Proteção por meio do instituto do desenho industrial: uma análise no segmento da moda afro-brasileira.

RESUMO

Sendo a indústria da moda, um setor em constante expansão ao qual é responsável por gerar empregos e movimentar a economia mundialmente, imprescindível se faz garantir a devida proteção de suas criações perante o órgão competente. Ao se tratar de um dos modelos protetivos, o desenho industrial se mostra pouco utilizado por este segmento, sobretudo, na moda afro-brasileira que embasa este trabalho. Sendo assim, foi realizado prospecção tecnológica nos bancos de dados do INPI, assim como levantamento bibliográfico acerca do tema, de modo a analisar e quantificar os pedidos de registro feitos pelos empreendedores atuantes neste ramo. Através desta prospecção, constatou-se que há ínfimos pedidos de registro relacionados à moda afro-brasileira e que muitos empreendedores do setor começam com pouco estrutura financeira e conhecimento acerca de temas importantes ao negócio, o que acaba por deixar seus inventos sem a devida proteção. Adicionalmente, nota-se uma lacuna na literatura específica sobre o tema e que possa orientar os profissionais da moda afro-brasileira a protegerem os seus produtos e invenções. Assim, percebe-se a necessidade de difundir o tema da propriedade intelectual a esses empresários, garantir o fomento de políticas públicas capacitadoras e educacionais, e com isso inserir os negócios no mercado de forma segura e com a estrutura necessária.

Palavras-chave: Desenho industrial. Moda afro-brasileira. Propriedade intelectual.

Protection through the industrial design institute: analysis in the afro-brazilian fashion segment.

ABSTRACT

As the fashion industry is a sector in constant expansion that is responsible for generating jobs and driving the economy worldwide, it is imperative that it ensures the protection of the lives of its creations before the competent body. As it is one of these protective models, industrial design appears to be little used by this segment, especially in the Afro-Brazilian fashion that supports this work. Therefore, technological prospecting was carried out in the INPI databases, as well as a bibliographic survey on the topic, in order to analyze and quantify the registration requests made by entrepreneurs working in this field. Through this prospecting, it was found that there were very few registration requests related to Afro-Brazilian fashion, revealing that many entrepreneurs in the sector start with little financial structure and knowledge about topics important to the business, which ends up leaving their inventions without debt protection. . Furthermore, there is a gap in the specific literature on the topic that can guide Afro-Brazilian fashion professionals to protect their products and inventions. Thus, there is a need to finance the issue of intellectual property for these entrepreneurs and guarantee the promotion of enabling and educational public policies and thus insert businesses into the market in a safe way and with security structures.

Keywords: Industrial design. Afro-Brazilian fashion. Intellectual property.

Protección a través del instituto de diseño industrial: análisis en el segmento de la moda afrobrasileña.

RESUMEN

Al ser la industria de la moda un sector en constante expansión que se encarga de generar empleos e impulsar la economía a nivel mundial, es imperativo que garantice la protección de la vida de sus creaciones ante el organismo competente. Al tratarse de uno de esos modelos protectores, el diseño industrial parece ser poco utilizado por este segmento, especialmente en la moda afrobrasileña que sustenta este trabajo. Para ello, se realizó una prospección tecnológica en las bases de datos del INPI, así como un levantamiento bibliográfico sobre el tema, con el fin de analizar y cuantificar las solicitudes de registro realizadas por empresarios que actúan en este campo. A través de esta prospección, se encontró que hubo muy pocas solicitudes de registro relacionadas con la moda afrobrasileña, revelando que muchos empresarios del sector comienzan con poca estructura financiera y conocimiento sobre temas importantes para el negocio, lo que termina dejando sus inventos sin deuda. proteccion. . Además, existe un vacío en la literatura específica sobre el tema que pueda orientar a los profesionales de la moda afrobrasileña para proteger sus productos e invenciones. Así, surge la necesidad de financiar el tema de propiedad intelectual de estos emprendedores y garantizar la promoción de políticas públicas habilitantes y educativas y así insertar las empresas al mercado de forma segura y con estructuras de seguridad.

Palabras clave: Diseño industrial. Moda afrobrasileña. Propiedad intelectual.

  1. INTRODUÇÃO

A indústria da moda é um setor de grande relevância e expansão mundial, responsável também por movimentar de maneira expressiva a economia em escala global. Em pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Industria Têxtil e de Confecção- ABIT (2022) foi averiguado que esta indústria obteve ganhos de aproximadamente R$ 194 bilhões em 2021. Estudo mais recente publicado no site da EXAME (2022), demonstra que no Brasil, o setor já movimenta R$ 229 bilhões de reais.

Nesse contexto, percebe-se a relevância do setor da indústria da moda, sobretudo, por ser responsável por gerar empregos, renda e movimentar a economia como um todo. O relatório constante no site da ABIT (2022) aponta ainda que o setor de confecção é o 2º maior empregador da indústria de transformação, perdendo apenas para o de alimentos. Nesse contexto, também vale salientar que para além das questões econômicas, a moda tem um papel de destaque no que tange a questões identitárias, que se refletem na sociedade a partir da vestimenta e de como as pessoas escolhem expressar-se através dela.

