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Colonização,
religião e música sacra no Planalto Norte de Santa Catarina (1891-1923)
Colonization, religion and sacred music
in the North of Santa
Catarina (1891-1923)
Matheus Theodorovitz Prust
1 matheusprust@gmail.com
UNESPAR, Brasil
Revista
Orfeu
Universidade do Estado de
Santa Catarina, Brasil
ISSN: 2525-5304
Periodicidade: Semestral
vol. 7, núm. 2, 2022
revistaorfeu@gmail.com
Recepção: 10 Fevereiro
2022
Aprovação: 08 Abril
2022
Autores mantém os
direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação.
Este trabalho está sob uma Licença Internacional Creative Commons Atribuição 4.0.
Resumo: Neste
artigo abordo a relação entre o processo de colonização do Planalto Norte
catarinense e o concomitante desenvolvimento da Paróquia de Santa Cruz de
Canoinhas, entre fins do século XIX e início do XX, com vistas a uma descrição
da presença da música sacra naquele cenário. Através de fontes primárias
(documentos da paróquia, cartoriais, iconografia) e bibliografia das áreas
abarcadas, apresento um mapeamento do processo de desenvolvimento da estrutura
musical da paróquia, tendo como marcos temporais o início das missões
jesuíticas na região (1891) e o ano de mudança do primeiro vigário (1923). A
discussão é pautada em aspectos da igreja romanizada de Pio IX e das
determinações do Motu Proprio “Tra
le sollecitudini” de Pio X.
A partir do exposto, compreende-se que para a comunidade saxônica da região a
igreja e seus aparatos (incluindo a música) tinham uma representatividade
particular, compondo a rede social em suas permanências nas jovens vilas do
estado. Procuro, ainda, chamar a atenção para a necessidade de expansão de
investigações musicológicas para campos atualmente menos privilegiados, tais
como o interior de Santa Catarina.
Palavras-chave: História da Música de
Santa Catarina, Colonização em Santa Catarina, Música Sacra em Santa Catarina,
Paróquia de Santa Cruz de Canoinhas, Guerra do Contestado.
Abstract: In this article we
approach the relationship between the colonization
process in the North Santa
Catarina State and the concomitant development of the Paróquia Santa Cruz de Canoinhas, between
the end of
the 19th century and the beginning
of the 20th, aiming a description of the presence
of sacred music in that scenario.
Using records from the curch,
cartorials, iconography and bibliography of the areas
covered, we present a mapping of the process
of development of the musical structure at the
Paróquia, having as temporal landmarks
the beginning of the Jesuit
missions in the region (1891) and the year of
change of the first vicar
(1923). The discussion is based on aspects
of the Romanized
Church of Pius IX and the
determinations of the Motu Proprio “Inter pastoralis officci sollicitudines” of Pius X. It is understood
that for the Saxon community of the region,
the church and its apparatus (including music) were important for the life of
the colonizers, composing the social network in their stays in the young villages
of the state.
We also aim
to draw attention
to the need
to expand the musicological investigations about less privileged fields, such as the contryside of Santa Catarina.
Keywords: Music History
in Santa Catarina, Colonization in Santa Catarina, Sacred Music in Santa Catarina, Paróquia de Santa Cruz de
Canoinhas, Contestado War.
Introdução
Desde que Maria Elizabeth Lucas, no I Simpósio Latino-Americano
de Musicologia (LUCAS, 1998), chamou a
atenção para a defasagem dos estudos musicológicos sobre
as regiões periféricas da sociedade colonial brasileira, um grande
caminho já foi trilhado. Antes praticamente ausentes na
historiografia musical, estados como Santa Catarina têm recebido, cada
vez mais, atenção da comunidade acadêmica. Esse fato fica bem ilustrado no
levantamento de estudos em torno da história da música em Santa Catarina, de Tiago Pereira (2020), que nos dá um
panorama do desenvolvimento da área. O problema apresentado por Lucas (1998), e revisitado por Castagna (2004b),
Holler (2008)
e outros, talvez tenha tomado uma diferente dimensão: nota-se a quase que
centralização dos estudos sobre a capital ou cidades de médio e grande porte.
Não que haja qualquer problema com isso: o meu ponto é que o grande valor e a
representatividade dessas pesquisas para as suas regiões e para a construção de
uma historiografia do estado podem impulsionar (ou continuar a impulsionar)
outras iniciativas que abarquem as “ainda periféricas áreas da historiografia
musical brasileira”.
Em outro texto (LUCAS, 1998),
no qual discuto dois acervos musicais sacros interioranos, da região do
Planalto Norte, foram suscitadas questões que trouxeram a este artigo. Aquele
estudo se relaciona à tradição coral da cidade de Canoinhas, consistindo na
atribuição de parte dos acervos à Schola Cantorum “Santa Caecilia”, da Paróquia
de Santa Cruz. Enquanto o objetivo havia sido o de elaboração e descrição de
procedimentos metodológicos de análise documental para aquele caso específico,
almejando elaborar ferramentas que auxiliassem na continuidade das
investigações sobre aqueles (e eventuais novos) acervos, muito estimulado pelas
questões levantadas por Castagna
(2004a), o processo me fez debruçar sobre a cronologia daquele coro e,
naturalmente, da própria paróquia. Como apontado lá, a cronologia apresentada
foi uma decorrência do processo adotado para a atribuição de repertório, sendo
um efeito colateral que possibilitaria reflexões
futuras.
Dentre os pontos levantados está a necessidade de elucidação do
processo pelo qual a música sacra foi inserida e desenvolvida na região. Quem
foram os colonizadores da região? E os religiosos, missionários e suas ordens?
Que tradição musical (ou tradições) trouxeram ao planalto? Como o contexto de
colonização e a religião se entrelaçavam? Qual era e como se desenvolveu a
estrutura de música sacra?
Buscando contribuir para a compreensão desses aspectos, proponho
um olhar para a Paróquia Santa Cruz de Canoinhas. Essa paróquia, por seu
histórico e representatividade local, pode ilustrar e representar um processo
mais amplo de prática musical, que envolve o grande número de capelas
interioranas surgidas no planalto catarinense no final do século XIX e início
do século XX. A discussão será realizada em quatro seções. A primeira delas
trata das missões jesuíticas e vicentinas da igreja católica romanizada e a
relação com a criação de assentamentos urbanos na região; as missões
representam os primeiros exemplos conhecidos de música sacra na localidade. A
seguir apresento aspectos das missões franciscanas e do estabelecimento da
Ordem dos Frades Menores em Canoinhas, o que culminou na criação da paróquia. A
relação do vigário da matriz e dos devotos, com enfoque no papel da mulher na
estrutura musical da igreja, é tratada na terceira seção. A quarta e última parte
consiste em uma leitura do Livro Tombo da paróquia,
com um levantamento de dados relativos ao histórico da igreja, os contextos de
prática musical e os personagens envolvidos. Adoto como escopo os anos que
compreendem o período entre o início das missões em Canoinhas (1891) e a
mudança do 1° vigário da paróquia (1923).
Uma nota
Serão fios norteadores desta discussão os aspectos da igreja
romanizada de Pio IX e as determinações do Motu Proprio “Tra le sollecitudini” de Pio X.
O período de reformas da Igreja Católica no âmbito do Concílio
Vaticano I (1869-1870) coincide com o da expansão da colonização do interior de
Santa Catarina. A ruptura com a tutela do Estado e a afirmação de centralização
do poder papal, proclamando-se a sua infalibilidade e a restauração da
autonomia de Roma, trouxeram um novo modelo pastoral ao Brasil. O processo de recatolização ou romanização de Pio IX já
estava em curso desde meados do século XIX e determinou a fortuna da então
religião oficial do Império. Para atender as vastas regiões sertanejas do sul
do Brasil, as missões apostólicas – ausentes desde a reforma pombalina e a
expulsão dos jesuítas – seriam importantes ferramentas de catecismo. Nesse
catolicismo romanizado, a figura do missionário e depois do padre (muitas vezes
o único membro do clero na região) foram seminais para as colônias do planalto:
Pio IX relançou as
Missões católicas, enfraquecidas desde a grande epopeia evangelizadora dos
séculos XVI e XVII. Buscou que não faltasse atendimento pastoral aos milhares de
imigrantes que deixavam a Europa. E, especialmente, cuidou que fossem novas
Ordens e Congregações religiosas para o Continente americano, carente de
sacerdotes e religiosos. (BESEN, 1994, p. 52).
Sobre o fim do regime de padroado, tendo como marco a
Proclamação da República, frei Rogério Neuhaus, OFM,
importante figura religiosa no contexto abordado, diz: “Cahiu
o regimen monarchico, oppressor da liberdade de culto. Substituiu-o a Republica,
proclamando sua separação da Egreja, com o que esta
sentiu cahirem-lhe as pesadas correntes das mãos e
dos pés.” (SINZIG, 1934, p. 70). Para o
processo de recatolização, o frei chama a atenção
para a necessidade da vinda de religiosos da Europa, para atender as estruturas
pré-existentes e aquelas que precisavam ser formadas:
Donde esperar a
vida? De novas vocações no Brasil? Até que viesse a primeira o último frade
estaria sepultado no cemitério não havendo mais quem pudesse transmittir as tradições seraphicas,
nem mesmo receber na Ordem e garantir a successão
legal. Restava um só recurso: a Santa Sé. Si esta mandasse religiosos europeus,
bons, zelosos, prudentes a occuparem as casas
desertas a tornarem a entoar os psalmos do Officio Divino, a cellebrarem a
S. Missa, prégarem e administrarem os Santos
Sacramentos, a vida voltaria. (Ibid., p. 70).
