e-ISSN 1984-7246  

 


Lei nº 14.285/21: Lei posterior ao Código Florestal e menos protetiva ao meio ambiente

 

 

Renata Bousfield *

Polícia Militar de Santa Catarina (PMSC)

Florianópolis, SC - Brasil.

lattes.cnpq.br/5329743080711547

orcid.org/0009-0008-2907-6283

rebousfield@gmail.com

 

 

Jorge Luiz Rodrigues Filho **

Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)

Florianópolis, SC - Brasil.

lattes.cnpq.br/1847907417927121

orcid.org/0000-0002-3681-9806

jorlrf@gmail.com

 

 

 

 

 

 

Lei nº 14.285/21: Lei posterior ao Código Florestal e menos protetiva ao meio ambiente

Resumo

A Lei nº 14.285/21 possibilitou aos municípios brasileiros disciplinarem as áreas de preservação permanente (APP’s) próximas a cursos d’água em áreas urbanas. A Resolução do CONSEMA nº 196/22 pormenorizou a matéria, com base em parecer do Ministério Público e em duas notas da Federação de Consórcios, Associações e Municípios de Santa Catarina. Essa alteração legislativa é objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) nº 7.146/22, no Supremo Tribunal Federal (STF). Nesse processo, discute-se o fato de não caber aos municípios disciplinarem a matéria, mas sim à União. Também se aventa o sistema de freios e contrapesos entre os poderes do Estado, não cabendo ao legislativo agir posteriormente e em descompasso com questão decidida pelo judiciário. Por fim, pontua-se o necessário cumprimento do princípio da vedação ao retrocesso da proteção ambiental. Além da discussão no STF, a Lei nº 14.285/21 alterou o conceito de área urbana consolidada, deixando aos municípios o encargo de localmente pontuar essas áreas, facilitando a “escolha” das APP’s próximas a curso d’água em área urbana. Essa conjuntura enseja especulação imobiliária. Da própria justificativa do projeto dessa lei, extrai-se a preocupação com áreas consolidadas, independente de serem áreas de interesse social. Esse panorama será exemplificado com a situação atual do município de Joinville, em Santa Catarina. Dessa forma, será analisada a Resolução do CONSEMA nº 196/22, a discussão da inconstitucionalidade da Lei nº 14.285/21, bem como a intenção do legislador, conforme justificativa da Lei nº 14.285/21, exemplificando essa realidade com a situação atual de Joinville.

 

Palavras-chave: área de preservação permanente; código forestal; competência legislativa.

 

Law nº 14.285/21: Law after the Forestry Code and less protective of the environment

Abstract

Law nº 14,285/21 has empowered Brazilian municipalities to regulate permanent preservation areas (PPAs) near watercourses in urban areas. Resolution CONSEMA nº 196/22 further detailed the matter, based on the opinion of the Public Ministry and two notes from the Federation of Consortia, Associations, and Municipalities of Santa Catarina. This legislative amendment is the subject of Direct Action of Unconstitutionality (Adin) nº 7,146/22 in the Federal Supreme Court (STF). In this process, the debate revolves around whether municipalities have the authority to regulate the matter or if it falls under the jurisdiction of the Union. The principle of checks and balances between the branches of government is also discussed, emphasizing that the legislature should not act subsequently and in discordance with an issue already decided by the judiciary. Finally, the necessary adherence to the principle of non-regression in environmental protection is underscored. In addition to the discussion in the STF, Law nº 14,285/21 altered the concept of consolidated urban areas, assigning to municipalities the responsibility of locally scoring these areas, facilitating the "selection" of PPAs near watercourses in urban areas. This situation opens the door to real estate speculation. The justification for this law project itself reflects concerns about consolidated areas, regardless of whether they are areas of social interest. This scenario will be exemplified by the current situation in the municipality of Joinville, Santa Catarina. Thus, Resolution CONSEMA No. 196/22, the debate on the unconstitutionality of Law nº 14,285/21, and the legislator's intention, as stated in the justification of Law nº 14,285/21, will be analyzed, illustrating this reality with the current situation in Joinville.

 

Keywords: permanent preservation area; forest code; legislative competence.

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Contribuições de autoria

* Conceituação, Curadoria de Dados, Análise Formal, Aquisição de Financiamento, Investigação, Metodologia, Administração do Projeto, Recursos, Visualização, Escrita – rascunho original.

** Curadoria de Dados, Metodologia, Supervisão, Validação, Escrita – análise e edição.

1 Introdução

O Brasil é conhecido pela abundância de recursos hídricos. Entretanto, pesquisas demonstram que aproximadamente 15,7% de sua superfície de água foi perdida nos últimos 30 anos, o equivalente a 3,1 milhões de hectares de superfície hídrica. Em 1991, ela era de cerca de 19 milhões de hectares. Em 2020, essa área foi reduzida para 16,6 milhões de hectares, equivalente a mais de uma vez e meia a superfície de água de toda região Nordeste em 2020 (ANTUNES, 2022). Ainda, o Brasil é o sexto país do mundo que mais sofre com enchentes. Nos cinco primeiros meses de 2022, 457 pessoas morreram em desastres causados pelo excesso de chuva, segundo levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM), com base nos dados das defesas civis municipais. O número indica um aumento de 57% em relação a 2021 (ANTUNES, 2022).

Mesmo assim, foi promulgada a Lei nº 14.285/21, passando os municípios brasileiros poder disciplinar a ocupação das margens de cursos d’água, em áreas urbanas, através dos planos diretores e leis de uso do solo, em detrimento da regra do Código Florestal, que determina APP de, pelo menos, 30 metros dos cursos d’água (para cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura), em áreas urbanas e rurais.

Em um primeiro momento, o município parece ser o mais indicado para essa tarefa, pela proximidade com a população e com os problemas locais. A autonomia municipal no planejamento territorial é disciplinada constitucionalmente, cabendo a ele legislar sobre assuntos de interesse local, suplementar legislação federal e estadual, bem como promover o ordenamento territorial, mediante planejamento e controle de uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano (Brasil, 1988, art. 30, I, II e VIII).

Contudo, ao administrar espaços e pessoas, muitas vezes o município se depara com questões ambientais que extrapolam suas circunscrições. Ainda, e infelizmente, muitas vezes o município não cumpre o seu papel, vindo a somente consolidar obras já finalizadas, fornecer autorizações para construir, prestar serviço de luz, de água e de asfaltamento de ruas, em locais que a legislação ambiental federal proíbe a ocupação, e que até mesmo já foram vistoriados e autuados por órgãos de fiscalização ambiental.

Agora, com a possibilidade dos municípios regularem APP’s próximas a cursos d’água em áreas urbanas, a situação se complica. Muitos municípios não são capazes de apresentar corpo técnico habilitado para prever possíveis impactos provenientes dessa possibilidade legal. Sem condições financeiras, muitos deles dependerão de repasses de verbas de outros entes federados, o que pode ser obstaculizado por burocracias ou interesses conflitantes. Ainda, municípios limítrofes podem fazer estipulações legais diferentes, o que pode afetar um mesmo rio ou bacia hidrográfica. Ainda, deve-se considerar o interesse municipal na especulação imobiliária.

Dessa forma, será analisada a Resolução do CONSEMA nº 196/22, que regulamentou a Lei nº 14.285/21, com base em parecer técnico do Ministério Público e em duas notas técnicas da Federação de Consórcios, Associações e Municípios de Santa Catarina.