Este segmento também reflete desigualdades e aspectos problemáticos derivados de sua atuação, perpassando por questões raciais, ambientais, éticas e até mesmo trabalhistas, como as questões que envolvem mão de obra escravizada. Nesse interim, ao pensar no empreendedorismo negro voltado a moda, deve-se levar em consideração diversas questões que refletem uma realidade social muito discrepante em termos de oportunidades, vivências, conhecimentos, reconhecimento e condições, tanto de abrir o próprio negócio quanto de fazer com que ele permaneça funcionando e com obtenção de lucros. Nesse sentido, Sabino e Pinheiro, 2022, p. 2 afirmam que:

Os desafios são maiores para a população negra, atravessada por desigualdades sociais, discriminação e preconceitos, decorrentes de uma construção histórica escravocrata. A inserção do negro no contexto empresarial brasileiro ilustra as discriminações raciais que persistem, o que significa não só a menor condição de igualdade para se competir, como as desvantagens no reconhecimento de suas potencialidades, em vista do racismo vigente.

A população negra muitas vezes recorre ao empreendedorismo por não conseguir se inserir no mercado de trabalho, e não necessariamente por desejo. Isso fica evidente a partir da pesquisa do SEBRAE com a FVG (2021) que aponta que 44,5% dos afrodescendentes criam um negócio por causa da falta de emprego. Tal realidade, faz com que por vezes, estes empreendedores abram suas empresas sem o devido conhecimento prático que envolve o negócio, não somente se tratando de questões burocráticas, como também, as específicas do ramo de atuação.

Um dos aspectos específicos do negócio, é a proteção das criações autorais de moda, que no Brasil, possui o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) como órgão responsável pela realização e concessão deste registro. No contexto da proteção intelectual, o instituto protetivo do desenho industrial é uma das modalidades que podem proteger estas criações. O desenho industrial visa proteger o ornamento, o design de um objeto, que a partir dos requisitos da novidade e originalidade, possam ser aplicados a produtos em escala industrial, conforme Giacchetta e Santos (2018).

Há muitas formas dos registros de desenhos industriais serem aplicados na indústria da moda, como por exemplo em estampas de tecidos, em que podem ser replicadas em inúmeros produtos, como bolsas, sapatos, turbantes, lenços, dentre outros, assim como, na própria estrutura visual destes artigos de moda ora citados. Neste cenário, segundo Arrabal e Soares (2021) a proteção de direitos de propriedade intelectual sobre produtos lançados no mercado da moda pode ser importante, especialmente em relação ao interesse em garantir exclusividade, ainda que temporária, sobre novas formas e características de relevante apelo mercantil.

Ao direcionar para o tema da moda afro-brasileira, a criação do design, quando englobado nessa proteção, traz os elementos que representam aspectos da cultura afro, como as cores e formas, associados a elementos artísticos, inovadores e autorais que denotem a criação, originalidade e diferenciação mercadológica, ou seja, elementos que não tenham sido conhecidos e postos no mercado anteriormente. Tudo isso está embutido, como fora dito, no reforço da estética negra em um lugar de beleza e valoração cultural, como forma de se promover o orgulho negro expresso pela moda afro.

Assim, as estilistas afro-brasileiras, ao desenvolverem suas coleções, se voltam para suas raízes culturais e ancestrais transmitindo seus valores pessoais e sociais em forma de produtos de moda, tentando inseri-los em um mercado que muitas vezes não está aberto às questões que estão embutidas na moda afro-brasileira, enfrentando da mesma maneira o preconceito que sofrem os afrodescendentes até os dias atuais (Harger, 2016, p. 3).

Sendo assim, com a utilização da moda afro-brasileira ancorada pelo registro do desenho industrial, torna-se possível que o design criado por estes profissionais seja incorporado em diversos produtos, ganhando uma expansão mercadológica, segurança jurídica, direito de exclusividade e o reconhecimento do seu trabalho.

Nesse diapasão, tem-se como objetivo geral do presente artigo, analisar como se dá a busca pelos profissionais da moda por registro de desenho industrial, com enfoque na moda afro-brasileira. Desta feita, diante dos fatos ora descritos e encontrados no decorrer do estudo, importante se fez, realizar um levantamento no banco de dados do INPI, de modo a obter um diagnóstico situacional sobre este registro neste segmento, com o intuito de compreender na literatura o nível de conhecimento destes empreendedores acerca do tema, bem como as possíveis vantagens de se implementar o desenho industrial nessas criações de moda.

  1. METODOLOGIA

O presente artigo trata-se de um estudo de caráter transversal, analítico e descritivo. Inicialmente realizou-se no período de janeiro de 2023 até março de 2023 uma prospecção tecnológica perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI. Nessa prospecção foi realizado o cruzamento de dados com os termos que representam ativos da moda, associados as terminologias, “afro”, “afro-brasileira” e “moda afro-brasileira”¹. Sendo assim, dentro do estudo, foram consideradas as nomenclaturas que representam os artigos de moda como: roupa, moda, turbante, joia, pulseira, bracelete, colar, anel, tecidos, brinco, bolsa, sapato e adornos para cabeça. Não houve delimitação de tempo de registro nas buscas, tampouco, região do país, sendo considerado todo o recorte histórico de registros no INPI até a data de coleta de dados.