No contexto da restauração da Igreja Católica, especialmente
importantes para nosso caso são as determinações de Pio X em torno da música
sacra. O Motu Proprio “Tra le sollecitudini”2, de 1903, regulamentava a prática e produção de música.
Sobretudo visando a restauração do canto gregoriano e da música polifônica e a
proibição de hibridização de estilos sacro e profanos (ie.
teatrais), o Motu Proprio estabelece,
dentre outros aspectos, normativas sobre estilo, instrumentos, canto e
atribuições do clero e dos leigos com relação à música. O mais conhecido e
influente documento de regulamentação da música sacra no país até então, foi
reafirmado em sua oficialização pelo Concilium Plenarium Brasiliense, em
1939. Na introdução, Pio X explicita a soberania do documento, destacando a
necessidade de se combater os “abusos mais comuns em tal matéria”:
E por isso, de
própria iniciativa e ciência certa, publicamos a Nossa presente instrução; será
ela como que um código jurídico de Música Sacra; e, em virtude da plenitude de
Nossa Autoridade Apostólica, queremos que se lhe dê força de lei, impondo a
todos, por este Nosso quirógrafo, a sua mais escrupulosa observância. (Motu Proprio, Introdução).
A vida religiosa dos colonizadores catarinenses foi marcada pelo
novo cenário da Igreja Católica. Com o estabelecimento das ordens religiosas e
a criação e a centralização de regulamentação na Diocese de Florianópolis, os
princípios norteadores do catolicismo romanizado influenciaram o
desenvolvimento das estruturas das capelas interioranas, envolvendo as de
prática musical.
Cronografia
1829 | Fundação da colônia de
São Pedro de Alcântara
1831 | Abdicação do trono do
Império por D. Pedro I
1888 | Instalação de Francisco
de Paula Pereira em Canoinhas
1889 | Proclamação da República
1891 | Missões de Padre João
Maria Cybeo, SJ, em Canoinhas
1893 | Chegada da Ordem dos
Frades Menores em Canoinhas
1902 | Elevação de Canoinhas a
distrito de Curitibanos
1903 | Motu Proprio
“Tra le sollecitudini”
1908 | Criação da Diocese de
Florianópolis
1911 | Emancipação
político-administrativa de Canoinhas
1911 | Chegada de Frei Menandro Kamps, OFM, em Canoinhas
1912 | Início da Guerra do
Contestado
1912 | Ereção Canônica da
Paróquia de Santa Cruz de Canoinhas
1913 | Instauração da Comarca
de Canoinhas
1913 | Fundação do coro da
Paróquia Santa Cruz de Canoinhas
1916 | Fim da Guerra do
Contestado
1920 | Chegada das Irmãs
Franciscanas de Maria Auxiliadora em Canoinhas
1921 | Fundação do Colégio
“Sagrado Coração de Jesus”
1922 | Falecimento de Rosalina
Steffen Werner
1923 | Mudança de frei Menandro Kamps para Santo Amaro
As Missões Populares e a
Capela de Santa Cruz de Canoinhas
A história da difusão do catolicismo e da constituição das
colônias na então Província de Santa Catarina, no século XIX, confundem-se.
Antes mesmo antes da proliferação das vilas no planalto do estado, o tropeirismo e a expansão colonial paranaense já faziam
emergir pequenas comunidades estáveis, que traziam consigo demandas de
atendimento religioso. Com a intensificação das correntes
imigratórias/colonizadoras a partir de 1828 (com estímulo do governo imperial)
e o pequeno número de sacerdotes em Santa Catarina, que dificultava o
estabelecimento de paróquias3, as Missões-Apostólicas Populares foram essenciais, até a
criação da Diocese de Florianópolis, em 1908. Enquanto o protestantismo levaria
algumas décadas para se afirmar naquele território (e as missões dos frades
franciscanos no planalto iniciando apenas em 1891), os missionários jesuítas e
vicentinos se encarregavam do catecismo nas regiões mais remotas do sul do
país, disseminando a fé católica nos povoados e arraiais do vasto sertão
catarinense. Não se fundava vila sem capela. Os
desafios dos missionários não eram pequenos.
Apesar de o Caminho das Tropas
passar pela região de Canoinhas desde 1730, e de haver registros de
propriedades rurais naquela localidade a partir de 1850, foi no último quartel
do século XIX que um núcleo urbano definitivo começou a ser estabelecido. Um
dos pioneiros, tido oficialmente como o fundador da vila de Canoinhas, foi o
paranaense Francisco de Paula Pereira (1835-1898) que, em 1888, junto de sua
comitiva, instalou-se na foz do rio Água Verde. Anteriormente Juiz de Paz em
São Bento do Sul, Francisco de Paula Pereira chegou em Canoinhas refugiando-se
de conflitos políticos, acompanhado por familiares, peões e agregados.
Encontrando ricos ervais e outras riquezas naturais, o lavrador contribuiu para
o povoamento da região, conectando-a a outros centros urbanos com economia mais
desenvolvida. Amigo da religião, como seria
referido posteriormente, recebeu e auxiliou as missões católicas na nova
comunidade4.
Uma figura central neste contexto, que marcou profundamente os
rumos da religião em Canoinhas, foi o Padre João Maria Cybeo
(1837-1925). Missionário italiano da Companhia de Jesus, desde 1868 empreendeu
missões populares nos três estados do sul. Atendendo os colonos no interior de
Santa Catarina, auxiliou na propagação do catolicismo romanizado, seguindo as
diretrizes do Concílio Vaticano I, batizando, casando e confessando dezenas de
milhares de pessoas ao longo de sua missão no Brasil. A passagem de João Maria Cybeo por Canoinhas, por volta de 1890, foi determinante
para a estruturação religiosa da vila que nascia5
Mantendo boas relações com os líderes locais, encontrou grande interesse e
receptividade da comunidade, que se concentrava na casa de Francisco de Paula
Pereira para ouvir e ver o Santo Padre, que emanava uma aura de misticismo (VINHAS DE QUEIROZ, 1966, p. 41).
A boa convivência entre missionários e as lideranças das
colônias – sempre almejada – favorecia ambos os lados. Os padres conseguiam
acesso facilitado às comunidades, até mesmo se hospedando junto de figuras
proeminentes (como donos de terras e chefes políticos sertanejos), que davam
aos demais o exemplo de bons cristãos. Por outro
lado, estas mesmas lideranças encontravam benefícios na difusão de determinados
princípios da religião católica romanizada, como os de ordem, retidão moral,
trabalho árduo e respeito às autoridades (SERBIN,
2008, p. 92-93). A religião, também, representava um importante componente
social, que permitia a reunião regular dos colonos que, muitas vezes, viviam
isolados em regiões remotas do sertão catarinense. Fosse em prol da ereção de
igrejas e construção de cemitérios ou da assistência ao calendário religioso,
para as missões populares a participação comunitária era imperativa. Não se fundava vila sem capela; não se erguia capela sem o
esforço coletivo.
Do esquecimento em “terra de ninguém” às missas, sermões,
batizados, cantos e confissões: a rotina dos pioneiros da colonização do
planalto catarinense foi remodelada. Em uma carta do punho do Pe. Cybeo, lemos o programa diário de suas missões6:
Levantar-se cedo,
preparar a sacristia e tocar o Angelus. Aberta a
porta da igreja, entro imediatamente no confessionário. Às 6 horas, quando
somos em dois, a primeira Missa. Depois continuam as confissões até a Missa da
Missão, às 9 horas, durante a qual se reza o terço. Depois da Missa, um sermão,
rápido lanche, muitas vezes na sacristia. Em seguida, confessionário até às 13
ou 14 horas. Então almoço e catecismo para as crianças. Findo este, confissões
até o sermão da tarde. A seguir, cantos, Benção e instrução para bem
confessar-se. As mulheres vão
para casa, ficando os homens para as confissões, até às 23 ou 24 horas.
Finalmente os missionários vão repousar umas quatro ou cinco horas, para no dia
seguinte recomeçar. (Pe. João Maria Cybeu, s/d. Grifo
nosso.)
Não havendo capela em Canoinhas, o serviço religioso era
realizado, em princípio, na casa de Francisco de Paula Pereira, que permitia o
primeiro contato do missionário com as centenas de moradores que já habitavam a
insípida região7. Urgia a criação de um local de
culto. Como era de costume, buscou-se o local mais alto próximo ao povoado,
onde futuramente seria erguida uma capela8. Frei Menandro Kamps, o primeiro pároco
desta capela, explica:
O padre Cybeu, onde celebrava missa, deixava uma cruz. Plantou um
destes cruzeiros, numa colina, pertencente aos terrenos de um tal Francisco
Pereira, grande amigo da Religião. Os “canoinhenses”, de perto e de longe,
começaram de procurá-la, enchendo-a de ex-votos e de velas. Fizeram um telhado.
Um furacão arrancou o telhado. Construíram-lhe, então, ao redor, uma igreja.
(Frei Menandro Kamps, s/d)9.
Como reza a tradição, foi com a ajuda de Francisco de Paula
Pereira e de Joaquim Branco, pioneiros da região, que a cruz foi levantada e a
capela construída. Primeiro templo de Deus em Canoinhas. Símbolo dos colonos,
da colina de Santa Cruz veio o nome da vila, futuras cidade e paróquia. Foi
nessa colina que a música sacra chegou em Canoinhas, feita primeiramente por
Pe. João Maria Cybeo, depois continuada pelos fiéis,
até se consolidar por meio da criação de um coro de devotos, quando da chegada
dos padres franciscanos. Ergueu-se capela, fundou-se vila:
Vila de Santa Cruz de Canoinhas (Fig. 1).
