Uniformes do voleibol feminino brasileiro: com a palavra, as atletas dos Jogos Olímpicos (1980-2012)

Marcelo Luís Ribeiro Silva Tavares

Doutor, Universidade Federal de Juiz de Fora / marcelo.tavares@estudante.ufjf.br

Orcid: https://orcid.org/0000-0001-5548-8486 / Lattes: http://lattes.cnpq.br/9620173885930319

Frederico Braida

Doutor, Universidade Federal de Juiz de Fora / frederico.braida@ufjf.br

Orcid: https://orcid.org/0000-0002-7735-8380 / Lattes: http://lattes.cnpq.br/5018338717420441

Enviado: 29/07/2023 / Aceito: 19/02/2024

Uniformes do voleibol feminino brasileiro: com a palavra, as atletas dos Jogos Olímpicos (1980-2012)

RESUMO

Esporte e sociedade têm desenvolvido interações cada vez mais complexas no mundo competitivo e globalizado. O objetivo deste artigo é analisar a construção discursiva em torno dos uniformes utilizados pelas seleções femininas de voleibol do Brasil, a partir da percepção de atletas que disputaram os Jogos Olímpicos pela seleção, entre os anos de 1980 a 2012. A metodologia utilizada correlaciona apontamentos da literatura com depoimentos de atletas coletados por meio de entrevistas. Verifica-se como há uma preocupação gradativa com o design de uniformes, que perpassa aspectos materiais, simbólicos e midiáticos. Conclui-se que o design de uniformes para mulheres tem se evidenciado um tema central para a discussão sobre gênero no esporte.

Palavras-chave: Moda. Mulher. Esporte.

Brazilian women’s volleyball uniforms: with the word, the athletes of the Olympic Games (1980-2012)

ABSTRACT

Sport and society have developed increasingly complex interactions in the competitive globalized world. The aim of this article is to analyze the discursive construction around the uniforms used by Brazilian women’s volleyball teams, based on the perception of athletes who competed in the Olympic Games for the national team, between the years 1980 and 2012. The methodology used correlates notes from the literature with testimonials from athletes collected through interviews. It is verified that there is a gradual concern with the design of uniforms, which pervades material, symbolic, and mediatic aspects. It is concluded that the design of uniforms for women has become a central theme for the discussion on gender in sports.

Keywords: Fashion. Woman. Sport.

Uniformes brasileños de voleibol femenino: con la palabra, las atletas de los Juegos Olímpicos (1980-2012)

RESUMEN

El deporte y la sociedad han desarrollado interacciones cada vez más complejas en el mundo competitivo y globalizado. El objetivo de este artículo es analizar la construcción discursiva en torno a los uniformes utilizados por las selecciones de voleibol femenino en Brasil, a partir de la percepción de atletas que compitieron en los Juegos Olímpicos por la selección nacional, entre los años 1980 y 2012. La metodología utilizada correlaciona notas de literatura con testimonios de deportistas recogidos a través de entrevistas. Se verifica cómo hay una preocupación paulatina por el diseño de uniformes, que impregna aspectos materiales, simbólicos y mediáticos. Se concluye que el diseño de uniformes para mujeres se ha convertido en un tema central para la discusión sobre género en el deporte.

Palabras clave: Moda. Mujer. Deporte.

1. INTRODUÇÃO

O esporte, como atividade de forte interesse social, tem experimentado um crescimento significativo em termos de público, impulsionado pelo avanço e diversificação dos meios de comunicação nas últimas décadas. Elias e Dunning (1992) afirmam que está ocorrendo uma “esportivização” da sociedade. No entanto, para as atletas do sexo feminino, os desafios nesse campo são distintos daqueles enfrentados pelos atletas masculinos. Na maioria das sociedades, as mulheres ainda se deparam com obstáculos e discriminações que se manifestam no contexto esportivo, variando desde a proibição de participação em determinados esportes, dependendo da cultura em que estão inseridas, até a luta pela equiparação salarial e de premiações com os homens em diversas competições oficiais. O uniforme que utilizam para competir torna-se um aspecto visível de uma questão que possui ramificações mais profundas e complexas.

Este artigo integra uma pesquisa de pós-doutoramento que analisa os uniformes do voleibol feminino utilizados pelas atletas nos Jogos Olímpicos (Tavares; Braida, 2021, 2022a, 2022b). O recorte temporal abrange desde os jogos de 1980 (Moscou), quando a seleção brasileira estreou em uma olimpíada, até a conquista da segunda medalha de ouro, em 2012 (Londres). No âmbito teórico, são abordados conceitos sobre o design de uniformes (Soares, 2011; Udale; Sorger, 2009), questões de gênero no esporte (Nicholson, 2000; Goellner, 2013), aspectos simbólicos, discursivos e socioculturais da relação moda-sociedade (Bourdieu, 1982; Foucault, 2012; Hall, 2016; Lipovetsky, 2009), além de uma reflexão sobre patrocínio esportivo (Melo Neto, 2020; Sanfelice; Fernandes; Savegnago, 2005).

Metodologicamente, este estudo fundamenta-se, além da revisão bibliográfica sobre os temas mencionados anteriormente, em entrevistas conduzidas com nove atletas olímpicas, uma de cada edição do período analisado. Assim, busca-se estabelecer uma correlação entre os depoimentos das entrevistadas e as questões que têm sido debatidas na literatura especializada.

O objetivo deste artigo, portanto, é analisar a construção discursiva em torno dos uniformes utilizados pelas seleções femininas de voleibol do Brasil, a partir da percepção de atletas entrevistadas que disputaram os Jogos Olímpicos (JO) pela seleção brasileira, entre os anos de 1980 e 2012, sob a perspectiva de três enfoques: (a) questões materiais, (b) simbólicas e (c) midiáticas.

2. MODA, DESIGN E UNIFORMES

Considerar a existência humana como parte integrante de uma cultura social é refletir sobre como o vestuário compõe os costumes de cada época e local, com implicações sociológicas, filosóficas e no campo da deontologia. Tais questões são abordadas, por exemplo, no dossiê temático organizado por Crane e Bueno (2008), que trata da moda e da teoria social. Nesse compêndio, moda e cultura contemporânea são articuladas por meio de artigos e traduções inéditas de autores fundamentais das ciências sociais, como Georg Simmel, Thorstein Veblen, Norbert Elias, Roland Barthes e Pierre Bourdieu.

A discussão da moda sob uma perspectiva sociológica é fundamental para uma melhor compreensão das práticas culturais enraizadas nos aspectos simbólicos de uma sociedade. Como parte de um campo discursivo, “a moda expressaria de maneira exemplar a condição de construção de um habitus afinado à configuração de uma particular maneira de se socializar”, como destaca Setton (2008, p. 129), referindo-se a uma das categorias nomeadas por Pierre Bourdieu, o habitus, que, juntamente com a ideia de socialização e dinâmicas distintivas do chamado “jogo social”, configura a moda como uma prática cultural em constante disputa entre grupos, em busca de legitimação.

Silvano e Mezabarba (2019, p. 22) ressaltam que, a partir dos anos 1980, a moda tornou-se um campo de investigação próprio sobre a cultura material, tanto no que diz respeito ao que é produzido em desfiles e performances, quanto ao que tange e impacta o indivíduo propriamente: “[...] as roupas e os acessórios surgiram como objetos de estudo antropológico incontornáveis”, especializando-se por meio de diversas atuações profissionais e movimentando diferentes segmentos produtivos.

A moda esportiva é um desses segmentos especializados que, desde o início do século XX, passou por transformações significativas no design, incorporando tecidos macios e leves que funcionam como uma extensão do corpo, proporcionando maior liberdade de movimentos. Para as mulheres, cultural e socialmente, representou uma forte ruptura dos padrões estabelecidos de vestimenta (como deixar de usar saltos e poder usar calças compridas estilo “montaria”), resultando em “[...] alianças de estilos, trânsito entre gêneros, interação de usos” (Soares, 2011, p. 31), sem precedentes até então.

As questões materiais relacionadas aos uniformes revelam que, a partir da utilização de novos materiais, aspectos comportamentais surgiram como consequência, proporcionando novas possibilidades no uso do vestuário esportivo. A influência da moda em uniformes de determinadas modalidades tornou-se referência para o modo feminino de se vestir, oferecendo mais conforto e empoderamento. Consequentemente, foi também relevante para repensar o papel da mulher brasileira naquela época (١٩٣٢), que estava expandindo sua participação no mercado de trabalho e havia conquistado o direito ao voto (Mourão, 1998).

Atualmente, observa-se um notável desenvolvimento tecnológico em termos de materiais, cortes e confecções dos uniformes esportivos, acompanhando a crescente profissionalização do setor, que movimenta expressivas somas financeiras. No entanto, simbolicamente, percebe-se uma discussão que poderia parecer ultrapassada, mas não é: a exploração do corpo atlético feminino pela mídia durante o exercício de suas atividades profissionais esportivas (Tavares; Braida, 2022b).

Segundo Frandsen (2015), o interesse midiático pelo esporte expandiu as oportunidades de investimento em diversos setores relacionados, especialmente nos esportes de alto rendimento. A autora denominou esse fenômeno como uma “nova onda” de midiatização, abrangendo um número crescente de organizações e profissionais especializados, que atuam em variadas áreas e níveis, exigindo conhecimentos específicos para realizar a cobertura em diferentes meios de comunicação, como televisão, redes sociais, entre outros.

No entanto, essa cobertura midiática está longe de ser igualitária entre os gêneros ou equivalente nos conteúdos explorados. Romero e Pereira (2014, p. 66) concluem que

[...] inferimos que o sexismo e as hierarquias de gênero estão presentes não só nas desiguais e diferentes formas de representação do masculino e do feminino, como também nos papéis produzidos pela mídia, que legitimam os estereótipos presentes na sociedade.

Portanto, o design de uniformes esportivos abrange questões relevantes do ponto de vista material, isto é, o tecido, a cor e o caimento, tudo se relaciona com o movimento do corpo, especialmente o feminino. Simbolicamente, é correto afirmar que as roupas em geral estão ligadas a instâncias de poder e hierarquias familiares e sociais. Como atesta Soares (2011, p. 130 e 131, grifos do original): “[...] as roupas como objetos culturais prolongam a extensão do corpo, instituem relações duráveis, afirmando seu lugar de mediadoras [...]”, e os uniformes, de diferentes atividades (escola, igreja, esporte), “[...] parecem uniformizar, também, as maneiras de portar-se conforme as circunstâncias, valorizando hábitos e costumes públicos”.

Em conjunto, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos a partir dos uniformes do voleibol feminino, que têm modificado não apenas sua aparência (design), mas também seus significados.

3. METODOLOGIA

A pesquisa que fundamenta este artigo é de natureza básica, exploratória e qualitativa. Conceitualmente, baseia-se em estudos que abordam a discussão de gênero na contemporaneidade, os atributos sociais relacionados ao uso de uniformes e as relações entre esporte e mídia. Destaca-se a experiência da seleção brasileira feminina de voleibol por meio de depoimentos de atletas que participaram dos Jogos Olímpicos, constituindo-se como fonte primária e original da pesquisa.

Após a realização de contatos prévios com pessoas próximas às atletas, ou mesmo diretamente com as atletas de nossa rede de contatos, obtivemos retorno imediato e definimos, como participantes desta etapa da pesquisa, nove atletas, sendo uma de cada edição olímpica: Denise Mattioli (1980); Sandra Lima (1984); Ana Cláudia Ramos (1988); Ana Lúcia Barros (1992); Erikléia Botziak, conhecida como Filó (1996); Janina Conceição (2000); Hélia Souza, conhecida como Fofão (2004); Paula Pequeno (2008); e Fernanda Ferreira (2012).

Foram realizadas sete perguntas abordando o uso de uniformes pelas atletas, como forma de compreender melhor a perspectiva de quem efetivamente os utiliza. As questões foram distribuídas em quatro blocos temáticos: o primeiro, com duas perguntas sobre o uso e a usabilidade do uniforme; o segundo, com duas questões acerca de possíveis interferências no desempenho; o terceiro, com uma pergunta sobre memórias adicionais; e o quarto e último, sobre a percepção dos uniformes como veículo midiático e sua relação com os patrocinadores.

As entrevistas foram gravadas em áudio, transcritas e interpretadas à luz dos fundamentos da história oral temática, técnica que articula os diálogos e narrativas com outros documentos (Meihy, 2005). Foram analisadas com base nas técnicas propostas pelo Museu da Pessoa, que privilegia a fluidez, o ritmo e a compreensão ampliada dos dados coletados (Henriques, 2014; Tavares; Mourão, 2016).

Fotografias do acervo pessoal das jogadoras também foram disponibilizadas pelas entrevistadas, constituindo importante material documental consultado. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e encontra-se registrada na Plataforma Brasil sob o número 4.995.260.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base nas entrevistas conduzidas e no material coletado e selecionado durante a revisão bibliográfica, apresenta-se uma análise dos uniformes sob três perspectivas: os aspectos materiais e técnicos (a prática de vestir o uniforme); os aspectos simbólicos (as interpretações e desdobramentos do uso do uniforme esportivo); e, por fim, os aspectos midiáticos (relacionados às questões comerciais e de patrocínio).

4.1 Uniformes em quadra

O uso de uniformes na sociedade está diretamente relacionado ao próprio ato de se vestir. Portanto, é apropriado considerar que os processos de como nos vestimos irão

especializando-se de maneira profunda, permitindo mesmo distinguir aqueles que se limitam à proteção de outros que vão ao encontro da distinção, do conforto, da eficácia e da performance dos gestos em diferentes esferas da vida em sociedade (Soares, 2011, p. 26).

No esporte, o design dos uniformes deve atentar para aspectos como conforto, sendo adequados às atividades específicas exigidas pelos diversos esportes(Udale; Sorger, 2009). No caso do voleibol, os uniformes nem sempre contaram com um projeto personalizado. Durante muito tempo, houve o uso de uniformes importados e até improvisados (Tavares; Mourão, 2016). Certamente, fazer uma digressão no tempo implica reconhecer também que muito mudou e se avançou no cuidado com os uniformes e com o esporte como um todo.

Nas entrevistas realizadas, as atletas olímpicas de voleibol do Brasil também atentaram para o aspecto do desempenho, quando questionadas se o uniforme poderia interferir positiva ou negativamente durante a partida. Para a levantadora Fernanda Ferreira, nos Jogos Olímpicos de 2012,

[...] um uniforme que prende embaixo do braço, um short que fica subindo ou que fica roçando entre as coxas. Então, não acho que vá influenciar no desempenho, mas incomoda. Menos uma coisa para pensar deixa a jogadora com mais foco na partida. [Deve ser] bom o suficiente para não me fazer pensar sobre ele (Ferreira, 2023).

Conceição (2023), central nos Jogos Olímpicos de 2000, também observa que a chamada “sunga”, que as atletas usaram por muito tempo, era desconfortável e, quando foi substituído por um tipo de “short”, foi melhor, pois “eu me senti mais à vontade por não ficar incomodando e também por não machucar a pele por causa do deslize, quando a gente fazia uma defesa”.

Os uniformes da Seleção Brasileira sempre foram objeto de reflexão para as atletas. Em cada época, adotou-se um modelo de uniforme que era comum em outras seleções mundiais. Os itens básicos de um uniforme esportivo (camisa, shorts, calçado e acessórios específicos) variaram consideravelmente ao longo do tempo.

De acordo com Sandra Lima (2022), atacante nos JO de 1984, as mudanças ocorreram com a utilização cada vez mais difundida de mangas curtas ou “cavadas” e a introdução de um acessório para proteção do antebraço (brac). A atleta também enfatiza que, frequentemente, a opinião das jogadoras tinha pouca influência na decisão sobre o uso do uniforme.

