delsarte e é considerado o maior
teórico da dança do século XX, o eslovaco Rudolf Laban (1879-1958).
Participei também da pesquisa embrionária (de 1999 a 2002) do projeto
interdisciplinar
Elementaridades
que reuniu músicos, físicos, dançarinos e atores,
utilizando referenciais teóricos da Física Quântica, procedimentos da
Arte do
Movimento
de Rudolf Laban e de música computacional, que perdurou até 2017 e
culminou na publicação de um livro de autoria de Joana Lopes em 2020, intitulado
A dança elementar.
Desse período de colaboração de pesquisa mais intensa, tenho vívidas e
excelentes memórias, o que é sinal de que estive presente e atenta a cada
encontro, conversa, sessão de trabalho, refeição compartilhada, trajeto de carro
vivido juntas. Desde as primeiras aulas que recebi de Joana no Bacharelado em
Artes Cênicas na Unicamp, mas principalmente como sua orientanda no GITD, a
convivência bastante frequente entre Joana, eu e outros colegas de grupo de
pesquisa se estreitou e transbordou para além dos muros da universidade.
Dentro da Unicamp o GITD não tinha uma sala, um galpão, sequer uma mesa
ou armário fixos disponíveis para abrigar suas atividades. Era e é um legado que
literalmente não encontrou lugar num departamento, num escaninho, numa
‘caixinha’ e, no Brasil, por enquanto não foi reconhecido e valorizado em seu
genuíno valor, ainda pouco dimensionado o ineditismo e o rigor das pesquisas
acadêmicas que desenvolveu. O que poderia ser uma queixa ou denúncia (e não
deixa aqui de sê-lo), porém, se tornou combustível a nos unir em torno da
generosidade e gratuidade dos gestos de Joana, que oferecia sua casa de campo
nos feriados para que trabalhássemos de modo tão intenso e criativo que nunca
experimentei igual em outro ambiente de pesquisa.
Sentia, naquelas condições excepcionais de trabalho e, ainda que fossem
condições exigentes, valia muito a pena ensaiar aos fins de semana, ter uma
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
11
dedicação extra que os outros colegas estudantes de graduação até então não
tinham. Foi no encontro e convivência com duas pessoas mais experientes do que
eu, Joana Lopes e Luiz Andrade, meus iniciadores em referências que até hoje me
são muito importantes, que senti pela primeira vez o que é participar de um grupo
de teatro. O que é pertencer a um grupo.
Em vários feriados e fins de semana prolongados íamos para um condomínio
localizado em uma reserva de Mata Atlântica em São Lourenço da Serra (SP), para
trabalharmos na pesquisa da
Coreodramaturgia Jogos arcaicos entre D. e O7
.
Nesses dias de pesquisa fora das dependências da universidade o trabalho seguia
um
continuum
, num convite o tempo todo para conviver, relacionar-se, escutar,
estar aberta, experimentar, errar, recomeçar. Era tudo o que eu sentia falta na
graduação em Artes Cênicas, mas que ali as condições favoráveis, o
estado de jogo
fazia aflorar, sem medos, sem reservas, sem palavras vazias.
Foi nesses períodos que percebi, pela primeira vez, algumas qualidades
positivas minhas. Essas qualidades ‘emanavam’ e havia o olhar atento de
Joana Lopes para estimular, desafiar e trazê-las à tona. Joana também
via deficiências, resistências, dificuldades em mim, nos outros e também
nela. E acredito que, por reconhecer suas próprias dificuldades, ela
aceitava bem os limites, tinha paciência, respeito, ia com calma e
persistência (Cabrera, 2015, p. 15).