Além de terem recebido o missionário, as lideranças locais, por
sua influência e exemplo, fizeram com que a população adotasse a rotina do
culto e a missão de difusão do catolicismo através da construção de capelas na
região. História oficial, Francisco de Paula
Pereira subia a colina todos os domingos, para cantar a ladainha, acompanhado
por “um preto de nome Romão” (CABRAL, 1979, p. 321). História
concreta, proliferaram as capelas por meio do trabalho popular. De
acordo com o Relatório do Frei Rogerio Neuhaus, OFM,
de 24 de dezembro de 1908, como fruto das missões populares:
“[...] há na Villa
de Canoinhas, distante de Curytibanos 30 legoas, uma pequena Capella de
Santa Cruz, de madeira, bem decente, que tem alguma oração que os devotos têm
dado em honra de S. Cruz. Fora desta Capella tem naquelle districto 14 a 15 capellas de madeira, sem patrimônio nem alfaias, apenas tem
algumas toalhas.” (Livro Tombo, fl 3v)
Mais do que a difusão do catolicismo, esses empreendimentos
contribuíram para a estruturação da comunidade. Com o desenvolvimento da vila,
a pequena capela se converteria em paróquia e depois em matriz, regendo as
igrejas da região, influindo na vida da sociedade canoinhense.
Fig. 1
Foto: Uhlig.
Acervo: Fátima Santos.
A Paróquia de Santa Cruz e
a Ordem de São Francisco
De vila a cidade, de
capela a paróquia. Quando Canoinhas, antigo distrito de Curitibanos10, tornou-se município, em 1911, o bispo Dom João
Becker pôde elevar a singela capela de Santa Cruz à condição de Paróquia e
Matriz, em 1912. Marcava-se, assim, o início de uma nova página do catolicismo
na região. Os padres franciscanos, presentes nas missões populares em Canoinhas
deste 189311, assumiram a paróquia e todas as
obrigações e responsabilidades exigidas: “Ordenamos que na Capella
dedicada a Santa Cruz, sita na Villa de Canoinhas, tenham todos os direitos,
honras e distinções de uma Igreja Parochial”,
assinalou o bispo de Florianópolis, no decreto de ereção canônica12. Não mais “itinerantes”, os freis, de origem saxônica,
auxiliariam no desenvolvimento da cidade, com obras religiosas, de caridade e
de assistência comunitária e de ensino. Com o crescimento da população e com
uma nova onda migratória no planalto norte catarinense, os frades franciscanos
e colonos germânicos trariam importantes contribuições para a paróquia e
cidade. Dentre elas, um coro.
Santa Catarina era um estado periférico a nível nacional, com
poucos habitantes e com grande dificuldade de expansão. Através dos malfadados
planos de incentivo governamental, os imigrantes que chegaram na nova colônia
de São Pedro de Alcântara e Rio Negro, em 1829, espalharam-se pelas vastas
áreas de litígio entre a Argentina e as Províncias de Santa Catarina, Paraná e
Rio Grande do Sul, povoando o estado. Em Canoinhas, os poloneses, ucranianos e
italianos se estabeleceram em regiões retiradas, a partir de 1870. No centro
urbano, por volta de 1895, chegaram imigrantes de origem germânica, incluindo
os missionários franciscanos (TOKARSKI et
al, 2011, p. 36-37). Independentemente da etnia, para os novos moradores a
religião era tanto um aspecto de conexão com a terra natal como representava um
marco da colonização:
Os imigrantes foram
obrigados a fazer sua vida, sem muita proteção governamental. Isso favoreceu
seu enquistamento cultural e religioso no conjunto da população catarinense.
Neste isolamento, dois elementos foram decisivos: a religião católica e a
língua de origem. Ambas lhes recordavam a Pátria deixada e não os deixavam
desenraizados. Imediatamente após sua chegada, duas preocupações: a construção
de uma capela e de uma escola. (Besen, 1994, p. 55).
Neste contexto, o padre era o elo. O ponto de convergência das
capelas do interior, o pároco era tanto líder religioso como educacional e
pessoal. Possibilitava, por meio da confluência de pessoas, a interação social,
importante para o desenvolvimento local. Havendo igreja e a manutenção do
calendário religioso, tanto do tempo comum como com a realização das festas e
celebrações, a vivência comunitária semanal era estimulada. Junto do padre, no
catolicismo romanizado, a mulher teria funções abrangentes, com contribuição
decisiva: era catequista, fundava e presidia as obras leigas, era rezadora e
entoadora de cantos (BESEN, op. cit., p. 55).
Ao longo da história da paróquia de Canoinhas, essa tradição de colaboração
seria uma constante. Foi ela que possibilitou a criação e desenvolvimento da
tradição coral na região.
Frei Menandro
Kamps e Rosalina Steffen
Werner
No início do século XX, coincidindo com a chegada de frei Menandro Kamps (1874-1959),
primeiro vigário da nova paróquia, instalaram-se no centro urbano de Canoinhas
algumas famílias de origem germânica. Eram lavradores, oleiros e comerciantes,
vindos de cidades como Lages e Brusque, assim como dos estados do Paraná e Rio
Grande do Sul. Aqueles de fé católica seriam, por alguns anos, os principais
frequentadores da capela de Canoinhas (os protestantes precisariam aguardar até
1921 para ter a sua própria igreja). É importante notar que nesse período,
diferindo de cidades com grande confluência de etnias, que permitiam a
interação religiosa de múltiplas matrizes, Canoinhas manteve traços das antigas
práticas de catequização: aos colonizadores alemães (no centro urbano), padre e
língua alemã; aos poloneses (no interior), tradição eslava; e assim por diante.
Isso possibilitou o prolongamento de tradições religiosas que já eram
familiares aos novos canoinhenses13.
Apesar de Cândido de Abreu,
Secretário do Estado do Paraná, ter chamado a simples igrejinha branca do Morro
da Cruz de “capela de culto extravagante”14, em
1897, nas colônias do interior catarinense não havia lugar para o esplendor,
nem dos antigos rituais nem da estrutura física das capelas. Pode-se dizer que
a paupérrima paróquia de Canoinhas teve um início verdadeiramente franciscano:
não tinha nada e faltava tudo, mas não deixava de cumprir sua missão. Com o
auxílio da população e liderança de frei Menandro, a
partir de 1911 foram instalados piso e sinos, adquiridos bancos, harmônio e paramentos;
construiu-se casa paroquial, que também abrigou escola, que depois teve prédio
próprio; com o aumento dos fiéis, aumentou-se o templo, erguendo-se a torre. Dom Daniel Hostin a chamaria de
“mimosa paróquia”15.
Frei Menandro Kamps,
OFM, desembarcou no Rio de Janeiro, vindo da Südlohn,
Prússia, sua terra natal, em agosto de 1900, sendo ordenado padre no ano
seguinte, em Petrópolis. Logo atuando como professor da “Escola de Meninos”,
certamente teve contato com a vasta produção de música sacra daquele verdadeiro
celeiro, que contava com alguns dos principais nomes da composição católica
nacional do período, além de abrigar a célebre Typographia da Escola
Gratuita São José, prestigiosa editora brasileira de música sacra no
século XX, atual Editora Vozes. O contato com a música sacra era inevitável,
ainda mais com as estipulações do Motu Proprio
de Pio X, que determinava que, dentre outros aspectos do uso da música,
fossem oferecidas lições sobre música sacra aos estudantes de teologia, “para
que os clérigos não saiam dos seminários ignorando estas noções, tão
necessárias à plena cultura eclesiástica”16.
Frei Menandro lecionou em Petrópolis justamente
quando Frei Basílio Röwer – importante formulador da
tradição musical sacra brasileira no século XX – lá estudava Teologia. Teriam
se conhecido? Não sabemos. Mas a tradição apreendida em Petrópolis acompanhou o
franciscano em suas perigrinações por Santa Catarina,
levando as publicações da Typographia – missas, hinários, motetos,
cânticos e antífonas de Frei Basílio – até Canoinhas, para servir à rotina da
capela, ao coro que surgiria, assim como para os alunos de sua escola paroquial17. Passando por Curitiba, Curitibanos e Lages, por fim
pisou em Canoinhas no ano de 1911, nomeado Administrador da Paróquia em 1912 e
seu Vigário em 1913, saindo de lá apenas em 192318.
Os novos moradores de Canoinhas chegaram lá, coincidentemente,
em 1913. Dentre eles estavam duas famílias que já tinham em seu cerne a prática
musical doméstica. Estes Werner e Steffen, afeitos a
música desde seus antepassados da Prússia, já tinham experiência e alguns,
inclusive, formação em canto ou instrumentos. Conforme conta a tradição, não
tardou para que frei Menandro, tendo notícias deles,
procurasse-os, pedindo que formassem um coro sacro para as funções religiosas,
no que foi prontamente atendido (CARVALHO,
1977, p. 11). Como já foi destacado, a vida religiosa representava uma
possibilidade de expressão de fé e de continuação de tradições, que podia
simbolizar e significar a vida em novas terras. A responsável pelo coro foi a
jovem Rosalina Steffen Werner.
Pouco sabemos sobre a interação de frei Menandro
e de Rosalina, mas dela vieram duas contribuições historicamente importantes
para a paróquia: em 1913, a fundação do coro para o serviço religioso; em 1916,
a fundação do Apostolado da Oração. Enquanto regia o coro e presidia o Apostolado,
certamente Rosalina teve uma convivência frequente e bem-sucedida com o pároco,
não havendo quaisquer indícios do contrário. Ambas as obras deram frutos ao
longo de gerações, existindo até o presente.