[...] você vê que agora praticamente não tem mais ninguém jogando de manga comprida. Até pelo aparecimento do “brac” do braço, que muita gente já usa e é um acessório que faz o papel da manga comprida [...]. Então, o atleta tem que aceitar usar o uniforme (Lima, 2022).

Indubitavelmente, a falta de discussão nas décadas anteriores sobre os uniformes acarretou algumas questões, conforme destaca Mattioli (2022), atacante nos Jogos Olímpicos de 1980. A atleta menciona a seleção do calçado esportivo, por exemplo, com consequências duradouras: “não tinham plataforma, não tinham amortecedor nenhum [...]. E isso daí interferiu e complicou muito, comprometeu as articulações”.

Segundo Soares (2011), a flexibilidade proporcionada pela vestimenta suscita um deleite feminino no que tange às sensações físicas e à percepção da articulação entre as partes do corpo em movimento, da sutileza e da força dos ossos sob a pele, da alternância rítmica dos deslocamentos e do peso do corpo” (Soares, 2011, p. 31). Evidencia-se, portanto, que o uniforme está intrinsecamente relacionado, dentre outros aspectos, ao bem-estar dos atletas.

Bodziak (2023), atacante nos JO de 1996, recorda que os uniformes mais antigos eram provenientes do Japão, possuíam um tecido de excelente qualidade e durabilidade, porém eram “pesados” e dificultavam os movimentos de ataque, além de serem um tanto apertados para ela, devido à sua elevada estatura (1,92m). Barros (2023), atacante nos Jogos Olímpicos de 1992, associou o “peso” do uniforme à produção de calor, o que a incomodava consideravelmente, questão que aparentemente foi solucionada com o passar do tempo e com o desenvolvimento de tecidos tecnológicos. Conforme destaca Pequeno (2023), atacante e melhor jogadora nos JO de 2008, o uniforme utilizado por ela naquela ocasião já priorizava o conforto, caía muito bem no nosso corpo e absorvia bastante o suor”.

Analisadas em conjunto, é praticamente um truísmo afirmar que as exigências para a criação de uniformes esportivos devem considerar as nuances e particularidades de cada época, modalidade e categoria (masculina e feminina), além de incorporar o que há de mais avançado em termos tecnológicos (Udale; Sorger, 2009).

4.2 Para além do conforto

No esporte e no design de uniformes esportivos, contudo, nem tudo se refere apenas ao conforto e ao aspecto técnico. Os uniformes têm sido tema de debates em razão de algumas modalidades e/ou competições imporem regras que, na maioria das vezes, são direcionadas às atletas mulheres. Durante os JO de 2021, em Tóquio, ocorreram diversos protestos relacionados ao uso de uniformes com atributos sensuais em detrimento do conforto e, principalmente, da liberdade de escolha da atleta sobre o que vestir (Tavares; Braida, 2022b).

Em 2008, aparentemente houve maior consenso acerca das possibilidades para o uniforme da seleção, que consolidou o uso do short e de uma camiseta mais ajustada ao corpo feminino. Conforme menciona Souza (2023),

[...] eu acho que o uniforme da Olimpíada de 2008 foi perfeito. Tanto short quanto a camiseta. Eu destaco esses uniformes por conta do conforto e pelo fato de não expor demais as atletas. Eram roupas que davam segurança para executar qualquer tipo de movimento, principalmente a parte de baixo. E a parte de cima, que era uma camiseta adequada ao feminino, né?

A adoção da bermuda, que perdura até os dias atuais, foi recebida com alívio pelas atletas que sempre consideraram excessivo o nível de exposição do próprio corpo na época do uso recorrente da sunga. Esta última possuía um tecido mais fino e “ marcava muito a calcinha”, especialmente se a atleta “estivesse naqueles dias” [menstruação], conforme comentaram Ramos (2022) e Bodziak (2022). Esta última acrescentou: “na minha opinião, eu gostaria de jogar de bermuda, uma bermuda no meio da coxa, pra você poder se jogar no chão, deslizar e ficar tranquila”.

Para Oliveira, Macedo e Millen Neto (2020, p. 2), existe uma certa objetificação do corpo feminino quando são identificadas “práticas que legitimam a lógica heterossexual como fundamental e natural; marginalizando orientações sexuais e expressões de gênero fora dos seus padrões”.Com base nas concepções teóricas propostas por Foucault (2012), pode-se afirmar que as opiniões femininas, devido às desigualdades de gênero, foram historicamente desconsideradas, especialmente quando se trata da legitimação do saber e do poder hegemônicos.

As entrevistadas expressaram preocupação quanto à escassa atenção dada às opiniões das atletas e aos discursos tendenciosos ou subliminares resultantes da excessiva exposição do corpo feminino. Conforme destacou Conceição (2023), o uniforme pode ser esteticamente agradável nas fotografias, porém não deve ser “invasivo” se, do ponto de vista funcional, “não abranger as necessidades de uma jogadora”.

A questão da exposição do corpo feminino é antiga e tem ainda mais impacto quando se trata do vôlei de praia, no qual as atletas utilizam uniformes diferentes dos usados em quadra, frequentemente tendo seus corpos explorados pela mídia: “as meninas do vôlei de praia sofrem bastante com esse tipo de coisa. As fotos que tiram delas, né?” (Ramos, 2022). Pereira, Pontes e Ribeiro (2015, p. 132) observam em suas pesquisas que os fotógrafos tendem a negar o conteúdo sexista em muitas fotografias jornalísticas de atletas, como as do voleibol feminino:

[...] o retratamento é feito de costas, evidenciando glúteos, e raramente aparecem imagens delas suadas e/ou despenteadas. Já o homem é retratado pondo-se em evidência a agressividade, a competitividade [...],

O que indica a urgência dessa pauta para discussão nos editoriais esportivos.

Hall (2016, p. 85-86) rememora que Michel Foucault encontrava no discurso, sob uma perspectiva semiótica, a concepção mais elaborada para a produção dos objetos do conhecimento. Dessa forma, a atribuição da “verdade” a uma questão social está condicionada a um conjunto de atores em seu contexto histórico. Portanto, a partir do presente artigo, enfatiza-se que a busca pela verdade semântica acerca da representação social dos uniformes do voleibol feminino pode ser obtida, principalmente, por meio da “voz” das atletas, frequentemente negligenciada ou relegada a segundo plano em outros momentos da história esportiva.

Embora a dominação masculina já venha sendo discutida, Bourdieu (1982) argumenta que a sociologia (e podemos acrescentar que o próprio campo da moda, lato sensu) necessita de maior engajamento para denunciar constantemente os mecanismos de uma sociedade injusta e hierarquizada, estruturada conforme uma divisão de poderes dominantes e desiguais.

A questão da exposição do corpo feminino não é menos relevante para as atletas que atuam nas quadras (o denominado voleibol indoor). Hélia Souza, conhecida como Fofão, considera que as atletas em quadra também ficam consideravelmente expostas, de maneira semelhante às que competem na praia (outdoor), devido à natureza dos movimentos exigidos durante as partidas: “às vezes, isso era explorado de uma forma que não era muito legal para o esporte [...], enfim, hoje em dia eu acho que a mídia já entendeu que isso não pode ser uma prioridade” (Souza, 2023).

Os uniformes das seleções têm sido alvo de maior debate e atenção nos últimos anos, com o convite a estilistas renomados para desenharem os trajes de diversas modalidades. Esse processo estabelece uma relação intrínseca entre moda e comunicação (Barnard, 2003). Os uniformes esportivos também possuem atributos lúdicos, que são indubitavelmente cruciais para sua aceitação e afeição. Conforme observa Ferreira (2023), há uma preocupação evidente com o bem-estar e a estética no uso do uniforme: “[...] e também porque deixava a gente mais bonita e mulher é assim. Tinha brilhos e a gente gostava muito!”.

Na década de 1980, quando a seleção feminina começava a se destacar no cenário internacional, Lima (2022) ressalta que as cores do uniforme eram significativas: “a gente tinha essas opções do amarelo, do azul, do branco, e isso realmente marcava que era a seleção brasileira que estava chegando”, ou seja, demarcando um território nas competições por meio das cores-símbolo nacionais. Foi ao assistir aos jogos, encantada com os uniformes, que Ana Cláudia se sentiu motivada para o esporte: “aí que eu falei que eu queria jogar na seleção brasileira” (Ramos, 2022) – e conseguiu.

O esporte de alto rendimento possui um elevado nível de exigências a serem cumpridas, que abrangem recursos financeiros e, sobretudo, humanos. Os uniformes representam símbolos de uma nação, e os atletas tornam-se símbolos por extensão. Indubitavelmente, a relação atleta-uniforme-expressão está intimamente ligada às mensagens que os uniformes evocam, não apenas simbólicas, mas também pragmáticas.

4.3 Mídia e patrocínio esportivo

Um dos fatores que impulsionaram o crescimento do esporte como atrativo para investimentos foi o aumento expressivo da audiência, que se tornou massiva com o advento das novas mídias (Melo Neto, 2020). O voleibol conquistou notável repercussão com a denominada geração dos anos 1980, tanto na categoria masculina quanto na feminina (Tavares; Mourão, 2016). Contudo, já nessa época, uma questão permanecia controversa: a relação entre o patrocínio e os atletas, ou mais especificamente, com as atletas, como evidenciado no emblemático protesto da levantadora Jacqueline, que foi afastada da seleção por vestir a camisa do avesso (Silva, 1985).

Com a progressiva profissionalização do esporte, a entrada de patrocinadores diversificou-se e novos acordos vêm sendo estabelecidos desde os anos 1990, impactando na composição dos uniformes. Lima (2022) recorda que, na década de 1980, as atletas eram obrigadas a usar um tênis fornecido pelo patrocinador, que nem sempre era adequado, embora tivessem acesso a produtos melhores, mas não tinham a opção de substituí-lo. Em outras ocasiões, os produtos eram de boa qualidade, porém não tão apropriados, e as atletas não tinham voz para opinar sobre isso (Mattioli, 2022).

No âmbito do patrocínio, a relação com o esporte exerce forte impacto na mídia, e os acordos costumam ser bastante diretos nesse setor (Sanfelice; Fernandes; Savegnano, 2005). Há a necessidade de divulgar informações com clareza durante as transmissões dos jogos, para que a publicidade surta o efeito desejado (Mazzei, 2018). Atualmente, parece impossível que o esporte de alto rendimento se sustente sem o apoio de patrocínios. Como afirma Ferreira (2023):

Eu acho que são coisas importantes. A relação que eu faria da mídia com os uniformes seria: definição das cores, a clareza da divulgação do patrocinador para favorecer o espectador e o narrador também [...]. É dessa forma que o esporte continua, que o voleibol continua. A relação do uniforme com o patrocinador é fundamental.

Para a concepção do uniforme em parceria com os patrocinadores, contudo, o layout precisa ser bem elaborado, pois há uma relação direta com a mídia, devido à visualização e “da identidade que vai [se] criando com as marcas patrocinadoras” (Pequeno, 2023). Se não for bem planejado, o efeito pode ser contrário, como alerta Ramos (2022): “tem time que tem tanto patrocínio, mas tem tanto patrocínio, que você não sabe nem quem é o patrocinador, não sabe nem qual é o time”, além da questão da localização da marca no uniforme, para que não fique vulgar (Barros, 2023).

A relação dos patrocínios com a mídia abrange aspectos que nem sempre as atletas conseguem administrar, incluindo o uso de imagens e o tempo de exposição midiática. O vínculo entre atleta, patrocinador e mídia também se tornou mais complexo e multifacetado.

[...] é o patrocinador que paga, que investe e às vezes, a gente está concedendo uma entrevista e a nossa imagem é reduzida para que não apareça o patrocinador, sendo que durante o jogo, numa transmissão, você vê o nome do patrocinador o tempo todo (Souza, 2023).

Como bem conclui Bodziak (2022), há muita diferença quando se analisa hoje a relação do voleibol com a mídia, os patrocinadores, entre outros aspectos. “Eu acho que é imprescindível, né? O uniforme, a mídia e o esporte, porque tudo se tornou profissional” (Bodziak, 2022).

Por fim, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos quando analisados em conjunto à luz da experiência de atletas olímpicas do voleibol feminino. A literatura que aborda o tema também indica que, transcorridos mais de 40 anos desde a primeira participação da seleção em Jogos Olímpicos nessa modalidade e categoria, muito se transformou em relação ao design dos uniformes, pois, como bem ressalta Lipovetsky (2009, p. 13), a moda “chegou ao topo de seu poder, conseguiu remodelar a sociedade inteira à sua imagem; era periférica, agora é hegemônica”. Nesse contexto, a emancipação feminina aponta para uma (nova) forma de representação que tangencia a esfera política, “ter voz”, efetivamente, contra a opressão existencial, conforme discute Hall (2016, p. 13).

Indubitavelmente, a maior contribuição da análise retrospectiva é precisamente enxergar o uniforme feminino como um elemento intrinsecamente ligado à concepção de mulher na sociedade contemporânea – por um lado, impregnada de machismo explícito e velado e, por outro, fundamentada em uma compreensão abrangente, crítica e profissional, principalmente da mulher-atleta, que ainda tem participação limitada nos processos decisórios em questões que a afetam e lhe dizem respeito diretamente.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O esporte tem ocupado um lugar cada vez mais proeminente no cotidiano das populações, seja como prática, seja como entretenimento. No Brasil, o voleibol consolidou-se como o segundo esporte em preferência nacional desde a década de 1980. A partir de então, diversas mudanças ocorreram em relação à profissionalização de atletas, patrocínios e midiatização. Como se pode observar, os depoimentos das atletas olímpicas evidenciam de forma abrangente e aprofundada esses temas.

Espera-se que todo uniforme (assim como praticamente toda vestimenta) seja confortável e adequado à prática a que se destina. No entanto, no caso do voleibol feminino, a questão historicamente se apresenta de maneira distinta. Devido a exigências de patrocínio e à frequente negligência em relação à mulher-atleta como profissional, muitos uniformes foram utilizados no passado sem oferecer conforto ou mesmo adequação. Felizmente, essa situação tem se modificado, ao menos no aspecto material.

Contudo, o uniforme como um elemento comunicativo e midiático ainda enfrenta diversos obstáculos para a atleta feminina, e os protestos recentes ocorridos nos JO de 2021 são cruciais para se reconsiderar a imposição de certos tipos e padrões de uniformes para mulheres, seguindo uma lógica nem sempre clara, mas que perpassa questões de exploração midiática dos corpos femininos.

Mídia, patrocínio e esporte têm formado uma tríade fundamental para a profissionalização do esporte de alto rendimento nas últimas décadas, atingindo um nível tão elevado que se torna cada vez mais difícil conceber como os uniformes utilizados por atletas femininas podem evidenciar aspectos tão pouco empáticos.

A possibilidade de incorporar no design dos uniformes femininos um meio para atender às necessidades não apenas materiais, técnicas, comerciais e midiáticas, mas também simbólicas das atletas, revela-se essencial. As estratégias de design mais recentes apontam para a participação indispensável dos agentes diretamente envolvidos no processo de criação e destinação dos produtos. Ao colocar as jogadoras no centro do projeto dos uniformes, adotando estratégias de design centrado no usuário, acredita-se que os uniformes poderão ser desenvolvidos não só com mais criatividade e tecnologia, mas também garantindo uma participação mais ampla de quem não apenas veste, usa, divulga e representa clubes, marcas e nações, mas é profissional do esporte e, principalmente, cidadã.

AGRADECIMENTOS

Os autores expressam sua gratidão às atletas entrevistadas e ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pelo apoio fundamental à realização desta pesquisa.

REFERÊNCIAS

BARROS, A. Ana Lúcia Barros: depoimento [jan. 2023]. Entrevistador: Marcelo Ribeiro Tavares. Entrevista por áudio concedida à pesquisa do Projeto aprovado na Plataforma Brasil sob o nº 4.995.260, Universidade Federal de Juiz de Fora.