À primeira vista parecia que não estávamos trabalhando; ou era um momento
desconectado do trabalho de pesquisa em Artes da Cena, porém de fato era tudo
tão integrado às perguntas da pesquisa e se dava de tal modo que parecia que
dava tempo para tudo. E ainda tínhamos laboratórios, conversas, ensaios e tudo o
mais que se parecia com trabalho empírico de pesquisa nas outras ‘30 horas do
dia’ em dias plenos, tão vívidos que ainda hoje sorvo cada gota de toda aquela
integridade e conexão. Joana se mantinha sempre muito respeitosa dos tempos e
espaços de cada pessoa do grupo de pesquisa, da autogestão do grupo e, ao
mesmo tempo, numa intencionalidade pedagógica de nos ensinar muitas coisas
de arte que sabia e compartilhava sob a forma de arte de viver. Recebi algo
digerido, transmutado, transcendido e, ao mesmo tempo, Joana nunca fazia
7 Assista a uma gravação do espetáculo feita em 1999 no Teatro San Martino, Bologna, Itália, no contexto do
evento
L’Ombra dei Maestri: Rudolf Laban
, promovido pelo Dipartamento di Musica e Spetacolo (DAMS) da
Universidade de Bologna. Jogos arcaicos entre D e O. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=LqDxZNvjSpc. Acesso em: 15 mar. 2025.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
12
nada por mim ou pelo outros, apenas fazia junto, maieuticamente acompanhando
jovens artistas a se parirem a si mesmos, ativamente esperando que perguntas
fossem formuladas, buscas pudessem ser pressentidas e sentidas, vividas e
percorridas. Foram alguns anos em que, pelas mãos de Joana, fui guiada de forma
bem discreta e sempre em regime de automotivação, autonomia,
corresponsabilização, autogestão. Pude realizar as primeiras viagens internacionais
com finalidade de estudo e de pesquisa, conhecer artistas e intelectuais de peso
no Brasil e no exterior, estrear, com o grupo, um espetáculo na Itália8. Com Joana
Lopes e por meio de contatos e referências que ela me ofereceu, tive acesso a
referências artísticas, culturais e acadêmicas que não exatamente a universidade
pública me proporcionava, mas Joana e o círculo que ela frequentava se abria para
me acolher em deferência a ela e à sua pesquisa. O encontro com Joana moldou
não uma ética como também uma poética, uma aspiração do Ser na qual o
oficio de artista transcende (e muito) a funcionalidade, a estetização precoce e
banalizante que é, muitas vezes, preciso tolerar para fazer parte, para corroborar
com um incipiente meio teatral dito profissional cuja oferta supera a demanda,
cujos espaços de vazão são ínfimos e mal pagos, onde se trabalha com ‘teatro de
pesquisa’ sem remuneração ou remuneração à altura. sentia esse medo de
choque de realidade, esse pressentimento da opacidade do mundo (econômico,
financeiro, social) em comparação a meus desejos criativos e artísticos e, muito
jovem que era, me sentia despreparada e imatura diante da grandiosidade de um
projectum
ético, poético e estético que precisava de financiamento, de estrutura
para poder se realizar plenamente. Condições materiais que Joana conseguiu, a
duras penas, garantir em relativa medida para ela própria, porém não passível de
ser estendida para o grupo de pesquisa e a continuidade das pesquisas. Um
recorte de classe precisa ser destacado aqui, quando me recordo que, em
inúmeras ocasiões, a limitação criativa esteve (e está) atrelada ou condicionada
por uma lógica capitalista neoliberal colonizada.
Mesmo nas inúmeras sessões de trabalho que tivemos no GITD entre 1998 e
2000, nos espações itinerantes e precarizados que éramos autorizados a ocupar
8 No
Teatro San Martino
, em Bologna, Itália, edifício em que foram encenadas produções de diretores como
Giorgio Strehler e Jerzy Grotowski.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
13
na universidade, podia-se sentir nitidamente a profunda e coerente busca de
Joana por uma ética-poética-estética que agora eu reconheço afinidade com uma
práxis
decolonial.
Joana Lopes exercia uma práxis ressonante, com
pensamento
decolonial
, o que sempre buscou, em sua trajetória pessoal e profissional, desde
a década de 1960, para romper com as opressões impingidas pelo colonialismo
europeu e sofridas pelos povos não europeus. Que eu tenha noticia, Joana não
teve contato com estudiosos latino-americanos da
decolonialidade
,
especialmente o Grupo
Modernidade/Colonialidade
. Porém, vale destacar que ela
mencionava a leitura de obra do psiquiatra e filósofo político martiniquenho Frantz
Fanon (1925-1961). Joana Lopes recebeu influência direta de pensadores como
Paulo Freire, inclusive atuando como professora alfabetizadora numa comunidade
de pescadores no litoral norte de São Paulo na década de 1960, e quando atuou
como jornalista entrevistou Freire na década de 1980. O que quero ressaltar é que
Joana, em sua práxis enraizada, encarnava uma
epistemologia decolonial
, de
cunho interseccional
e
fenomenológico
.
Entendo de forma bem ampla a
epistemologia
como o estudo metódico e
reflexivo do saber, de sua organização, de sua formação, de seu desenvolvimento,
de seu funcionamento e de seus produtos intelectuais; e as
epistemologias
decoloniais
como o estudo do conhecimento não eurocentrados nem
brancocêntricos, retomando e cultivando possibilidades outras para a produção
de conhecimentos, especialmente os histórico-educacionais; para formas
múltiplas de ser; para a valorização de saberes e fazeres diversos e valorização
das experiências vividas. Ainda que sem nomear sua práxis assim, me parece que
Joana Lopes ativava em suas ações pedagógicas/ andragógicas uma
epistemologia
decolonial
, o tempo todo fomentando reflexão acerca do eurocentrismo presente
na produção científica e artística ‘global’ e de outras estruturas de poder ligadas
ao saber, ao fazer e ao Ser. Em sua práxis ético-poético-estética-andragógica
Joana buscava e praticava constantemente, desde a década de 1960 mesmo
sem ter tido contato direto com os termos cunhados posteriormente – aquilo que
foi nomeado como a
decolonização do ser
e pela
decolonização do saber
.