Rosalina Steffen Werner (1892-1922)19, então com 20 anos, e seu marido Pedro Nicolau Werner
(1886-1944), casados na cidade de Lages em 191220,
instalaram-se em Canoinhas nos ramos da cervejaria e da olaria, certamente
atraídos pela “febre do ouro-verde”. Vieram acompanhados de outros familiares,
atuantes nas mesmas áreas. Leopoldo Steffen junto do
cunhado Pedro Werner, já visitava a região alguns anos antes, abriram o
empreendimento que deu origem a Cervejaria Canoinhense, adquirida pela família Loeffler, até hoje existente. Quando, em 1913,
instalaram-se definitivamente em Canoinhas, trouxeram os irmãos mais novos de
Rosalina, Alvina Steffen
(16 anos) e Rodolpho Steffen (14 anos), aos seus
cuidados. Eles seriam, com mais alguns convidados, os membros fundadores do
coro, tendo Rosalina como líder.
Qual foi o caminho que levou os Steffen-Werner
ao planalto norte, trazendo a sua contribuição para a estrutura de música sacra
à paróquia de Santa Cruz? Foi o mesmo de centenas de imigrantes e seus
descendentes que, desamparados pelo governo imperial e provincial, com as
crises pós-D. Pedro I, migraram pelo território catarinense em busca melhores
perspectivas. Os alemães levados à colônia São Pedro de Alcântara em 1829 –
dentre eles as famílias Steffen e Werner – mudaram-se
para o litoral, para o Vale do Itajaí, Lages ou Curitibanos, por exemplo. Um
fato a ser salientado é que os membros deste primeiro coro não chegaram em
Canoinhas por meio da expansão territorial paranaense, mas todos vindos do sul
de Santa Catarina, das cidades em torno da estrada RS-SP, que também se
conectava à capital através de Lages. De São Pedro de Alcântara a Lages, de
Lages a Curitibanos e das duas cidades a Canoinhas. Interessante o suficiente
para ser destacado é o fato de que os membros da Banda “Lyra Catharinense”, o contraponto do coro sacro em uma vila de
estrutura urbana crescente, vinham do sentido oposto – ou seja, do Paraná, mais
especificamente da cidade da Lapa. Duas formas diferentes de colonização, duas
tradições distintas: a primeira banda de Canoinhas, de Emílio Gothardo Wendt (1911) e o
primeiro coro da localidade, de Rosalina Steffen
Werner (1913), ilustram o processo de colonização da região
A tradição de música sacra e doméstica inserida em Canoinhas
pode ser traçada pelo histórico do casal Rosalina e Pedro Nicolau. Rosalina,
natural de São Pedro de Alcântara, estudou violino e harmônio em casa com o
pai, Pedro Steffen, vindo de Kastellaun,
na Prússia21. O seu aperfeiçoamento se deu em
Desterro (Florianópolis), cuja estrutura musical era das mais desenvolvidas da
província22. Lá residiram e frequentavam a
Catedral de Florianópolis, onde seguramente ouviam o órgão e o coro (o
integravam?)23. Pedro José Werner, avô de Pedro
Nicolau, um dos fundadores da Colônia Itajahy
(Brusque), também chegou em São Pedro de Alcântara vindo do Alemanha, mas do
Norte, de Bremen24. Teve vários filhos, dos
quais Maria Werner (1855-1932) casou-se com João Augusto Maluche
(1843 -1925), aclamado músico e fundador da primeira banda de música de
Brusque, também natural da Prússia, batizado na paróquia de Wilhau25. Agora tio de Pedro Nicolau, conviveriam em suas
peregrinações pelo estado, chegando em Lages. Sabemos que Rosalina continuou os
estudos de música nesta mesma cidade, quando para lá se mudou e se casou –
teria sido aluna de Augusto Maluche? Impossível
dizer. O que importa, aqui, é ilustrar como a música fazia parte do cotidiano
desses personagens, sendo transportada para o seio das colônias e da vida
religiosa da paróquia.
Fig. 2
Revista Notícias de Vicente Só, número 3 (p. 76)26
Assim, esse primeiro coro de Santa Cruz, formado a pedido de
frei Menandro Kamps, tinha
como seus membros: Rosalina Steffen Werner (regente,
organista e coralista), Alvina
Steffen, Maria Konig, Pedro
Werner, Leopoldo Steffen, Rodolpho Steffen e um senhor de sobrenome Aulike.
Pouco anos depois foi acrescido de novos integrantes: Maria Theiss
Mayer, Antônio Kohler, Ana Franz Bosse,
Mariz Franz e João Zauer (CARVALHO, 1977, p. 11).
Considero importante destacar um aspecto da estrutura musical da
paróquia: o coro era misto. Pelas determinações do Motu Proprio, seguindo a tradição já implementada por
outros decretos da Sagrada Congregação dos Ritos27,
contudo, proibia-se a participação de mulheres no coro ou capela musical,
devendo ser constituídos única e exclusivamente por homens. Pio X foi enfático
em sua normativa:
Os cantores têm na
Igreja um verdadeiro ofício litúrgico e, por isso, as mulheres sendo incapazes
de tal ofício, não podem ser admitidas a fazer parte do coro ou da capela
musical. Querendose, pois, ter vozes agudas de
sopranos e contraltos, empreguem-se os meninos, segundo o uso antiquíssimo da
Igreja.28
Apesar disso, conforme Duarte
(2016b) demonstrou, nas mais diversas regiões do Brasil, nessa época, a
presença feminina nos coros era notada29. A
querela seria resolvida, “oficialmente”, apenas por Pio XII, através da
Encíclica “Musicae Sacrae
Disciplina”, de 1955, que tolerava a participação de mulheres quando não
houvesse número suficiente de cantores. Certamente uma decisão apoiada na
necessidade e na prática corrente. No Brasil, frei Basílio Röwer
(1907, p.128, apud DUARTE,
op. cit., p. 229), em seu livro sobre o Motu Proprio, já sugeria que “os coros fossem formados
pelos membros do Apostolado da Oração e das Filhas de Maria”, as principais
agremiações de leigos no catolicismo romanizado, que substituíram as irmandades
e ordens terceiras. É nesse cenário frei Menandro,
Rosalina Werner e a paróquia de Santa Cruz se encontravam.
Na Canoinhas de 1913, uma vila com não mais do que 500
habitantes, as decisões do pároco deveriam ser práticas. A própria existência
da paróquia dependia, fundamentalmente, da participação ativa dos colonos. Já
diria frei Menandro Kamps30
que o objetivo do Apostolado da Oração deveria ser o de “trazer novos membros
para a paróquia” e que a escola servia para, por meio dos meninos, “atrair para
a igreja os pais deles”. Nas missas solenes e nas festas de guarda o coro será
sempre referido como um atrativo, assim como o coro dos catequistas (meninos e
meninas), “de modo que sempre mais devotos frequentam a igreja nestes dias.”
Para Duarte (op. cit., p. 238):
Em suma, no
universo católico brasileiro, se a moralidade propagada pelos padres romanizadores poderia ainda encontrar eco nos anseios da
sociedade que se pretendia europeia, fato é que na prática de música litúrgica,
soluções não-oficiais foram encontradas a fim de garantir uma participação
efetiva destas atrizes sociais. Esta via não-oficial solucionou um problema que
o clero teria de enfrentar caso optasse por cumprir literalmente as
determinações presentes nas normas romanas: com o ensino laico, a obtenção de
meninos dispostos a cantar em missas certamente seria reduzida.
No nosso caso, não apenas era difícil ter meninos para cantar
nas missas, como parece ter sido um desafio arregimentar homens para o coro.
Dos nomes dados por Carvalho (1977, p. 11)
seis são mulheres e cinco são homens. Isso era por “quererem vozes agudas” ou
por uma necessidade básica para a existência do coro? Fato indiscutível, as
mulheres das paróquias do interior catarinense do início do século XX
desempenhavam relevantes funções – e em Canoinhas, como em outras cidades, eram
responsáveis diretas pela música na igreja (dentro das atribuições leigas),
apesar das diretrizes de Pio X. Não fosse por Rosalina, talvez a Paróquia de
Santa Cruz não tivesse o seu coro.
Fig. 3
Foto: Desconhecido. Acervo: Matheus Prust
A música na Paróquia
através do “Livro Tombo”
Apesar de trazer poucas informações explícitas, as principais
referências sobre a estrutura musical da paróquia vêm do seu Livro Tombo. Além de nos dar indícios sobre os membros do
coro e descrições de participações no calendário litúrgico, esse texto permite
conhecermos o contexto no qual a música sacra estava inserida, possibilitando
uma compreensão mais aprofundada do cotidiano da comunidade católica de
Canoinhas.
Os livros tombo (ou equivalentes) das paróquias do interior
representam, por vezes, as principais fontes históricas/primárias das cidades
catarinenses. No caso de Canoinhas, que foi fundada em torno da capela de Santa
Cruz, o Livro Tombo é uma das únicas fontes primárias sobreviventes. Com o
incêndio da primeira prefeitura da cidade, a documentação oficial do município
foi perdida, fazendo com que os documentos da igreja adquirissem uma
representatividade ainda maior. Este documento também reporta dados sobre as
colônias das proximidades, sendo uma referência para os estudos históricos da
região. O Livro Tombo está sob os auspícios da Paróquia de Santa Cruz de
Canoinhas, Matriz Cristo Rei, sendo disponibilizado, com restrições, para
investigações. O arquivo da paróquia também possui os registros de nascimentos,
casamentos, óbitos e enterros anteriores aos registros cartoriais de Canoinhas,
a partir de 1912.
Com relação aos dados referentes a música sacra, tomando como
referência os textos do período de 1912 (de abertura do Livro Tombo) até 1923
(saída de frei Menandro da paróquia, um ano após a
morte de Rosalina Werner), observo alguns aspectos musicais a serem destacados.