Na sequência, serão analisados os argumentos apresentados em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) nº 7.146/22, no Supremo Tribunal Federal (STF), pela inconstitucionalidade da Lei nº 14.285/21. Nesta, arguiu-se a incompetência municipal, sendo a matéria de competência da União; o desrespeito ao sistema de freios e contrapesos que norteia o equilíbrio entre os poderes do Estado, não cabendo ao legislativo (promulgação da Lei nº 14.285, de 29/12/2021, passando aos municípios a possibilidade de disciplinar APP’s próximas a cursos d’água em área urbana) agir posteriormente e em descompasso com questão decidida pelo judiciário (Superior Tribunal de Justiça – STJ - Tema 1.010, julgado em 28/04/2021, decidindo que nas áreas urbanas valiam as regras do Novo Código Florestal, legislação federal, para fixação das áreas de APP); bem como o desrespeito ao princípio da vedação do retrocesso da proteção ambiental, sendo inconcebível lei posterior menos protetiva ao meio ambiente.

Por fim, retira-se da própria justificativa do projeto dessa lei a preocupação com áreas consolidadas, independentemente de serem áreas de interesse social. Esse panorama de possível ampliação de construções, e não somente de ratificação daquelas que não há como retificar, será exemplificado com a situação atual do município de Joinville, em Santa Catarina, conforme dados da prefeitura.

 

 

2 Resolução CONSEMA nº 196/2022: Regulamentação da Lei nº 14.285/2021

A Resolução CONSEMA nº 196, de 03/06/2022, estabeleceu orientações para a aplicação da Lei n° 14.285/21. Na elaboração dessa resolução, levou-se em consideração legislação pertinente, bem como documentos orientativos, como o Parecer Técnico n° 1/2021/GAM/CAT, sobre APP’s em Núcleos Urbanos Informais Consolidados propensos à Reurb, do Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente (CME), do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), bem como as Notas Técnicas n° 002 e 004/2022, da Federação de Consórcios, Associações e Municípios de Santa Catarina (FECAM, 2022a e 2022b).

No Parecer Técnico n° 1/2021/GAM/CAT do MPSC há a previsão de estudo técnico socioambiental (SANTA CATARINA, 2021, p. 06), feito por equipe multidisciplinar, que comprove que as intervenções de regularização fundiária implicam melhoria das condições ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior, com a adoção das medidas nele preconizadas, inclusive por meio de compensações ambientais (art. 36 da Lei nº 9.985/2000 e arts. 31 a 34 do Decreto nº 4.340/2002). Esse estudo constitui condição indispensável para a regularização ambiental de núcleos urbanos informais consolidados situados em APP, aplicando-se o disposto nos arts. 64 e 65 da Lei nº 12.651/12 e nos arts. 11, § 2º, e 12, ambos da Lei nº 13.465/17. Ainda, viu-se como relevante esclarecer que o conceito de Estudo Técnico Socioambiental (ETSA) engloba também os estudos citados na Lei nº 13.465/17: “estudos técnicos” (art. 11, § 2º); “estudo preliminar das desconformidades e da situação jurídica, urbanística e ambiental” (art. 35, inc. III); “estudo técnico para situação de risco” (art. 35, inc. VII); e “estudo técnico ambiental” (art. 35, inc. VIII).

No tocante à equipe multidisciplinar (SANTA CATARINA, 2021, p. 13), o MPSC pontuou como indispensáveis à elaboração do Estudo Técnico Socioambiental as seguintes especialidades: Antropologia ou Serviço Social; Arquitetura ou Engenharia Civil; Ciências Biológicas; Direito; Engenharia Cartográfica ou de Agrimensura; Engenharia Sanitária e Ambiental; Geografia; Geologia; e Urbanismo. Ainda colocou a eventual necessidade de outros profissionais não citados, bem como a eventual dispensa de alguns, desde que sejam apresentadas justificativas.

Também foi pontuado que aspectos específicos do estudo técnico socioambiental (SANTA CATARINA, 2021, p. 14) exigirão a participação de diferentes áreas de formação. Por exemplo, a avaliação de riscos de inundações deve ser subscrita por profissionais da área de hidrologia, enquanto que os riscos relacionados a movimentos de massas devem ser avaliados por profissional da área de geologia ou especialista no tema. Já a proposição de possíveis soluções de mitigação/eliminação dos riscos são, em regra, mais bem abordadas por equipe que conte com profissional da geotecnia. Impactos à flora e à fauna devem ser avaliados por equipes da biologia. O geoprocessamento costuma ser mais densamente explorado em cursos de geociências. Ainda, há a possibilidade de sobreposições de áreas de formação. Tanto a engenharia civil quanto a arquitetura podem emitir opinião sobre a segurança estrutural, por exemplo.

O MPSC também reforçou a necessidade de atender a dois dispositivos leais: art. 64, § 2º, da Lei nº 12.651/12, referente aos tópicos mínimos para um estudo técnico em caso de regularização fundiária de interesse social; e art. 36, § 1º, da Lei nº 13.465/17, referente à infraestrutura essencial de um projeto urbanístico de regularização fundiária de interesse social (SANTA CATARINA, 2021, p. 50). Assim, o estudo técnico exige: caracterização da situação ambiental da área a ser regularizada; especificação dos sistemas de saneamento básico; proposição de intervenções para a prevenção e o controle de riscos geotécnicos e de inundações; recuperação de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização; comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental, considerados o uso adequado dos recursos hídricos, a não ocupação das áreas de risco e a proteção das unidades de conservação, quando for o caso; comprovação da melhoria da habitabilidade dos moradores propiciada pela regularização proposta; e garantia de acesso público às praias e aos corpos d'água. No tocante à infraestrutura essencial, exige-se: sistema de abastecimento de água potável, coletivo ou individual; sistema de coleta e tratamento do esgotamento sanitário, coletivo ou individual; rede de energia elétrica domiciliar; soluções de drenagem, quando necessário; e outros equipamentos a serem definidos pelos Municípios em função das necessidades locais e características regionais.

Já a Nota Técnica n° 002/2022 da FECAM traz diretrizes gerais para os municípios aplicarem a Lei Federal nº 14.285/21, como critérios para delimitar área urbana consolidada (FECAM, 2022a, p. 02): a) estar incluída no perímetro urbano ou em zona urbana pelo plano diretor ou por lei municipal específica (leis de uso e ocupação do solo); b) dispor de sistema viário implantado; c) estar organizada em quadras e lotes predominantemente edificados; d) apresentar uso predominantemente urbano, caracterizado pela existência de edificações residenciais, comerciais, industriais, institucionais, mistas ou direcionadas à prestação de serviços; e) dispor de, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados: 1. drenagem de águas pluviais; 2. esgotamento sanitário; 3. abastecimento de água potável; 4. distribuição de energia elétrica e iluminação pública; e 5. limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos.

Também há a referência ao diagnóstico socioambiental, a ser feito por equipe multidisciplinar (FECAM, 2022a, p. 03). Nele deve constar o levantamento de informações e o mapeamento de áreas ao longo dos cursos d'água existentes na área urbana, apresentando: delimitação física da área urbana consolidada; representação gráfica do relevo; sistema viário; remanescente de vegetação nativa; unidade de conservação; elaboração de cadastro das propriedades das áreas urbanas ao longo dos cursos d’água; demarcação das áreas de risco identificáveis; infraestrutura urbana (saneamento básico, pavimentação, rede de energia elétrica); serviços públicos (transporte coletivo, telefonia, segurança, limpeza urbana, iluminação pública); equipamentos públicos (áreas verdes dos loteamentos, parques, praças, equipamentos de saúde, equipamentos de educação); densidade demográfica; hidrografia; entre outros.