Como mulher cisgênero feminista com atuação fundamental na cofundação
em 1975 (Debértolis, 2002) do primeiro jornal feminista do Brasil, o
Brasil Mulher
,
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
14
Joana Lopes sempre mantinha em vista as questões de gênero, de classe, de raça
em todas as etapas do processo criativo. Fazia parte de seu enfoque multifatorial
a perspectiva de classe, de gênero, de raça/etnia. Sua atitude
interseccional9
(antes
que o termo existisse ou fosse usado corriqueiramente) se revelava como prática
investigativa e práxis, tendo como arcabouço suas experiências e reflexões como
feminista. Inspirando-se em artistas como a cineasta belga radicada na França
Agnés Varda (1928-2019) e pensadoras como a filósofa, escritora e educadora
estadunidense Susanne Langer (1895-1985), Joana me parece que dialogava
talvez sem declará-lo plenamente com as
epistemologias feministas
decoloniais/interseccionais
. De origem mestiça, filha de uma mulher burguesa de
origem austríaco-italiana com um homem indígena guarani, interessava a Joana
agir de forma contra hegemônica sem necessariamente nomear com esses
nomes atuais uma discussão sobre o silenciamento das influências indígenas nos
projetos político-pedagógicos dos currículos de cursos de formação acadêmica e
profissional em Arte no Brasil. Como uma mulher que foi casada muito jovem na
década de 1960 em Minas Gerais e viveu situações de violência no primeiro
casamento, Joana Lopes não pode deixar de discutir as questões de equidade de
gênero, de direitos reprodutivos da mulher num contexto imperfeito e opressivo
da família nuclear e das inúmeras violências simbólicas que sofreu durante o
cerceamento de suas atividades profissionais artísticas durante a Ditadura Militar,
no seu autoexílio na América Latina e Europa. Mesmo sem explicitar publicamente,
nem nomear dessa maneira, Joana foi uma perseguida simbólica no ambiente
acadêmico brasileiro, oprimida pela falta de reconhecimento de seu valor como
docente-pesquisadora num ambiente acadêmico sexista, tecnicista, colonizado e
opressor às pessoas artistas e com pesquisas interdisciplinares. Presenciei
algumas situações em que Joana era pouco valorizada e reconhecida no caráter
rigoroso, transversal e precursor de suas investigações. Provavelmente essa pouca
valorização também se dava como crítica velada à multiplicidade de correntes
filosóficas e artísticas que influenciaram sua obra, ao cultivo de um
pensamento
complexo
(Morin, 1999) e transversal, evitando simplificações, reduções,
9 No que tange à
interseccionalidade
como prática investigativa e práxis e
epistemologias feministas
decoloniais/ interseccionais
, refiro-me a obras de pessoas autoras como Carla Akotirene; Sueli Carneiro;
Patrícia Collins; Angela Davis; Lelia Gonzalez; bell hooks; Nathalia Jaramillo; Grada Kilomba, entre outras.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
15
separações esquemáticas e generalizações precipitadas e enviesadas. Reunindo
em sua práxis o arcaico e o ancestral com o ultracontemporâneo, Joana Lopes
realizava sínteses entre campos de conhecimento tão vastos como a Arte e a
Ciência, a Física Quântica e as práticas corporais e filosóficas do Extremo Oriente,
o marxismo e a psicanálise. O trabalho foi alvo de críticas por pessoas que nem
mesmo foram suas alunas ou colaboradoras de pesquisa e sequer conheciam o
volume de sua produção artística e intelectual nem o rigor e inventividade com o
qual costumeiramente ela conduzia suas investigações. Apesar de tudo isso,
lidando com várias adversidades e oposições, ela fez parte do grupo de artistas-
pesquisadoras cuja práxis epistemológica, artística e pedagógica/andragógica são
consonantes com uma perspectiva de ativismo contra o silenciamento da cultura
indígena, emancipadora, revolucionária, posicionando-se lado a lado em
importância e contributos com figuras bastante reconhecidas da Arte Educação,
do Teatro e da Dança do final do século XX e início do século XXI no Brasil como
Augusto Boal, Ana Mae Barbosa, Ingrid Koudela, entre outras. Há de se questionar
por que o legado de Laban no Brasil, via Maria Duschenes, não inscreva Joana
Lopes publicamente nessa linhagem, como continuadora que antropofagizou
essas influências e criou uma versão autoral de ensino-aprendizagem do Sistema
Laban. de se questionar por que pessoas autoras estrangeiras ligadas ao ensino
de teatro tenham entrado na educação escolarizada como referência com
tamanha amplitude nas décadas de 1980/1990 na arte-educação ao invés de nos
debruçarmos sobre a força política e poética do trabalho de Joana em
Pega teatro
,
de 1981, que narra experiências brasileiras de forte cunho de
ação cultural
(Coelho,
2001). Talvez por ser Joana uma mulher perseguida pela Ditadura Militar e o livro
Pega teatro
narrar experiências artísticas e culturais de forte cunho libertário,
revelando desigualdades sociais e econômicas? Talvez por ela não ter se rendido
a um esquema mais comercial para sobreviver e tenha assumido o trabalho na
clandestinidade em comunidades, em vez de buscar a todo custo grande
visibilidade na mídia e no meio acadêmico?
