(des)educação estética em Weapon is a part of my body: Corpo e política em discurso
Jean Carlos Gonçalves; Michelle Bocchi Gonçalves
Florianópolis, v.1, n.43, p.1-20, abr. 2022
comprado, mas o raio que atinge a casa também não pode ser comprado.
Você se atém ao que disse. Mas o que você disse? Você é honesto. Você
diz sua opinião. Qual opinião? Você é corajoso. Contra quem? Você é
sábio. Em relação a quem? Você não considera suas vantagens pessoais.
Quais vantagens você considera, então? Você é um bom amigo. Você
também é um bom amigo das pessoas boas? Ouça-nos, então: nós
sabemos. Você é nosso inimigo.
A máscara ressurge nesta parte do trabalho nomeada
A good man
, só que,
agora, sob outra dimensão. Pedro coloca uma máscara preta sobre os olhos, em
uma evidente referência à forma como o atual presidente do Brasil se relacionava
com o objeto máscara, especialmente no início da pandemia, de forma
equivocada. Além de retardar e negar o uso da máscara, o presidente apareceu
em algumas ocasiões utilizando a máscara de proteção de forma inadequada e
destoante das recomendações dos órgãos de saúde. Nesta cena, vemos o rosto
de Pedro, com os olhos cobertos pela máscara, enquanto Ruthie enuncia o
fragmento destacado acima.
As relações entre estética e ética voltam à cena, agora com um tom irônico
e desacreditado quanto a crenças sobre honestidade, sabedoria e amizade no
campo da política. A verbo-visualidade que constitui esta cena se mescla a
interrogações que permeiam toda a narrativa do espetáculo. Quem somos e como
agimos quando ninguém nos vê? O contraste entre verdade e violência constitui
todo o percurso de
Weapon is a part of my body
e parece, neste bloco, em
específico, chegar ao seu auge. A construção de sentidos repousa e ferve na
interface entre realidade e ficção. No texto bakhtiniano ao qual estamos
recorrendo ao longo deste ensaio, há, na discussão dedicada ao problema do
material, um caminho de reflexão que pode nos auxiliar a sustentar teoricamente
esta questão:
Numa obra poética, as palavras organizam-se, por um lado, no conjunto
das orações, do período, do capítulo, do ato, etc., e por outro, constroem
o conjunto da aparência do herói, de seu caráter. De sua situação, de seu
ambiente, de sua conduta, etc., e, enfim, o conjunto do evento ético da
vida, esteticamente formulado e acabado; com isso deixam de ser
palavras, proposições, estrofes, capítulos, etc. (Bakhtin, 2014, p.51).
Cabe ao artista, do corpo e da palavra, se pudermos assim abordá-lo, embora
cientes de que qualquer dualidade sucinta não pode dar conta do todo complexo