Seguindo a nota técnica, os municípios que não dispuserem de Conselho de Meio Ambiente, devem se regularizar, independentemente de disporem de órgão ambiental que realize o licenciamento de impacto local, para compor a parcela da sociedade a ser consultada. Alternativamente, eles podem encaminhar para o Conselho Estadual. Com o diagnóstico socioambiental do município, os limites das APP’s, marginais de qualquer curso d’água natural em área urbana consolidada, poderão ser determinados nos planos diretores, nas leis municipais de uso do solo ou em leis específicas (FECAM, 2022a, p. 04).

Por fim, o último documento que serviu de base para a Resolução do CONSEMA foi a Nota Técnica n° 004/2022 da FECAM, com orientações para elaboração de diagnóstico socioambiental, exigindo em seu conteúdo (FECAM, 2022b, p. 07):

 

1. Elementos Pré Textuais e Introdutórios

2. Diagnóstico Socioambiental

2.1. Aspectos Físicos e Bióticos

2.2. Uso e Ocupação do Solo

2.3. Especificação dos Sistemas de Infraestrutura Urbana e Saneamento Básico Implantados, Outros Serviços, Equipamentos Públicos e Respectivos Planos de Saneamento, Resíduos Sólidos, Drenagem e Recursos Hídricos.

2.4. Descrição e Delimitação da Área Urbana Consolidada –

2.5. Descrição e Delimitação das Áreas Consideradas de Risco a Inundações e Deslizamentos e Histórico de Ocorrências

2.6. Descrição e Delimitação das Áreas de Preservação Permanente

2.6.1. Avaliação dos Riscos Ambientais

2.6.2. Mapeamento das Áreas de Preservação Permanente e com Restrições

2.6.3. Mapeamento das Áreas Consolidadas em APP

2.6.4. Mapeamento das Áreas Frágeis e Degradadas

2.6.5. Mapeamento das Áreas de Interesse Ecológico e Ambiental Relevante e Unidades de Conservação

2.7. Conclusões e Recomendações

3. Referências e Apêndices

 

No tocante ao item 1. Elementos Pré Textuais e Introdutórios, exige-se a estruturação da equipe técnica, a elaboração da base cartográfica, entre outros itens cartográficos. Quanto ao item 2.2. Uso e Ocupação do Solo, solicitam-se dados históricos, dinâmica populacional, a existência de comunidades tradicionais. Referente ao item 2.4. Descrição e Delimitação da Área Urbana Consolidada, pontua-se o seguimento da Lei n° 14.285/21, que alterou o art. 3º, XXVI, da Lei nº 12.651/2012, colocando que área urbana consolidada é aquela que atende os seguintes critérios: a) estar incluída no perímetro urbano ou em zona urbana pelo plano diretor ou por lei municipal específica; b) dispor de sistema viário implantado; c) estar organizada em quadras e lotes predominantemente edificados; d) apresentar uso predominantemente urbano, caracterizado pela existência de edificações residenciais, comerciais, industriais, institucionais, mistas ou direcionadas à prestação de serviços; e) dispor de, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados: 1. drenagem de águas pluviais; 2. esgotamento sanitário; 3. abastecimento de água potável; 4. distribuição de energia elétrica e iluminação pública; e 5. limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos (FECAM, 2022b, p. 07-10).

Esses três documentos técnicos serviram de base para a Resolução CONSEMA nº 196/2022, sobre a qual é válido fazer algumas considerações.

No art. 3º desta resolução há uma previsão de rito a ser seguido pelo executivo municipal, não uma obrigatoriedade, haja vista que ele “poderá” seguir o seguinte rito: “I - Definir a Área Urbana Consolidada; II - Elaborar ou revisar o DSA; III - Elaborar o Projeto de Lei que estabelecerá as faixas marginais de cursos d'água em área urbana consolidada; IV - Encaminhar o DSA e o Projeto de Lei para manifestação do Conselho Municipal de Meio Ambiente ou, de forma supletiva, para o Conselho Estadual de Meio Ambiente; e V - Encaminhar o Projeto de Lei ao poder legislativo municipal” (Santa Catarina, 2022). Seria mais adequado estipular um rito a ser necessariamente seguido, com o intuito de garantir o devido estudo da área. Até porque não parece ser possível o município deixar alguma dessas etapas de lado.

Ainda, quando couber ao município somente revisar o diagnóstico socioambiental (DAS), elaborado por particular, o município terá corpo técnico habilitado? Referente aos arts. 6º e 7º, compete ao Conselho Municipal de Meio Ambiente manifestar-se acerca das faixas marginais de qualquer curso d’água indicado em diagnóstico socioambiental. E, quando o município não dispuser de Conselho Municipal de Meio Ambiente, o Conselho Estadual de Meio Ambiente atuará de forma supletiva e se manifestará mediante apresentação pelo município de, no mínimo, Diagnóstico Socioambiental e Projeto de Lei Municipal. Ou seja, o próprio documento regulamentador já previu a ineficiência municipal, ainda que eventualmente, conjecturando a supletividade estadual na análise do estudo. O Estado não é o mais próximo da realidade municipal para avaliar localmente.

 

3 Competências constitucionais na seara ambiental

Vê-se que tanto a Lei nº 14.285/21, como a regulamentadora Resolução CONSEMA nº 196/22 deixam dúvidas quanto à capacidade dos municípios para disciplinarem APP’s próximas a cursos d’água em áreas urbanas, não sendo despropositada a previsão constitucional da incumbência da União para tanto, discorridas na sequência.  

3.1 Dispositivos Constitucionais

Segundo Silva (2005, p. 479), competência é a “faculdade juridicamente atribuída a uma entidade ou a um órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões.” E complementando, o autor coloca que competências são “as diversas modalidades de poder de que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções” (Silva, 2005). O princípio geral que norteia a repartição de competências entre os entes do Estado Federal é a predominância do interesse público, cabendo à União matérias de interesse geral, nacional, aos Estados, matérias de cunho regional e aos Municípios, matérias de interesse local. No Estado moderno, muitas vezes não é fácil discernir a abrangência do interesse. Pode ocorrer de um interesse não necessariamente ser de cunho nacional, por não afetar a nação como um todo, mas também não se restringir a um Estado, como os problemas ambientais da Amazônia, ou os do polígono da seca (SILVA, 2005). 

É por conta dessa dificuldade que se estabeleceu critérios constitucionais mínimos de competências legislativas na CF. E, contrariando isso, vem a Lei nº 14.285/21, tanto que foi impugnada no STF, através da ADIn nº 7.146/22, por eventual violação ao regime de legislação concorrente e aos princípios que regem a proteção ao meio ambiente, pendente de julgamento. Mais especificamente, foi alegado que a referida lei é materialmente inconstitucional, pois contraria os artigos 5º, caput (direito fundamental à vida), art. 23, caput (competência comum entre os entes federados para legislar), art. 23, incisos VI e VII (VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII – preservar as florestas, a fauna e a flora;), art. 24 (competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal para legislar), art. 30, inciso II (competência suplementar dos municípios para legislar) e art. 225 (direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado) da CF.

O art. 23, caput, da CF, traz a competência comum entre os entes federados para legislar sobre certos assuntos. Nos incisos VI e VII, materializa as temáticas de proteção do meio ambiente, o combate à poluição em qualquer de suas formas, bem como a preservação das florestas, da fauna e da flora. Já o art. 24, caput, da CF, traz a competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal para legislar sobre determinados assuntos, como nos incisos VI, VII, VII: florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição, proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico, responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (BRASIL, 1988).