Eles se relacionam (i) à atuação leiga, formando o coro de devotos; (ii) aos instrumentos utilizados na igreja e festas e a
relação com bandas profanas; (iii) quanto à descrição
de participações do coro no calendário litúrgico; (iv)
sobre um grupo vocal de alunos da escola da paróquia; (v) ao estilo do
repertório executado. Como os temas são complementares, eles serão apresentados
sem seccionamentos, relatados a seguir.
Os anos de 1912 a 1919 foram muito conturbados na paróquia de
Canoinhas. Palco da Guerra de Contestado (1912-1916),
passou pelos mais difíceis momentos em 1914 e 1915, quando a região foi campo
de batalha entre as forças armadas brasileiras e os revoltosos. A igreja foi
vandalizada, um grande número de vítimas teve de ser sepultado em seu cemitério
e o pároco precisou se refugiar em Curitiba, fugindo do perigo eminente – frei Menandro era contrário ao levante popular e o messianismo,
que combatia pública e veementemente. Além disso, junto da guerra, a fome, o
tifo e a lepra – “Nestes dias de miséria cansei em dar sepulturas aos mortos.
Pois a pobreza da pobre gente era tão enorme, que muitos têm morrido de fome”31. Já em 1917, com a declaração brasileira de guerra
contra a Tríplice-Aliança, a situação dos alemães e
seus descentes se tornou instável na região, o que levou ao rebaixamento
temporário de frei Menandro de Vigário a Coadjutor da
paróquia de Santa Cruz, como medida preventiva em favor da sua segurança
pessoal. A comunidade protestante, que tencionava construir igreja desde 1916,
foi impedida de professar publicamente a sua fé, por conta das tensões
políticas. Ainda, o ano de 1919 marcou a chegada da influenza
espanhola em Canoinhas, ceifando a vida de 70 membros da matriz de Santa
Cruz e cerca de 400 membros do território da paróquia. As atividades
precisaram, novamente, ser interrompidas, retornando apenas no último dia
daquele ano.
Não obstante as dificuldades (que afetaram toda a região, e não
apenas a sua igreja), o desenvolvimento e progresso da cidade continuou. A
própria paróquia viu, paulatinamente, o aumento do número de fiéis e,
consequentemente, a melhoria de sua estrutura física e a expansão de suas ações
assistenciais. Em pouco tempo, além dos Steffen-Werner,
personalidades locais como os Kohler, Scholze, Pavão, Rauen, Ritzmann e Ferreira, pioneiros de Canoinhas, também se
envolveriam diretamente na rotina da matriz. Frei Menandro
louvava a participação dos “brazileiros” em uma
capela antes apenas de alemães. Esses devotos eram encarregados da manutenção
do coro sacro, responsável pelos cânticos sagrados do ofício religioso. Assim
já previa o Motu Proprio quanto
as atribuições litúrgicas dos leigos:
Excetuadas as
melodias próprias do celebrante e dos ministros, que sempre devem ser em
gregoriano, sem acompanhamento de órgão, todo o restante canto litúrgico faz
parte do coro dos levitas. Por isso, os cantores, ainda que leigos, realizam,
propriamente, as funções de coro eclesiástico, devendo as músicas, ao menos na
sua maior parte, conservar o caráter de música de coro.32
Como regra, frei Menandro Kamps se esmerou nos relatos das festas de guarda e
solenidades notadas no Livro Tombo. Nestas ocasiões a comunidade local se
reunia publicamente, auxiliando financeiramente a paróquia e atraindo novos
membros. É da descrição da Semana Santa de 1916 que
vem a primeira menção explícita a este grupo de devotos, também dedicado à
música sacra, que atuava em torno das lideranças das obras leigas, tendo
Rosalina Steffen Werner como principal representante.
Lemos:
Também a Semana
Santa se fez mais solemne, especialmente a
quinta-feira Santa. “Quasi
todos os dias se ouvia os cânticos sagrados como as rezas dos devotos, pois a
Adoração foi feita pelo grupo dos devotos.”
(Livro Tombo, fl
26v. Grifo nosso.)
A participação leiga também é destacada nos anos seguintes, como
em 1918:
Na Quinta Feira
Santa houve grande numero de communhões
e o povo se revezava na adoração do ss. sacramento
durante o dia inteiro, ouvindo-se ininterruptamente as orações ou os
canticos em honra de Jesus Sacramentado. Salientaram-se os meninos da escola parochial e as meninas da doutrina, e os fervorosos membros
do Apostolado do Sagrado Coração de Jesus. Nestes dias viu-se claramente que o
nosso povo é ainda profundamente religioso. (Livro
Tombo fl 32v. Grifo nosso.)
A mais antiga alusão à música sacra, contudo, data de alguns
anos antes. Ela decorre do momento de estruturação física da igreja,
empreendida por frei Menandro Kamps,
em 1913. Trata-se da aquisição de um harmônio, o primeiro da região:
Na viagem que o
Administrador no principio do mez
de Outubro de de mil
novecentos e treze fez para Curityba afim de se
confessar e de assistir a festa do fundador da sua
Ordem de S. Franscisco de Assis, arranjou para nossa
Matriz os seguintes objectos necessarios:
2 sinos novos, um
de 17 kilos e outro de 60 kilos
em valor de 385$000; um pequeno harmonium
da fabrica da casa Hertel=Curityba, que custou
270$000. (Livro Tombo, fl
9v. Grifo nosso.)
Os harmônios seriam instrumentos essenciais para as capelas do
interior, por seu baixo custo, fácil manutenção e transporte. A posição
estratégica das fábricas e lojas no Paraná e Rio Grande do Sul vinha a suprir a
crescente demanda de Santa Catarina: com parcos recursos, nem todas as igrejas
podiam ter um órgão de tubos. Sendo proibida a utilização de pianos e de
“instrumentos fragorosos” (como tambor, bombo, pratos e campainhas) nas igrejas
católicas, os órgãos e harmônios continuariam a ser indispensáveis para a
música sacra em todo o país, ao longo do século XX. Determina-se, através do Motu Proprio, que “posto que a
música da Igreja é meramente vocal, contudo, também se permite a música com
acompanhamento de órgão”33. E, como vimos
anteriormente, vedava-se o uso do órgão na música própria dos ministrantes,
sugerindo-se a utilização pelos levitas. É interessante notar a preocupação de
frei Menandro em adquirir um harmônio naquele momento
específico – no fim de 1913, ano da chegada dos SteffenWerner
em Canoinhas – visto que a capela sequer tinha bancos suficientes, e muitos
fiéis tinham que se sentar no chão. Já se via necessário criar uma estrutura de
música sacra na paróquia.
Fig. 4
Foto: Desconhecido. Acervo: Ricardo Herrmann.
Além do coro, as bandas locais e militares, quando da Guerra do
Contestado, proviam a paróquia de música para as festas, missas campais e
solenidades públicas. Apesar de não ser autorizada a utilização desses
instrumentos na igreja pelo Motu Proprio,
era possível “nas procissões, fora da igreja, o Ordinário permitir a banda
musical, uma vez que não se executem composições profanas”34.
Um fato marcante, a título de exemplo, foi o da visita do Padre
Provincial dos Franciscanos na festa de Santa Cruz. Estando pronta a
estrada de ferro até o distrito de Três Barras, sede da madeireira Southern Brazil Lumber
& Colonization Company,
frei Menandro foi, a cavalo, receber e buscar o frei Criso, levando-o a uma recepção preparada pelas
autoridades, comerciantes e latifundiários locais; recepção essa festivamente
animada pela banda local (provavelmente a Lyra Catharinense),
que também se fez presente nas solenes cerimônias religiosas de Santa Cruz, em
2 e 3 de maio, de 191335.
Não podemos descartar a hipótese de que o coro e as bandas
locais colaborassem nas festas religiosas. Essa prática já era prevista no Motu Proprio, que preconizava
que nas procissões seria desejável que “a banda se restringisse a acompanhar
algum cântico espiritual, em latim ou vulgar, proposto pelos cantores ou pias
congregações que tomam parte na procissão.”36 A
partir de 1918, quando a Paróquia de Santa Cruz já dispunha de melhores
condições financeiras, sendo a cidade mais desenvolvida, as festas santas já
tinham um novo esplendor. Sobre a primeira Procissão do
Santíssimo Sacramento realizada – fato muito comentado à época – lemos
que houve “oração de estylo e canto dos evangelhos” e
que a “banda de música generosamente prestou o seu concurso”37.
Fig. 5
Foto: Desconhecido. Acervo: Fernando Tokarski
Página infeliz da história brasileira, a Guerra do Contestado
trouxe grandes prejuízos ao Planalto Norte Catarinense. A cidade de Canoinhas
vivenciou diversos conflitos entre as Forças Oficiais e os revoltosos; a
presença militar foi constante naquela localidade e, em meados de 1914, tropas
governamentais se instalaram no centro de Canoinhas, com acampamento na praça
Lauro Müller. Em uma cidade católica, em diversas ocasiões, entre 1914 e 1916,
foram realizadas missas campais aos militares – todas com música. Através das
descrições do Livro Tombo, podemos entender que as participações da banda
militar de Caçadores estiveram de acordo com as premissas do Motu Proprio (Artigo VI,
Parágrafo 21), já discutidas anteriormente. Dentre as missas celebradas, destacaremos
duas ocasiões notadas por frei Menandro.