Fora realizado ainda, no período de novembro de 2022 até março de 2023, uma prospecção bibliográfica que tratam da perspectiva do desenho industrial voltado ao segmento da moda. A prospecção de artigos científicos teve como fonte de busca o Google Acadêmico, utilizando-se os termos: empreendedorismo na moda; empreendedorismo na moda afro-brasileira; moda, desenho industrial e INPI; moda afro-brasileira, desenho industrial e INPI; moda afro-brasileira, desenho industrial e INPI; proteção por desenho industrial na moda afro; proteção por desenho industrial na moda afro-brasileira; proteção por desenho industrial e moda afro-brasileira em aspas, e por fim, proteção por desenho industrial na moda. Adicionalmente, foi feito o levantamento dos materiais didáticos disponíveis para o segmento da moda sobre desenho industrial constantes no banco de dados da academia do INPI e na biblioteca de dados do Programa de Pós-Graduação em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para a Inovação - PROFNIT.

Na prospecção bibliográfica, os critérios de inclusão foram artigos científicos e livros que abarcavam a temática da moda afro-brasileira, como também o desenho industrial na perspectiva da moda de forma ampla, assim como delimitando-se à moda afro-brasileira, sendo estes publicados dentro do lapso temporal de 2003 a 2024, em ambos os formatos, digital e físico. Quanto ao critério de exclusão, se deu por produções literárias sem teor científico, assim como, conteúdos que abordaram o desenho industrial aplicados a vertentes fora do panorama da moda.

  1. REFERENCIAL TEÓRICO
  1. Propriedade Industrial sob a ótica do Desenho Industrial

Ao adentrar na temática do artigo em questão, primeiramente se aponta o estudo e entendimento da Lei de Propriedade Industrial, a Lei nº 9.279 de 14 de maio de 1996. Este arcabouço legal, traz os conceitos e requisitos do que pode ser considerado e protegido por meio do desenho industrial. Sua conceituação, encontra-se presente no Art. 95, em que traz a definição do desenho industrial como sendo:

a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial (Brasil, 1996).

Como pôde-se observar, no corpo do referido artigo, já é possível identificar os requisitos para este enquadramento, sendo eles os requisitos da novidade, originalidade e possibilidade de produção em escala industrial. No entanto, este instituto protetivo contempla somente os aspectos estéticos a serem aplicados a um produto e que possam ser desenvolvidos em escala industrial. As funcionalidades técnicas que porventura sejam abarcadas por um design não são protegidas por este instituto.

Para Farias e Silva (2021) o registro vai proteger a aparência do produto, o que o diferencia dos demais tipos de registros de propriedade industrial e intelectual. Mas os autores asseveram que o pedido de registro concedido pelo INPI não protege funcionalidades, vantagens práticas, materiais ou formas de fabricação, da mesma forma que não protege cores ou associações destas a um determinado objeto. Já no que tange ao prazo em que vigorará a concessão do registro, encontra-se prescrito no mesmo diploma legal em seu art. 108, o prazo de 10 (dez) anos contados da data do depósito, podendo ser prorrogável por 3 (três) períodos sucessivos de 5 (cinco) anos cada².

No Brasil, o órgão responsável pela realização e concessão deste registro é o Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI. Quanto às taxas por eles cobradas, segundo a tabela disponível no site² na data do presente estudo, o valor para o pedido de registro encontra-se em R$235,00 (duzentos e trinta e cinco reais). Vale destacar que o INPI (2019) estabelece descontos de 60% para alguns grupos e afirmam que os concedem a:

pessoas naturais (somente se estas não detiverem participação societária em empresa do ramo a que pertence o item a ser registrado); microempresas, microempreendedor individual e empresas de pequeno porte, assim definidas na Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006; cooperativas, assim definidas na Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971; instituições de ensino e pesquisa; entidades sem fins lucrativos, bem como órgãos públicos, quando se referirem a atos próprios (INPI, 2019).

Além das taxas de registros, outros valores podem ser cobrados em caso de cumprimento de exigências, de se necessitar de recursos e nulidades, da manutenção e prorrogação do registro, dentre outros possíveis serviços, além dos honorários dos profissionais habilitados para realizar tais trâmites. As presentes informações são válidas por ser indispensável o conhecimento acerca dos valores cobrados pelo INPI, de modo a ser possível averiguar se poderão ser arcados por grande parte dos empreendedores que atuam com a moda afro no Brasil e que desejam obter proteção de seus produtos.

O INPI (2022) realiza um boletim mensal e anual constando os números dos pedidos de registro de propriedade industrial. Por meio dele pôde-se constatar como é discrepante a quantidade de pedidos por meio do desenho industrial em comparação a outros tipos de registros, como as marcas e patentes. Segundo o relatório, em 2022 foram realizados 27.139 (vinte e sete mil, cento e trinta e nove) pedidos de registro de patentes e 398.811 (trezentos e noventa e oito mil, oitocentos e onze) pedidos de registro de marcas. Já para o desenho industrial, foram feitos apenas 7.196 (sete mil cento e noventa e seis).

O presente relatório descreve ainda que os residentes no país que efetuaram depósitos de desenhos industriais, no período acumulado de janeiro a junho de 2023, 2.613 (dois mil seiscentos e treze), apresentam os seguintes perfis: Pessoas Físicas (905 pedidos ou 35%), Empresas de Médio e Grande Porte (892 ou 34%), Microempreendedor Individual - MEI, Microempresa e Empresa de Pequeno Porte - EPP (758 ou 29%).

Sendo assim, estudos de prospecção tecnológica em bancos de dados de registros e de materiais didáticos e instrucionais do INPI corroboraram para compreender não somente os aspectos que envolvem o tema, como também analisar se as informações ali dispostas são suficientes e de fácil entendimento para o grande público do segmento da moda.