Já o art. 30, da CF, traz a competência dos municípios para legislarem sobre interesse local (inciso I), promover o ordenamento territorial, mediante planejamento e controle de uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano (VIII). Tanto é assim que, no art. 182 confere-se aos municípios a competência para elaborar seus planos diretores para ordenação do desenvolvimento, das funções socias da cidade e do bem estar dos habitantes. Ainda, cabe aos municípios suplementar legislação federal e estadual (II) (BRASIL, 1988).

No tocante às competências legislativas, constitucionalmente pontuadas, cabe acentuar que, é comum todos os entes federados legislarem sobre a proteção do meio ambiente e preservação de florestas (art. 23, VI e VII, CF). Referente à competência legislativa concorrente, como sobre florestas, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, a competência da União diz respeito à definição de normas gerais (art. 24, § 1º, CF), reservando-se aos estados a competência suplementar (art. 24, § 2º, CF). Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os estados exercem a competência legislativa plena (art. 24, § 3º, CF). Todavia, a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia de lei estadual, no que lhe contrariar (art. 24, § 4º, CF). Em sequência lógica, cabe ao município legislar somente sobre assuntos de interesse local (art. 30, I, CF), suplementando a legislação federal e estadual (art. 30, II, CF) (BRASIL, 1988).

Assim, não há como aceitar competência legislativa suplementar do município ao se discutir APP’s próximas a cursos d’água em áreas urbanas (Lei nº 14.285/2021), pois a matéria já é disciplinada na Lei Federal nº 12.651/2012, em seu art. 4º, inciso I, que estipula vários tamanhos de áreas a serem protegidas, a depender da largura do curso d’água, sendo a área mínima de proteção de 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura, como se debate na ADIn em em andamento.

A questão é recente, não havendo julgamentos pelo STJ sobre a aplicabilidade da Lei nº 14.285/21 em casos pontuais. Mesmo assim, o STJ já se manifestou pela aplicação do art. 4°, I, da Lei n. 12.651/2012 (equivalente ao art. 2°, alínea “a”, da revogada Lei n. 4.771/1965), no tocante às APP’s, cuja largura varia de 30 (trinta) a 500 (quinhentos) metros, em detrimento do recuo de 15 (quinze) metros determinados no art. 4°, caput, III, da Lei n. 6.766/1979, a fim de assegurar a mais ampla garantia ambiental a esses espaços territoriais especialmente protegidos e, por conseguinte, à coletividade, bem como o cumprimento do art. 225, da CF/88, priorizando o princípio do desenvolvimento sustentável (art. 170, VI,) e as funções social e ecológica da propriedade. Isso se depreende do Recurso Especial nº 1770760/SC/2021 e do Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.377.266 / SC/2022:

 

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AMBIENTAL. CONTROVÉRSIA A RESPEITO DA INCIDÊNCIA DO ART. 4º, I, DA LEI N. 12.651/2012 (NOVO CÓDIGO FLORESTAL) OU DO ART. 4º, CAPUT, III, DA LEI N. 6.766/1979 (LEI DE PARCELAMENTO DO SOLO URBANO). DELIMITAÇÃO DA EXTENSÃO DA FAIXA NÃO EDIFICÁVEL A PARTIR DAS MARGENS DE CURSOS D'ÁGUA NATURAIS EM TRECHOS CARACTERIZADOS COMO ÁREA URBANA CONSOLIDADA [...]
3. [...] se corresponde à área de preservação permanente prevista no art. 4°, I, da Lei n. 12.651/2012 (equivalente ao art. 2°, alínea "a", da revogada Lei n. 4.771/1965), cuja largura varia de 30 (trinta) a 500 (quinhentos) metros, ou ao recuo de 15 (quinze) metros determinado no art. 4°, caput, III, da Lei n. 6.766/1979.
4. A definição da norma a incidir sobre o caso deve garantir a melhor e mais eficaz proteção ao meio ambiente natural e ao meio ambiente artificial, em cumprimento ao disposto no art. 225 da CF/1988, sempre com os olhos também voltados ao princípio do desenvolvimento sustentável (art. 170, VI,) e às funções social e ecológica da propriedade [...]
6. A disciplina da extensão das faixas marginais a cursos d'água no meio urbano foi apreciada inicialmente nesta Corte Superior no julgamento do REsp 1.518.490/SC, Relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 15/10/2019, precedente esse que solucionou, especificamente, a antinomia entre a norma do antigo Código Florestal (art. 2º da Lei n. 4.771/1965) e a norma da Lei de Parcelamento do Solo Urbano (art. 4º, III, da Lei n. 6.766/1976), com a afirmação de que o normativo do antigo Código Florestal é o que deve disciplinar a largura mínima das faixas marginais ao longo dos cursos d'água no meio urbano [...]
7. Exsurge inarredável que a norma inserta no novo Código Florestal (art. 4º, caput, inciso I), ao prever medidas mínimas superiores para as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, sendo especial e específica para o caso em face do previsto no art. 4º, III, da Lei n. 6.766/1976, é a que deve reger a proteção das APPs ciliares ou ripárias em áreas urbanas consolidadas, espaços territoriais especialmente protegidos (art.225, III, da CF/1988), que não se condicionam a fronteiras entre o meio rural e o urbano [...]
9. Tese fixada - Tema 1010/STJ: Na vigência do novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de Preservação Permanente de qualquer curso d’água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve respeitar o que disciplinado pelo seu art. 4º, caput, inciso I, alíneas a, b, c, d e e, a fim de assegurar a mais ampla garantia ambiental a esses espaços territoriais especialmente protegidos e, por conseguinte, à coletividade [...]
 

ADMINISTRATIVO. EDIFICAÇÃO NA MARGEM DE RIO. ÁREA URBANA CONSOLIDADA. INCIDÊNCIA DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL. TEMA 1.010/STJ.

1. Segundo consolidado entendimento desta Corte, o Código Florestal é norma específica a ser observada nos casos de proteção marginal dos cursos de água, mostrando-se descabido falar em incidência da Lei de Parcelamento do Solo Urbano. Precedente: REsp 1518490/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 9/10/2018, DJe 15/10/2018.

2. Incide, na espécie, a tese firmada no Tema 1.010/STJ: “Na vigência do novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de Preservação Permanente de qualquer curso d'água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve respeitar o que disciplinado pelo seu art. 4º, caput, inciso I, alíneas a, b, c, d e e, a fim de assegurar a mais ampla garantia ambiental a esses espaços territoriais especialmente protegidos e, por conseguinte, à coletividade” [...] (BRASIL, 1988).

 

O ambiente e toda a legislação que o protege devem ser vistos de forma sistêmica. Assim, a Lei nº 14.285/2021, discutida em Adin, não pode ser considerada constitucional, devendo ser esse o futuro posicionamento do STJ em casos pontuais e do STF, de forma definitiva, em sede de Adin. Não pode o legislador federal prever mecanismo legal de proteção ambiental e o município legislar posteriormente em conflito, com norma menos protetiva. As normas estaduais e municipais sobre meio ambiente somente podem ser mais protetivas que as federais, sob pena de proteção insuficiente do meio ambiente.

