Perspectivas para pensar uma justiça social e epistêmica para e com as infâncias em dissidência
Mateus J. Fazzioni | Diego de Medeiros Pereira
Florianópolis, v.1, n.50, p.1-25, abr. 2024
como educadores(as) podem abrir novos caminhos e discussões, como também,
dependendo do nosso olhar para as crianças, pode compactuar com a censura,
reprodução de padrões e estereótipos relativos à infância. Como aponta Fazzioni
(2023, p. 147),
[...] nosso papel principal é ter uma escuta atenta e um olhar sensível
para encontrar estratégias de intervenção e mediação dessas discussões,
mesmo que nas entrelinhas, nos entrelugares e nas fronteiras. O teatro,
por si só, não consegue mobilizar todas essas questões, uma vez que o
teatro também já foi um espaço onde pessoas trans e travestis, por
exemplo, eram excluídas até pouco tempo atrás12.
Defendemos que é preciso que a(o) professora(o) tenha um olhar atento às
práticas e metodologias pautadas em uma Pedagogia
queer
/cuir ou dissidente, que
promova a emancipação e o acolhimento a partir do teatro. A ideia de uma
pedagogia
queer
/cuir é apresentada por Fernando Augusto do Nascimento em seu
livro
Teatro e representatividade queer: experiências com o método do drama na
escola
(2022) e por Guacira Lopes Louro, em seu artigo
Teoria queer: uma política
pós-identitária para a educação
(2001). Para Louro (2001, p. 552),
[...] uma pedagogia e um currículo queer “falam” a todos e não se dirigem
apenas àqueles ou àquelas que se reconhecem nessa posição-de-sujeito,
isto é, como sujeitos queer. Uma tal pedagogia sugere o questionamento,
a desnaturalização e a incerteza como estratégias férteis e criativas para
pensar qualquer dimensão da existência. A dúvida deixa de ser
desconfortável e nociva para se tornar estimulante e produtiva. As
questões insolúveis não cessam as discussões, mas, em vez disso,
sugerem a busca de outras perspectivas, incitam a formulação de outras
perguntas, provocam o posicionamento a partir de outro lugar.
Certamente, essas estratégias também acabam por contribuir na
produção de um determinado ‘tipo’ de sujeito. Mas, neste caso, longe de
pretender atingir, finalmente, um modelo ideal, esse sujeito – e essa
pedagogia – assumem seu caráter intencionalmente inconcluso e
incompleto.
Em paralelo com Nascimento (2022), é possível pensar a pedagogia
12 Essa perspectiva vem sendo alterada pela ocupação de muitas pessoas trans e travestis em espaços
artísticos, culturais e acadêmicos. Na cena artística, a presença de artistas como Renata Carvalho, Verónica
Valenttino, Linn da Quebrada, Liniker, entre tantas outras, evidencia a representatividade e as discussões que
vêm sendo ampliadas pela presença e ocupação de corpos trans nos diferentes espaços, no entanto, ainda
há muito a ser feito. No campo das pesquisas em Artes Cênicas, pesquisadoras como Dodi Leal, Isadora
Ravena, Fredda Amorim, Marina Silvério, entre outras, vem ampliando as discussões sobre curadoria, recepção,
performatividades transgêneras, produção cultural, afrofeminismo e outros estudos pautados nas vivências
de corpos trans e travestis. Esse campo epistemológico, contudo, ainda está distante dos espaços escolares
e entendemos que é esse aspecto que precisamos ampliar em nossas práticas, pesquisas e discussões entre
professores(as) e com nossos(as) parceiros(as) de trabalho no chão da escola.