A primeira delas é da missa campal realizada para o 56° Batalhão
de Caçadores, sob o comando do Coronel republicano Onofre Ribeiro, em 1914. As
investidas do Coronel, lideradas pelo General Setembrino de Carvalho, levariam
a destruição de vários redutos e, consequentemente, a rendição de muitos
sertanejos. Três dias após esta missa, em meio às batalhas, frei Menandro Kamps deixou Canoinhas,
visitando as capelas do interior e se retirando para Curitiba39. Lemos:
Em 15 de Novembro
celebrei às 8 horas uma Missa Campal, no meio da praça, num lindo gramado. O
altar foi armado diante de uma arvore lindissima, e
estava ornada de uma formosa imagem de S. José. O Dr. Vallim
de Arruda, cavalheiro muito distincto, bom catholico, membro da Conferencia de S. Vicente de Paula,
solicitou a honra de ajudar a Santa Missa, o que fez com muita devoção. A
música do 56° de caçadores tocou durante o acto, e
foram entoados piedosos canticos. O commandante, o digno
coronel Onofre Ribeiro e sua brilhante officialidade, assistiram á
cerimonia com verdadeira devoção e respeito. No fim, num pequeno sermão,
expliquei o dever do soldado em servir a Dêus e á Patria. (Livro Tombo fls 17v,
18f. Grifo nosso.)
Ao longo de 1915, vencidos pela situação mais do que precária em
que se encontravam, aconteceram sucessivas rendições de grupos populares:
Quanta miséria
assistimos! Homens, mulheres e creanças famintas em
completos andrajos de mendicidade, entraram nesta villa
como uma tropa dispersa implorando perdão. Compaixão para esses infelizes a
quem o fatal destino conduziu. Os soldados de “José Maria” se entregaram porque
já chega de tão horrorosos soffrimentos. Mulheres esqualidas que mais se pareciam com um esguiu
quadro plastico e creanças
que mais se assemelhavam com um esqueleto preocupavam o coração dos habitantes
de Canoinhas que lhes davam o conforto e lhes perdoavam o que fizeram quando,
durante tantas noites chuvosas atacaram o nosso povoado e roubaram a tranquillidade do lar! (Livro
Tombo, fl 23v)
Fig. 6
Foto: Claro Jansson.
Fonte: Senado Federal40
É deste contexto que vem a segunda missa campal realizada na
praça Lauro Müller – agora não apenas aos militares e comunidade paroquial, mas
aos cativos do exército, na presença do General Setembrino de Carvalho. Isso em
janeiro de 1915:
O General
Setembrino, na sua presença nesta villa, queria se
verificar do bom comportamento deste povo do nosso matto,
e para este fim e também para satisfazer os sentimentos religiosos de seus
soldados, me pediu de rezar uma missa campal no dia 20 de Janeiro,
na festa de São Sebastião.
Cheguei por tanto
no dia 19 de janeiro na sede da parochia. Em 20, às
10 horas celebrei a Missa Campal, no meio da praça, no mesmo logar, onde agora esta levantada
uma cruz. O Altar foi armado por ordem do I° Tenente
Castello Branco, que exerce o cargo de chefe da Policia;
que se tinha encarregado de convidar toda gente. O General Setembrino e sua brilhante officialidade, muitissimos militares e um grupo de fanaticos,
e muitos civis assistiram a ceremonia com verdadeira devoação e respeito. A musica
do 56° de caçadores tocaram durante o acto e foram
entoados piedosos canticos pelos jagunços
apresentados, cujo número era
relativamente pequeno. (Livro Tombo, fls 19v, 20f. Grifo nosso)
Piedosos cânticos entoados
pelos jagunços: funesta passagem.41
Fig. 7
Fonte: Setor de
Iconografia do Arquivo Histórico do Exército
Não havendo mais informações sobre o repertório apresentado nas
ocasiões em que as bandas profanas colaboraram com a paróquia, não podemos
afirmar se a música era exclusivamente sacra ou não. Que na procissão de 1918
houve canto e a “banda de música generosamente prestou o seu concurso” nós
sabemos, mas não temos certeza de que o coro e banda tenham se unido. A banda
do 56° Batalhão de Caçadores tocou durante a missa campal de 1915, mas se os
“piedosos cânticos” entoados foram por ela acompanhados segue sendo uma
incógnita. O que sabemos, por meio do Livro Tombo, é que o único instrumento
mencionado para a prática no interior da igreja era o harmônio e que em
procissões e missas campais poderia haver a participação de bandas musicais.
Passados os flagelos da guerra no local, para frei Menandro: “O meu primeiro cuidado era restaurar a Matriz.
Faltaram diversos objetos e as paredes estavam muito danificadas pelas balas.42” Contudo, para o pároco, ainda, os danos físicos não
se comparavam aos “danos morais”, em uma época na qual a vida urbana e seus
divertimentos eram procurados pela população castigada:
O grande danno causado a vida religiosa desta parochia
pelo movimento fanatico muito difficilmente
e bem devagarsinho só se pode reparar. Os soldados do
exercito e na frente delles
alguns officiaes abertamente anticlericaes
fazem festas e divertimentos mundanos e animam os moradores desta villa de fazer o mesmo, sobre tudo bailes, sobre os quaes se fazem esquecer os deveres christãos.
(Livro Tombo, fl
25v)
Buscando reestruturar a paróquia, duas iniciativas: escola e
Apostolado da Oração. O objetivo: arrebanhar fiéis.
No dia 15 de
janeiro [de 1916] foi aberta a minha escola parochial
para o sexo masculino; ensino eu mesmo. Esta escola vi uma necessidade, para
ensinar a religão ao meninos, pois o Chefe Escolar
sabia me arranjar um obstaculo de ensinar o catechismo na escola publica
depois das aulas, como me permitiram os seus antecessores43,
e pelos meninos espero ganhar para a religião os pais delles. (Livro Tombo, fl 25v.
Grifo nosso)
Esperando a
reanimação da vida religiosa desta parochia,
trabalhei desde o principio do anno
para formar e erguer de novo o Apostolado da Oração. A D. Rosalina Werner foi
nomeada Presidente do Apostolado e mais tres senhoras
e um zelador, que todos mostravam grande zelo e promtteram
arranjar novos membros. Em consequencia deste facto deste dia em diante foram
frequentadas as devoções e a benção nos domingos de muitos devotos. (Livro Tombo, fl 27f.
Grifo nosso)
Ambas as obras se utilizavam de música como ferramenta. Por meio
do grupo dos devotos é que o coro da paróquia subsistia – ambos presididos por
Rosalina S. Werner. Na escola (e no catecismo), formava-se, também, um coro de
crianças que participava do serviço religioso – o ensino musical era a cargo de
frei Menandro Kamps. Pelos
dados que dispomos, entendemos que foi partir de 1916 que o coro dos devotos
passou a se consolidar como um coro sacro, que se dedicaria a uma rotina
regular de ensaios, de preparação de repertório com maior grau de dificuldade e
de participação notável nas festividades do calendário. Talvez, a partir desse
momento, o coro de crianças possa ter assumido outras responsabilidades do
tempo comum, da forma sugerida pelo Motu Proprio. Vejamos:
No dia 1 de Fevereiro [de 1917] se reabriu a escola parochial
do sexo masculino. O nosso Vigario edificou no lado
da nossa Matriz um edificio pequeno de 7x7m de
madeira. Era possivel aceitar mais alumnos e o numero chegou nos
primeiros dias até ser 55 alunos. Professor da aula é também neste anno só o Vigario mesmo.
Com o canto ensinado nesta escola, os alumnos solemnisaram [ao longo do
ano] o culto divino nos domingos e dias de preceito, de modo que sempre mais
devotos frequentam a igreja nestes dias.
(Livro Tombo, fl
29f. Grifo nosso)
Ao mesmo tempo, um novo tipo de referência ao coro sacro
aparece. Destaca-se, com louvor, a participação do “coro bem ensaiado dos
nossos cantores” na festa do Sagrado Coração de Jesus44:
No dia 7 de Junho [de 1918] celebrou-se com todo o esplendor possível a
festa do Sagr. Coração de Jesus. O povo previamente instruido e convidado nas praticas
de domingos e festas antecedentes acudiu em grande numero,
e não só os membros do Apostolado [da Oração] como ainda os alumnos
da escola e muitissimas outras pessoas approximaram-se da mesa sagrada. A
missa foi cantada com toda a perfeição pelo coro bem ensaiado dos nossos
cantores, sendo celebrante o Pe. Menandro Kamps, administrador da parochia. O sermão teve como resultado a entrada de
diversos devotos no Apostolado. (Livro
Tombo, fls 33v, 34f. Grifo nosso).
Como os dados são escassos (e partindo da hipótese anterior)
podemos imaginar que não seria impossível que os dois grupos colaborassem
mutuamente – como já previsto no Motu Proprio:
“Querendo-se, pois, ter vozes agudas de sopranos e contraltos, empreguem-se os
meninos, segundo o uso antiquíssimo da Igreja.45”
Além da escola para meninos, a paróquia também catequizava meninos e meninas –
em 1917 formaram coro de 70 vozes, intercalando sua participação especial com
os cânticos, presumivelmente junto dos adultos. Lemos:
Bello e edificante espetaculo offereceu a primeira communhão de trinta e seis meninos e meninas, acompanhados
por quasi igual numero de
meninos que no anno passado ja
fizeram a sua primeira communhão. Entrando
no templo, cujo altar apresentava um aspecto deslumbrante, cantaram um hymno jubiloso, e em seguida, teve começo a santa missa.
Orações de preparação para a santa communhão e canticos appropriados se alteranavam até o momento em
que os meninos felizes com uma devoção que commovia
profundamente os adultos, se approximaram da mesa
sagrada. [...]. Depois de fervorosa e prolongada acção
de graças foi servido a todos elles no edificio da escola um bom café com bôlo
delicioso, e durante a refeição reinou a mais expansiva hilaridade. (Livro Tombo, fl 30f.