A alteridade permeava também as interações de Joana com colegas da
Unicamp, especialmente de outras áreas de conhecimento e na busca por um
diálogo efetivamente interdisciplinar. Joana buscou aprender novas linguagens e
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
16
vocabulários bastante específicos para ser capaz de dialogar com a especificidade
do outro, neste caso, outro campo de conhecimento, a Física Quântica. Joana
dialogava muito também com ‘o outro’, ‘estrangeiro’, pessoas artistas e
pesquisadoras de outros países, outras universidades e nesse diálogo me parecia
que obtinha reconhecimento extraordinário, muito além do que recebia de
reconhecimento profissional no Brasil.
A práxis cultivada por Joana Lopes, de cunho decolonial e interseccional
também me parece consonante e extremamente coerente com uma perspectiva
fenomenológica10
, de suspensão dos pré-juízos, pré-julgamentos, pré-conceitos.
Exercitava o difícil olhar ‘como se fosse a primeira vez’, suspendendo um
entendimento implícito
a priori
das coisas, evitava tomar uma representação dos
fenômenos como a verdadeira e natural e buscava, por sua vez, distância em
relação às validações naturais ingênuas. Joana suportava bem a desordem
aparente que é subjacente ao ato criativo, sabia tirar partido do acaso, da
imprevisibilidade e do inconcluso, apreciava o processo artesanal, singular, de
‘tentativa e erro’ em que os ‘acertos’ são muitos poucos e frutos de bastante
esforço, no amor às verdades que se possa ter acesso por meio da experiência,
humildemente na lida com a matéria simbólica. Joana aguentava com coragem as
dialéticas-sem-síntese, as contradições, os antagonismos, os conflitos, as
adversidades, ainda que sofresse com o processo e abraçasse esse sofrimento
sem desviar-se dele nem o escamotear. Joana lutava com conceitos, paradigmas,
proposições práticas artísticas diversas e às vezes aparentemente divergentes,
nutria-se da fricção causada na luta entre adversários e fazia uso da energia
resultante dessa fricção no ato criativo. Uma diferença etária de cerca de 35 a 40
anos entre ela e seus colaboradores não lhe dava o direito de ‘posar’ como
‘encenadora demiurga’, não a impedia de nos ouvir atentamente, de esperar que
o nascimento das perguntas surgisse, de nutrir nossos corpos-mente de autores
e artistas da
complexidade
, grandes mestres, que pude conhecer pelas mãos
de Joana e sua mestria empírica rigorosa e exigente. Não havia um traço sequer
de Joana a nos ‘colonizar’ por sermos mais jovens e artisticamente menos
experientes do que ela: havia um compartilhar de saberes honesto, franco,
10 Refiro-me aqui especialmente à
epoché fenomenológica
husserliana.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
17
colaborativo, paciente, constante e amoroso. Não sentia nenhum jogo de poder
abusivo, de autoritarismo, de manipulação para que os objetos de pesquisa
propostos e guiados por ela, mais experiente, nos ‘objetificassem’ como meros
‘intérpretes-marionetes’, deixasse de contar nossas subjetividades, interesses e
desejos. Muito ao contrário, sentia-me pesquisando “junto com”11, apesar de a
pergunta inicial de pesquisa vir de Joana, chegávamos muitas vezes a formular
outras juntos que ela própria tomava como estímulo para exercitar sua mestria,
propor novos exercícios, em situação laboratorial. Joana foi uma diretora-
pedagoga em sua mais exata acepção: era da ético-poética correalizada entre
pessoas pesquisadoras que emergia uma estética contextualizada,
complexa
,
numa epistemologia na qual fazer-refletir-desfazer-refazer-tornar e refletir se
retroalimentavam em espiral. Ela sabia profundamente ouvir e escutar, enxergar e
ver, esperar pelo acontecimento e não o forçar a aparecer sob uma ‘fôrma’12
induzida. Sabia rigorosamente se postar diante do não-saber e não o reduzir a uma
resposta banal, requentada ou simplória. Muitas vezes foi difícil para mim (e até
impossível) trabalhar com ela, uma tendência minha a querer ser mandada, a
querer ser dirigida como ‘marionete’, a preferir obedecer passivamente a refletir
com autonomia. Seu rigor e exigência podia às vezes machucar um ‘ego’ alheio,
dado seu compromisso com a qualidade e não com a mediocridade.