BARNARD, M. Moda e comunicação. Rio de Janeiro: Rocco, 2003.

BOTZIAK, E. Erikléia Botziak (Filó): depoimento [jul. 2022]. Entrevistador: Marcelo Ribeiro Tavares. Entrevista por áudio concedida à pesquisa do Projeto aprovado na Plataforma Brasil sob o nº 4.995.260, Universidade Federal de Juiz de Fora.

BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1982.

CONCEIÇÃO, J. Janina Conceição: depoimento [mar. 2023]. Entrevistador: Marcelo Ribeiro Tavares. Entrevista por áudio concedida à pesquisa do Projeto aprovado na Plataforma Brasil sob o nº 4.995.260, Universidade Federal de Juiz de Fora.

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Uniformes do voleibol feminino brasileiro: com a palavra, as atletas dos Jogos Olímpicos (1980-2012)

RESUMO

Esporte e sociedade têm desenvolvido interações cada vez mais complexas no mundo competitivo e globalizado. O objetivo deste artigo é analisar a construção discursiva em torno dos uniformes utilizados pelas seleções femininas de voleibol do Brasil, a partir da percepção de atletas que disputaram os Jogos Olímpicos pela seleção, entre os anos de 1980 a 2012. A metodologia utilizada correlaciona apontamentos da literatura com depoimentos de atletas coletados por meio de entrevistas. Verifica-se como há uma preocupação gradativa com o design de uniformes, que perpassa aspectos materiais, simbólicos e midiáticos. Conclui-se que o design de uniformes para mulheres tem se evidenciado um tema central para a discussão sobre gênero no esporte.

Palavras-chave: Moda. Mulher. Esporte.

Brazilian women’s volleyball uniforms: with the word, the athletes of the Olympic Games (1980-2012)

ABSTRACT

Sport and society have developed increasingly complex interactions in the competitive globalized world. The aim of this article is to analyze the discursive construction around the uniforms used by Brazilian women’s volleyball teams, based on the perception of athletes who competed in the Olympic Games for the national team, between the years 1980 and 2012. The methodology used correlates notes from the literature with testimonials from athletes collected through interviews. It is verified that there is a gradual concern with the design of uniforms, which pervades material, symbolic, and mediatic aspects. It is concluded that the design of uniforms for women has become a central theme for the discussion on gender in sports.

Keywords: Fashion. Woman. Sport.

Uniformes brasileños de voleibol femenino: con la palabra, las atletas de los Juegos Olímpicos (1980-2012)

RESUMEN

El deporte y la sociedad han desarrollado interacciones cada vez más complejas en el mundo competitivo y globalizado. El objetivo de este artículo es analizar la construcción discursiva en torno a los uniformes utilizados por las selecciones de voleibol femenino en Brasil, a partir de la percepción de atletas que compitieron en los Juegos Olímpicos por la selección nacional, entre los años 1980 y 2012. La metodología utilizada correlaciona notas de literatura con testimonios de deportistas recogidos a través de entrevistas. Se verifica cómo hay una preocupación paulatina por el diseño de uniformes, que impregna aspectos materiales, simbólicos y mediáticos. Se concluye que el diseño de uniformes para mujeres se ha convertido en un tema central para la discusión sobre género en el deporte.

Palabras clave: Moda. Mujer. Deporte.

1. INTRODUÇÃO

O esporte, como atividade de forte interesse social, tem experimentado um crescimento significativo em termos de público, impulsionado pelo avanço e diversificação dos meios de comunicação nas últimas décadas. Elias e Dunning (1992) afirmam que está ocorrendo uma “esportivização” da sociedade. No entanto, para as atletas do sexo feminino, os desafios nesse campo são distintos daqueles enfrentados pelos atletas masculinos. Na maioria das sociedades, as mulheres ainda se deparam com obstáculos e discriminações que se manifestam no contexto esportivo, variando desde a proibição de participação em determinados esportes, dependendo da cultura em que estão inseridas, até a luta pela equiparação salarial e de premiações com os homens em diversas competições oficiais. O uniforme que utilizam para competir torna-se um aspecto visível de uma questão que possui ramificações mais profundas e complexas.

Este artigo integra uma pesquisa de pós-doutoramento que analisa os uniformes do voleibol feminino utilizados pelas atletas nos Jogos Olímpicos (Tavares; Braida, 2021, 2022a, 2022b). O recorte temporal abrange desde os jogos de 1980 (Moscou), quando a seleção brasileira estreou em uma olimpíada, até a conquista da segunda medalha de ouro, em 2012 (Londres). No âmbito teórico, são abordados conceitos sobre o design de uniformes (Soares, 2011; Udale; Sorger, 2009), questões de gênero no esporte (Nicholson, 2000; Goellner, 2013), aspectos simbólicos, discursivos e socioculturais da relação moda-sociedade (Bourdieu, 1982; Foucault, 2012; Hall, 2016; Lipovetsky, 2009), além de uma reflexão sobre patrocínio esportivo (Melo Neto, 2020; Sanfelice; Fernandes; Savegnago, 2005).

Metodologicamente, este estudo fundamenta-se, além da revisão bibliográfica sobre os temas mencionados anteriormente, em entrevistas conduzidas com nove atletas olímpicas, uma de cada edição do período analisado. Assim, busca-se estabelecer uma correlação entre os depoimentos das entrevistadas e as questões que têm sido debatidas na literatura especializada.

O objetivo deste artigo, portanto, é analisar a construção discursiva em torno dos uniformes utilizados pelas seleções femininas de voleibol do Brasil, a partir da percepção de atletas entrevistadas que disputaram os Jogos Olímpicos (JO) pela seleção brasileira, entre os anos de 1980 e 2012, sob a perspectiva de três enfoques: (a) questões materiais, (b) simbólicas e (c) midiáticas.

2. MODA, DESIGN E UNIFORMES

Considerar a existência humana como parte integrante de uma cultura social é refletir sobre como o vestuário compõe os costumes de cada época e local, com implicações sociológicas, filosóficas e no campo da deontologia. Tais questões são abordadas, por exemplo, no dossiê temático organizado por Crane e Bueno (2008), que trata da moda e da teoria social. Nesse compêndio, moda e cultura contemporânea são articuladas por meio de artigos e traduções inéditas de autores fundamentais das ciências sociais, como Georg Simmel, Thorstein Veblen, Norbert Elias, Roland Barthes e Pierre Bourdieu.

A discussão da moda sob uma perspectiva sociológica é fundamental para uma melhor compreensão das práticas culturais enraizadas nos aspectos simbólicos de uma sociedade. Como parte de um campo discursivo, “a moda expressaria de maneira exemplar a condição de construção de um habitus afinado à configuração de uma particular maneira de se socializar”, como destaca Setton (2008, p. 129), referindo-se a uma das categorias nomeadas por Pierre Bourdieu, o habitus, que, juntamente com a ideia de socialização e dinâmicas distintivas do chamado “jogo social”, configura a moda como uma prática cultural em constante disputa entre grupos, em busca de legitimação.

Silvano e Mezabarba (2019, p. 22) ressaltam que, a partir dos anos 1980, a moda tornou-se um campo de investigação próprio sobre a cultura material, tanto no que diz respeito ao que é produzido em desfiles e performances, quanto ao que tange e impacta o indivíduo propriamente: “[...] as roupas e os acessórios surgiram como objetos de estudo antropológico incontornáveis”, especializando-se por meio de diversas atuações profissionais e movimentando diferentes segmentos produtivos.

A moda esportiva é um desses segmentos especializados que, desde o início do século XX, passou por transformações significativas no design, incorporando tecidos macios e leves que funcionam como uma extensão do corpo, proporcionando maior liberdade de movimentos. Para as mulheres, cultural e socialmente, representou uma forte ruptura dos padrões estabelecidos de vestimenta (como deixar de usar saltos e poder usar calças compridas estilo “montaria”), resultando em “[...] alianças de estilos, trânsito entre gêneros, interação de usos” (Soares, 2011, p. 31), sem precedentes até então.

As questões materiais relacionadas aos uniformes revelam que, a partir da utilização de novos materiais, aspectos comportamentais surgiram como consequência, proporcionando novas possibilidades no uso do vestuário esportivo. A influência da moda em uniformes de determinadas modalidades tornou-se referência para o modo feminino de se vestir, oferecendo mais conforto e empoderamento. Consequentemente, foi também relevante para repensar o papel da mulher brasileira naquela época (١٩٣٢), que estava expandindo sua participação no mercado de trabalho e havia conquistado o direito ao voto (Mourão, 1998).

Atualmente, observa-se um notável desenvolvimento tecnológico em termos de materiais, cortes e confecções dos uniformes esportivos, acompanhando a crescente profissionalização do setor, que movimenta expressivas somas financeiras. No entanto, simbolicamente, percebe-se uma discussão que poderia parecer ultrapassada, mas não é: a exploração do corpo atlético feminino pela mídia durante o exercício de suas atividades profissionais esportivas (Tavares; Braida, 2022b).

Segundo Frandsen (2015), o interesse midiático pelo esporte expandiu as oportunidades de investimento em diversos setores relacionados, especialmente nos esportes de alto rendimento. A autora denominou esse fenômeno como uma “nova onda” de midiatização, abrangendo um número crescente de organizações e profissionais especializados, que atuam em variadas áreas e níveis, exigindo conhecimentos específicos para realizar a cobertura em diferentes meios de comunicação, como televisão, redes sociais, entre outros.

No entanto, essa cobertura midiática está longe de ser igualitária entre os gêneros ou equivalente nos conteúdos explorados. Romero e Pereira (2014, p. 66) concluem que

[...] inferimos que o sexismo e as hierarquias de gênero estão presentes não só nas desiguais e diferentes formas de representação do masculino e do feminino, como também nos papéis produzidos pela mídia, que legitimam os estereótipos presentes na sociedade.

Portanto, o design de uniformes esportivos abrange questões relevantes do ponto de vista material, isto é, o tecido, a cor e o caimento, tudo se relaciona com o movimento do corpo, especialmente o feminino. Simbolicamente, é correto afirmar que as roupas em geral estão ligadas a instâncias de poder e hierarquias familiares e sociais. Como atesta Soares (2011, p. 130 e 131, grifos do original): “[...] as roupas como objetos culturais prolongam a extensão do corpo, instituem relações duráveis, afirmando seu lugar de mediadoras [...]”, e os uniformes, de diferentes atividades (escola, igreja, esporte), “[...] parecem uniformizar, também, as maneiras de portar-se conforme as circunstâncias, valorizando hábitos e costumes públicos”.

Em conjunto, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos a partir dos uniformes do voleibol feminino, que têm modificado não apenas sua aparência (design), mas também seus significados.

3. METODOLOGIA

A pesquisa que fundamenta este artigo é de natureza básica, exploratória e qualitativa. Conceitualmente, baseia-se em estudos que abordam a discussão de gênero na contemporaneidade, os atributos sociais relacionados ao uso de uniformes e as relações entre esporte e mídia. Destaca-se a experiência da seleção brasileira feminina de voleibol por meio de depoimentos de atletas que participaram dos Jogos Olímpicos, constituindo-se como fonte primária e original da pesquisa.

Após a realização de contatos prévios com pessoas próximas às atletas, ou mesmo diretamente com as atletas de nossa rede de contatos, obtivemos retorno imediato e definimos, como participantes desta etapa da pesquisa, nove atletas, sendo uma de cada edição olímpica: Denise Mattioli (1980); Sandra Lima (1984); Ana Cláudia Ramos (1988); Ana Lúcia Barros (1992); Erikléia Botziak, conhecida como Filó (1996); Janina Conceição (2000); Hélia Souza, conhecida como Fofão (2004); Paula Pequeno (2008); e Fernanda Ferreira (2012).

Foram realizadas sete perguntas abordando o uso de uniformes pelas atletas, como forma de compreender melhor a perspectiva de quem efetivamente os utiliza. As questões foram distribuídas em quatro blocos temáticos: o primeiro, com duas perguntas sobre o uso e a usabilidade do uniforme; o segundo, com duas questões acerca de possíveis interferências no desempenho; o terceiro, com uma pergunta sobre memórias adicionais; e o quarto e último, sobre a percepção dos uniformes como veículo midiático e sua relação com os patrocinadores.

As entrevistas foram gravadas em áudio, transcritas e interpretadas à luz dos fundamentos da história oral temática, técnica que articula os diálogos e narrativas com outros documentos (Meihy, 2005). Foram analisadas com base nas técnicas propostas pelo Museu da Pessoa, que privilegia a fluidez, o ritmo e a compreensão ampliada dos dados coletados (Henriques, 2014; Tavares; Mourão, 2016).

Fotografias do acervo pessoal das jogadoras também foram disponibilizadas pelas entrevistadas, constituindo importante material documental consultado. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e encontra-se registrada na Plataforma Brasil sob o número 4.995.260.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base nas entrevistas conduzidas e no material coletado e selecionado durante a revisão bibliográfica, apresenta-se uma análise dos uniformes sob três perspectivas: os aspectos materiais e técnicos (a prática de vestir o uniforme); os aspectos simbólicos (as interpretações e desdobramentos do uso do uniforme esportivo); e, por fim, os aspectos midiáticos (relacionados às questões comerciais e de patrocínio).

4.1 Uniformes em quadra

O uso de uniformes na sociedade está diretamente relacionado ao próprio ato de se vestir. Portanto, é apropriado considerar que os processos de como nos vestimos irão

especializando-se de maneira profunda, permitindo mesmo distinguir aqueles que se limitam à proteção de outros que vão ao encontro da distinção, do conforto, da eficácia e da performance dos gestos em diferentes esferas da vida em sociedade (Soares, 2011, p. 26).

No esporte, o design dos uniformes deve atentar para aspectos como conforto, sendo adequados às atividades específicas exigidas pelos diversos esportes(Udale; Sorger, 2009). No caso do voleibol, os uniformes nem sempre contaram com um projeto personalizado. Durante muito tempo, houve o uso de uniformes importados e até improvisados (Tavares; Mourão, 2016). Certamente, fazer uma digressão no tempo implica reconhecer também que muito mudou e se avançou no cuidado com os uniformes e com o esporte como um todo.

Nas entrevistas realizadas, as atletas olímpicas de voleibol do Brasil também atentaram para o aspecto do desempenho, quando questionadas se o uniforme poderia interferir positiva ou negativamente durante a partida. Para a levantadora Fernanda Ferreira, nos Jogos Olímpicos de 2012,

[...] um uniforme que prende embaixo do braço, um short que fica subindo ou que fica roçando entre as coxas. Então, não acho que vá influenciar no desempenho, mas incomoda. Menos uma coisa para pensar deixa a jogadora com mais foco na partida. [Deve ser] bom o suficiente para não me fazer pensar sobre ele (Ferreira, 2023).

Conceição (2023), central nos Jogos Olímpicos de 2000, também observa que a chamada “sunga”, que as atletas usaram por muito tempo, era desconfortável e, quando foi substituído por um tipo de “short”, foi melhor, pois “eu me senti mais à vontade por não ficar incomodando e também por não machucar a pele por causa do deslize, quando a gente fazia uma defesa”.

Os uniformes da Seleção Brasileira sempre foram objeto de reflexão para as atletas. Em cada época, adotou-se um modelo de uniforme que era comum em outras seleções mundiais. Os itens básicos de um uniforme esportivo (camisa, shorts, calçado e acessórios específicos) variaram consideravelmente ao longo do tempo.

De acordo com Sandra Lima (2022), atacante nos JO de 1984, as mudanças ocorreram com a utilização cada vez mais difundida de mangas curtas ou “cavadas” e a introdução de um acessório para proteção do antebraço (brac). A atleta também enfatiza que, frequentemente, a opinião das jogadoras tinha pouca influência na decisão sobre o uso do uniforme.

