Os paradoxos de uma pedagogia teatral contracolonial
Raimundo Kleberson de Oliveira Benício
Florianópolis, v.1, n.50, p.1-25, abr. 2024
MARINA
– Eu posso começar, então. Me chamo Marina e eu não tenho certeza de
estar no lugar certo, sabe.
LEVI
– Não precisa ter medo de falar Marina, estamos aqui para te escutar. Por que
você veio para esse encontro?
MARINA
– Assim, eu queria um conselho, sabe, algo tá me incomodando muito
atualmente... Recentemente uma garota no meu trabalho, sabe... Longe de mim, eu
não a odeio, mas já faz 5 anos que tô trabalhando nessa empresa, e recentemente
uma mulher negra novata chegou, num está nem com um ano, e foi promovida.
TODO MUNDO
: Mas isso não é justo...
MARINA
– Foi assim que eu me senti.
DÁRIO
– Então, a "mulata" te defendeu pelo menos? Dizendo algo do tipo, “não, mas
ela chegou aqui primeiro que eu, ela merece”...
MARINA
– Não.
LEVI
– Gente, ninguém vai postar nas redes sociais sobre isso, certo? Marina,
podemos recorrer. Nossa constituição foi construída e pensada para proteger gente
como você, sabia disso?
DÁRIO
– Ei, levanta essa cabeça meu anjo, você é um ser humano, esses
sentimentos não são errados tá bom, não fique triste.
MARINA
– Eu fiquei muita puta, então fui perguntar ao meu chefe por que ela foi
promovida e não eu. E sabe o que foi que ele me disse? que é porque ela tem um
perfil de liderança melhor que eu. Fiquei paralisada, me sentindo injustiçada, e meus
colegas de trabalho não me apoiaram, ninguém!
TODO MUNDO
: que foda isso!
DÁRIO
– Cara isso é como, tipo, a diversidade cultural que tá na moda né. Ou a
inclusão... ou a retomada indígena, ou as pessoas se reconhecendo como “índios”!
Sem nem mesmo morar em aldeia! Vocês sabem o que quero dizer né? Tá em todo
lugar, em todo formulário, em todo concurso fudido, em quase toda página na
internet. Cada governo, cada emprego, cada país. Essas pessoas estão roubando
nosso lugar.
L
EVI
– Nossa! Eu também penso assim e me sinto contemplado com suas palavras
Marina... Muito obrigado pelo seu desabafo. Eu queria acrescentar também... Vocês
sabem né, gays, lésbicas, trans, deficientes, negros, “índios”, podem se safar dizendo
coisas do tipo como: HAAA, PESSOAS BRANCAS SÃO TÃO PRIVILEGIADAS E TÃO
HORRÍVEIS, O TEMPO TODO, Gente é tanto “mimimi”!
TODO MUNDO:
ave maria, demais! Chega a cansar só de escutar e ver isso o tempo
todo, uma chatice!
MARINA
– Ou “Branco...” Esse é meu favorito... “Os brancos, héteros, são os piores e
ninguém diz nada”. Mas no minuto em que falamos qualquer tipo de crítica... As
pessoas gritam logo seu “Racista, homofóbico”!
TODO MUNDO
: Sim!
DÁRIO
– Marina, saiba que você está acolhida aqui. Todos nós meio que sentimos o
que você sente, sabe. E qualquer coisa que você nos diga, você tá segura com a
gente.