Em suma, a competência legislativa dos municípios é limitada aos assuntos de seu interesse local, critério dentro do qual não se incluem as faixas marginais de cursos d’água. Não bastasse a técnica legislativa, deve-se considerar que vários cursos d’água fazem parte de uma bacia hidrográfica e raramente cruzam um único município, ou interferem em uma única localidade. As bacias hidrográficas funcionam como unidade de gestão da água, ou seja, uma unidade territorial para implementação da política brasileira. A decisão de um município, isoladamente, pode interferir em toda a bacia hidrográfica, na circunscrição de municípios próximos, ainda que estes legislem e administrem de forma contrária. E ainda que se discuta sobre um curso d’água localizado em um mesmo município, interferir nesse espaço demanda um estudo razoável e amplo, pois mudanças em um bairro podem interferir em outro bairro.

Assim, não cabe aos municípios estipular as APP’s próximas a cursos d’água, em áreas urbanas. Cabe a eles a fiscalização do meio ambiente, a gestão do território urbano sem agredir o meio ambiente, a criação de unidades de conservação municipais, aumentando a proteção federal. A decisão local, pertinente a APP’s hídricas, pode interferir em toda uma bacia hidrográfica, em aspectos ambientais de estados, do país e do mundo. A defesa do meio ambiente deve ser ampla e não pode retroceder, com a devida harmonia entre os poderes do Estado na execução dessa missão.

3.2 Sistema de freios e contrapesos

Segundo o art. 2º, da CF, “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário” (BRASIL, 1988). Essa divisão visa o adequado funcionamento do Estado, ainda que não seja absoluta. Podem ocorrer interferências entre os poderes, materializando um sistema de freios e contrapesos, um equilíbrio entre eles para o bem da coletividade. Isso caracteriza a exceção, pois a regra é o que dispõe o art. 2º, da CF, ou seja, harmonia entre os poderes, trato recíproco e respeitoso entre eles.

De toda forma, imperioso é resgatar que a separação de poderes do Estado nasceu em período histórico marcado pelo liberalismo político e econômico, em contraposição ao sistema monárquico. Buscava-se a intervenção mínima do Estado na organização das atividades sociais. Nas ideias absolutistas, a concentração dos poderes ficava nas mãos de um soberano. Do ponto de vista filosófico, este poder era limitado somente pelo direito natural; todavia, na prática, apenas pela sua vontade e não pelo direito.

A vontade do soberano se confundia com a vontade do Estado, como exemplifica a célebre frase atribuída ao rei Luís XIV: “O estado sou eu”. Essa concentração de poderes levou ao abuso do poder. Com a ascensão da econômica burguesa e o descontentamento com a monarquia, inicia-se o término da idade moderna (BONAVIDES, 1996, p. 134):

 

Com efeito, observava-se em quase toda a Europa continental, sobretudo em França, a fadiga resultante do poder político excessivo da monarquia absoluta, que pesava sobre todas as camadas sociais interpostas entre o monarca e a massa de súditos. Arrolavam essas camadas em seus efetivos a burguesia comercial e industrial ascendente, a par da nobreza, que por seu turno se repartia entre nobres submissos ao trono e escassa minoria de fidalgos inconformados com a rigidez e os abusos do sistema político vigente, já inclinado ao exercício de práticas semidespóticas [...].

Todos os pressupostos estavam formados pois na ordem social, política e econômica a fim de mudar o eixo do Estado moderno, da concepção doravante retrógrada de um rei que se confundia com o Estado no exercício do poder absoluto, para a postulação de um ordenamento político impessoal, concebido segundo as doutrinas de limitação do poder, mediante as formas liberais de contenção da autoridade e as garantias jurídicas da iniciativa econômica.

 

Essa conjuntura contribuiu para o desenvolvimento da doutrina da separação dos poderes, como técnica de limitação do poder, conforme Montesquieu, em sua obra “O Espírito das Leis”, influenciado por Aristóteles (“Política”) e Locke (“Segundo Tratado do Governo Civil”), no período da Revolução Francesa (MALDONADO, 2003; PISKE; SARACHO, 2018). Montesquieu traçou essa separação entre o poder legislativo, executivo e judiciário, bem como o necessário equilíbrio entre eles (MONTESQUIEU, 2003, p. 166):

 

Quando em uma só pessoa, ou em um mesmo corpo de magistratura, o poder legislativo está reunido ao poder executivo, não pode existir liberdade, pois se poderá temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado criem leis tirânicas para executá-las tiranicamente. Também não haverá liberdade se o poder de julgar não estiver separado do legislativo e do Executivo. Se o poder executivo estiver unido ao poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário: pois o juiz seria o legislador. E se estiver ligado ao poder executivo, o juiz poderia ter a força de um opressor. Tudo então estaria perdido se o mesmo homem, ou o mesmo corpo dos principais ou o dos nobres, ou o do povo, exercesse estes três poderes: o de criar as leis; o de executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou as querelas dos particulares.

 

Assim, a doutrina da separação dos poderes é vivenciada nas revoluções liberais burguesas dos séculos XVII e XVIII – Revolução Gloriosa, Inglaterra (1688/89), Independência Norte-Americana (1776) e Revolução Francesa (1789), em resposta aos abusos resultantes da concentração de poderes nas mãos do soberano, típica do absolutismo da Idade Moderna, marcando o início do Estado de Direito (MALDONADO, 2003, p. 08). A divisão proposta foi marcante, transcrita até no art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789: “Toda sociedade na qual a garantia dos direitos não está assegurada, nem a separação de poderes estabelecida não tem constituição” (Onu, 1789).

Dessa forma, dividido o poder, assim como superada a ideia da prevalência de um sobre o outro, pressupondo-se equilíbrio, independência e harmonia entre eles, passa-se a admitir a interferência entre eles, a necessidade de controle e vigilância recíprocos, para o cumprimento dos deveres constitucionais de cada um. A título de exemplo, o poder executivo pode editar e vetar leis que são criadas pelo legislativo. Já o poder legislativo pode instaurar CPI (comissão parlamentar de inquérito) perante o executivo. Por sua vez, o poder judiciário pode avaliar a constitucionalidade de leis criadas pelo legislativo.

Esse sistema visa o equilíbrio entre os poderes, não a prevalência de um sobre o outro. Cita-se como exemplo desse descompasso entre os poderes, mais especificamente entre o judiciário e o legislativo, o caso da vaquejada. Inicialmente, houve o julgamento da ADI nº 4.983/2016/CE, na qual o STF declarou a inconstitucionalidade da Lei nº. 15.299, do Ceará, pertinente à regulamentação da Vaquejada como prática desportiva e cultural, por considerar a prática como maus tratos aos animais. Mesmo assim, posteriormente, houve a inclusão do parágrafo 7º, no art. 225, da CF, através da Emenda Constitucional nº 96/2017: “§ 7º Para fins do disposto na parte final do inciso VII do § 1º deste artigo, não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais, conforme o § 1º do art. 215 desta Constituição Federal, registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser regulamentadas por lei específica que assegure o bem-estar dos animais envolvidos” (Brasil, 2017).

O mesmo desencontro entre legislativo e judiciário está acontecendo com a promulgação da Lei nº 14.285, de 29/12/2021, atividade do poder legislativo que se deu após atividade do poder judiciário. Primeiramente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu, em julgamento de recurso especial com efeito repetitivo e de alcance geral (Tema 1.010, julgado em 28/04/2021), que nas áreas urbanas valiam as regras do Novo Código Florestal, legislação federal, para fixação das áreas de APP. Inconformado, o Congresso Nacional reagiu e aprovou posterior projeto de lei, adotando posição diferente daquela definida pelo STJ, promulgando a Lei nº 14.285/21, que possibilita aos municípios disciplinar as APP’s próximas a cursos d’água em áreas urbanas.