[...] você vê que agora praticamente não tem mais ninguém jogando de manga comprida. Até pelo aparecimento do “brac” do braço, que muita gente já usa e é um acessório que faz o papel da manga comprida [...]. Então, o atleta tem que aceitar usar o uniforme (Lima, 2022).

Indubitavelmente, a falta de discussão nas décadas anteriores sobre os uniformes acarretou algumas questões, conforme destaca Mattioli (2022), atacante nos Jogos Olímpicos de 1980. A atleta menciona a seleção do calçado esportivo, por exemplo, com consequências duradouras: “não tinham plataforma, não tinham amortecedor nenhum [...]. E isso daí interferiu e complicou muito, comprometeu as articulações”.

Segundo Soares (2011), a flexibilidade proporcionada pela vestimenta suscita um deleite feminino no que tange às sensações físicas e à percepção da articulação entre as partes do corpo em movimento, da sutileza e da força dos ossos sob a pele, da alternância rítmica dos deslocamentos e do peso do corpo” (Soares, 2011, p. 31). Evidencia-se, portanto, que o uniforme está intrinsecamente relacionado, dentre outros aspectos, ao bem-estar dos atletas.

Bodziak (2023), atacante nos JO de 1996, recorda que os uniformes mais antigos eram provenientes do Japão, possuíam um tecido de excelente qualidade e durabilidade, porém eram “pesados” e dificultavam os movimentos de ataque, além de serem um tanto apertados para ela, devido à sua elevada estatura (1,92m). Barros (2023), atacante nos Jogos Olímpicos de 1992, associou o “peso” do uniforme à produção de calor, o que a incomodava consideravelmente, questão que aparentemente foi solucionada com o passar do tempo e com o desenvolvimento de tecidos tecnológicos. Conforme destaca Pequeno (2023), atacante e melhor jogadora nos JO de 2008, o uniforme utilizado por ela naquela ocasião já priorizava o conforto, caía muito bem no nosso corpo e absorvia bastante o suor”.

Analisadas em conjunto, é praticamente um truísmo afirmar que as exigências para a criação de uniformes esportivos devem considerar as nuances e particularidades de cada época, modalidade e categoria (masculina e feminina), além de incorporar o que há de mais avançado em termos tecnológicos (Udale; Sorger, 2009).

4.2 Para além do conforto

No esporte e no design de uniformes esportivos, contudo, nem tudo se refere apenas ao conforto e ao aspecto técnico. Os uniformes têm sido tema de debates em razão de algumas modalidades e/ou competições imporem regras que, na maioria das vezes, são direcionadas às atletas mulheres. Durante os JO de 2021, em Tóquio, ocorreram diversos protestos relacionados ao uso de uniformes com atributos sensuais em detrimento do conforto e, principalmente, da liberdade de escolha da atleta sobre o que vestir (Tavares; Braida, 2022b).

Em 2008, aparentemente houve maior consenso acerca das possibilidades para o uniforme da seleção, que consolidou o uso do short e de uma camiseta mais ajustada ao corpo feminino. Conforme menciona Souza (2023),

[...] eu acho que o uniforme da Olimpíada de 2008 foi perfeito. Tanto short quanto a camiseta. Eu destaco esses uniformes por conta do conforto e pelo fato de não expor demais as atletas. Eram roupas que davam segurança para executar qualquer tipo de movimento, principalmente a parte de baixo. E a parte de cima, que era uma camiseta adequada ao feminino, né?

A adoção da bermuda, que perdura até os dias atuais, foi recebida com alívio pelas atletas que sempre consideraram excessivo o nível de exposição do próprio corpo na época do uso recorrente da sunga. Esta última possuía um tecido mais fino e “ marcava muito a calcinha”, especialmente se a atleta “estivesse naqueles dias” [menstruação], conforme comentaram Ramos (2022) e Bodziak (2022). Esta última acrescentou: “na minha opinião, eu gostaria de jogar de bermuda, uma bermuda no meio da coxa, pra você poder se jogar no chão, deslizar e ficar tranquila”.

Para Oliveira, Macedo e Millen Neto (2020, p. 2), existe uma certa objetificação do corpo feminino quando são identificadas “práticas que legitimam a lógica heterossexual como fundamental e natural; marginalizando orientações sexuais e expressões de gênero fora dos seus padrões”.Com base nas concepções teóricas propostas por Foucault (2012), pode-se afirmar que as opiniões femininas, devido às desigualdades de gênero, foram historicamente desconsideradas, especialmente quando se trata da legitimação do saber e do poder hegemônicos.

As entrevistadas expressaram preocupação quanto à escassa atenção dada às opiniões das atletas e aos discursos tendenciosos ou subliminares resultantes da excessiva exposição do corpo feminino. Conforme destacou Conceição (2023), o uniforme pode ser esteticamente agradável nas fotografias, porém não deve ser “invasivo” se, do ponto de vista funcional, “não abranger as necessidades de uma jogadora”.

A questão da exposição do corpo feminino é antiga e tem ainda mais impacto quando se trata do vôlei de praia, no qual as atletas utilizam uniformes diferentes dos usados em quadra, frequentemente tendo seus corpos explorados pela mídia: “as meninas do vôlei de praia sofrem bastante com esse tipo de coisa. As fotos que tiram delas, né?” (Ramos, 2022). Pereira, Pontes e Ribeiro (2015, p. 132) observam em suas pesquisas que os fotógrafos tendem a negar o conteúdo sexista em muitas fotografias jornalísticas de atletas, como as do voleibol feminino:

[...] o retratamento é feito de costas, evidenciando glúteos, e raramente aparecem imagens delas suadas e/ou despenteadas. Já o homem é retratado pondo-se em evidência a agressividade, a competitividade [...],

O que indica a urgência dessa pauta para discussão nos editoriais esportivos.

Hall (2016, p. 85-86) rememora que Michel Foucault encontrava no discurso, sob uma perspectiva semiótica, a concepção mais elaborada para a produção dos objetos do conhecimento. Dessa forma, a atribuição da “verdade” a uma questão social está condicionada a um conjunto de atores em seu contexto histórico. Portanto, a partir do presente artigo, enfatiza-se que a busca pela verdade semântica acerca da representação social dos uniformes do voleibol feminino pode ser obtida, principalmente, por meio da “voz” das atletas, frequentemente negligenciada ou relegada a segundo plano em outros momentos da história esportiva.

Embora a dominação masculina já venha sendo discutida, Bourdieu (1982) argumenta que a sociologia (e podemos acrescentar que o próprio campo da moda, lato sensu) necessita de maior engajamento para denunciar constantemente os mecanismos de uma sociedade injusta e hierarquizada, estruturada conforme uma divisão de poderes dominantes e desiguais.

A questão da exposição do corpo feminino não é menos relevante para as atletas que atuam nas quadras (o denominado voleibol indoor). Hélia Souza, conhecida como Fofão, considera que as atletas em quadra também ficam consideravelmente expostas, de maneira semelhante às que competem na praia (outdoor), devido à natureza dos movimentos exigidos durante as partidas: “às vezes, isso era explorado de uma forma que não era muito legal para o esporte [...], enfim, hoje em dia eu acho que a mídia já entendeu que isso não pode ser uma prioridade” (Souza, 2023).

Os uniformes das seleções têm sido alvo de maior debate e atenção nos últimos anos, com o convite a estilistas renomados para desenharem os trajes de diversas modalidades. Esse processo estabelece uma relação intrínseca entre moda e comunicação (Barnard, 2003). Os uniformes esportivos também possuem atributos lúdicos, que são indubitavelmente cruciais para sua aceitação e afeição. Conforme observa Ferreira (2023), há uma preocupação evidente com o bem-estar e a estética no uso do uniforme: “[...] e também porque deixava a gente mais bonita e mulher é assim. Tinha brilhos e a gente gostava muito!”.

Na década de 1980, quando a seleção feminina começava a se destacar no cenário internacional, Lima (2022) ressalta que as cores do uniforme eram significativas: “a gente tinha essas opções do amarelo, do azul, do branco, e isso realmente marcava que era a seleção brasileira que estava chegando”, ou seja, demarcando um território nas competições por meio das cores-símbolo nacionais. Foi ao assistir aos jogos, encantada com os uniformes, que Ana Cláudia se sentiu motivada para o esporte: “aí que eu falei que eu queria jogar na seleção brasileira” (Ramos, 2022) – e conseguiu.

O esporte de alto rendimento possui um elevado nível de exigências a serem cumpridas, que abrangem recursos financeiros e, sobretudo, humanos. Os uniformes representam símbolos de uma nação, e os atletas tornam-se símbolos por extensão. Indubitavelmente, a relação atleta-uniforme-expressão está intimamente ligada às mensagens que os uniformes evocam, não apenas simbólicas, mas também pragmáticas.

4.3 Mídia e patrocínio esportivo

Um dos fatores que impulsionaram o crescimento do esporte como atrativo para investimentos foi o aumento expressivo da audiência, que se tornou massiva com o advento das novas mídias (Melo Neto, 2020). O voleibol conquistou notável repercussão com a denominada geração dos anos 1980, tanto na categoria masculina quanto na feminina (Tavares; Mourão, 2016). Contudo, já nessa época, uma questão permanecia controversa: a relação entre o patrocínio e os atletas, ou mais especificamente, com as atletas, como evidenciado no emblemático protesto da levantadora Jacqueline, que foi afastada da seleção por vestir a camisa do avesso (Silva, 1985).

Com a progressiva profissionalização do esporte, a entrada de patrocinadores diversificou-se e novos acordos vêm sendo estabelecidos desde os anos 1990, impactando na composição dos uniformes. Lima (2022) recorda que, na década de 1980, as atletas eram obrigadas a usar um tênis fornecido pelo patrocinador, que nem sempre era adequado, embora tivessem acesso a produtos melhores, mas não tinham a opção de substituí-lo. Em outras ocasiões, os produtos eram de boa qualidade, porém não tão apropriados, e as atletas não tinham voz para opinar sobre isso (Mattioli, 2022).

No âmbito do patrocínio, a relação com o esporte exerce forte impacto na mídia, e os acordos costumam ser bastante diretos nesse setor (Sanfelice; Fernandes; Savegnano, 2005). Há a necessidade de divulgar informações com clareza durante as transmissões dos jogos, para que a publicidade surta o efeito desejado (Mazzei, 2018). Atualmente, parece impossível que o esporte de alto rendimento se sustente sem o apoio de patrocínios. Como afirma Ferreira (2023):

Eu acho que são coisas importantes. A relação que eu faria da mídia com os uniformes seria: definição das cores, a clareza da divulgação do patrocinador para favorecer o espectador e o narrador também [...]. É dessa forma que o esporte continua, que o voleibol continua. A relação do uniforme com o patrocinador é fundamental.

Para a concepção do uniforme em parceria com os patrocinadores, contudo, o layout precisa ser bem elaborado, pois há uma relação direta com a mídia, devido à visualização e “da identidade que vai [se] criando com as marcas patrocinadoras” (Pequeno, 2023). Se não for bem planejado, o efeito pode ser contrário, como alerta Ramos (2022): “tem time que tem tanto patrocínio, mas tem tanto patrocínio, que você não sabe nem quem é o patrocinador, não sabe nem qual é o time”, além da questão da localização da marca no uniforme, para que não fique vulgar (Barros, 2023).

A relação dos patrocínios com a mídia abrange aspectos que nem sempre as atletas conseguem administrar, incluindo o uso de imagens e o tempo de exposição midiática. O vínculo entre atleta, patrocinador e mídia também se tornou mais complexo e multifacetado.

[...] é o patrocinador que paga, que investe e às vezes, a gente está concedendo uma entrevista e a nossa imagem é reduzida para que não apareça o patrocinador, sendo que durante o jogo, numa transmissão, você vê o nome do patrocinador o tempo todo (Souza, 2023).

Como bem conclui Bodziak (2022), há muita diferença quando se analisa hoje a relação do voleibol com a mídia, os patrocinadores, entre outros aspectos. “Eu acho que é imprescindível, né? O uniforme, a mídia e o esporte, porque tudo se tornou profissional” (Bodziak, 2022).

Por fim, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos quando analisados em conjunto à luz da experiência de atletas olímpicas do voleibol feminino. A literatura que aborda o tema também indica que, transcorridos mais de 40 anos desde a primeira participação da seleção em Jogos Olímpicos nessa modalidade e categoria, muito se transformou em relação ao design dos uniformes, pois, como bem ressalta Lipovetsky (2009, p. 13), a moda “chegou ao topo de seu poder, conseguiu remodelar a sociedade inteira à sua imagem; era periférica, agora é hegemônica”. Nesse contexto, a emancipação feminina aponta para uma (nova) forma de representação que tangencia a esfera política, “ter voz”, efetivamente, contra a opressão existencial, conforme discute Hall (2016, p. 13).

Indubitavelmente, a maior contribuição da análise retrospectiva é precisamente enxergar o uniforme feminino como um elemento intrinsecamente ligado à concepção de mulher na sociedade contemporânea – por um lado, impregnada de machismo explícito e velado e, por outro, fundamentada em uma compreensão abrangente, crítica e profissional, principalmente da mulher-atleta, que ainda tem participação limitada nos processos decisórios em questões que a afetam e lhe dizem respeito diretamente.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O esporte tem ocupado um lugar cada vez mais proeminente no cotidiano das populações, seja como prática, seja como entretenimento. No Brasil, o voleibol consolidou-se como o segundo esporte em preferência nacional desde a década de 1980. A partir de então, diversas mudanças ocorreram em relação à profissionalização de atletas, patrocínios e midiatização. Como se pode observar, os depoimentos das atletas olímpicas evidenciam de forma abrangente e aprofundada esses temas.

Espera-se que todo uniforme (assim como praticamente toda vestimenta) seja confortável e adequado à prática a que se destina. No entanto, no caso do voleibol feminino, a questão historicamente se apresenta de maneira distinta. Devido a exigências de patrocínio e à frequente negligência em relação à mulher-atleta como profissional, muitos uniformes foram utilizados no passado sem oferecer conforto ou mesmo adequação. Felizmente, essa situação tem se modificado, ao menos no aspecto material.

Contudo, o uniforme como um elemento comunicativo e midiático ainda enfrenta diversos obstáculos para a atleta feminina, e os protestos recentes ocorridos nos JO de 2021 são cruciais para se reconsiderar a imposição de certos tipos e padrões de uniformes para mulheres, seguindo uma lógica nem sempre clara, mas que perpassa questões de exploração midiática dos corpos femininos.

Mídia, patrocínio e esporte têm formado uma tríade fundamental para a profissionalização do esporte de alto rendimento nas últimas décadas, atingindo um nível tão elevado que se torna cada vez mais difícil conceber como os uniformes utilizados por atletas femininas podem evidenciar aspectos tão pouco empáticos.

A possibilidade de incorporar no design dos uniformes femininos um meio para atender às necessidades não apenas materiais, técnicas, comerciais e midiáticas, mas também simbólicas das atletas, revela-se essencial. As estratégias de design mais recentes apontam para a participação indispensável dos agentes diretamente envolvidos no processo de criação e destinação dos produtos. Ao colocar as jogadoras no centro do projeto dos uniformes, adotando estratégias de design centrado no usuário, acredita-se que os uniformes poderão ser desenvolvidos não só com mais criatividade e tecnologia, mas também garantindo uma participação mais ampla de quem não apenas veste, usa, divulga e representa clubes, marcas e nações, mas é profissional do esporte e, principalmente, cidadã.

AGRADECIMENTOS

Os autores expressam sua gratidão às atletas entrevistadas e ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pelo apoio fundamental à realização desta pesquisa.