Como mencionado anteriormente, Joana foi uma mulher miscigenada e
sua práxis era miscigenada, era flexível sem ser permissiva, firme sem ser rígida,
ágil sem ser superficial, “séria sem ser chata”, como ela própria definia. Minha
hipótese é de que essas miscigenações étnico-raciais, mas principalmente
culturais levaram-na numa senda de maleabilidade estética, na qual o processo
coletivo e cocriativo ético-poético-pedagógico/andragógico encontrou uma
expressão e comunicação estética coerente com o processo. Uma práxis que
dialogava com referências europeias, mas também as latino-mediterrâneas, as
brasileiras. Sem negar influências extrínsecas, porém criticamente as deglutindo e
11 Joana Lopes possuía uma linguagem verbal e não verbal muito ricas, repletas de imagens, expressões
idiomáticas, um ritmo de fala e movimento muito singulares. Neste artigo, as citações de falas características
de Joana estão entre “” e foram ouvidas inúmeras vezes durante nossa convivência, por isso não é possível
precisar data e local da informação verbal.
12 Mesmo desobedecendo à norma culta, coloco intencionalmente aqui a palavra fôrma com acento
circunflexo para indicar a moldura, a padronização de formatos.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
18
digerindo ‘antropofagicamente’, contextualizando-as naquele processo singular e
temporal-historicamente orientado. Maleabilidade estética, a meu ver, não deve
soar como oportunismo ou falta de estilo. Muito pelo contrário, se Joana Lopes
assumiu a direção de espetáculos com estéticas diversas, isso se deve ao fato de
que os processos criativos, tão imbricados na arte de viver, nas necessidades e
potencialidades do grupo, nas singularidades das circunstâncias, tudo isso
precisava, exigia estar presente nas opções estéticas. Além do apelo à visão e à
audição, os aromas e o tato contavam muito em seu processo criativo, apareciam
com muita constância nas propostas empíricas de pesquisa de movimento e em
seus escritos ficcionais. Porém, a função cinética (
metacinética
, para mais
exatidão) do movimento interior ao qual se buscava fazer emergir um movimento
exterior, a busca por tornar visível por meio de movimentos, sons e palavras o
invisível da interioridade e por dar visibilidade às tensões sociais, ideológicas,
políticas era o sentido mais aguçado de Joana e era com ele que ela conduzia as
pesquisas, dirigia espetáculos, dava aulas. Esse ‘sexto sentido’ em Joana era um
modo de abrir-se, de fundir-se e de distanciar-se do outro, da outra pessoa. Numa
atitude genuinamente
decolonial
, de uma humana que se humanizava a cada
encontro, Joana se realizava na outra pessoa, com a outra, diante da outra e para
atender à necessidade de outras que não sua vaidade. Realmente se sentia uma
submissão a uma meta comum, sem haver traço algum de subserviência ou abuso
de poder potencialmente subjacentes. A práxis
de Joana como artista educadora,
como mulher criadora era permeada de muita ação na reflexão e muita reflexão
na ação, num tempo-espaço de muito respeito mútuo, que reunia condições de
uma cocriação de si, do senso de coletivo e dos objetos de pesquisa das Artes da
Cena. Ao atuar como diretora-pedagoga,
Joana Lopes agia como
mestre de jogo13 . Mestre de jogo
significava
jogadora de fora do jogo, mas num alto grau de envolvimento com o que
acontecia nele. Ela ia propondo aos jogadores enquanto jogavam. Muito
pouco se comentava do jogo depois dele, Lopes elaborava novos
exercícios e práticas que trabalhassem o que ela buscava sem,
necessariamente, dizer quais eram suas intenções e sem induzir
13
Mestre do jogo
é a forma como Joana Lopes designava o artista-educador ou
diretor-pedagogo
propondo
ou conduzindo jogos e dramatizações. A nominação vem da cultura tradicional da infância: o
mestre de jogo
é, geralmente, uma das crianças mais velhas que toma a liderança nas brincadeiras e as outras crianças
aceitam “faremos tudo o que seu mestre mandar” (informação verbal, 1997). Também no RPG (
Role-playing
games
) se utiliza a nomenclatura
mestre de jogo
.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
19
resultados (Cabrera, 2015, p. 135).