Grifo nosso)
Ainda sobre a participação do coro sacro, diversas passagens do
Livro Tombo apontam para a presença de cantores. Dentre elas, celebrando o fim
da epidemia de gripe espanhola em Canoinhas, estão as funções solenes de 1919:
Para o fim do anno esta[va]
quasi extinta a epidemia e o Rev.mo Vigario podia com o coração mais alliviado
reunir o povo catholico na igreja matriz no ultimo dia do ano e terminar as funções solemnes correspondentes a tal occasião
com um jubliloso Te Deum laudamus.
Da mesma forma, cantou-se solemnemente o Veni Creator antes da missa cantada do dia primeiro de Janeiro. (Livro Tombo, f
36f. Grifo nosso)
Fig. 8
Livro Tombo (fl 33f, excerto).
Por meio destas e de outras descrições do Livro Tombo, sabemos
que o coro participava em cerimônias ou ofícios específicos, ao longo do ano
litúrgico. Excedendo o escopo aqui tratado (1912-1923), observamos que houve um
aumento contínuo de participações até 1951 (fechamento do livro). Nesse
período, há descrições de atuação de cantores leigos (coro, devotos e crianças)
no Advento, Natal, Quaresma e Tríduo Pascal, assim como no Tempo Comum,
sobretudo com relação às celebrações da Virgem Maria e São Francisco de Assis,
além das Festas de Guarda. As festas religiosas comumente mencionadas –
tradicionais até hoje – são as do Sagrado Coração de Jesus e de Santa Cruz.
Apontamentos finais
Enquanto a capela de Santa Cruz e os padres franciscanos haviam
sido o centro aglutinador dos colonizadores de Canoinhas desde o final do
século XIX, com a chegada das Irmãs Franciscanas de Maria Auxiliadora (1920) e
o estabelecimento do Colégio Sagrado Coração de Jesus (1921), essa
responsabilidade seria dividida com as missionárias franciscanas. A escola
paroquial de frei Menandro Kamps
seria absorvida pelo novo colégio; o internato feminino seria instalado; as
irmãs assumiriam o coro da paróquia no lugar dos leigos (que dele continuariam
participando) e constituiriam novas formações corais de freiras (com vozes
iguais) e de alunos do colégio (com vozes mistas). Essa havia sido uma demanda
de frei Menandro por anos, que continuamente pedia
auxílio as Congregações, estimulando a vinda das religiosas:
Durante este anno de 1920 realizou-se finalmente o desejo ardentissimo de nosso Vigario,
pois sendo debaldadas as forças empregadas de
alcançar o consentimento alguma qualquer Congregação das Irmãs de fundar nesta villa de Canoinhas residencia e collegio de ensino e educação tão necessario,
aceitaram finalmente as Irmãs Franciscanas da Maria Auxiliadora, que até então
tinham uma casa semelhante aqui no Brasil só em Quissamã, Estado do Rio. (Livro Tombo, fl 37v).
Dentre estas irmãs estava Maria Carolina Gross, cuja ampla
formação musical trazida da Áustria seria disseminada na cidade, ao longo das
décadas seguintes. Já em 1920 irmã Carolina aproximou-se de Rosalina Steffen Werner, dividindo as responsabilidades do coro
originado em 1913, que, em 1925, foi batizado como coro “Santa Cecilia”, dando
origem à Schola Cantorum “Santa Caecilia”.
Rosalina faleceu, tragicamente, afogada, dois anos depois da vinda das irmãs46. No ano seguinte, em 1923, frei Menandro
retirou-se de Canoinhas, falecendo em 1959, coincidentemente, em Quissamã.
Pelo exposto neste texto, compreendemos que a atuação leiga foi
essencial para a existência de uma estrutura musical sacra na Matriz de Santa
Cruz e, consequentemente, na região. A participação e influência desses
pioneiros – lavradores, comerciantes e oleiros, sobretudo de origem saxônica –
somou-se aos esforços dos freis (também saxões) que, apesar das estruturas mais
do que precárias, quase que inexistentes, da Igreja Católica no interior de
Santa Catarina, desenvolveram seus trabalhos missionários. Naquele contexto de
desamparo governamental, a participação nas obras religiosas – incluindo a
prática musical – certamente era um fator importante para a vida dos
colonizadores, compondo a rede social em suas permanências, momentâneas ou
definitivas, nas jovens vilas do estado.
REFERÊNCIAS
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Abreu. Ano XII, n° 267. Curitiba (PR), 22 de dezembro de 1897.
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raízes que fizeram surgir a “Schola Cantorum Santa Cecília” de Canoinhas, fundada em 26 de
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Registro de matrimônio. Leocadia Steffen, Alphéo Tolentino de
Souza. Paróquia de Nossa Senhora do Desterro, Livro de Casamentos n° 25,
Registro n° 16. Florianópolis (SC), 15 de abril de 1909. Disponível em:
https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:9Q97-Y3S1-2FX?cc=2177296&p ersonaUrl=%2Fark%3A%2F61903%2F1%3A1%3AQGRT-DX6Z
Registro de matrimônio. Maria Werner, João Augusto Maluche. Igreja de São Luiz Gonzaga, Registros da Igreja, fl 35v. Brusque (SC), 31 de dezembro de 1874.
Registro de matrimônio. Rosalina Steffen,
Pedro Nicolau Werner. Cartório Municipal de Lages, Livro de Matrimônios n° 9, Certificado n° 26. Lages (SC), 25 de fevereiro de 1912.
Disponível
em:https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:S3HY-X9G9-2JB?i=102&cc=2016197
Registro de nascimento. Pedro José [Nicolau] Werner. Matriz São
Luiz Gonzaga, Livro de Nascimentos, Registro n° 48. Brusque (SC), 6 de janeiro
de 1886.
Registro de óbito. Rosalina Steffen
Werner; Laudelino Werner; Claudio Werner. Paróquia Santa Cruz de Canoinhas,
Livro de Óbitos, Registro no ano 1922, n. 32-34. Canoinhas (SC), 17 de outubro
de 1912.
Registro de nascimento. Peter Steffen.
Kastellayn, Rheinland, Prussia, 28 de fevereiro de 1858. Disponível em:
https://www.familysearch.org/ ark:/61903/1:1:N67R-RRX?from=lynx1UIV8&treeref=LX6Z-4NG
Notas
2
Publicado em latim sob o título “Inter pastoralis officci sollicitudines”. Aqui
utilizo a tradução ao português pelo Vaticano. Disponível em:
https://www.vatican.va/content/pius-x/pt/motu_proprio/documents/hf_p-x_motu-proprio_19031122_sollecitudini.html,
visitado em fevereiro de 2022.
3 Besen (1994, p. 53)
contabiliza apenas quatro sacerdotes brasileiros atuantes em Santa Catarina, no
início do século XIX: Pe. José Fabriciano Pereira Serpa, em Santo Antônio de
Lisboa; Pe. Manoel João Luiz da Silva, em Laguna; Pe. Antônio Francisco da
Nóbrega, em São Francisco do Sul; Pe. João Nepomuceno Manfredo Leite, em São
José. Destaca-se a dificuldade em arregimentar novos sacerdotes, até mesmo à
época de Dom João Becker, 1° Bispo de Santa Catarina. Em Canoinhas, por
exemplo, só seria nomeado vigário em 1913.
4
Para mais sobre o início da colonização de Canoinhas e a contribuição de
Francisco de Paula Pereira e outros colonizadores, ver Tomporoski et al
(2019). Sobre as diferentes etnias e o contexto do estabelecimento de
colônias na região, ver Tokarski
et al (2011).
5
Não há consenso sobre as datas de missões do Pe. João Maria Cybeo
no Planalto Norte (e mesmo sobre a quantidade de visitas). Nas “Crônicas do
Convento”, da Paróquia Santa Cruz de Canoinhas (c. 1910), Frei Menandro Kamps aponta: “Lá pelos
anos de 1890 o bispo enviou o zelosíssimo missionário Pe. João Maria Cibeo S.J., a estas paragens, fora de toda a civilização.”.
Em sua cronografia, Besen
(1994, p. 57) destaca o “retorno ao planalto catarinense em 1890”.
Valendo-se de relatos de moradores que assistiram às missões, Cabral (1979, p. 319) dá as datas de 1893 e
1896, podendo referir-se tanto ao padre João Maria quanto ao monge de mesmo
nome. Um dado importante a ser considerado é que, segundo a tradição local, a
primeira vinda do missionário jesuíta foi posterior à grande enchente de 1891
(de onde surge a lenda de que se a cruz levantada na ocasião desaparecer,
Canoinhas será novamente engolida por águas). Ainda, as missões franciscanas –
posteriores as jesuíticas – iniciaram em Canoinhas no ano de 1893, com Frei Redento Kulmann. Dessa forma, o
mais provável é que o Pe. João Maria Cybeo tenha
passado por Canoinhas entre os anos de 1891 e 1893. (Não devemos confundir as
missões do Pe. Cybeo com o messianismo dos monges da
região, tal como do monge João Maria de Jesus. A esse respeito, Besen (1994., p.55)
destaca a polarização e hibridização: “É significativo que o caboclo cultue as
duas figuras, referenciais para sua vida religiosa: “São” João Maria [de Jesus]
e o “Santo” Rogério [Neuhaus].”)
6
Carta transcrita nas Crônicas da Residência de Nova Trento. Tradução do
italiano por Besen
(1994, p.57).
7
Prática comum em Santa Catarina, fica bem ilustrada no relato de frei Rogério Neuhaus: “Os religiosos franciscanos, tendo vivido na Allemanha em conventos multiseculares,
de tradições vivas, de muros, onde cada pedra falava de glórias e de provações
do passado, não encontraram convento algum em Teresópolis. Tiveram que escolher
uma simples casa de colonos, para adaptá-la, quanto possível, para seus fins
religiosos.” (SINZIG, 1934, p. 79).