Não pode o poder legislativo fechar os olhos para atividade legítima do poder judiciário, embasada na CF, na qual se dispuseram as competências legislativas, como a competência concorrente. Segundo esta, cabe à União estabelecer normas gerais sobre as correspondentes matérias (BRASIL, 1988, art. 24), cabendo aos estados e municípios somente suplementar. Como já exposto, é inconcebível a competência legislativa suplementar do município ao se discutir APP’s próximas a cursos d’água em áreas urbanas (Lei nº 14.285/2021), haja vista que a matéria já é disciplinada em legislação federal. A Lei Federal nº 12.651/2012, no art. 4º, inciso I, estipula tamanhos de áreas protegidas, a depender da largura do curso d’água, sendo a área mínima de proteção de 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura (Brasil, 2012).

Não bastasse o poder legislativo criar lei em desrespeito ao que preceitua a CF, no tocante às competências legislativas, passando matéria federal para o âmbito municipal, ele também desrespeita a divisão e harmonia entre os poderes, pois o fez após a análise da questão pelo poder judiciário, em evidente retrocesso da proteção ambiental.

3.3 Art. 225, da CF: Direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e Princípio da vedação ao retrocesso da proteção ambiental

Na referida ADIn, pontuou-se que a proteção das APP’s hídricas não consiste em óbice à expansão de áreas de cultivo ou às ocupações urbanas, mas sim existe para manter o equilíbrio ecológico e para proteger as populações humanas. Ainda, ressaltou-se a necessidade de observância sistêmica do ambiente e dos biomas e ecossistemas como uma coisa integral, una, em que um bioma e os ecossistemas estão interligados como condição sine qua non de continuidade e existência.

É necessário manter o equilíbrio ecológico, a estabilidade entre fatores de um ecossistema, suas cadeias tróficas, vegetação, clima, solo, ar, água. O meio ambiente – “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.” (BRASIL, 1981, art. 3º, I), merece proteção em sua integralidade, respeitando-se todas as formas de vidas. Essa constatação beneficia o homem, bem como consiste em uma tentativa mais inteligente de fugir da ultrapassada visão antropocêntrica, sendo o homem parte integrante do meio ambiente, e não seu narrador ou parasita. Nessa linha leciona Machado (2020, p. 88):

 

O homem não é a única preocupação do desenvolvimento sustentável. A preocupação com a natureza deve também integrar o desenvolvimento sustentável. Nem sempre o homem há de ocupar o centro da política ambiental, ainda que comumente ele busque um lugar prioritário. Haverá casos em que para se conservar a vida humana ou para colocar em prática a “harmonia com a natureza” será preciso conservar a vida dos animais e das plantas de áreas declaradas inacessíveis ao próprio homem. Parece paradoxal chegar-se a essa solução de impedimento de acesso humano, que, afinal de contas, deve ser decidida pelo próprio homem.

 

Mesmo assim, e felizmente, as populações humanas acabam sendo necessariamente preservadas ao se proteger os recursos ambientais, posto que lhes garantem mais qualidade de vida. Tanto é assim que a Lei nº 6.938/81, art. 2º, inciso I, prevê o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo.” (BRASIL, 1981).

A preservação do meio ambiente, “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (BRASIL, 1988, art. 225, caput), é um direito fundamental, representando respeito ao próprio direito à vida, também um direito fundamental (art. 5º, caput, CF). O direito à vida “é o mais básico de todos os direitos, no sentido de que surge como verdadeiro pré-requisito da existência dos demais direitos consagrados constitucionalmente”. (TAVARES, 2010, p. 569.) Esse contexto deve ser analisado sob uma perspectiva sistêmica, haja vista que o equilíbrio dos ecossistemas é necessário tanto para a continuidade deles, como da própria existência humana. Tanto é assim que o conceito de meio ambiente supera a qualificação de bem público, pois abarca também a coletividade, o dever de defender e preservar, para as presentes e futuras gerações (BRASIL, 1988, art. 225, caput).

Esse dever de proteção de todos é norteado pelo princípio da vedação de retrocesso da proteção ambiental. Como garantidor das conquistas ambientais, o princípio visa assegurar proteção ao meio ambiente, bem como o dever de progressividade da proteção, seja pelos órgãos estatais ou pelos particulares. Essa garantia tem por escopo impedir a adoção de medidas que reduzam ou suprimam os níveis de proteção já alcançados, como nas situações de desmonte ou esvaziamento do aparato estatal, necessário para a implementação de adequadas políticas públicas ambientais.

Esse princípio visa garantir o máximo de proteção aos direitos ao meio ambiente sadio, bem como ao próprio e decorrente direito à vida. Além do mais, todos os direitos e garantias individuais constitucionais estão resguardados como cláusulas pétreas (art. 60, parágrafo 4º, CF), ou seja, não podem ser alterados nem mesmo por proposta de emenda à CF. Nesse sentido, expõe Machado (2020, p. 149):

 

O “bom ambiental” só pode ser alterado para transformá-lo em “ótimo ambiental”. A regressão de normas ambientais traduz a ocorrência do “pior ambiental”, isto é, do desequilíbrio ecológico. [...] A inalterabilidade legislativa para pior em matéria de direitos individuais está consagrada pela Constituição (art. 60). Não há nenhum excesso nesse mandamento constitucional, pois é da essência dos direitos humanos que estes mereçam somente evoluir e não regredir.

 

De toda forma, esse é um princípio constitucional implícito, que se impõe ao legislador em nome da garantia constitucional dos direitos adquiridos, do princípio constitucional de segurança jurídica, do princípio da dignidade da pessoa humana e, finalmente, em nome do princípio de efetividade máxima dos direitos fundamentais (nos termos do artigo 5º, § 1º, da CF) (PRIEUR, 2012, p. 32).

Mesmo que sem previsão normativa expressa, o princípio da proibição do retrocesso da proteção ambiental, ou seja, a proibição de regresso a patamares inferiores de proteção ambiental, está embasada na progressividade dos direitos, prevista em obrigações e compromissos definidos em instrumentos internacionais (LEITE, 2015, p. 115), como o “artigo 2.1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; no artigo 26 da Convenção Americana dos Direitos Humanos; nos artigos 1, 12 e 12.1 do Protocolo Adicional de San Salvador” (LEITE, 2015, p. 115). Ainda, o princípio da proibição do retrocesso da proteção ambiental está presente na ordem brasileira, como registra Herman Benjamin (2012, p. 64), ressaltando a necessidade de melhorar as condições ambientais, e não somente preservá-las:

 

Princípio geral ainda porque tanto a legislação (a Lei 6.938/8112, p. ex.) como a jurisprudência brasileira perfilham, sem meias palavras, o princípio da melhoria ambiental. Ora, prescrever, como objetivo da Política Nacional do Meio Ambiente, a “melhoria da qualidade ambiental propícia à vida” é até dizer mais do que ambiciona o princípio da proibição de retrocesso, pois não bastará manter ou conservar o que se tem, impondo-se melhorar, avançar (=progresso) no terreno daquilo que um dia ecologicamente se teve, e desapareceu, ou hoje se encontra dilapidado, e, se não zelado de maneira correta, mais cedo ou mais tarde desaparecerá (BENJAMIN, 2012, p. 64).

 

Analisando esse princípio, não há como aceitar a aplicação da Lei nº 14.285/21, que possibilita aos municípios disciplinarem as APP’s próximas a cursos d’água em áreas urbanas. Uma determinação municipal nessa matéria pode afetar localidades com características diferentes, até mesmo município com legislação diferente, mas banhado pelo mesmo curso d’água. Por isso, a CF, ao dispor sobre competências legislativas, colocou como incumbência da União legislar normas gerais sobre “conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente” (Brasil, 1988, art. 24, VI), sendo que o ente federado assim o fez, editando o Código Florestal (art. 4º, inciso I, da Lei nº 12.651/12), o qual estipula distâncias mínimas de cursos d’água (Brasil, 2012).

