Apresentação do Dossiê
Linguagens e metodologias na Educação Geográfica
Organizadores do Dossiê
Rosemy da Silva Nascimento
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
Florianópolis, SC – Brasil
lattes.cnpq.br/2298176439926963
Adilson Tadeu Basquerote Silva
Universidade para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí
(UNIDAVI)
Rio do Sul, SC - Brasil
lattes.cnpq.br/8318350738705473
Sérgio Claudino Loureiro Nunes
Universidade de Lisboa (Ulisboa)
Lisboa - Portugal
lattes.cnpq.br/8727109556137218
Jörn Seemann
Ball State University
Muncie, Indiana - EUA
lattes.cnpq.br/3145349748881926
Nas últimas décadas, os debates sobre linguagens na educação geográfica no Brasil resultaram em uma enxurrada de publicações acerca de metodologias, materiais e recursos para ensinar Geografia, desde coletâneas “clássicas” como “Geografia em sala de aula: práticas e reflexões” (Castrogiovanni; Callai; Schäffer; Kaercher, 1999)[1] e “A Geografia na Sala de Aula” (Carlos, 1999)[2] até obras muito mais recentes como “O Ensino de Geografia e as Diferentes Linguagens na Formação de Professores” (Santos; Queiroz; Cardoso, 2020)[3], “Geografia na Sala de Aula: Linguagens, Conceitos e Temas” (Portugal; Oliveira; Meireles; Souza, 2020)[4] e “O Ensino de Diferentes Linguagens na Leitura Geográfica” (Mello, 2024)[5], para citar apenas alguns exemplos.
Ao lado de linguagens firmemente estabelecidas e bem conhecidas (por exemplo, mapas, croquis, desenhos, gráficos, fotografias), surgiram outras formas de comunicação e expressão como fontes digitais de informação e tecnologias que nos permitem repensar o papel e as possibilidades de fazer geografia na sala de aula (Silva, 2021)[6]. Além disso, pesquisadores e educadores têm se inspirado em linguagens provindas de outros campos de estudo como a música (Dozena, 2024)[7], cinema (Rodrigues; Santana; Erthal, 2013)[8], histórias em quadrinhos (Costa, 2014)[9] e jogos e brincadeiras (Breda, 2018)[10], entre muitas outras possibilidades.
Nessa perspectiva, o dossiê “Linguagens e metodologias na Educação Geográfica” busca evidenciar o uso das formas de linguagem pelas quais o conhecimento geográfico foi e pode ser produzido, as distintas metodologias de ensino e de aprendizagem e a valorização do conhecimento geográfico como promotores de cidadania e de conhecimento para os sujeitos. Deste modo, reúnem-se reflexões, experiências e investigações que evidenciam a riqueza e a complexidade do ensino e da aprendizagem da Geografia em diferentes contextos educacionais. As contribuições aqui reunidas enfatizam a importância de repensar as linguagens, metodologias e recursos como caminhos para potencializar a formação do pensamento geográfico, a leitura crítica do espaço contemporâneo e a apropriação do conhecimento geográfico.
O conjunto de onze artigos, uma entrevista e uma resenha revela a diversidade de abordagens e perspectivas que atravessam o campo da Educação Geográfica, abrangendo metodologias ativas, práticas cartográficas, visuais e discursivas.
Abrindo o dossiê, o artigo “A tríade metodológica do “Projeto Nós Propomos!” como possibilidade na educação geográfica”, apresenta o Projeto Nós Propomos!, criado no Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa em 2011/12. Atualmente está em oito países. Busca aprimorar a educação geográfica, numa perspectiva de construção da cidadania territorial. Fundamenta-se no estudo de caso, apelando a que os jovens olhem criticamente a sua comunidade e a cidade, identifiquem os problemas socioambientais mais significativos e construam propostas de solução dos mesmos, que depois partilham publicamente. Promove, assim, práticas inovadoras, designadamente de trabalho de campo, e o desenvolvimento de diversas competências educativas.