  1. Relevância da Propriedade Industrial para o inventor no Segmento industrial da Moda

Barbosa (2003), disserta acerca da importância da propriedade industrial e constata que após o avanço da tecnologia foi possível realizar a reprodução em série de produtos voltados ao comércio, e não somente o registro de propriedade sobre os mesmos. Frente a este fato, o sistema econômico teve um olhar voltado aos direitos relativos à replicação dos inventos, evidenciando que as criações no âmbito da propriedade industrial estão intimamente ligadas aos avanços tecnológicos, associados ao desenvolvimento econômico. Sua relevância nesses quesitos é tamanha, que o direito precisou regulamentar essas criações, concedendo vantagens aos criadores, para incentivar e estimular novos inventos que possam ser importantes para o avanço do país.

Barbosa (2003), conceitua ainda que a estes direitos, que resultam na exclusividade de reprodução ou emprego de um produto (ou serviço) se dá o nome de “Propriedade Intelectual”, mas quando se fala no segmento da Propriedade Intelectual que afeta de forma mais direta o interesse da indústria de transformação e do comércio, tal como os direitos relativos a marcas e patentes, costuma-se designar por “Propriedade Industrial”.

Bagnato et al (2016) ao tratar sobre a importância que o sistema de proteção à propriedade intelectual possui, dissertam que sua finalidade é estimular novas criações, sendo um de seus pontos cruciais promover a garantia aos autores e inventores de serem reconhecidos intelectualmente por sua obra e o direito de desfrutar dos proventos econômicos resultantes da reprodução e utilização de sua criação, impedindo terceiros não autorizados de explorá-las.

O Brasil infere tamanha relevância ao tema, que regulamenta o direito de proteção à propriedade intelectual na própria Constituição Federal em seu art. 5º, incisos XXVII, XXVIII e XXIX, garantindo aos autores dos inventos industriais direito de exclusividade de utilização temporária, assim como garante proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes das empresas e outros signos distintivos, tudo isso visando o interesse social e o desenvolvimento econômico e tecnológico do país (Brasil, 1988). Desta forma, mais uma vez há a referência, não somente na literatura quanto nos dispositivos legais do desenvolvimento econômico e tecnológico advindo do estímulo às criações industriais protegidas pela propriedade industrial.

Para Russo, et al (2016) a inovação tecnológica quando inserida no mercado global possui a finalidade de atender as necessidades do consumidor, mudando a função de modelo de produto já existente ou criando um produto para suprir necessidades. Contudo, os autores afirmam que a estética modificada do produto é o que o posiciona melhor no mercado comercial e aduz que se pode observar a quantidade de vezes que um mesmo produto é colocado no mercado, apenas alterando seu design, sua forma plástica, materiais, cores, tamanhos e textura e que quão mais inovador nesse sentido for, e mais aceito pelo público consumidor for, mais valor será agregado ao produto, apenas por suas novas características estéticas.

Sendo assim, demonstra-se o quão relevante é, incentivar criações autorais no âmbito de proteção da propriedade intelectual voltados ao meio industrial, sendo incluído a moda, tendo em vista os avanços tecnológicos e econômicos que são gerados a partir de produtos inovadores inseridos no mercado consumidor e como estes elementos geram valor e garantem proteção os negócios.

3.3 Proteção do Desenho Industrial no Segmento da Moda Afro-brasileira

Para Moreira (2020) a moda pode ser entendida sob dois aspectos: filosóficas e sociológicos (moda como fato social) e assevera acerca do contexto histórico da moda, demonstrando que nem sempre esta foi democrática e acessível a todos, onde até o século XVIII havia restrição conforme a classe social, sendo exclusividade da nobreza ditar quem poderia usar determinados trajes. Somente após a Primeira Guerra Mundial, pôde-se observar o processo de democratização da moda, em termos de consumo e de produção.

Quando se volta para esta temática na perspectiva do Brasil, é possível observar que há nas narrativas acadêmicas produzidas acerca da História da Moda e Indumentária diversos cortes e apagamentos que ocultam aspectos da nossa cultura, conforme aduz Maia (2022). A autora faz a constatação acerca do parco conteúdo que descreve as contribuições dos povos originários, africanos e afro-brasileiros, como sujeitos protagonistas dessa história, aparecendo apenas como participantes dos trânsitos coloniais. Portanto, esta reforça a ideia de como é imprescindível a descentralização da narrativa historiográfica, de modo a transformar e ressignificar o modo de pensar e pesquisar.

Assim, pensar na moda sob a ótica do apagamento da história do povo negro é indispensável para se refletir neste real contexto. É inegável e evidente a relevância da moda e os reflexos desse fenômeno social no cotidiano da população, revelando o modo como as pessoas encontram-se inseridas ou pertencentes a determinado grupo.

Cury (2019) fala que a criatividade que é inerente a este ramo de atuação, ganha espaço no chamado paradigma cultural criativo e cita a importância do investimento em conhecimento com o objetivo de estimular a criatividade e com ela gerar riqueza de forma vital na atual economia. Carvalho (2018) por sua vez, afirma que a moda exprime cultura de forma contundente e é um setor em constante evolução, e crescimento à medida que de uma forma ou de outra, todos se utilizam da moda, mesmo que em escalas diferentes. Portanto, a moda se manifesta em diversos aspectos de uma sociedade e a força que este setor tem, faz com que muitos invistam nesse ramo.