Cada encontro de trabalho favorecia uma cocriação em que o inédito, o
inusitado pudessem surgir, sem indução na pesquisa, sem autocobrança de
resultados imediatistas e superficiais, apenas para corresponder às expectativas
neoliberais, “bancárias” na acepção freiriana, ‘proforma’ de publicação de
papers
que pouco ou nada têm de achados autorais e inéditos. Com Joana aprendi a
degustar, desde o início de minha trajetória como pesquisadora, o apreço por obras
basais de grandes autores e autoras, de “ler e estudar diretamente os clássicos” e
então conhecer as obras secundárias, buscar criar algo autoral sempre em
constante diálogo com uma bibliografia verticalmente estudada. E ao mesmo
tempo que uma pesquisa empírica fosse o foco principal da pesquisa bibliográfica,
ocorria que o “mapa pudesse ser consultado e melhorado, porém sempre dando
ênfase a descoberto do território mesmo” e assim evitando que “o bebê não fosse
jogado fora com a água do banho”, analogias às quais Joana sempre recorria...
Entre 2002 e 2004 estive envolvida na pesquisa de Mestrado em Arte na
Unicamp com um tema que havia surgido no âmbito do GITD, “do movimento à
palavra”, de uma conexão entre movimento e emoção que transbordasse na
construção de uma palavra cênica íntegra, ancorada no corpo-mente em
harmonia, conexões entre o visível e invisível, o silêncio por detrás das palavras, o
não dizível que se expressa pelo movimento etc. Como uma mestra que
maieuticamente parteja o nascimento de autonomia de uma discípula, Joana não
ficava por perto fisicamente, porém sua influência artística e afetiva esteve o
tempo todo presente. Eu nem ao menos me dignei de convidá-la para assistir à
arguição da dissertação14, tamanho o pudor de fracassar diante da mestra. Porém
ao menos o nome da mestra constava dos agradecimentos iniciais na dissertação,
pois a memória de conversas e orientações esteve presente em mim o tempo
todo, impactos inauditos e que não suportava naquele momento reconhecer,
admitir, conciliar com novas influências que vinham da orientadora e do co-
orientador. Entre 2005 e 2007 a “boa filha a casa torna” e Joana me dirigiu no
14 Dissertação de Mestrado em Artes no Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas entre 2002-
2004, sob orientação da Profa. Dra. Verônica Fabrini de Almeida e co-orientação de Carlos Simioni (LUME).
(Cabrera, 2004).
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
20
espetáculo
Uma aprendizagem de sabores15
, em uma nova versão após a arguição
da dissertação de Mestrado, aderindo às minhas perguntas de jovem pesquisadora,
auxiliando-me num acabamento estético de uma ética-poética que vinha se
delineando de forma ainda tímida, modesta, repleta de pudor e titubeios. Joana
Lopes, como diretora do espetáculo, pediu-me
algumas vezes algo como atriz, o que é o exercício máximo da escuta:
falar deixando as palavras me tocarem, me impressionarem, deixar que
elas soassem dentro de mim para ressoar no público. No caso desse
espetáculo, especialmente, era um rito de passagem: representar a
transformação da personagem era me transformar, era preparar-me para
ser capaz de realizá-la como mulher, como educadora, como aprendiz
(Cabrera, 2015, p.22).
Entre 2008-2014 Joana e eu não colaboramos nas pesquisas, não a vi
pessoalmente em muitas ocasiões, porém ‘conversava’ quase diariamente com
ela e com as referências que me trouxe. Pagava minhas dívidas de gratidão com
Joana me dedicando a planejar aulas para os estudantes de Licenciatura em
Teatro, a orientar de forma bem próxima e atenta colaboradores de pesquisa em
laboratórios, consultorias, do mesmo jeito dedicado, afetivo, comprometido que
havia recebido dela.
Porém, entre 2011-2015 retomei bastante referências que me foram
generosamente oferecidas por Joana Lopes e parte dessas reflexões estão
registradas na Tese de Doutoramento em Educação Universidade de São Paulo,
(Cabrera, 2015). Em 2016, enquanto realizava meu Pós-Douramento em Educação
pela USP, publiquei um artigo que discutia a questão do jogo de categoria
mimicry
(Caillois, 1990) e aprofundava elementos que não tinham sido suficientemente
discutidos na tese de Doutoramento. Retomando contato com Joana, enviei para
ela o artigo publicado e ela me fez o honroso convite dele constar da terceira
edição do clássico livro de autoria de Joana, o
Pega teatro
(2017). A partir daí,
Joana e eu retomamos contato profissional ainda espaçado, porém muito prolífico.