Na sequência, o artigo “Geoeducação e metodologias ativas no ensino médio: um estudo de caso do Geoparque Caminhos dos Cânions do Sul” analisa uma sequência didática sobre o Geoparque Caminhos dos Cânions do Sul, aplicada em uma turma do ensino médio em Santa Catarina (2023). Com base na geoeducação e em metodologias ativas, como Microlearning, Team-Based Learning e Flipped Classroom, as atividades promoveram aprendizagem significativa, pensamento crítico e maior compreensão da relação entre sociedade, meio ambiente e geodiversidade.
O artigo “Educação geográfica e pedagogização visual nas fotografias da National Geographic Magazine: três discussões postas em diálogo” discute a pedagogização visual na National Geographic Magazine, analisando como suas fotografias educam e constroem modos de perceber o mundo. A partir de três estudos sobre imagens icônicas da revista, identifica-se que ela atua como agente formador de geografias e percepções culturais, produzindo noções de verdade e ampliando a educação para além dos espaços formais de ensino. Nesse mesmo raciocínio, o artigo “Educação geográfica e visualidade: a prática fotográfica de professores sobre o espaço urbano” investiga como professores de Geografia podem utilizar a fotografia como recurso pedagógico para interpretar o espaço urbano. Com base em autores como Lynch, Sontag, Gomes e Cavalcanti, a pesquisa, que envolveu sete docentes, demonstrou que fotografar a cidade estimula a leitura crítica da paisagem, favorecendo reflexões sobre desigualdades e práticas educativas significativas.
No artigo “Abordagem das imagens de satélite nos livros didáticos do novo ensino médio: linguagens e metodologias na educação para área de ciências humanas”, analisa-se o tratamento dado ao sensoriamento remoto em livros do Novo Ensino Médio aprovados pelo PNLD, avaliando quatorze coleções de Ciências Humanas. Embora as imagens de satélite estejam presentes, o tema é pouco explorado e carece de embasamento teórico e interdisciplinaridade. Conclui-se que os professores precisam recorrer a recursos complementares para aprimorar o ensino de geotecnologias.
Por sua vez, o artigo “Cartografia Social como linguagem para a Educação Geográfica” discute a proposta da prática da Cartografia Social como metodologia que aproxima os alunos de sua realidade, permitindo-lhes representar experiências por meio de mapas participativos. Aplicada em escolas de Baía Formosa/RN, essa metodologia promoveu aprendizagem contextualizada e reflexiva, destacando o protagonismo estudantil e o potencial da cartografia como linguagem na educação geográfica.
O artigo “A contribuição de Lana de Souza Cavalcanti ao ensino de Geografia” reflete sobre a importância das contribuições da Geógrafa e Professora Dra. Lana de Souza Cavalcanti à educação geográfica, especialmente na construção de uma didática da Geografia brasileira. Com base em Vygotsky e Raffestin, destaca o conceito de território como eixo articulador da cidadania e defende sua compreensão para além do sentido nacional, promovendo aprendizagens críticas e contextualizadas.
Nas reflexões do artigo “Análise da abordagem pedagógica do Componente Físico-Natural Água nas pesquisas Geográficas (1990–2024)”, é apresentada uma análise de teses e dissertações de Geografia defendidas entre 1990 e 2024 sobre o componente físico-natural “água”, destacando a UFG como importante polo de pesquisa. Identificou-se a predominância de temas como hidrografia, análise físico-natural e ensino da água, com metodologias diversificadas e foco na percepção cotidiana dos estudantes. O estudo ressalta a necessidade de aprofundar o diálogo acadêmico para aprimorar o ensino da água na Geografia.
O artigo “Análisis de los conocimientos geográficos sobre el continente americano de los estudiantes de nuevo ingreso en el grado de historia de la Universidad de Córdoba, España” apresenta um panorama crítico sobre o conhecimento geográfico de quarenta e cinco estudantes ingressantes do curso de História da Universidade de Córdoba acerca da América, a partir da aplicação de um questionário. Os resultados revelaram baixo nível de conhecimento e variações entre os ramos da Geografia, destacando a importância de estudos semelhantes em outros contextos.
Em seguida, o artigo “Municípios da Baixada Fluminense: toponímias como recurso didático no ensino de Geografia” analisa o uso das toponímias como recurso didático em oficina realizada com alunos do ensino médio na Baixada Fluminense. Utilizando cartografia participativa e práticas ativas, a atividade promoveu reflexão crítica sobre identidade e território, desconstruindo estereótipos e fortalecendo uma educação geográfica emancipatória e cidadã.