Neste prisma, os estilistas, que possuem papel fundamental na cadeia da moda, buscam meios de superarem suas criações, sendo de extrema importância a garantia da proteção destes inventos. Neste contexto, observa-se que a proteção de direitos de propriedade intelectual sobre produtos lançados no mercado da moda pode ser importante, especialmente em relação ao interesse em garantir exclusividade, ainda que temporária, sobre novas formas e características de relevante apelo mercantil, assim como assevera Arrabal e Soares (2021).

No que tange ao desenho industrial, o INPI (2013) em parceria com a Organização Mundial de Propriedade Intelectual - OMPI exemplifica alguns dos objetos que podem ser protegidos por este instituto, podendo abranger desde instrumentos técnicos e médicos, até relógios, joias e outros; produtos domésticos, brinquedos, automóveis e outros de maior complexidade técnica; estampas têxteis a equipamentos esportivos e de vestuário esportivo. Este instituto de proteção também está presente nas formas plásticas de diversos produtos.

Quando voltados especificamente ao setor da moda, Fontes, Mesquita e Pereira (2018) afirmam que esse instrumento de registro é aplicável, já que condiz com o dinamismo inerente ao setor, levando-se em consideração que esse ramo é extremamente sazonal, possuindo duração média de apenas seis meses por coleção e a proteção concedida pelo desenho industrial é de dez anos, prorrogáveis por três períodos de cinco anos. Contudo, chama-se atenção para o fato de que nem todas as criações de moda irão atender aos requisitos exigidos por eles, que são a viabilidade industrial; a novidade; e a originalidade.

Sendo assim, constata-se que o desenho industrial é perfeitamente adequado às criações de moda, no entanto, no que tange ao design, Araújo (2018) denota a complexidade que o design da modelagem da indumentária possui, uma vez que é necessário o enquadramento no requisito da originalidade, e como descrito anteriormente, na prática, é muito difícil que o mesmo, no campo da forma, alcance essa originalidade. O autor reafirma que a maioria das peças de vestuário são produzidas contendo elementos já conhecidos, como padronagem das mangas, bolsos, acabamentos e demais formas que a compõe.

Araújo (2018) assevera ainda que o design de uma vestimenta pode ser constituído por dois elementos centrais, sendo eles a estampa e o design propriamente dito quanto a sua forma, estrutura e/ou modelagem indumentária. Desta forma, quando se fala da moda afro-brasileira, as estampas se tornam uma grande expressão dessa identidade cultural voltada à moda. Os ditos “tecidos africanos” são assim reconhecidos pela combinação de suas cores e traços que formam estes desenhos aplicados aos tecidos. Assim como também, as estampas autorais que tragam elementos da cultura afro, como cabelo black, pente garfo, símbolos de religiões de matrizes africanas, frases de cunho antirracista, dentre outros.

Neste sentido, a criação de estampas autorais pode se enquadrar no preenchimento dos requisitos do desenho industrial, tendo em vista que como foi visto no texto legal, esse instituto de proteção visa proteger somente o ornamento e caráter estético do produto e não sua funcionalidade. Entretanto, não somente as estampas podem ser protegidas pelo desenho industrial no âmbito da moda afro-brasileira, outros elementos artísticos, como por exemplos acessórios que contenham uma forma inovadora e que tragam elementos voltados à esta cultura, podem ser também enquadrados nesse instituto protetivo.

Sendo assim, ao promover o aumento da proteção pelo desenho industrial na área da moda, incentiva-se o desenvolvimento autoral e a ampliação dos produtos que possam conter este desenho. Com isso, aumenta-se ainda a receita destes empreendimentos, inserindo-os em um outro patamar no mercado através dos benefícios, sobretudo, econômicos trazidos pela exclusividade de uso dos produtos criados.

Catão e Souza (2019) reforçam a ideia de que no âmbito da moda é necessário garantir ao menos algum tipo de proteção intelectual a seus produtos e essa proteção se faz necessária na medida em que a indústria da moda dá extrema importância à exclusividade dos produtos: quanto mais exclusivo, mais caro para o consumidor final. O que torna muito comum as inspirações, réplicas e cópias, sendo quesitos comumente presentes neste setor. Sendo assim, garantir essa proteção, repele legalmente a exploração não autorizada por terceiros, a fim de recompensar o criador pelo tempo, esforço e dinheiro investidos para originar sua criação, não podendo deixar de lado o caráter da exclusividade.

Como fora abordado no tópico anterior, os elementos criativos que alteram o design do produto, tornando-o o mais atrativo em sua aparência, possui grande influência no mercado de consumo. Cria-se a partir destes elementos, o desejo em adquirir mais um produto, mesmo que sua funcionalidade não seja alterada pelo novo design. No ramo da moda, esse cenário é ainda mais notório. Russo, et al (2016) descreve que esse é o mercado que mais cresce no campo da propriedade intelectual. As características, novo desenho e sua boa aparência motivam o consumidor a consumir e é a partir desta demanda que o mercado fornecedor consequentemente busca proteger suas inovações, de modo que o redesenho do produto se torne rentável.

Neste contexto, evidencia-se como a economia se beneficia das criações autorais que se enquadram no desenho industrial. Com isso, é fundamental garantir sua proteção, para que assim seja possível inibir o plágio, concorrência desleal e beneficiar o autor daquele invento, de modo a incentivar que mais pessoas venham a desenvolver criações autorais incentivando como visto o desenvolvimento da economia e a inovação tecnológica do país.