Como professora substituta no curso de Licenciatura em Teatro do Instituto de
Artes da Unesp em duas ocasiões distintas (2015 e 2021/2022), muitas vezes fiz
15 Espetáculo solo com direção de Joana Lopes, atuação e dramaturgia de Theda Cabrera, que teve
apresentações em bibliotecas públicas municipais, SESCs e espaços culturais na capital e interior do estado
de São Paulo entre 2005 e 2008. Uma primeira versão do espetáculo foi dirigida por Verônica Fabrini, em
2004, e apresentada em Barão Geraldo, Campinas, SP.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
21
menções para os estudantes da obra de Joana e de seus principais escritos. Ao
orientar uma pesquisa de Mestrado Profissional em Arte-Polo IA Unesp entre 2018
e 2020 de Francisco Souza da Silva, não tornamos o
Pega teatro
de Joana Lopes
uma bibliografia consultada e discutida na dissertação como houve um encontro
entre Joana, Francisco e eu para uma entrevista presencial à Joana em 2020, bem
pouco antes do período de distanciamento social na pandemia de covid-19. Dessa
entrevista e reflexões concomitantes e posteriores, resultou a publicação de outro
artigo (Cabrera, 2021), que fazia referência ainda mais explícita da influência de
Joana Lopes nas reflexões do momento, escrito em coautoria entre orientadora e
orientando.
Entre 2021 e 2023 intensifiquei o contato com Joana Lopes, sendo que no
período de distanciamento social predominantemente de forma remota e em 2022
e 2023 em várias visitas presenciais ao residencial sênior onde ela morou no bairro
do Butantã, em São Paulo (SP). Uma parte de nosso contato seguiu sendo de
colaboração profissional, especialmente em torno da possível leitura
pública/mediação de leitura/narração oral de um conto autoral de Joana Lopes
Perfume de pêssego
presente no livro
Duas novelas Italianas
publicado por Joana
em 2021. Fiz leituras em voz alta para Joana em 2022, gravando e enviando áudios
por WhatsApp, e em setembro de 2023 fizemos leitura pública de parte do conto
para amigos de Joana residentes no residencial sênior, que o conto aborda a
questão da memória de fatos passados, do resgate do desejo e da sexualidade
entre idosos. Joana e eu também dialogamos bastante sobre a obra
Aldeia
antropomágica
que esteve exposta durante a XII Bienal de São Paulo (1973). Isso
porque na ocasião Joana acabava de conceder uma entrevista à professora da
Universidade de Leicester (Inglaterra) Isobel Whitelegg, que é historiadora de arte
e curadora especializada em arte moderna e contemporânea da América Latina
(especialmente do Brasil) e em história e historiografia da arte contemporânea e
suas instituições (Whitelegg, 2021-2022). Joana se sentia satisfeita de que uma
pesquisadora britânica desse importância a seus experimentos artísticos
produzidos na década de1970 em pleno regime militar. Dei notícias à Joana de que
fora publicado recentemente um artigo acadêmico na área de Artes da Cena
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
22
(Peretta, 2023)16 usando o conceito de
Coreodramaturgia
criado por ela, citando
sua definição de Coreodramaturgia presente no
Dicionário Laban
(Rengel, 2001),
numa nota de rodapé.
Em novembro de 2023 fomos todos surpreendidos pela notícia de um grave
acidente que alterou em muito o estado de saúde de Joana, que estava meses
antes em excelente estado físico e lucidez impressionante para a idade. Ao final
de 2023 Joana faleceu, deixando um legado profissional imenso e ainda pouco
reconhecido na singularidade de uma carreira profissional múltipla, pioneira e
precursora.
Sua vida dedicada à arte-educação foi documentada no vídeo
Percursos da
Arte na Educação Joana Lopes17
pela Ação Educativa, lançado em 27 de março
de 2014, no Museu de Arte de São Paulo. O
site
oficial18 de Joana no momento
encontra-se fora do ar. O Núcleo de Documentação e Pesquisa Histórica (NDPH)
da Universidade de Londrina abriga o acervo pessoal19 de Joana Lopes desde 2016,
onde o Fundo Joana D’Arc Lopes (JDL)20 possui a listagem de documentos físicos
que compõe a série fotográfica e a série documental. Postagens
21
na internet após
seu falecimento também buscaram homenageá-la e manter viva a memória de
sua contribuição profissional ainda pouco reconhecida na singularidade: Joana foi
múltipla, pioneira e precursora, incansavelmente criativa e generosa.
16 O conceito de coreodramaturgia que o artigo apresenta desde o tulo e ao longo da narrativa é devidamente
referenciado apenas numa nota de rodapé na página 11.
17 Assista em: https://www.youtube.com/watch?v=-0Xh9O1LZ48. Acesso em: 15 mar. 2025.
18 Site oficial: https://www.joanabizzottolopes.com/. Acesso em: 20 abr. 2024.
19 Para saber mais, acesse em:
https://www.uel.br/com/agenciaueldenoticias/index.php?arq=ARQ_not&FWS_Ano_Edicao=1&FWS_N_Edicao=
1&FWS_Cod_Categoria=2&FWS_N_Texto=23914. Acesso em: 15 mar 2025.