Além disso, o ente federado municipal normalmente apresenta menos condições e recursos financeiros. Como poderá ele dispor de recursos para realizar estudos detalhados. Essa realidade se materializa quando a própria Resolução CONSEMA nº 196/22 prevê a possibilidade de inexistência do Conselho Municipal de Meio Ambiente para se manifestar acerca das faixas marginais de qualquer curso d’água indicado em diagnóstico socioambiental, conjecturando a supletividade estadual na análise do estudo. (SANTA CATARINA, 2022).

Essa falta de recursos, aliada à própria flexibilidade de interesses locais, muitas vezes mais pendente à especulação imobiliária do que à proteção do meio ambiente, como se verá na sequência, pode influenciar nas decisões municipais, colocando a defesa do meio ambiente de todos em risco. Assim, a Lei nº 14.285/21, ao possibilitar aos municípios disciplinarem as APP’s próximas a cursos d’água em áreas urbanas, restringiu indevidamente o conteúdo do direito fundamental ao meio ambiente sadio, e por decorrência lógica do próprio direito à vida, ao mesmo tempo que descumpriu o dever estatal de adequada e efetiva proteção ao bem jurídico (Brasil, 2021).

 

4 Lei nº 14.285/2021: Outras incongruências

A redação original da Lei nº 12.651/12 previa que a área urbana consolidada era aquela do art. 47, II, da Lei nº 11.977/09, referente ao Programa Minha Casa, Minha Vida e regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas. Assim, “área urbana consolidada” era a “parcela da área urbana com densidade demográfica superior a 50 (cinquenta) habitantes por hectare e malha viária implantada e que tenha, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados: a) drenagem de águas pluviais urbanas; b) esgotamento sanitário; c) abastecimento de água potável; d) distribuição de energia elétrica; ou e) limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos” (Brasil, 2012)

Posteriormente, o art. 47, da Lei nº 11.977/09 foi revogado pela Lei nº 13.465/17, que dispunha sobre a regularização fundiária rural e urbana. A Lei nº 13.465/17 substituiu a expressão “área urbana consolidada” por "núcleo urbano informal consolidado", e em seu art. 11, III, trouxe o novo, e mais flexível, conceito como sendo “aquele de difícil reversão, considerados o tempo da ocupação, a natureza das edificações, a localização das vias de circulação e a presença de equipamentos públicos, entre outras circunstâncias a serem avaliadas pelo Município” (Brasil, 2017).

Agora, com a Lei nº 14.285/21, foi reintroduzida no ordenamento jurídico a expressão "área urbana consolidada" (Brasil, 2021), mas com definição e aplicação diversa daquela adotada pela Lei nº 11.977/09. A Lei nº 14.285/21 alterou o anterior conceito de áreas urbanas consolidadas, alterando o art. 3º, XXVI, da Lei nº 12.651/12, que passou a ser designada da seguinte forma:

 

aquela que atende os seguintes critérios: a) estar incluída no perímetro urbano ou em zona urbana pelo plano diretor ou por lei municipal específica; b) dispor de sistema viário implantado; c) estar organizada em quadras e lotes predominantemente edificados; d) apresentar uso predominantemente urbano, caracterizado pela existência de edificações residenciais, comerciais, industriais, institucionais, mistas ou direcionadas à prestação de serviços; e) dispor de, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados: 1. drenagem de águas pluviais; 2. esgotamento sanitário; 3. abastecimento de água potável; 4. distribuição de energia elétrica e iluminação pública; e 5. limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos (Brasil, 2012).

 

A realidade social não pode ser ignorada. Todavia, não se pode deixar de notar que o conceito de área urbana consolidada deixou de iniciar-se de forma clara, igual para qualquer situação, como o descrito no art. 47, II, da Lei nº 11.977/09 - “parcela da área urbana com densidade demográfica superior a 50 (cinquenta) habitantes por hectare...” (Brasil, 2009), para passar por certa discricionariedade municipal. Com a Lei nº 13.465/17, já não havia mais uma quantidade numérica específica, passando as circunstâncias a serem analisadas pelo município: “aquele de difícil reversão, considerados o tempo da ocupação, a natureza das edificações, a localização das vias de circulação e a presença de equipamentos públicos, entre outras circunstâncias a serem avaliadas pelo Município” (Brasil, 2017). A Lei nº 14.285/21, que alterou o art. 3º, XXVI, da Lei nº 12.651/12, reutilizou a expressão áreas urbanas consolidadas, conceituando-a de forma diferente da Lei nº 11.977/09: “a) estar incluída no perímetro urbano ou em zona urbana pelo plano diretor ou por lei municipal específica...” (Brasil, 2009). Ou seja, a discricionariedade do município está ao disciplinar quais são as áreas urbanas consolidadas, por consequência podendo disciplinar o corte de vegetação próxima a qualquer curso d’água que esteja dentro delas. Havendo interesse em uma área próxima a curso d’água, basta o município declarar que a área se trata de uma área urbana consolidada.

Além disso, manter área urbana como aquela discricionariamente especificada pelo município foi algo pontuado nas Notas Técnicas n° 002 e 004/2022, da FECAM, ou seja, legislação federal – a Lei nº 14.285/21 – , que foi influenciada por entidade focada em interesses municipais, muitas vezes considerados de forma unilateral, em desrespeito ao sistêmico direito ao meio ambiente equilibrado, direito de todos (FECAM, 2022a; 2022b).

Corroborando com a nefasta possibilidade aventada acima, vê-se o que dispõe na Justificação do Projeto de Lei nº 2.510/19, que deu vida à Lei nº 14.285/21:

 

 

 

 

 

A providência procura corrigir inadequação presente na Lei nº 12.651, de 2012 (Lei Florestal), que, em variados casos, fixa limites de APP iguais para zonas rurais e urbanas e admite intervenção ou a supressão de vegetação nativa em APPs somente nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental.

Ocorre que em tais hipóteses não se enquadram diversas situações muito frequentes em áreas urbanas, tais como construções privadas e públicas próximas a encostas e a cursos ou corpos d’água. Em razão disso, inúmeros administradores municipais se encontram em situação desconfortável, pois, sem ter como fazer cumprir os limites fixados pela Lei Florestal, são constantemente pressionados e questionados pelo Ministério Público. (BRASIL, 2019).

 

No primeiro parágrafo da Justificativa do Projeto de Lei nº 2.510/19 já surge a pergunta: Se o município precisa elaborar ou revisar um estudo socioambiental sobre a área, demonstrando diversas circunstâncias, como baixo risco de desastre, como inundações e deslizamentos, bem como avaliação de riscos ambientais, entre outros, independentemente de a área ser urbana ou rural, porque eventual caso em análise já não se enquadraria no caso de “baixo impacto ambiental”, da Lei nº 12.651/12 (Brasil, 2019, art. 3º, X, k: “k) de outras ações ou atividades similares, reconhecidas como eventuais e de baixo impacto ambiental em ato do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA ou dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente;”)?