  1. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Tendo em vista a relevância de se proteger as criações autorais no âmbito da moda afro-brasileira pelo instituto do desenho industrial, buscou-se constatar quantitativamente, através da realização de prospecção tecnológica nos bancos de dados do INPI, as solicitações de pedidos de registro por este instituto. Estes dados, são fundamentais para se ter um panorama em nível nacional destes pedidos. Neste condão, foi feito a busca com associação dos termos que se referem a produtos do ramo da moda com a palavra “afro”.

Ao se fazer essa associação utilizando no item de refinamento de busca “palavra exata”, não foi possível encontrar nenhum resultado. Considerando não ser possível encontrá-los desta forma, mudou-se a estratégia e realizou-se as buscas somente com os termos simples, retirando a palavra “afro” e dentro dos resultados buscou-se identificar características associadas à moda afro-brasileira, sendo possível encontrar os resultados descritos na figura 1 a seguir:

Figura 1. Registros de desenho industriais encontrados em prospecção tecnológica sobre a temática da moda afro-brasileira no site do INPI

Fonte: Site e banco de dados de desenho industrial do INPI

Os únicos 2 (dois) itens próximos do que seria voltado à moda afro, foram turbantes que puderam ser caracterizados pela própria nomenclatura. No entanto, o pedido de nº DI6101137-1, depositado ao dia 02/02/2001, com título de “turbante” teve que reformular o título e as fotos que foram enviadas para se enquadrar nos requisitos do INPI para obter a concessão do registro, mas foi extinto em 03/02/2006 por falta de pagamento da guia de recolhimento referente a renovação da concessão do registro.

Já o pedido de nº DI 6301905-1, com título: “toalha para secagem de cabelos ou turbante”, teve seu pedido de depósito realizado em 03/06/2003 e foi indeferido em 09/09/2003 com base no não atendimento ao disposto no art. 106, parágrafo 4º da Lei de Propriedade Intelectual, entendendo o julgador que o item de moda cumpria apenas aspectos funcionais, sem o devido teor inovativo estético. Houve recurso após parecer do INPI, que também foi negado.

Tais dados demonstram que os afroempreendedores que atuam com este setor específico da moda não estão buscando o INPI para protegerem suas criações autorais por este instituto de proteção (desenho industrial). Em contrapartida, a partir do que fora encontrado, os empreendedores que não atuam voltados ao público negro, ou seja, com a moda afro especificamente, protegem de forma substancial suas criações, quando se faz essa comparação. Constata-se assim, a não equidade de informação e condições advinhas de questões raciais históricas presente no Brasil.

Amartine e Queiroz (2022) refletem que no afroempreendedorismo há um sentimento, por vezes mascarado, de levante contra o racismo, contribuindo para uma equidade econômica e social, de modo a promover uma distribuição, não somente de renda, quanto de alcance aos direitos que lhe são comumente negados. Para eles, o ato de empreender deve ser vislumbrado sob o contexto de um longo período em que foi ceifado o poder de autonomia, apontando para o fato de que ser negro nesse contexto histórico e social corresponde a incessante negativa de ascender patrimonialmente e de gerar lucros e riquezas.

Neste diapasão, Almeida (2019) reforça que ao longo dos anos, diversas pesquisas constatam que o fator racial é um marcador determinante da desigualdade econômica, e para haver efetividade nas políticas públicas e na garantia dos direitos sociais que visem a promoção da distribuição de riquezas e combate à pobreza, as questões de raça e cor precisam necessariamente serem levadas em consideração. Estes dados revelam, portanto, a necessidade de se promover maior capacitação aos empreendedores do ramo da moda afro que atuam no Brasil, de modo a não somente conhecerem os diferentes meios de proteção de suas criações, assim como garantir que possam compreender os requisitos, os trâmites processuais, as limitações, os prazos, valores e fortalecer esses empreendimentos para que possam investir em um setor que cuide e preste assessoria referentes à essa área.

Há no site do INPI, uma grande gama de conteúdos voltados a esta temática, sendo possível ter acesso aos valores, legislações, guia com o passo a passo para realizar o registro e materiais bibliográficos de apoio. Contudo, questiona-se se este conteúdo é difundido aos empreendedores e se estes conseguem dedicar-se ao estudo destes materiais. Não basta pensar em empreendedorismo negro, em investir no ramo da moda, sem pensar em equiparar e promover o acesso ao público negro.

Quando se pensa no caminho percorrido desde o período pós-abolição, empreender foi um árduo caminho para a população negra, inicialmente no quadro de subempregos (Oliveira; Nunes; Jesus, 2021). Essa equiparação deve ser iniciada e pensada, a partir da difusão de conhecimentos e de incentivos que visem promover essa equiparação de oportunidades e condições.

Sendo assim, compreender como o empreendedorismo negro se estrutura no Brasil serve de auxílio para conseguir promover uma análise acerca das oportunidades e acesso aos conhecimentos acerca do negócio. Hisrich et al. (2014) ressaltam o papel fundamental da educação no ato de empreender e na criação do empreendedor. Os autores afirmam que o conhecimento é indispensável, sobretudo, no que tange ao auxílio aos empreendedores a lidarem com os problemas decorrentes da sua atuação profissional. Ou seja, o controle emocional também é um pilar importante a se ter.