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Brazilian women’s volleyball uniforms: with the word, the athletes of the Olympic Games (1980-2012)

ABSTRACT

Sport and society have developed increasingly complex interactions in the competitive globalized world. The aim of this article is to analyze the discursive construction around the uniforms used by Brazilian women’s volleyball teams, based on the perception of athletes who competed in the Olympic Games for the national team, between the years 1980 and 2012. The methodology used correlates notes from the literature with testimonials from athletes collected through interviews. It is verified that there is a gradual concern with the design of uniforms, which pervades material, symbolic, and mediatic aspects. It is concluded that the design of uniforms for women has become a central theme for the discussion on gender in sports.

Keywords: Fashion. Woman. Sport.

Uniformes brasileños de voleibol femenino: con la palabra, las atletas de los Juegos Olímpicos (1980-2012)

RESUMEN

El deporte y la sociedad han desarrollado interacciones cada vez más complejas en el mundo competitivo y globalizado. El objetivo de este artículo es analizar la construcción discursiva en torno a los uniformes utilizados por las selecciones de voleibol femenino en Brasil, a partir de la percepción de atletas que compitieron en los Juegos Olímpicos por la selección nacional, entre los años 1980 y 2012. La metodología utilizada correlaciona notas de literatura con testimonios de deportistas recogidos a través de entrevistas. Se verifica cómo hay una preocupación paulatina por el diseño de uniformes, que impregna aspectos materiales, simbólicos y mediáticos. Se concluye que el diseño de uniformes para mujeres se ha convertido en un tema central para la discusión sobre género en el deporte.

Palabras clave: Moda. Mujer. Deporte.

1. INTRODUÇÃO

O esporte, como atividade de forte interesse social, tem experimentado um crescimento significativo em termos de público, impulsionado pelo avanço e diversificação dos meios de comunicação nas últimas décadas. Elias e Dunning (1992) afirmam que está ocorrendo uma “esportivização” da sociedade. No entanto, para as atletas do sexo feminino, os desafios nesse campo são distintos daqueles enfrentados pelos atletas masculinos. Na maioria das sociedades, as mulheres ainda se deparam com obstáculos e discriminações que se manifestam no contexto esportivo, variando desde a proibição de participação em determinados esportes, dependendo da cultura em que estão inseridas, até a luta pela equiparação salarial e de premiações com os homens em diversas competições oficiais. O uniforme que utilizam para competir torna-se um aspecto visível de uma questão que possui ramificações mais profundas e complexas.

Este artigo integra uma pesquisa de pós-doutoramento que analisa os uniformes do voleibol feminino utilizados pelas atletas nos Jogos Olímpicos (Tavares; Braida, 2021, 2022a, 2022b). O recorte temporal abrange desde os jogos de 1980 (Moscou), quando a seleção brasileira estreou em uma olimpíada, até a conquista da segunda medalha de ouro, em 2012 (Londres). No âmbito teórico, são abordados conceitos sobre o design de uniformes (Soares, 2011; Udale; Sorger, 2009), questões de gênero no esporte (Nicholson, 2000; Goellner, 2013), aspectos simbólicos, discursivos e socioculturais da relação moda-sociedade (Bourdieu, 1982; Foucault, 2012; Hall, 2016; Lipovetsky, 2009), além de uma reflexão sobre patrocínio esportivo (Melo Neto, 2020; Sanfelice; Fernandes; Savegnago, 2005).

Metodologicamente, este estudo fundamenta-se, além da revisão bibliográfica sobre os temas mencionados anteriormente, em entrevistas conduzidas com nove atletas olímpicas, uma de cada edição do período analisado. Assim, busca-se estabelecer uma correlação entre os depoimentos das entrevistadas e as questões que têm sido debatidas na literatura especializada.

O objetivo deste artigo, portanto, é analisar a construção discursiva em torno dos uniformes utilizados pelas seleções femininas de voleibol do Brasil, a partir da percepção de atletas entrevistadas que disputaram os Jogos Olímpicos (JO) pela seleção brasileira, entre os anos de 1980 e 2012, sob a perspectiva de três enfoques: (a) questões materiais, (b) simbólicas e (c) midiáticas.

2. MODA, DESIGN E UNIFORMES

Considerar a existência humana como parte integrante de uma cultura social é refletir sobre como o vestuário compõe os costumes de cada época e local, com implicações sociológicas, filosóficas e no campo da deontologia. Tais questões são abordadas, por exemplo, no dossiê temático organizado por Crane e Bueno (2008), que trata da moda e da teoria social. Nesse compêndio, moda e cultura contemporânea são articuladas por meio de artigos e traduções inéditas de autores fundamentais das ciências sociais, como Georg Simmel, Thorstein Veblen, Norbert Elias, Roland Barthes e Pierre Bourdieu.

A discussão da moda sob uma perspectiva sociológica é fundamental para uma melhor compreensão das práticas culturais enraizadas nos aspectos simbólicos de uma sociedade. Como parte de um campo discursivo, “a moda expressaria de maneira exemplar a condição de construção de um habitus afinado à configuração de uma particular maneira de se socializar”, como destaca Setton (2008, p. 129), referindo-se a uma das categorias nomeadas por Pierre Bourdieu, o habitus, que, juntamente com a ideia de socialização e dinâmicas distintivas do chamado “jogo social”, configura a moda como uma prática cultural em constante disputa entre grupos, em busca de legitimação.

Silvano e Mezabarba (2019, p. 22) ressaltam que, a partir dos anos 1980, a moda tornou-se um campo de investigação próprio sobre a cultura material, tanto no que diz respeito ao que é produzido em desfiles e performances, quanto ao que tange e impacta o indivíduo propriamente: “[...] as roupas e os acessórios surgiram como objetos de estudo antropológico incontornáveis”, especializando-se por meio de diversas atuações profissionais e movimentando diferentes segmentos produtivos.

A moda esportiva é um desses segmentos especializados que, desde o início do século XX, passou por transformações significativas no design, incorporando tecidos macios e leves que funcionam como uma extensão do corpo, proporcionando maior liberdade de movimentos. Para as mulheres, cultural e socialmente, representou uma forte ruptura dos padrões estabelecidos de vestimenta (como deixar de usar saltos e poder usar calças compridas estilo “montaria”), resultando em “[...] alianças de estilos, trânsito entre gêneros, interação de usos” (Soares, 2011, p. 31), sem precedentes até então.

As questões materiais relacionadas aos uniformes revelam que, a partir da utilização de novos materiais, aspectos comportamentais surgiram como consequência, proporcionando novas possibilidades no uso do vestuário esportivo. A influência da moda em uniformes de determinadas modalidades tornou-se referência para o modo feminino de se vestir, oferecendo mais conforto e empoderamento. Consequentemente, foi também relevante para repensar o papel da mulher brasileira naquela época (١٩٣٢), que estava expandindo sua participação no mercado de trabalho e havia conquistado o direito ao voto (Mourão, 1998).

Atualmente, observa-se um notável desenvolvimento tecnológico em termos de materiais, cortes e confecções dos uniformes esportivos, acompanhando a crescente profissionalização do setor, que movimenta expressivas somas financeiras. No entanto, simbolicamente, percebe-se uma discussão que poderia parecer ultrapassada, mas não é: a exploração do corpo atlético feminino pela mídia durante o exercício de suas atividades profissionais esportivas (Tavares; Braida, 2022b).

Segundo Frandsen (2015), o interesse midiático pelo esporte expandiu as oportunidades de investimento em diversos setores relacionados, especialmente nos esportes de alto rendimento. A autora denominou esse fenômeno como uma “nova onda” de midiatização, abrangendo um número crescente de organizações e profissionais especializados, que atuam em variadas áreas e níveis, exigindo conhecimentos específicos para realizar a cobertura em diferentes meios de comunicação, como televisão, redes sociais, entre outros.

No entanto, essa cobertura midiática está longe de ser igualitária entre os gêneros ou equivalente nos conteúdos explorados. Romero e Pereira (2014, p. 66) concluem que

[...] inferimos que o sexismo e as hierarquias de gênero estão presentes não só nas desiguais e diferentes formas de representação do masculino e do feminino, como também nos papéis produzidos pela mídia, que legitimam os estereótipos presentes na sociedade.

Portanto, o design de uniformes esportivos abrange questões relevantes do ponto de vista material, isto é, o tecido, a cor e o caimento, tudo se relaciona com o movimento do corpo, especialmente o feminino. Simbolicamente, é correto afirmar que as roupas em geral estão ligadas a instâncias de poder e hierarquias familiares e sociais. Como atesta Soares (2011, p. 130 e 131, grifos do original): “[...] as roupas como objetos culturais prolongam a extensão do corpo, instituem relações duráveis, afirmando seu lugar de mediadoras [...]”, e os uniformes, de diferentes atividades (escola, igreja, esporte), “[...] parecem uniformizar, também, as maneiras de portar-se conforme as circunstâncias, valorizando hábitos e costumes públicos”.

Em conjunto, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos a partir dos uniformes do voleibol feminino, que têm modificado não apenas sua aparência (design), mas também seus significados.

3. METODOLOGIA

A pesquisa que fundamenta este artigo é de natureza básica, exploratória e qualitativa. Conceitualmente, baseia-se em estudos que abordam a discussão de gênero na contemporaneidade, os atributos sociais relacionados ao uso de uniformes e as relações entre esporte e mídia. Destaca-se a experiência da seleção brasileira feminina de voleibol por meio de depoimentos de atletas que participaram dos Jogos Olímpicos, constituindo-se como fonte primária e original da pesquisa.

Após a realização de contatos prévios com pessoas próximas às atletas, ou mesmo diretamente com as atletas de nossa rede de contatos, obtivemos retorno imediato e definimos, como participantes desta etapa da pesquisa, nove atletas, sendo uma de cada edição olímpica: Denise Mattioli (1980); Sandra Lima (1984); Ana Cláudia Ramos (1988); Ana Lúcia Barros (1992); Erikléia Botziak, conhecida como Filó (1996); Janina Conceição (2000); Hélia Souza, conhecida como Fofão (2004); Paula Pequeno (2008); e Fernanda Ferreira (2012).

Foram realizadas sete perguntas abordando o uso de uniformes pelas atletas, como forma de compreender melhor a perspectiva de quem efetivamente os utiliza. As questões foram distribuídas em quatro blocos temáticos: o primeiro, com duas perguntas sobre o uso e a usabilidade do uniforme; o segundo, com duas questões acerca de possíveis interferências no desempenho; o terceiro, com uma pergunta sobre memórias adicionais; e o quarto e último, sobre a percepção dos uniformes como veículo midiático e sua relação com os patrocinadores.

As entrevistas foram gravadas em áudio, transcritas e interpretadas à luz dos fundamentos da história oral temática, técnica que articula os diálogos e narrativas com outros documentos (Meihy, 2005). Foram analisadas com base nas técnicas propostas pelo Museu da Pessoa, que privilegia a fluidez, o ritmo e a compreensão ampliada dos dados coletados (Henriques, 2014; Tavares; Mourão, 2016).

Fotografias do acervo pessoal das jogadoras também foram disponibilizadas pelas entrevistadas, constituindo importante material documental consultado. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e encontra-se registrada na Plataforma Brasil sob o número 4.995.260.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base nas entrevistas conduzidas e no material coletado e selecionado durante a revisão bibliográfica, apresenta-se uma análise dos uniformes sob três perspectivas: os aspectos materiais e técnicos (a prática de vestir o uniforme); os aspectos simbólicos (as interpretações e desdobramentos do uso do uniforme esportivo); e, por fim, os aspectos midiáticos (relacionados às questões comerciais e de patrocínio).

4.1 Uniformes em quadra

O uso de uniformes na sociedade está diretamente relacionado ao próprio ato de se vestir. Portanto, é apropriado considerar que os processos de como nos vestimos irão

especializando-se de maneira profunda, permitindo mesmo distinguir aqueles que se limitam à proteção de outros que vão ao encontro da distinção, do conforto, da eficácia e da performance dos gestos em diferentes esferas da vida em sociedade (Soares, 2011, p. 26).

No esporte, o design dos uniformes deve atentar para aspectos como conforto, sendo adequados às atividades específicas exigidas pelos diversos esportes(Udale; Sorger, 2009). No caso do voleibol, os uniformes nem sempre contaram com um projeto personalizado. Durante muito tempo, houve o uso de uniformes importados e até improvisados (Tavares; Mourão, 2016). Certamente, fazer uma digressão no tempo implica reconhecer também que muito mudou e se avançou no cuidado com os uniformes e com o esporte como um todo.

Nas entrevistas realizadas, as atletas olímpicas de voleibol do Brasil também atentaram para o aspecto do desempenho, quando questionadas se o uniforme poderia interferir positiva ou negativamente durante a partida. Para a levantadora Fernanda Ferreira, nos Jogos Olímpicos de 2012,

[...] um uniforme que prende embaixo do braço, um short que fica subindo ou que fica roçando entre as coxas. Então, não acho que vá influenciar no desempenho, mas incomoda. Menos uma coisa para pensar deixa a jogadora com mais foco na partida. [Deve ser] bom o suficiente para não me fazer pensar sobre ele (Ferreira, 2023).

Conceição (2023), central nos Jogos Olímpicos de 2000, também observa que a chamada “sunga”, que as atletas usaram por muito tempo, era desconfortável e, quando foi substituído por um tipo de “short”, foi melhor, pois “eu me senti mais à vontade por não ficar incomodando e também por não machucar a pele por causa do deslize, quando a gente fazia uma defesa”.

Os uniformes da Seleção Brasileira sempre foram objeto de reflexão para as atletas. Em cada época, adotou-se um modelo de uniforme que era comum em outras seleções mundiais. Os itens básicos de um uniforme esportivo (camisa, shorts, calçado e acessórios específicos) variaram consideravelmente ao longo do tempo.

De acordo com Sandra Lima (2022), atacante nos JO de 1984, as mudanças ocorreram com a utilização cada vez mais difundida de mangas curtas ou “cavadas” e a introdução de um acessório para proteção do antebraço (brac). A atleta também enfatiza que, frequentemente, a opinião das jogadoras tinha pouca influência na decisão sobre o uso do uniforme.

[...] você vê que agora praticamente não tem mais ninguém jogando de manga comprida. Até pelo aparecimento do “brac” do braço, que muita gente já usa e é um acessório que faz o papel da manga comprida [...]. Então, o atleta tem que aceitar usar o uniforme (Lima, 2022).

Indubitavelmente, a falta de discussão nas décadas anteriores sobre os uniformes acarretou algumas questões, conforme destaca Mattioli (2022), atacante nos Jogos Olímpicos de 1980. A atleta menciona a seleção do calçado esportivo, por exemplo, com consequências duradouras: “não tinham plataforma, não tinham amortecedor nenhum [...]. E isso daí interferiu e complicou muito, comprometeu as articulações”.

Segundo Soares (2011), a flexibilidade proporcionada pela vestimenta suscita um deleite feminino no que tange às sensações físicas e à percepção da articulação entre as partes do corpo em movimento, da sutileza e da força dos ossos sob a pele, da alternância rítmica dos deslocamentos e do peso do corpo” (Soares, 2011, p. 31). Evidencia-se, portanto, que o uniforme está intrinsecamente relacionado, dentre outros aspectos, ao bem-estar dos atletas.

Bodziak (2023), atacante nos JO de 1996, recorda que os uniformes mais antigos eram provenientes do Japão, possuíam um tecido de excelente qualidade e durabilidade, porém eram “pesados” e dificultavam os movimentos de ataque, além de serem um tanto apertados para ela, devido à sua elevada estatura (1,92m). Barros (2023), atacante nos Jogos Olímpicos de 1992, associou o “peso” do uniforme à produção de calor, o que a incomodava consideravelmente, questão que aparentemente foi solucionada com o passar do tempo e com o desenvolvimento de tecidos tecnológicos. Conforme destaca Pequeno (2023), atacante e melhor jogadora nos JO de 2008, o uniforme utilizado por ela naquela ocasião já priorizava o conforto, caía muito bem no nosso corpo e absorvia bastante o suor”.