8
Nesta época, Francisco de Paula Pereira havia transferido suas instalações para
as proximidades da atual praça Lauro Müller. Com a enchente de 1891, a maior já
registrada na região, foi necessário distanciar-se do rio Canoinhas.
9
Texto das “Crônicas do Convento”, publicado no Jornal Correio do Norte, Canoinhas-SC,
30/07/1962 (Ano XV, N° 693). Tradução do alemão pelo editorial. Na
transcrição de frei Aurelio
Stutzer (1982, p. 97), lemos: “Uma tal cruz
plantou o “padre missionário” numa colina perto da moradia do Sr. Francisco
Pereira, que enorme veneração desfrutou entre os antigos e pobres moradores da
nossa paróquia, como ainda desfruta, em virtude do que recebia muitos
donativos. O caboclo sente como pecado de omissão bem grave quando não a visita
diversas vezes ao ano para levar-lhe o preito de sua veneração.”
10
Canoinhas foi elevada a Distrito Judiciário de Curitibanos em 1902, emancipada
em 1911, com instalação da comarca em 1913.
11
Primeiro com frei Redento Kulmann,
em missão no ano de 1893. Tendo assumido o governo da paróquia de Curitibanos e
fixado residência na cidade em 1894, outros missionários da Ordem Franciscana
atenderam a região de Canoinhas até a ereção canônica de sua paróquia, em 1912.
12
Excerto do Decreto de 14 de junho de 1912, transcrito no Livro Tombo (fls 2f,
2v).
13
Fazemos essa afirmação com base nos registros de frequência, batizados,
casamentos e confissão das capelas locais, assim como pela presença de padres
em missões específicas para determinadas etnias (como as “missões catholicas para os polacos”).
14 Em
discurso no qual, na realidade, buscava denegrir a imagem do sertão
catarinense, sugerindo sua ligação imoral com o messianismo. Publicado no
jornal paranaense “A República”. Ano XII, n°
267. Curitiba (PR), 22/12/1897.
15
Jornal “Correio do Norte”. Ano 15, n° 693.
Canoinhas (SC), 30/06/1962.
16
Motu Proprio, Artigo VIII – Meios Principais,
Parágrafo 26.
17 Os
documentos relativos à paróquia de Canoinhas são discutidos na próxima seção.
Os documentos musicais são discutidos em outro artigo, já mencionado (Prust, 2021).
18 As
informações biográficas de Frei Menandro Kamps são do Livro Tombo e de Stulzer (1982, p.
22-27). As de Frei Basílio Röwer são da RevistaVida Franciscana (n° 24,
dezembro de 1958).
19 As
informações sobre Rosalina Steffen Werner, Pedro
Nicolau Werner e seus familiares vem de documentos oficiais (como certidões de
nascimento, casamento e óbito), além daqueles do Livro Tombo e daqueles
informados por Carvalho (1977).
20
Registro de matrimônio: Rosalina Steffen, Pedro Nicolau Werner. Cartório Municipal de Lages,
Livro de Matrimônios n° 9, Certificado n° 26. Lages
(SC), 25 de fevereiro de 1912.
21
Registro de nascimento: Peter Steffen. Kastellayn, Rheinland, Prussia, 28 de
fevereiro de 1858.
22
Vale ressaltar que as missões mais expressivas do Padre João Maria Cybeo foram justamente nesta localidade, empreendidas de
1868 a 1925 (conforme Besen
(1994. p. 57). As informações sobre a vida pregressa de Rosalina são de Carvalho (1977, p. 11).
23
Dentro outros registros, menciona-se a residência em Florianópolis enquanto
testemunhas do casamento de irmã de Rosalina, Leocádia. Registro de matrimônio:
Leocadia Steffen, Alphéo Tolentino de Souza. Paróquia de Nossa Senhora do
Desterro, Livro de Casamentos n° 25,
Registro n° 16. Florianópolis (SC), 15 de abril de 1909.
24 Um
histórico da família Werner é dado por Ayres Gevaerd:
Política e Políticos de Antanho, in Notícias
de Vicente Só, I, n. 2, abr-mai-jun, Sociedade Amigos
de Brusque, 1977.
25
Registro de matrimônio: Maria Werner, João
Augusto Maluche. Igreja de São Luiz Gonzaga,
Registros da Igreja, fl 35v. Brusque (SC), 31 de
dezembro de 1874.
26
Disponível em:
https://enciclopedia.brusque.sc.gov.br/index.php?title=Arquivo:Acervo_FCB-SAB-Sociabilidade-Bandas_Musicais-08_Primeiro_Conjunto_Musical.jpg,
visitado em fevereiro de 2022.
27 Duarte (2016b, p. 230) cita os decretos de
n° 3964, 4201 e 4231.
28
Motu Proprio, Artigo V – Os Cantores, Parágrafo 13.
29
Sobre a região sul, o autor destaca que em Desterro, a Catedral de
Florianópolis tinha coro misto. Em 1914 contava com um clérigo na função de
mestre de capela (padre Remaelo Foxins)
e com uma organista mulher (Edésia Aducci). Da mesma
Catedral, vem a descrição de 1922: “O canto sacro, como o são sessões solenes,
foi executado brilhantemente por um coro composto das melhores vozes de
senhoritas, meninos e homens, sob a magistral regência do incansável P.
Frederico Maute, S.J.” (DUARTE, 2016b. cit. p. 235).
30 As
passagens citadas neste parágrafo são do Livro
Tombo (fls 27f, 25v, 29f, respectivamente).
31
Livro Tombo, fl 20v.
32
Motu Proprio, Artigo V – Os Cantores, Parágrafo 12.
33
Motu Proprio, Artigo VI – Órgão e Instrumentos,
Parágrafo 15.
34
Motu Proprio, Artigo VI – Órgão e Instrumentos,
Parágrafo 21.
35
Foi nesta ocasião em que frei Menandro Kamps foi desligado da paróquia de Curitibanos, autorizando
que se instalasse definitivamente em Canoinhas, logo nomeado vigário. (Jornal Correio do Norte, Canoinhas-SC,
30/07/1962 (Ano XV, N° 693).
36
Motu Proprio, Artigo VI – Órgão e Instrumentos,
Parágrafo 21.
37
Livro Tombo, f 33f.
38
Descrição de Frei Menandro: “A instalação da Comarcar
de Canoinhas, realizada no dia quinze de Novembro do anno de mil novecentos e treze [...] foi um das mais
importantes e solemne acto
que esta Villa tinha visto desde o seu principio. [...] Convidado a este acto
solemne pelo Dr. Juiz de Direito [...] o
Administrador do logar de honra ocupar entre as auctoridades durante o acto solemne, dirigiu palavras de paz e saudações aos
convidados, mostrando a intima união que existe entre a justiça divina e humana
e a emanação desta da justiça suprema e convidando finalmente as auctoridades para uma actividade
de união e boa harmonia entre os dous poderes ecclesiasticos e civil, palavras muito applaudidas
da parte da auctoridade como do bom povo da Comarca.”
(Livro Tombo, fl
10f).
39
Confiou aos cuidados de Pedro Nicolau Werner, integrante do coro dos devotos,
os pertences da igreja, tais como o arquivo documental (Livro Tombo fl 18f).
40
Disponível em:
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/07/01/ha-100-anos-o-fim-da-sangrenta-guerra-do-contestado,
visitado em fevereiro de 2022.
41 Na
transcrição de frei Aurélio Stulzer (1982) – texto que levou ao público os
documentos da igreja que se relacionam ao Contestado – a passagem é amenizada,
modificada como que para diminuir o seu impacto. Os “fanáticos” são os “ex-fanáticos”; não foram coagidos ao serviço religioso, mas
sim “convidados”; quem entoou os cânticos não foram os “jagunços”, mas sim os
“nossos caboclos”. Lemos assim: “Setembrino e sua oficialidade, quase todos os
soldados e muitos ex-fanáticos, para isto convidados,
compareceram. O número destes últimos porém foi menor
do que o esperado. A banda de música tocava e durante a cerimônia e nossos
caboclos acompanhavam alguns hinos religiosos.” (STULZER, 1982, p. 126).
42
Livro Tombo (fl 20f).
43
Refere-se à Sociedade Escolar, que teve como seu administrador, até 1916,
Emílio Gothardo Wendt (que
como já vimos, colaborava junto da paróquia com a Banda “Lyra Catharinense”).
44
Ver Fig. 8, a seguir.
45
Motu Proprio, Artigo V – Os Cantores, Parágrafo 13.
46
Registro de óbito: Rosalina Steffen Werner; Laudelino Werner; Claudio Werner. Paróquia
Santa Cruz de Canoinhas, Livro de Óbitos, Registro no ano 1922, nos 32-34.
Canoinhas (SC), 17 de outubro de 1912.
Autor notes
1
Matheus Prust é violinista e camerista.
Professor da Universidade Estadual do Paraná. Doutorando Música Musicologia
Histórica (UFPR), mestre em Musicologia Histórica (UFPR), graduado em Música
(EMBAP). Realizou estudos de violino barroco na cidade do Porto, Portugal
(ESMAE), sob orientação dos violinistas Amandine Beyer e Benjamin Chernier.
Especializou-se na interpretação do repertório do classicismo e início do
romantismo com Rebecca Huber, professora do Conservatório Real de Haia. Em 2019
fundou a Série de Concertos Ingrid Müller Seraphim.
Atua ativamente da vida cultural no sul do Brasil, apresentando recitais solo e
dirigindo concertos de câmara e orquestrais. É violinista e pesquisador do LAMUSA ? Laboratório de Música Antiga da UFPR, realizando
pesquisa em música barroca francesa dos séculos XVII e XVIII.