Ainda, no segundo parágrafo da Justificativa do Projeto de Lei nº 2.510/19, vê-se uma preocupação com “construções privadas e públicas” (Brasil, 2019), sem qualquer preocupação com a envergadura dessas construções. Não se deixa de lado a preocupação com famílias mais carentes que ocupam APP’s próximas a cursos d’água em áreas urbanas. Todavia, na prática, muitas dessas construções são casas de excelentes condições, a despeito do que a maioria supõe, o que indica que aquele que constrói tem condições financeiras, condições de construir em área adequada, sem colocar em risco a APP, assim legalmente nomeadas para a preservação do meio ambiente para todos. Referente a certos casos mais específicos e de difícil reversão, pode-se pensar até mesmo em compensações. Todavia, em hipótese alguma, pode-se pensar em um permissivo legal para futuras construções nessas áreas. Assim, caso a preocupação fosse social, porque eventual caso em análise já não se enquadraria no caso de “interesse social”, da Lei nº 12.651/12 (Brasil, 2012, art. 3º, IX, d, “d) a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados predominantemente por população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas, observadas as condições estabelecidas na Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009;”)?

Para justificar esse raciocínio, fez-se pesquisa em sites de prefeituras de grandes municípios de Santa Catarina, banhados por ricas bacias hidrográficas, verificando-se uma interessante realidade no município de Joinville. Lá, conforme informações publicadas no site da prefeitura (Joinville, 2023), o particular pode apresentar o diagnóstico socioambiental por microbacia hidrográfica (DSMH), visando a atualização do levantamento hidrográfico do Município quanto à caracterização das faixas marginais a serem aplicadas em toda extensão dos cursos hídricos mapeados na Área Urbana Consolidada e inseridos no Sistema de Informações Municipais Georreferenciadas – SIMGeo –, para fins de aplicação da Lei Complementar nº 601/2022. Ainda, o município disponibiliza o “Diagnóstico Socioambiental da Microbacia 13-3 – Pedro Lessa”, para servir de referência/exemplo aos interessados em desenvolver estudos sobre demais microbacias de Joinville (SC).

O município de Joinville também deixa pública a quantidade de microbacias disponíveis para a elaboração de estudo socioambiental, os interessados em desenvolver o estudo, os estudos que estão em análise e os que já foram aprovados. Na figura 1 conforme a seguir, retirada do site da prefeitura em 24/04/2023, de 216 microbacias disponíveis para estudo, já havia 102 estudos apresentados e, desses 102 estudos, 63 estudos já estavam aprovados:

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 1 – Diagnóstico Socioambiental – Gestão das Microbacias do Município de Joinville

Fonte: Portal da Prefeitura, PMJ, 2023.

 

A Lei Federal n° 14.285 foi publicada em 29/12/2021. Em simetria, estabelecendo diretrizes para a delimitação das faixas marginais de cursos d'água em área urbana consolidada, a legislação municipal de Joinville foi publicada em 12/04/2022, a Lei Complementar nº 601. Após somente um ano do permissivo legal no município de Joinville, conforme se depreende do site disponibilizado pela Prefeitura de Joinville, já foram apresentados estudos socioambientais referentes a 47,22% microbacias hidrográficas (102 estudos apresentados, para um total de 216 microbacias hidrográficas). E dos estudos apresentados (102 estudos), 61,76% (63 estudos) já foram aprovados.  

Ainda, podemos analisar os interessados em apresentar os estudos até abril de 2023. Um dos 102 estudos foi o apresentado pela Prefeitura de Joinville como modelo – o “Diagnóstico Socioambiental da Microbacia 13-3 – Pedro Lessa”. Então, considerando 101 estudos, pode-se verificar que estão divididos para 21 empresas ou prestadores de serviço da área. A Ambiville Engenharia e Consultoria está responsável por 27 desses estudos (Microbacias estudadas pela Ambiville Engenharia e Consultoria: 10-0; 10-2; 13-8; 14-0; 14-2; 15-0; 15-1; 15-10; 15-4; 15-7; 16-15; 16-28; 17-2; 18-0; 18-4; 19-0; 19-1; 26-1; 26-5; 30-10; 30-3; 30-7; 30-8; 32-5; 32-6; 38-0; e 38-1.), sendo que 19 deles já foram aprovados e os 08 restantes estão em estudo. Já a Angelin Topografia está responsável por 17 desses estudos (Microbacias estudadas pela Angelin Topografia: 11-2; 110-3; 110-4; 16-17; 16-6; 17-1; 17-3; 17-4; 17-5; 17-6; 18-2; 32-10; 32-9; 43-0; 52-1; 52-5; e 53-0.), sendo que 08 deles já foram aprovados e os 09 restantes estão em estudo. Entre essas empresas interessadas em apresentar o estudo pertinente a uma microbacia, a maioria se trata de empresas prestadoras de consultoria ambiental. Entre elas, também se encontram construtoras como a HAGA Administração e Empreendimentos Imobiliários (13-4 e 18-3) e Rogga S.A. Construtora e Incorporadora (14-5 e 16-4). Ainda, vale ressaltar que, muito possivelmente, algumas das empresas de consultorias ambientais tenham sido contratadas por construtoras, visando o auspicioso mercado imobiliário próximos a cursos d’água. Ainda, somente seis profissionais que apresentaram os estudos não demonstraram relação com empresas de consultoria ambiental ou construtoras, o que não exclui a possibilidade desse vínculo.

 

5 Conclusão

A Lei nº 14.285/21, que possibilitou aos municípios disciplinarem APP’s próximas a cursos d’água em áreas urbanas, está em discussão na ADIn nº 7.146/22, no STF, pela sua inconstitucionalidade. Discutem-se as atribuições constitucionais de cada ente federado, segundo a CF, não cabendo aos municípios disciplinarem a matéria, mas sim à União. Não há competência legislativa suplementar do município ao se discutir APP’s próximas a curso d’água em áreas urbanas (Lei nº 14.285/2021), haja vista que a matéria já é disciplinada em legislação federal (Lei nº 12.651/2012, art. 4º, I), sendo a área mínima de proteção de 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura. Deve haver equilíbrio entre os poderes do Estado, não cabendo ao legislativo agir posteriormente (promulgação da Lei nº 14.285, de 29/12/2021) e em descompasso com questão decidida pelo judiciário (julgamento de recurso especial com efeito repetitivo e de alcance geral, Tema 1.010, julgado em 28/04/2021). Por fim, pontua-se o necessário cumprimento do princípio da vedação ao retrocesso da proteção ambiental.

Além dos argumentos levantados pelo STF, a Lei nº 14.285/21 alterou o conceito de área urbana consolidada, deixando o encargo de localmente pontuar essas áreas também para os municípios. Isso facilita para o município escolher as áreas consideradas como área urbana consolidada, posteriormente passíveis de terem suas APP’s próximas a curso d’água também disciplinadas pelos municípios. Ainda, se o município precisa elaborar ou revisar um estudo socioambiental, demonstrando diversas circunstâncias, como baixo risco de desastre, como inundações e deslizamentos, bem como avaliação de riscos ambientais, todas essas circunstâncias poderiam se enquadrar como caso de “baixo impacto ambiental”, da Lei nº 12.651/12 (Brasil, 2012, art. 3º, X e art. 8º).

Da própria justificativa do projeto dessa lei se extrai a preocupação com áreas consolidadas, independentemente de serem áreas de interesse social. Não se deixa de lado a preocupação com famílias mais carentes. Tanto é que há a possibilidade de regularização fundiária em APP em caso de interesse social (Brasil, 2012, art. 8º). Todavia, muitas dessas construções são casas de excelentes condições, a despeito do que a maioria supõe.

Assim, espera-se que a Lei nº 14.285/21 seja declarada inconstitucional, cabendo somente à União estipular APP próxima a curso d’água em área urbana (Lei nº 12.651/12).

 

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