20 Veja mais em: https://sites.uel.br/ndph/colecoes-e-fundos/; https://sites.uel.br/ndph/wp-
content/uploads/2022/08/JDL.SERIE-FOTO.pdf e https://sites.uel.br/ndph/wp-
content/uploads/2024/03/Fundo-Joana-Darc-Lopes-CJDL.pdf . Acessos em: 15 mar. 2025.
21 Foram publicadas na internet postagens comentando o falecimento de Joana Lopes, homenageando-a. Para
saber mais, acesse: https://portalmud.com.br/portal/ler/joana-lopes-1938-2023-lembrancas-de-uma-vida-
dedicada-ao-teatro-a-danca-e-educacao; https://www.nics.unicamp.br/2024/01/08/nota-de-falecimento-
professora-joana-lopes/. Acessos em: 15 mar. 2025.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
23
Referências
CABRERA, Theda.
Uma aprendizagem de sabores: a palavra cênica construída a
partir da conexão entre movimento, emoção e voz
. 2004. Dissertação (Mestrado
em Artes da Cena) Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2004.
Disponível em: https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/324449. Acesso em: 15 mar. 2025.
CABRERA, Theda.
A ético-poética do trabalho sobre si por meio da dramatização
de contos filosóficos de mitema iniciático na formação inicial de educadores.
Tese
(Doutorado em Educação) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015. Disponível
em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-15062015-143412/pt-br.php. Acesso em: 15
mar. 2025.
CABRERA, Theda. A maturação da capacidade de metamorfose no jogo
mimicry
.
Urdimento
- Revista de Estudos em Artes Cênicas
,
Florianópolis, v.2, n.27, p.397-
417, dez. 2016. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/urdimento/article/view/8225.
Acesso em: 15 mar. 2025.
CABRERA, Theda; SILVA, Francisco Souza da
. As reverberações de Pega teatro, de
Joana Lopes: contribuições para uma pesquisa em teatro educação. Urdimento
-
Revista de Estudos em Artes Cênicas, Florianópolis, v. 2, n. 41, p. 1-25, 2021.
Disponível em https://www.revistas.udesc.br/index.php/urdimento/article/view/19806. Acesso em:
15 mar. 2025.
CAILLOIS, Roger.
Os jogos e o homem
: a máscara e a vertigem. Lisboa: Cotovia,
1990.
COELHO, Teixeira.
O que é ação cultural.
São Paulo: Braziliense, 2001.
DEBÉRTOLIS, Karen Silvia.
Brasil Mulher Joana Lopes e a Imprensa Alternativa
Feminista no Brasil.
Dissertação (mestrado em Comunicação e Informação)
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2002.
RENGEL, Lenira Peral.
Dicionário Laban
. Dissertação (mestrado em Artes)
Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001.
LOPES, Joana. Teatro e dança num jogo pendular entre
palavra e movimento.
Teatro Antropomágico,
[
s. l
.], 2014. Disponível em:
https://teatroantropomagico.hotglue.me/?coreodramaturgia. Acesso em: 15 mar. 2025.
LOPES, Joana.
Pega teatro.
3. ed. Bragança Paulista - SP: Urutau, 2017.
LOPES, Joana. A dança elementar. São Paulo: Stacchini Editorial, 2020.
LOPES, Joana.
Duas novelas italianas.
São Paulo: Stacchini Editorial, 2021.
MORIN, Edgar.
Introdução ao pensamento complexo.
Porto Alegre: Sulina, 1999.
Os contributos de Joana Lopes a uma ético-poética-estética das artes da cena
Theda Cabrera
Florianópolis, v.1, n.54, p.1-24, abr. 2025
24
PERETTA, Éden. Atlas Coreodramatúrgico: constelações de imagens como método
de criação em dança.
Urdimento
revista de estudos em artes cênicas,
Florianópolis, v. 3, n. 48, set. 2023. Disponível em:
https://revistas.udesc.br/index.php/urdimento/article/view/24073. Acesso em: 15 mar. 2025.
SKLIAR, Carlos Alberto. Entre a diferença e os diferentes: retorno do outro ou
poética de um Eu que hospeda?
In
: FERREIRA-SANTOS, M.; GOMES, Eunice Simões
Lins (org.).
Educação & Religiosidade:
imaginários da diferença
.
João Pessoa:
Editora Universitária UFPB, 2010.
WHITELEGG, Isobel. Como falar de bienais que não existem: remontando a XII
Bienal de São Paulo (1973).
Documentos Tate, 34, 2022
. Disponível em:
https://www.tate.org.uk/research/tate-papers/34/biennials-that-dont-exist-reassembling-twelfth-sao-
paulo-biennial-1973. Acesso em: 15 mar. 2025.
Recebido em: 24/04/2024
Aprovado em: 30/03/2025
Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC
Programa de Pós-Graduação em Artes CênicasPPGAC
Centro de Arte CEART
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas
Urdimento.ceart@udesc.br