Analisadas em conjunto, é praticamente um truísmo afirmar que as exigências para a criação de uniformes esportivos devem considerar as nuances e particularidades de cada época, modalidade e categoria (masculina e feminina), além de incorporar o que há de mais avançado em termos tecnológicos (Udale; Sorger, 2009).

4.2 Para além do conforto

No esporte e no design de uniformes esportivos, contudo, nem tudo se refere apenas ao conforto e ao aspecto técnico. Os uniformes têm sido tema de debates em razão de algumas modalidades e/ou competições imporem regras que, na maioria das vezes, são direcionadas às atletas mulheres. Durante os JO de 2021, em Tóquio, ocorreram diversos protestos relacionados ao uso de uniformes com atributos sensuais em detrimento do conforto e, principalmente, da liberdade de escolha da atleta sobre o que vestir (Tavares; Braida, 2022b).

Em 2008, aparentemente houve maior consenso acerca das possibilidades para o uniforme da seleção, que consolidou o uso do short e de uma camiseta mais ajustada ao corpo feminino. Conforme menciona Souza (2023),

[...] eu acho que o uniforme da Olimpíada de 2008 foi perfeito. Tanto short quanto a camiseta. Eu destaco esses uniformes por conta do conforto e pelo fato de não expor demais as atletas. Eram roupas que davam segurança para executar qualquer tipo de movimento, principalmente a parte de baixo. E a parte de cima, que era uma camiseta adequada ao feminino, né?

A adoção da bermuda, que perdura até os dias atuais, foi recebida com alívio pelas atletas que sempre consideraram excessivo o nível de exposição do próprio corpo na época do uso recorrente da sunga. Esta última possuía um tecido mais fino e “ marcava muito a calcinha”, especialmente se a atleta “estivesse naqueles dias” [menstruação], conforme comentaram Ramos (2022) e Bodziak (2022). Esta última acrescentou: “na minha opinião, eu gostaria de jogar de bermuda, uma bermuda no meio da coxa, pra você poder se jogar no chão, deslizar e ficar tranquila”.

Para Oliveira, Macedo e Millen Neto (2020, p. 2), existe uma certa objetificação do corpo feminino quando são identificadas “práticas que legitimam a lógica heterossexual como fundamental e natural; marginalizando orientações sexuais e expressões de gênero fora dos seus padrões”.Com base nas concepções teóricas propostas por Foucault (2012), pode-se afirmar que as opiniões femininas, devido às desigualdades de gênero, foram historicamente desconsideradas, especialmente quando se trata da legitimação do saber e do poder hegemônicos.

As entrevistadas expressaram preocupação quanto à escassa atenção dada às opiniões das atletas e aos discursos tendenciosos ou subliminares resultantes da excessiva exposição do corpo feminino. Conforme destacou Conceição (2023), o uniforme pode ser esteticamente agradável nas fotografias, porém não deve ser “invasivo” se, do ponto de vista funcional, “não abranger as necessidades de uma jogadora”.

A questão da exposição do corpo feminino é antiga e tem ainda mais impacto quando se trata do vôlei de praia, no qual as atletas utilizam uniformes diferentes dos usados em quadra, frequentemente tendo seus corpos explorados pela mídia: “as meninas do vôlei de praia sofrem bastante com esse tipo de coisa. As fotos que tiram delas, né?” (Ramos, 2022). Pereira, Pontes e Ribeiro (2015, p. 132) observam em suas pesquisas que os fotógrafos tendem a negar o conteúdo sexista em muitas fotografias jornalísticas de atletas, como as do voleibol feminino:

[...] o retratamento é feito de costas, evidenciando glúteos, e raramente aparecem imagens delas suadas e/ou despenteadas. Já o homem é retratado pondo-se em evidência a agressividade, a competitividade [...],

O que indica a urgência dessa pauta para discussão nos editoriais esportivos.

Hall (2016, p. 85-86) rememora que Michel Foucault encontrava no discurso, sob uma perspectiva semiótica, a concepção mais elaborada para a produção dos objetos do conhecimento. Dessa forma, a atribuição da “verdade” a uma questão social está condicionada a um conjunto de atores em seu contexto histórico. Portanto, a partir do presente artigo, enfatiza-se que a busca pela verdade semântica acerca da representação social dos uniformes do voleibol feminino pode ser obtida, principalmente, por meio da “voz” das atletas, frequentemente negligenciada ou relegada a segundo plano em outros momentos da história esportiva.

Embora a dominação masculina já venha sendo discutida, Bourdieu (1982) argumenta que a sociologia (e podemos acrescentar que o próprio campo da moda, lato sensu) necessita de maior engajamento para denunciar constantemente os mecanismos de uma sociedade injusta e hierarquizada, estruturada conforme uma divisão de poderes dominantes e desiguais.

A questão da exposição do corpo feminino não é menos relevante para as atletas que atuam nas quadras (o denominado voleibol indoor). Hélia Souza, conhecida como Fofão, considera que as atletas em quadra também ficam consideravelmente expostas, de maneira semelhante às que competem na praia (outdoor), devido à natureza dos movimentos exigidos durante as partidas: “às vezes, isso era explorado de uma forma que não era muito legal para o esporte [...], enfim, hoje em dia eu acho que a mídia já entendeu que isso não pode ser uma prioridade” (Souza, 2023).

Os uniformes das seleções têm sido alvo de maior debate e atenção nos últimos anos, com o convite a estilistas renomados para desenharem os trajes de diversas modalidades. Esse processo estabelece uma relação intrínseca entre moda e comunicação (Barnard, 2003). Os uniformes esportivos também possuem atributos lúdicos, que são indubitavelmente cruciais para sua aceitação e afeição. Conforme observa Ferreira (2023), há uma preocupação evidente com o bem-estar e a estética no uso do uniforme: “[...] e também porque deixava a gente mais bonita e mulher é assim. Tinha brilhos e a gente gostava muito!”.

Na década de 1980, quando a seleção feminina começava a se destacar no cenário internacional, Lima (2022) ressalta que as cores do uniforme eram significativas: “a gente tinha essas opções do amarelo, do azul, do branco, e isso realmente marcava que era a seleção brasileira que estava chegando”, ou seja, demarcando um território nas competições por meio das cores-símbolo nacionais. Foi ao assistir aos jogos, encantada com os uniformes, que Ana Cláudia se sentiu motivada para o esporte: “aí que eu falei que eu queria jogar na seleção brasileira” (Ramos, 2022) – e conseguiu.

O esporte de alto rendimento possui um elevado nível de exigências a serem cumpridas, que abrangem recursos financeiros e, sobretudo, humanos. Os uniformes representam símbolos de uma nação, e os atletas tornam-se símbolos por extensão. Indubitavelmente, a relação atleta-uniforme-expressão está intimamente ligada às mensagens que os uniformes evocam, não apenas simbólicas, mas também pragmáticas.

4.3 Mídia e patrocínio esportivo

Um dos fatores que impulsionaram o crescimento do esporte como atrativo para investimentos foi o aumento expressivo da audiência, que se tornou massiva com o advento das novas mídias (Melo Neto, 2020). O voleibol conquistou notável repercussão com a denominada geração dos anos 1980, tanto na categoria masculina quanto na feminina (Tavares; Mourão, 2016). Contudo, já nessa época, uma questão permanecia controversa: a relação entre o patrocínio e os atletas, ou mais especificamente, com as atletas, como evidenciado no emblemático protesto da levantadora Jacqueline, que foi afastada da seleção por vestir a camisa do avesso (Silva, 1985).

Com a progressiva profissionalização do esporte, a entrada de patrocinadores diversificou-se e novos acordos vêm sendo estabelecidos desde os anos 1990, impactando na composição dos uniformes. Lima (2022) recorda que, na década de 1980, as atletas eram obrigadas a usar um tênis fornecido pelo patrocinador, que nem sempre era adequado, embora tivessem acesso a produtos melhores, mas não tinham a opção de substituí-lo. Em outras ocasiões, os produtos eram de boa qualidade, porém não tão apropriados, e as atletas não tinham voz para opinar sobre isso (Mattioli, 2022).

No âmbito do patrocínio, a relação com o esporte exerce forte impacto na mídia, e os acordos costumam ser bastante diretos nesse setor (Sanfelice; Fernandes; Savegnano, 2005). Há a necessidade de divulgar informações com clareza durante as transmissões dos jogos, para que a publicidade surta o efeito desejado (Mazzei, 2018). Atualmente, parece impossível que o esporte de alto rendimento se sustente sem o apoio de patrocínios. Como afirma Ferreira (2023):

Eu acho que são coisas importantes. A relação que eu faria da mídia com os uniformes seria: definição das cores, a clareza da divulgação do patrocinador para favorecer o espectador e o narrador também [...]. É dessa forma que o esporte continua, que o voleibol continua. A relação do uniforme com o patrocinador é fundamental.

Para a concepção do uniforme em parceria com os patrocinadores, contudo, o layout precisa ser bem elaborado, pois há uma relação direta com a mídia, devido à visualização e “da identidade que vai [se] criando com as marcas patrocinadoras” (Pequeno, 2023). Se não for bem planejado, o efeito pode ser contrário, como alerta Ramos (2022): “tem time que tem tanto patrocínio, mas tem tanto patrocínio, que você não sabe nem quem é o patrocinador, não sabe nem qual é o time”, além da questão da localização da marca no uniforme, para que não fique vulgar (Barros, 2023).

A relação dos patrocínios com a mídia abrange aspectos que nem sempre as atletas conseguem administrar, incluindo o uso de imagens e o tempo de exposição midiática. O vínculo entre atleta, patrocinador e mídia também se tornou mais complexo e multifacetado.

[...] é o patrocinador que paga, que investe e às vezes, a gente está concedendo uma entrevista e a nossa imagem é reduzida para que não apareça o patrocinador, sendo que durante o jogo, numa transmissão, você vê o nome do patrocinador o tempo todo (Souza, 2023).

Como bem conclui Bodziak (2022), há muita diferença quando se analisa hoje a relação do voleibol com a mídia, os patrocinadores, entre outros aspectos. “Eu acho que é imprescindível, né? O uniforme, a mídia e o esporte, porque tudo se tornou profissional” (Bodziak, 2022).

Por fim, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos quando analisados em conjunto à luz da experiência de atletas olímpicas do voleibol feminino. A literatura que aborda o tema também indica que, transcorridos mais de 40 anos desde a primeira participação da seleção em Jogos Olímpicos nessa modalidade e categoria, muito se transformou em relação ao design dos uniformes, pois, como bem ressalta Lipovetsky (2009, p. 13), a moda “chegou ao topo de seu poder, conseguiu remodelar a sociedade inteira à sua imagem; era periférica, agora é hegemônica”. Nesse contexto, a emancipação feminina aponta para uma (nova) forma de representação que tangencia a esfera política, “ter voz”, efetivamente, contra a opressão existencial, conforme discute Hall (2016, p. 13).

Indubitavelmente, a maior contribuição da análise retrospectiva é precisamente enxergar o uniforme feminino como um elemento intrinsecamente ligado à concepção de mulher na sociedade contemporânea – por um lado, impregnada de machismo explícito e velado e, por outro, fundamentada em uma compreensão abrangente, crítica e profissional, principalmente da mulher-atleta, que ainda tem participação limitada nos processos decisórios em questões que a afetam e lhe dizem respeito diretamente.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O esporte tem ocupado um lugar cada vez mais proeminente no cotidiano das populações, seja como prática, seja como entretenimento. No Brasil, o voleibol consolidou-se como o segundo esporte em preferência nacional desde a década de 1980. A partir de então, diversas mudanças ocorreram em relação à profissionalização de atletas, patrocínios e midiatização. Como se pode observar, os depoimentos das atletas olímpicas evidenciam de forma abrangente e aprofundada esses temas.

Espera-se que todo uniforme (assim como praticamente toda vestimenta) seja confortável e adequado à prática a que se destina. No entanto, no caso do voleibol feminino, a questão historicamente se apresenta de maneira distinta. Devido a exigências de patrocínio e à frequente negligência em relação à mulher-atleta como profissional, muitos uniformes foram utilizados no passado sem oferecer conforto ou mesmo adequação. Felizmente, essa situação tem se modificado, ao menos no aspecto material.

Contudo, o uniforme como um elemento comunicativo e midiático ainda enfrenta diversos obstáculos para a atleta feminina, e os protestos recentes ocorridos nos JO de 2021 são cruciais para se reconsiderar a imposição de certos tipos e padrões de uniformes para mulheres, seguindo uma lógica nem sempre clara, mas que perpassa questões de exploração midiática dos corpos femininos.

Mídia, patrocínio e esporte têm formado uma tríade fundamental para a profissionalização do esporte de alto rendimento nas últimas décadas, atingindo um nível tão elevado que se torna cada vez mais difícil conceber como os uniformes utilizados por atletas femininas podem evidenciar aspectos tão pouco empáticos.

A possibilidade de incorporar no design dos uniformes femininos um meio para atender às necessidades não apenas materiais, técnicas, comerciais e midiáticas, mas também simbólicas das atletas, revela-se essencial. As estratégias de design mais recentes apontam para a participação indispensável dos agentes diretamente envolvidos no processo de criação e destinação dos produtos. Ao colocar as jogadoras no centro do projeto dos uniformes, adotando estratégias de design centrado no usuário, acredita-se que os uniformes poderão ser desenvolvidos não só com mais criatividade e tecnologia, mas também garantindo uma participação mais ampla de quem não apenas veste, usa, divulga e representa clubes, marcas e nações, mas é profissional do esporte e, principalmente, cidadã.

AGRADECIMENTOS

Os autores expressam sua gratidão às atletas entrevistadas e ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pelo apoio fundamental à realização desta pesquisa.

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Uniformes brasileños de voleibol femenino: con la palabra, las atletas de los Juegos Olímpicos (1980-2012)

RESUMEN

El deporte y la sociedad han desarrollado interacciones cada vez más complejas en el mundo competitivo y globalizado. El objetivo de este artículo es analizar la construcción discursiva en torno a los uniformes utilizados por las selecciones de voleibol femenino en Brasil, a partir de la percepción de atletas que compitieron en los Juegos Olímpicos por la selección nacional, entre los años 1980 y 2012. La metodología utilizada correlaciona notas de literatura con testimonios de deportistas recogidos a través de entrevistas. Se verifica cómo hay una preocupación paulatina por el diseño de uniformes, que impregna aspectos materiales, simbólicos y mediáticos. Se concluye que el diseño de uniformes para mujeres se ha convertido en un tema central para la discusión sobre género en el deporte.

Palabras clave: Moda. Mujer. Deporte.

1. INTRODUÇÃO

O esporte, como atividade de forte interesse social, tem experimentado um crescimento significativo em termos de público, impulsionado pelo avanço e diversificação dos meios de comunicação nas últimas décadas. Elias e Dunning (1992) afirmam que está ocorrendo uma “esportivização” da sociedade. No entanto, para as atletas do sexo feminino, os desafios nesse campo são distintos daqueles enfrentados pelos atletas masculinos. Na maioria das sociedades, as mulheres ainda se deparam com obstáculos e discriminações que se manifestam no contexto esportivo, variando desde a proibição de participação em determinados esportes, dependendo da cultura em que estão inseridas, até a luta pela equiparação salarial e de premiações com os homens em diversas competições oficiais. O uniforme que utilizam para competir torna-se um aspecto visível de uma questão que possui ramificações mais profundas e complexas.