Nascimento (2018) afirma que de maneira ampla, os afroempreendedores se levantam contra o racismo, utilizando seus trabalhos também como forma de difundir a identidade negra e o empoderamento desta população, à medida em que reforçam e difundem o afroempreendedorismo e o afro consumo. A presente pesquisa de prospecção no seguimento da moda demonstrou as desigualdades envolvendo os empreendedores brancos e negros no país. Com isso, promovem o enfrentamento à vulnerabilidade econômica e social deste grupo. É necessário, pois, promover conhecimentos acerca do negócio, da proteção das criações e da importância de garantir esta proteção e os aspectos legais que envolvem o ramo.

Ao se realizar a pesquisa bibliográfica realizadas por meio do portal do Google Acadêmico, com as buscas feitas com os termos: “moda, desenho industrial e INPI” apareceram 1.600 (mil e seiscentos) resultados. Ao se buscar: “Moda afro-brasileira, desenho industrial e INPI”, encontrou-se 2 (dois) resultados e ao se pesquisar: “Moda afro-brasileira, desenho industrial e INPI”, sendo moda afro-brasileira colocada entre aspas, como forma de obter resultados que tivessem o termo exato, não foi possível encontrar nenhum resultado.

Ainda no Google Acadêmico, ao pesquisar por: “proteção por desenho industrial na moda”, evidenciou-se 30.400 (trinta mil e quatrocentos) resultados, “proteção por desenho industrial na moda afro” aparecem 8.700 (oito mil e setecentos) resultados, “proteção por desenho industrial na moda afro-brasileira”, 7.870 (sete mil oitocentos e setenta) resultados foram encontrados, e trazendo a moda afro-brasileira e desenho industrial em aspas, foram evidenciados apenas 5 (cinco) resultados, mas nenhum deles está ligado ao desenho industrial enquanto ativo de propriedade intelectual, mas sim, ao curso de graduação de desenho industrial.

Em relação as obras literárias, utilizou-se, como critério de seleção nas buscas, livros que tratam do tema desenho industrial na perspectiva da moda. Vale destacar, que ainda há poucos livros que tratam sobre a proteção pelo desenho industrial na moda, obtendo-se como referências as obras: “Coletânea do Direito da Moda” que contém dois artigos dos autores Soares e Arrabal (2021) e Farias e Silva (2021) e “Fashion Law: Direito e Moda no Brasil” também com dois artigos dos autores Giacchetta e Santos (2018) e Araújo (2018). No entanto, nenhum destes trata especificamente da moda afro-brasileira como aqui se propôs a fazer.

Constatou-se que a literatura que abarca esta temática é extremamente parca, inclusive em artigos, teses e publicações científicas. Existem poucos estudos desenvolvidos voltados de forma ampla e focada no desenho industrial, onde muitas vezes esse tema aparece somente como pequeno tópico em trabalhos que tratam da propriedade industrial em um aspecto macro, o que demonstra de forma ainda mais evidente a lacuna que se tem quando se envolve esta temática.

Os livros levantados no aporte teórico, que serviram como base deste trabalho, por exemplo, tratam sobre desenho industrial em apenas poucos capítulos, quando não somente um, em cada livro. Há artigos científicos que trazem unicamente essa temática, contudo, também não dissertam acerca da proteção do desenho industrial no segmento da moda afro-brasileira, de modo a não conseguir obter um panorama sobre se os empreendedores deste setor estão solicitando a proteção de seus inventos por este instituto ou, até mesmo, buscando entender sobre quais são as lacunas sociais, econômicas e políticas dentro desse eixo que se tornam barreiras à realização do pedido de proteção.

O Programa de Pós-graduação em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para a Inovação - PROFNIT, programa em rede de grande relevância nacional no tema de proteção de PI, traz em seu livro, “Conceitos e Aplicações de Propriedade Intelectual” (Santos, 2018), um capítulo que trata sobre este tema, englobando o desenho industrial na perspectiva da moda, contudo, não pôde ser encontrado um recorte para a moda afro-brasileira. Com isso, reforça-se que esses resultados demonstram a atual carência de estudos voltados a este público e suas necessidades, o que corrobora para a manutenção de uma estrutura empresarial que não busca atender e promover soluções para a evolução do empreendedorismo negro no Brasil.

No presente trabalho, constatou-se a partir do que fora exposto, a importância da propriedade industrial para a promoção dos avanços tecnológicos e especificamente dos direitos e garantias conferidos ao criador que tem a concessão do registro do desenho industrial. Associando-se a proteção do desenho industrial no segmento da moda, sobretudo, da moda afro-brasileira, foi possível averiguar os números irrisórios de pedidos feitos por este setor. A partir da análise destes números, o presente trabalho buscou compreender a razão desta parca quantidade de pedido de registro por meio do desenho industrial.

Desta forma, a partir dos dados de prospecção tecnológica realizado no banco de dados de INPI, buscando os pedidos de registro de desenho industrial no segmento da moda, constata-se que os empreendedores deste ramo, não estão buscando proteger de forma expressiva seus inventos por meio deste instituto. Quando se segmenta para a moda afro-brasileira, esses números são extremamente discrepantes, visto que, somente foram encontrados 2 (dois) pedidos de registro voltados a esse ramo e com pedidos nos anos de 2001 e 2003.