Finalizando a apresentação dos artigos, “A linguagem cartográfica no desenvolvimento do raciocínio geográfico” investiga como a linguagem cartográfica contribui para o aprimoramento do raciocínio geográfico. A pesquisa, de natureza qualitativa e exploratória, demonstra que esse raciocínio, fundamentado em conceitos e categorias da ciência geográfica, é potencializado quando os mapas são utilizados para interpretar situações espaciais e responder a questões geográficas.
O Dossiê também apresenta a entrevista com a Professora Doutora Gisele Girardi, intitulada “Gisele Girardi: em busca de outras cartografias na educação brasileira”. Atuante na educação cartográfica há mais de trinta anos, a professora propõe cartografias alternativas no ensino brasileiro, convidando a repensar os mapas como formas de comunicação visual para além das normas e convenções da cartografia científica. Na entrevista, ela compartilha momentos de sua trajetória acadêmica, relata como desenvolveu seu referencial teórico-metodológico de pesquisa e aponta caminhos possíveis para o estudo dos mapas no futuro.
Encerrando o repertório bibliográfico, Cassio Expedito Galdino Pereira apresenta a resenha do livro “Citizens and Rulers of the World: The American Child and the Cartographic Pedagogies of Empire”, de Mahshid Mayar, que revela como a linguagem cartográfica foi utilizada para moldar as crianças como cidadãos e governantes do mundo. No entanto, elas não devem ser vistas como seres passivos: embora inseridas em políticas, práticas e métodos voltados a interesses adultocêntricos e geopolíticos, as crianças constroem suas próprias lógicas ao consumir e reinterpretar essas pedagogias cartográficas do império.
Este dossiê reafirma a vitalidade e a pluralidade da Educação Geográfica contemporânea através das diversas linguagens utilizadas e convida o leitor a explorar caminhos que integram teoria, prática, linguagem e metodologia em favor de uma educação mais crítica, inclusiva e transformadora.
Rosemy da Silva Nascimento
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
Adilson Tadeu Basquerote Silva
Universidade para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí (UNIDAVI)
Sérgio Claudino Loureiro Nunes
Universidade de Lisboa (Ulisboa) - Portugal
Jörn Seemann
Ball State University- EUA
Organizadores/a
[1] CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos; CALLAI, Helena Copetti; SCHÄFFER, Neiva Otero; KAERCHER, Nestor André (orgs.) Geografia em sala de aulas: práticas e reflexões. Porto Alegre: Edição dos Autores, 1999.
[2] CARLOS, Ana Fani Alessandri (org.). A geografia na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1999.
[3] SANTOS, Clézio; QUEIROZ, Edileuza Dias de; CARDOSO, Cristiane (orgs.) O ensino de geografia e as diferentes linguagens na formação de professores. Joinville: Clube de Autores, 2020.
[4] PORTUGAL, Jussara Fraga; OLIVEIRA, Simone Santos de; MEIRELES, Mariana Martins de; SOUZA, Hanilton Ribeiro de (orgs.) Geografia na sala de aula: linguagens, conceitos e temas. Curitiba: Editora CRV, 2020.
[5] MELLO, Laércio de. O uso de diferentes linguagens na leitura geográfica. Curitiba: Intersaberes, 2024.
[6] SILVA, Valdenildo Pedro da. Novas tecnologias no ensino de geografia: possibilidades e limites em questão. São Paulo: Editora Dialética, 2021.
[7] DOZENA, Alessandro. Geografias sonoras. Rio de Janeiro: Mórula Editorial, 2024.
[8] RODRIGUES, Rejane Cristina de Araujo; SANTANA, Fabio Tadeu de Macedo; ERTHAL Leopoldo Carriello. Aprendendo com filmes: o cinema como recurso didático para o ensino da Geografia. Rio de Janeiro: Lamparina Editora, 2013.
[9] COSTA, Rafael Martins da. Geografias em quadrinhos: imaginando um mundo em sala de aula. Porto Alegre: Deriva, 2014.
[10] BREDA, Thiara Vichiato. Jogos geográficos na sala de aula. Curitiba: Appris, 2018.