Este artigo integra uma pesquisa de pós-doutoramento que analisa os uniformes do voleibol feminino utilizados pelas atletas nos Jogos Olímpicos (Tavares; Braida, 2021, 2022a, 2022b). O recorte temporal abrange desde os jogos de 1980 (Moscou), quando a seleção brasileira estreou em uma olimpíada, até a conquista da segunda medalha de ouro, em 2012 (Londres). No âmbito teórico, são abordados conceitos sobre o design de uniformes (Soares, 2011; Udale; Sorger, 2009), questões de gênero no esporte (Nicholson, 2000; Goellner, 2013), aspectos simbólicos, discursivos e socioculturais da relação moda-sociedade (Bourdieu, 1982; Foucault, 2012; Hall, 2016; Lipovetsky, 2009), além de uma reflexão sobre patrocínio esportivo (Melo Neto, 2020; Sanfelice; Fernandes; Savegnago, 2005).

Metodologicamente, este estudo fundamenta-se, além da revisão bibliográfica sobre os temas mencionados anteriormente, em entrevistas conduzidas com nove atletas olímpicas, uma de cada edição do período analisado. Assim, busca-se estabelecer uma correlação entre os depoimentos das entrevistadas e as questões que têm sido debatidas na literatura especializada.

O objetivo deste artigo, portanto, é analisar a construção discursiva em torno dos uniformes utilizados pelas seleções femininas de voleibol do Brasil, a partir da percepção de atletas entrevistadas que disputaram os Jogos Olímpicos (JO) pela seleção brasileira, entre os anos de 1980 e 2012, sob a perspectiva de três enfoques: (a) questões materiais, (b) simbólicas e (c) midiáticas.

2. MODA, DESIGN E UNIFORMES

Considerar a existência humana como parte integrante de uma cultura social é refletir sobre como o vestuário compõe os costumes de cada época e local, com implicações sociológicas, filosóficas e no campo da deontologia. Tais questões são abordadas, por exemplo, no dossiê temático organizado por Crane e Bueno (2008), que trata da moda e da teoria social. Nesse compêndio, moda e cultura contemporânea são articuladas por meio de artigos e traduções inéditas de autores fundamentais das ciências sociais, como Georg Simmel, Thorstein Veblen, Norbert Elias, Roland Barthes e Pierre Bourdieu.

A discussão da moda sob uma perspectiva sociológica é fundamental para uma melhor compreensão das práticas culturais enraizadas nos aspectos simbólicos de uma sociedade. Como parte de um campo discursivo, “a moda expressaria de maneira exemplar a condição de construção de um habitus afinado à configuração de uma particular maneira de se socializar”, como destaca Setton (2008, p. 129), referindo-se a uma das categorias nomeadas por Pierre Bourdieu, o habitus, que, juntamente com a ideia de socialização e dinâmicas distintivas do chamado “jogo social”, configura a moda como uma prática cultural em constante disputa entre grupos, em busca de legitimação.

Silvano e Mezabarba (2019, p. 22) ressaltam que, a partir dos anos 1980, a moda tornou-se um campo de investigação próprio sobre a cultura material, tanto no que diz respeito ao que é produzido em desfiles e performances, quanto ao que tange e impacta o indivíduo propriamente: “[...] as roupas e os acessórios surgiram como objetos de estudo antropológico incontornáveis”, especializando-se por meio de diversas atuações profissionais e movimentando diferentes segmentos produtivos.

A moda esportiva é um desses segmentos especializados que, desde o início do século XX, passou por transformações significativas no design, incorporando tecidos macios e leves que funcionam como uma extensão do corpo, proporcionando maior liberdade de movimentos. Para as mulheres, cultural e socialmente, representou uma forte ruptura dos padrões estabelecidos de vestimenta (como deixar de usar saltos e poder usar calças compridas estilo “montaria”), resultando em “[...] alianças de estilos, trânsito entre gêneros, interação de usos” (Soares, 2011, p. 31), sem precedentes até então.

As questões materiais relacionadas aos uniformes revelam que, a partir da utilização de novos materiais, aspectos comportamentais surgiram como consequência, proporcionando novas possibilidades no uso do vestuário esportivo. A influência da moda em uniformes de determinadas modalidades tornou-se referência para o modo feminino de se vestir, oferecendo mais conforto e empoderamento. Consequentemente, foi também relevante para repensar o papel da mulher brasileira naquela época (١٩٣٢), que estava expandindo sua participação no mercado de trabalho e havia conquistado o direito ao voto (Mourão, 1998).

Atualmente, observa-se um notável desenvolvimento tecnológico em termos de materiais, cortes e confecções dos uniformes esportivos, acompanhando a crescente profissionalização do setor, que movimenta expressivas somas financeiras. No entanto, simbolicamente, percebe-se uma discussão que poderia parecer ultrapassada, mas não é: a exploração do corpo atlético feminino pela mídia durante o exercício de suas atividades profissionais esportivas (Tavares; Braida, 2022b).

Segundo Frandsen (2015), o interesse midiático pelo esporte expandiu as oportunidades de investimento em diversos setores relacionados, especialmente nos esportes de alto rendimento. A autora denominou esse fenômeno como uma “nova onda” de midiatização, abrangendo um número crescente de organizações e profissionais especializados, que atuam em variadas áreas e níveis, exigindo conhecimentos específicos para realizar a cobertura em diferentes meios de comunicação, como televisão, redes sociais, entre outros.

No entanto, essa cobertura midiática está longe de ser igualitária entre os gêneros ou equivalente nos conteúdos explorados. Romero e Pereira (2014, p. 66) concluem que

[...] inferimos que o sexismo e as hierarquias de gênero estão presentes não só nas desiguais e diferentes formas de representação do masculino e do feminino, como também nos papéis produzidos pela mídia, que legitimam os estereótipos presentes na sociedade.

Portanto, o design de uniformes esportivos abrange questões relevantes do ponto de vista material, isto é, o tecido, a cor e o caimento, tudo se relaciona com o movimento do corpo, especialmente o feminino. Simbolicamente, é correto afirmar que as roupas em geral estão ligadas a instâncias de poder e hierarquias familiares e sociais. Como atesta Soares (2011, p. 130 e 131, grifos do original): “[...] as roupas como objetos culturais prolongam a extensão do corpo, instituem relações duráveis, afirmando seu lugar de mediadoras [...]”, e os uniformes, de diferentes atividades (escola, igreja, esporte), “[...] parecem uniformizar, também, as maneiras de portar-se conforme as circunstâncias, valorizando hábitos e costumes públicos”.

Em conjunto, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos a partir dos uniformes do voleibol feminino, que têm modificado não apenas sua aparência (design), mas também seus significados.

3. METODOLOGIA

A pesquisa que fundamenta este artigo é de natureza básica, exploratória e qualitativa. Conceitualmente, baseia-se em estudos que abordam a discussão de gênero na contemporaneidade, os atributos sociais relacionados ao uso de uniformes e as relações entre esporte e mídia. Destaca-se a experiência da seleção brasileira feminina de voleibol por meio de depoimentos de atletas que participaram dos Jogos Olímpicos, constituindo-se como fonte primária e original da pesquisa.

Após a realização de contatos prévios com pessoas próximas às atletas, ou mesmo diretamente com as atletas de nossa rede de contatos, obtivemos retorno imediato e definimos, como participantes desta etapa da pesquisa, nove atletas, sendo uma de cada edição olímpica: Denise Mattioli (1980); Sandra Lima (1984); Ana Cláudia Ramos (1988); Ana Lúcia Barros (1992); Erikléia Botziak, conhecida como Filó (1996); Janina Conceição (2000); Hélia Souza, conhecida como Fofão (2004); Paula Pequeno (2008); e Fernanda Ferreira (2012).

Foram realizadas sete perguntas abordando o uso de uniformes pelas atletas, como forma de compreender melhor a perspectiva de quem efetivamente os utiliza. As questões foram distribuídas em quatro blocos temáticos: o primeiro, com duas perguntas sobre o uso e a usabilidade do uniforme; o segundo, com duas questões acerca de possíveis interferências no desempenho; o terceiro, com uma pergunta sobre memórias adicionais; e o quarto e último, sobre a percepção dos uniformes como veículo midiático e sua relação com os patrocinadores.

As entrevistas foram gravadas em áudio, transcritas e interpretadas à luz dos fundamentos da história oral temática, técnica que articula os diálogos e narrativas com outros documentos (Meihy, 2005). Foram analisadas com base nas técnicas propostas pelo Museu da Pessoa, que privilegia a fluidez, o ritmo e a compreensão ampliada dos dados coletados (Henriques, 2014; Tavares; Mourão, 2016).

Fotografias do acervo pessoal das jogadoras também foram disponibilizadas pelas entrevistadas, constituindo importante material documental consultado. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e encontra-se registrada na Plataforma Brasil sob o número 4.995.260.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base nas entrevistas conduzidas e no material coletado e selecionado durante a revisão bibliográfica, apresenta-se uma análise dos uniformes sob três perspectivas: os aspectos materiais e técnicos (a prática de vestir o uniforme); os aspectos simbólicos (as interpretações e desdobramentos do uso do uniforme esportivo); e, por fim, os aspectos midiáticos (relacionados às questões comerciais e de patrocínio).

4.1 Uniformes em quadra

O uso de uniformes na sociedade está diretamente relacionado ao próprio ato de se vestir. Portanto, é apropriado considerar que os processos de como nos vestimos irão

especializando-se de maneira profunda, permitindo mesmo distinguir aqueles que se limitam à proteção de outros que vão ao encontro da distinção, do conforto, da eficácia e da performance dos gestos em diferentes esferas da vida em sociedade (Soares, 2011, p. 26).

No esporte, o design dos uniformes deve atentar para aspectos como conforto, sendo adequados às atividades específicas exigidas pelos diversos esportes(Udale; Sorger, 2009). No caso do voleibol, os uniformes nem sempre contaram com um projeto personalizado. Durante muito tempo, houve o uso de uniformes importados e até improvisados (Tavares; Mourão, 2016). Certamente, fazer uma digressão no tempo implica reconhecer também que muito mudou e se avançou no cuidado com os uniformes e com o esporte como um todo.

Nas entrevistas realizadas, as atletas olímpicas de voleibol do Brasil também atentaram para o aspecto do desempenho, quando questionadas se o uniforme poderia interferir positiva ou negativamente durante a partida. Para a levantadora Fernanda Ferreira, nos Jogos Olímpicos de 2012,

[...] um uniforme que prende embaixo do braço, um short que fica subindo ou que fica roçando entre as coxas. Então, não acho que vá influenciar no desempenho, mas incomoda. Menos uma coisa para pensar deixa a jogadora com mais foco na partida. [Deve ser] bom o suficiente para não me fazer pensar sobre ele (Ferreira, 2023).

Conceição (2023), central nos Jogos Olímpicos de 2000, também observa que a chamada “sunga”, que as atletas usaram por muito tempo, era desconfortável e, quando foi substituído por um tipo de “short”, foi melhor, pois “eu me senti mais à vontade por não ficar incomodando e também por não machucar a pele por causa do deslize, quando a gente fazia uma defesa”.

Os uniformes da Seleção Brasileira sempre foram objeto de reflexão para as atletas. Em cada época, adotou-se um modelo de uniforme que era comum em outras seleções mundiais. Os itens básicos de um uniforme esportivo (camisa, shorts, calçado e acessórios específicos) variaram consideravelmente ao longo do tempo.

De acordo com Sandra Lima (2022), atacante nos JO de 1984, as mudanças ocorreram com a utilização cada vez mais difundida de mangas curtas ou “cavadas” e a introdução de um acessório para proteção do antebraço (brac). A atleta também enfatiza que, frequentemente, a opinião das jogadoras tinha pouca influência na decisão sobre o uso do uniforme.

[...] você vê que agora praticamente não tem mais ninguém jogando de manga comprida. Até pelo aparecimento do “brac” do braço, que muita gente já usa e é um acessório que faz o papel da manga comprida [...]. Então, o atleta tem que aceitar usar o uniforme (Lima, 2022).

Indubitavelmente, a falta de discussão nas décadas anteriores sobre os uniformes acarretou algumas questões, conforme destaca Mattioli (2022), atacante nos Jogos Olímpicos de 1980. A atleta menciona a seleção do calçado esportivo, por exemplo, com consequências duradouras: “não tinham plataforma, não tinham amortecedor nenhum [...]. E isso daí interferiu e complicou muito, comprometeu as articulações”.

Segundo Soares (2011), a flexibilidade proporcionada pela vestimenta suscita um deleite feminino no que tange às sensações físicas e à percepção da articulação entre as partes do corpo em movimento, da sutileza e da força dos ossos sob a pele, da alternância rítmica dos deslocamentos e do peso do corpo” (Soares, 2011, p. 31). Evidencia-se, portanto, que o uniforme está intrinsecamente relacionado, dentre outros aspectos, ao bem-estar dos atletas.

Bodziak (2023), atacante nos JO de 1996, recorda que os uniformes mais antigos eram provenientes do Japão, possuíam um tecido de excelente qualidade e durabilidade, porém eram “pesados” e dificultavam os movimentos de ataque, além de serem um tanto apertados para ela, devido à sua elevada estatura (1,92m). Barros (2023), atacante nos Jogos Olímpicos de 1992, associou o “peso” do uniforme à produção de calor, o que a incomodava consideravelmente, questão que aparentemente foi solucionada com o passar do tempo e com o desenvolvimento de tecidos tecnológicos. Conforme destaca Pequeno (2023), atacante e melhor jogadora nos JO de 2008, o uniforme utilizado por ela naquela ocasião já priorizava o conforto, caía muito bem no nosso corpo e absorvia bastante o suor”.

Analisadas em conjunto, é praticamente um truísmo afirmar que as exigências para a criação de uniformes esportivos devem considerar as nuances e particularidades de cada época, modalidade e categoria (masculina e feminina), além de incorporar o que há de mais avançado em termos tecnológicos (Udale; Sorger, 2009).

4.2 Para além do conforto

No esporte e no design de uniformes esportivos, contudo, nem tudo se refere apenas ao conforto e ao aspecto técnico. Os uniformes têm sido tema de debates em razão de algumas modalidades e/ou competições imporem regras que, na maioria das vezes, são direcionadas às atletas mulheres. Durante os JO de 2021, em Tóquio, ocorreram diversos protestos relacionados ao uso de uniformes com atributos sensuais em detrimento do conforto e, principalmente, da liberdade de escolha da atleta sobre o que vestir (Tavares; Braida, 2022b).

Em 2008, aparentemente houve maior consenso acerca das possibilidades para o uniforme da seleção, que consolidou o uso do short e de uma camiseta mais ajustada ao corpo feminino. Conforme menciona Souza (2023),

[...] eu acho que o uniforme da Olimpíada de 2008 foi perfeito. Tanto short quanto a camiseta. Eu destaco esses uniformes por conta do conforto e pelo fato de não expor demais as atletas. Eram roupas que davam segurança para executar qualquer tipo de movimento, principalmente a parte de baixo. E a parte de cima, que era uma camiseta adequada ao feminino, né?

A adoção da bermuda, que perdura até os dias atuais, foi recebida com alívio pelas atletas que sempre consideraram excessivo o nível de exposição do próprio corpo na época do uso recorrente da sunga. Esta última possuía um tecido mais fino e “ marcava muito a calcinha”, especialmente se a atleta “estivesse naqueles dias” [menstruação], conforme comentaram Ramos (2022) e Bodziak (2022). Esta última acrescentou: “na minha opinião, eu gostaria de jogar de bermuda, uma bermuda no meio da coxa, pra você poder se jogar no chão, deslizar e ficar tranquila”.

Para Oliveira, Macedo e Millen Neto (2020, p. 2), existe uma certa objetificação do corpo feminino quando são identificadas “práticas que legitimam a lógica heterossexual como fundamental e natural; marginalizando orientações sexuais e expressões de gênero fora dos seus padrões”.Com base nas concepções teóricas propostas por Foucault (2012), pode-se afirmar que as opiniões femininas, devido às desigualdades de gênero, foram historicamente desconsideradas, especialmente quando se trata da legitimação do saber e do poder hegemônicos.