Como é sabido, empreender na moda afro-brasileira no Brasil, perpassa por quebra de algumas barreiras quando se compreende a ótica histórica de oportunidades e segregação do povo negro e a construção do imagético dessa população na sociedade. Silva (2018) constata que nem as experiências com empreendedorismo nem o engajamento político são aspectos auto evidentes. Pois, anteriormente a isso, há que se destacar as mudanças no cenário brasileiro do século XXI no ponto de vista tanto político quanto econômico, onde o desenvolvimento cultural e político e a união da população acabaram por desencadear em um pensamento e ações voltadas a inclusão, visando proporcionar um levante aos direitos do povo negro.

Portanto, para Silva (2018) torna-se necessário obter uma ótica ampla voltada para empreendedorismo, de modo a não somente analisar as relações exclusivas de mercado e de compra e venda de produtos, mas também, promovendo uma análise no que diz respeito a complexidade que a relação entre cultura e política evoca. Neste sentido, o que se almejou aqui foi chamar a atenção para uma estrutura de mercado que acaba restringindo as possibilidades de proteções trazidas pela Lei de Propriedade Industrial, acabando por deixar desprotegido os desenhos industriais, não se atentando as possibilidades de ampliação de seus negócios, que podem derivar em diversos outros artigos de moda, o que traria em suma, uma maior lucratividade e impacto em todo o cenário econômico e social desse segmento.

Com isso, resta evidente, a necessidade latente de se aumentar a produção de pesquisas e literaturas que tenham o condão de levantar as demandas deste setor, produzir e difundir material de apoio de fácil entendimento que possa ser disponibilizado a esses profissionais, tendo em vista a importância de se disseminar o conhecimento indispensável ao desenvolvimento do empreendimento de forma orgânica e assertiva, reduzindo assim, os riscos do negócio.

Imprescindível se faz também, promover a capacitação das pessoas que atuem neste segmento, com oficinas, workshops, palestras, cursos e realizar concessão de auxílio educacional sobre o desenvolvimento da proteção da propriedade industrial da moda afro-brasileira, antes e após a abertura do empreendimento. Isso fará com que as pessoas possuam um panorama geral das questões burocráticas, legais e dos saberes específicos do negócio em que atuam.

Como forma de resolução da presente situação, torna-se imprescindível haver um fomento de políticas públicas que busquem incentivar o empreendedorismo negro no Brasil, concedendo auxílio e suporte técnico-científico que permitam que esses negócios sejam abertos com toda estrutura, abarcando e impulsionando toda potencialidade criativa e identitária, com garantias e devida segurança trazida pela proteção dos inventos perante o INPI.

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando a importância da temática acerca da proteção do desenho industrial no segmento da moda afro-brasileira e do grande lucro que a moda gera no Brasil e no mundo, chegando à marca de R$ 229 bilhões de reais ao ano de 2022, associados aos remotos pedidos de proteção dos artigos de moda pelo desenho industrial, sobretudo, no ramo da moda afro-brasileira, demonstra-se a deficiência de conhecimentos práticos e teóricos nessa área.

Tal defasagem pode ser sustentada, ainda, pela ausência de materiais específicos na literatura que fomentem essa discussão. Assim, conclui-se que há uma carência nessa área, sendo necessário para que haja um aumento da proteção por meio do desenho industrial, um maior empoderamento dos ateliês de moda afro-brasileira em termos de difusão de conhecimentos acerca da matéria, incentivos e investimentos financeiros, com o intuito de demonstrar que ao realizar a proteção de suas criações, os seus inventos serão valorados, inclusive derivar em novos produtos.

Nesse contexto, também chama a atenção para o fomento de políticas públicas que possam auxiliar na resolução das presentes carências citadas e em estudos que possam detectar as lacunas existentes para o desenvolvimento da proteção da propriedade intelectual da moda afro-brasileira. Para tanto, se mostrou ser fundamental inicialmente compreender o contexto histórico derivado do racismo que reflete a razão de muitos destes empreendedores abrirem seus negócios sem o devido preparo financeiro e sem o conhecimento que envolve a estrutura do negócio. Fazer essa análise reflexiva permite ir à fonte desta problemática e com isso ter um olhar mais assertivo voltado às necessidades deste público e consequentemente pensar e propor soluções efetivas.

Sendo assim, ao promover o aumento da proteção por meio deste instituto protetivo na área da moda afro-brasileira, incentiva-se o desenvolvimento autoral e a ampliação dos produtos que possam conter este desenho, aumenta-se a receita destes empreendimentos, inserindo-os em um outro patamar no mercado, garantindo também que somente os criadores do desenho industrial irão usufruir do bem criado, inibindo o plágio e a cópia. Espera-se, pois, trazer um impacto positivo neste contexto de atuação em decorrência do processo de inovação e tecnologia para o segmento da moda como um todo.

AGRADECIMENTOS

Meus agradecimentos à Universidade Federal do Oeste da Bahia – UFOB, assim como ao Programa de Pós-Graduação em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para a Inovação – PROFNIT.

Notas de fim de texto

¹ Os dados coletados constam no banco de dados do INPI, disponível em: https://www.gov.br/inpi/pt-br.

² Informações retiradas da Tabela de retribuições dos serviços prestados pelo INPI. Disponível em: www.gov.br/inpi/pt-br/servicos/custos-e-pagamento/TabelaDIapsalteraesCGREC1.pdf.

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