As entrevistadas expressaram preocupação quanto à escassa atenção dada às opiniões das atletas e aos discursos tendenciosos ou subliminares resultantes da excessiva exposição do corpo feminino. Conforme destacou Conceição (2023), o uniforme pode ser esteticamente agradável nas fotografias, porém não deve ser “invasivo” se, do ponto de vista funcional, “não abranger as necessidades de uma jogadora”.

A questão da exposição do corpo feminino é antiga e tem ainda mais impacto quando se trata do vôlei de praia, no qual as atletas utilizam uniformes diferentes dos usados em quadra, frequentemente tendo seus corpos explorados pela mídia: “as meninas do vôlei de praia sofrem bastante com esse tipo de coisa. As fotos que tiram delas, né?” (Ramos, 2022). Pereira, Pontes e Ribeiro (2015, p. 132) observam em suas pesquisas que os fotógrafos tendem a negar o conteúdo sexista em muitas fotografias jornalísticas de atletas, como as do voleibol feminino:

[...] o retratamento é feito de costas, evidenciando glúteos, e raramente aparecem imagens delas suadas e/ou despenteadas. Já o homem é retratado pondo-se em evidência a agressividade, a competitividade [...],

O que indica a urgência dessa pauta para discussão nos editoriais esportivos.

Hall (2016, p. 85-86) rememora que Michel Foucault encontrava no discurso, sob uma perspectiva semiótica, a concepção mais elaborada para a produção dos objetos do conhecimento. Dessa forma, a atribuição da “verdade” a uma questão social está condicionada a um conjunto de atores em seu contexto histórico. Portanto, a partir do presente artigo, enfatiza-se que a busca pela verdade semântica acerca da representação social dos uniformes do voleibol feminino pode ser obtida, principalmente, por meio da “voz” das atletas, frequentemente negligenciada ou relegada a segundo plano em outros momentos da história esportiva.

Embora a dominação masculina já venha sendo discutida, Bourdieu (1982) argumenta que a sociologia (e podemos acrescentar que o próprio campo da moda, lato sensu) necessita de maior engajamento para denunciar constantemente os mecanismos de uma sociedade injusta e hierarquizada, estruturada conforme uma divisão de poderes dominantes e desiguais.

A questão da exposição do corpo feminino não é menos relevante para as atletas que atuam nas quadras (o denominado voleibol indoor). Hélia Souza, conhecida como Fofão, considera que as atletas em quadra também ficam consideravelmente expostas, de maneira semelhante às que competem na praia (outdoor), devido à natureza dos movimentos exigidos durante as partidas: “às vezes, isso era explorado de uma forma que não era muito legal para o esporte [...], enfim, hoje em dia eu acho que a mídia já entendeu que isso não pode ser uma prioridade” (Souza, 2023).

Os uniformes das seleções têm sido alvo de maior debate e atenção nos últimos anos, com o convite a estilistas renomados para desenharem os trajes de diversas modalidades. Esse processo estabelece uma relação intrínseca entre moda e comunicação (Barnard, 2003). Os uniformes esportivos também possuem atributos lúdicos, que são indubitavelmente cruciais para sua aceitação e afeição. Conforme observa Ferreira (2023), há uma preocupação evidente com o bem-estar e a estética no uso do uniforme: “[...] e também porque deixava a gente mais bonita e mulher é assim. Tinha brilhos e a gente gostava muito!”.

Na década de 1980, quando a seleção feminina começava a se destacar no cenário internacional, Lima (2022) ressalta que as cores do uniforme eram significativas: “a gente tinha essas opções do amarelo, do azul, do branco, e isso realmente marcava que era a seleção brasileira que estava chegando”, ou seja, demarcando um território nas competições por meio das cores-símbolo nacionais. Foi ao assistir aos jogos, encantada com os uniformes, que Ana Cláudia se sentiu motivada para o esporte: “aí que eu falei que eu queria jogar na seleção brasileira” (Ramos, 2022) – e conseguiu.

O esporte de alto rendimento possui um elevado nível de exigências a serem cumpridas, que abrangem recursos financeiros e, sobretudo, humanos. Os uniformes representam símbolos de uma nação, e os atletas tornam-se símbolos por extensão. Indubitavelmente, a relação atleta-uniforme-expressão está intimamente ligada às mensagens que os uniformes evocam, não apenas simbólicas, mas também pragmáticas.

4.3 Mídia e patrocínio esportivo

Um dos fatores que impulsionaram o crescimento do esporte como atrativo para investimentos foi o aumento expressivo da audiência, que se tornou massiva com o advento das novas mídias (Melo Neto, 2020). O voleibol conquistou notável repercussão com a denominada geração dos anos 1980, tanto na categoria masculina quanto na feminina (Tavares; Mourão, 2016). Contudo, já nessa época, uma questão permanecia controversa: a relação entre o patrocínio e os atletas, ou mais especificamente, com as atletas, como evidenciado no emblemático protesto da levantadora Jacqueline, que foi afastada da seleção por vestir a camisa do avesso (Silva, 1985).

Com a progressiva profissionalização do esporte, a entrada de patrocinadores diversificou-se e novos acordos vêm sendo estabelecidos desde os anos 1990, impactando na composição dos uniformes. Lima (2022) recorda que, na década de 1980, as atletas eram obrigadas a usar um tênis fornecido pelo patrocinador, que nem sempre era adequado, embora tivessem acesso a produtos melhores, mas não tinham a opção de substituí-lo. Em outras ocasiões, os produtos eram de boa qualidade, porém não tão apropriados, e as atletas não tinham voz para opinar sobre isso (Mattioli, 2022).

No âmbito do patrocínio, a relação com o esporte exerce forte impacto na mídia, e os acordos costumam ser bastante diretos nesse setor (Sanfelice; Fernandes; Savegnano, 2005). Há a necessidade de divulgar informações com clareza durante as transmissões dos jogos, para que a publicidade surta o efeito desejado (Mazzei, 2018). Atualmente, parece impossível que o esporte de alto rendimento se sustente sem o apoio de patrocínios. Como afirma Ferreira (2023):

Eu acho que são coisas importantes. A relação que eu faria da mídia com os uniformes seria: definição das cores, a clareza da divulgação do patrocinador para favorecer o espectador e o narrador também [...]. É dessa forma que o esporte continua, que o voleibol continua. A relação do uniforme com o patrocinador é fundamental.

Para a concepção do uniforme em parceria com os patrocinadores, contudo, o layout precisa ser bem elaborado, pois há uma relação direta com a mídia, devido à visualização e “da identidade que vai [se] criando com as marcas patrocinadoras” (Pequeno, 2023). Se não for bem planejado, o efeito pode ser contrário, como alerta Ramos (2022): “tem time que tem tanto patrocínio, mas tem tanto patrocínio, que você não sabe nem quem é o patrocinador, não sabe nem qual é o time”, além da questão da localização da marca no uniforme, para que não fique vulgar (Barros, 2023).

A relação dos patrocínios com a mídia abrange aspectos que nem sempre as atletas conseguem administrar, incluindo o uso de imagens e o tempo de exposição midiática. O vínculo entre atleta, patrocinador e mídia também se tornou mais complexo e multifacetado.

[...] é o patrocinador que paga, que investe e às vezes, a gente está concedendo uma entrevista e a nossa imagem é reduzida para que não apareça o patrocinador, sendo que durante o jogo, numa transmissão, você vê o nome do patrocinador o tempo todo (Souza, 2023).

Como bem conclui Bodziak (2022), há muita diferença quando se analisa hoje a relação do voleibol com a mídia, os patrocinadores, entre outros aspectos. “Eu acho que é imprescindível, né? O uniforme, a mídia e o esporte, porque tudo se tornou profissional” (Bodziak, 2022).

Por fim, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos quando analisados em conjunto à luz da experiência de atletas olímpicas do voleibol feminino. A literatura que aborda o tema também indica que, transcorridos mais de 40 anos desde a primeira participação da seleção em Jogos Olímpicos nessa modalidade e categoria, muito se transformou em relação ao design dos uniformes, pois, como bem ressalta Lipovetsky (2009, p. 13), a moda “chegou ao topo de seu poder, conseguiu remodelar a sociedade inteira à sua imagem; era periférica, agora é hegemônica”. Nesse contexto, a emancipação feminina aponta para uma (nova) forma de representação que tangencia a esfera política, “ter voz”, efetivamente, contra a opressão existencial, conforme discute Hall (2016, p. 13).

Indubitavelmente, a maior contribuição da análise retrospectiva é precisamente enxergar o uniforme feminino como um elemento intrinsecamente ligado à concepção de mulher na sociedade contemporânea – por um lado, impregnada de machismo explícito e velado e, por outro, fundamentada em uma compreensão abrangente, crítica e profissional, principalmente da mulher-atleta, que ainda tem participação limitada nos processos decisórios em questões que a afetam e lhe dizem respeito diretamente.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O esporte tem ocupado um lugar cada vez mais proeminente no cotidiano das populações, seja como prática, seja como entretenimento. No Brasil, o voleibol consolidou-se como o segundo esporte em preferência nacional desde a década de 1980. A partir de então, diversas mudanças ocorreram em relação à profissionalização de atletas, patrocínios e midiatização. Como se pode observar, os depoimentos das atletas olímpicas evidenciam de forma abrangente e aprofundada esses temas.

Espera-se que todo uniforme (assim como praticamente toda vestimenta) seja confortável e adequado à prática a que se destina. No entanto, no caso do voleibol feminino, a questão historicamente se apresenta de maneira distinta. Devido a exigências de patrocínio e à frequente negligência em relação à mulher-atleta como profissional, muitos uniformes foram utilizados no passado sem oferecer conforto ou mesmo adequação. Felizmente, essa situação tem se modificado, ao menos no aspecto material.

Contudo, o uniforme como um elemento comunicativo e midiático ainda enfrenta diversos obstáculos para a atleta feminina, e os protestos recentes ocorridos nos JO de 2021 são cruciais para se reconsiderar a imposição de certos tipos e padrões de uniformes para mulheres, seguindo uma lógica nem sempre clara, mas que perpassa questões de exploração midiática dos corpos femininos.

Mídia, patrocínio e esporte têm formado uma tríade fundamental para a profissionalização do esporte de alto rendimento nas últimas décadas, atingindo um nível tão elevado que se torna cada vez mais difícil conceber como os uniformes utilizados por atletas femininas podem evidenciar aspectos tão pouco empáticos.

A possibilidade de incorporar no design dos uniformes femininos um meio para atender às necessidades não apenas materiais, técnicas, comerciais e midiáticas, mas também simbólicas das atletas, revela-se essencial. As estratégias de design mais recentes apontam para a participação indispensável dos agentes diretamente envolvidos no processo de criação e destinação dos produtos. Ao colocar as jogadoras no centro do projeto dos uniformes, adotando estratégias de design centrado no usuário, acredita-se que os uniformes poderão ser desenvolvidos não só com mais criatividade e tecnologia, mas também garantindo uma participação mais ampla de quem não apenas veste, usa, divulga e representa clubes, marcas e nações, mas é profissional do esporte e, principalmente, cidadã.

AGRADECIMENTOS

Os autores expressam sua gratidão às atletas entrevistadas e ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pelo apoio fundamental à realização desta pesquisa.

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1. INTRODUÇÃO

O esporte, como atividade de forte interesse social, tem experimentado um crescimento significativo em termos de público, impulsionado pelo avanço e diversificação dos meios de comunicação nas últimas décadas. Elias e Dunning (1992) afirmam que está ocorrendo uma “esportivização” da sociedade. No entanto, para as atletas do sexo feminino, os desafios nesse campo são distintos daqueles enfrentados pelos atletas masculinos. Na maioria das sociedades, as mulheres ainda se deparam com obstáculos e discriminações que se manifestam no contexto esportivo, variando desde a proibição de participação em determinados esportes, dependendo da cultura em que estão inseridas, até a luta pela equiparação salarial e de premiações com os homens em diversas competições oficiais. O uniforme que utilizam para competir torna-se um aspecto visível de uma questão que possui ramificações mais profundas e complexas.

Este artigo integra uma pesquisa de pós-doutoramento que analisa os uniformes do voleibol feminino utilizados pelas atletas nos Jogos Olímpicos (Tavares; Braida, 2021, 2022a, 2022b). O recorte temporal abrange desde os jogos de 1980 (Moscou), quando a seleção brasileira estreou em uma olimpíada, até a conquista da segunda medalha de ouro, em 2012 (Londres). No âmbito teórico, são abordados conceitos sobre o design de uniformes (Soares, 2011; Udale; Sorger, 2009), questões de gênero no esporte (Nicholson, 2000; Goellner, 2013), aspectos simbólicos, discursivos e socioculturais da relação moda-sociedade (Bourdieu, 1982; Foucault, 2012; Hall, 2016; Lipovetsky, 2009), além de uma reflexão sobre patrocínio esportivo (Melo Neto, 2020; Sanfelice; Fernandes; Savegnago, 2005).

Metodologicamente, este estudo fundamenta-se, além da revisão bibliográfica sobre os temas mencionados anteriormente, em entrevistas conduzidas com nove atletas olímpicas, uma de cada edição do período analisado. Assim, busca-se estabelecer uma correlação entre os depoimentos das entrevistadas e as questões que têm sido debatidas na literatura especializada.

O objetivo deste artigo, portanto, é analisar a construção discursiva em torno dos uniformes utilizados pelas seleções femininas de voleibol do Brasil, a partir da percepção de atletas entrevistadas que disputaram os Jogos Olímpicos (JO) pela seleção brasileira, entre os anos de 1980 e 2012, sob a perspectiva de três enfoques: (a) questões materiais, (b) simbólicas e (c) midiáticas.

2. MODA, DESIGN E UNIFORMES

Considerar a existência humana como parte integrante de uma cultura social é refletir sobre como o vestuário compõe os costumes de cada época e local, com implicações sociológicas, filosóficas e no campo da deontologia. Tais questões são abordadas, por exemplo, no dossiê temático organizado por Crane e Bueno (2008), que trata da moda e da teoria social. Nesse compêndio, moda e cultura contemporânea são articuladas por meio de artigos e traduções inéditas de autores fundamentais das ciências sociais, como Georg Simmel, Thorstein Veblen, Norbert Elias, Roland Barthes e Pierre Bourdieu.

A discussão da moda sob uma perspectiva sociológica é fundamental para uma melhor compreensão das práticas culturais enraizadas nos aspectos simbólicos de uma sociedade. Como parte de um campo discursivo, “a moda expressaria de maneira exemplar a condição de construção de um habitus afinado à configuração de uma particular maneira de se socializar”, como destaca Setton (2008, p. 129), referindo-se a uma das categorias nomeadas por Pierre Bourdieu, o habitus, que, juntamente com a ideia de socialização e dinâmicas distintivas do chamado “jogo social”, configura a moda como uma prática cultural em constante disputa entre grupos, em busca de legitimação.

Silvano e Mezabarba (2019, p. 22) ressaltam que, a partir dos anos 1980, a moda tornou-se um campo de investigação próprio sobre a cultura material, tanto no que diz respeito ao que é produzido em desfiles e performances, quanto ao que tange e impacta o indivíduo propriamente: “[...] as roupas e os acessórios surgiram como objetos de estudo antropológico incontornáveis”, especializando-se por meio de diversas atuações profissionais e movimentando diferentes segmentos produtivos.

A moda esportiva é um desses segmentos especializados que, desde o início do século XX, passou por transformações significativas no design, incorporando tecidos macios e leves que funcionam como uma extensão do corpo, proporcionando maior liberdade de movimentos. Para as mulheres, cultural e socialmente, representou uma forte ruptura dos padrões estabelecidos de vestimenta (como deixar de usar saltos e poder usar calças compridas estilo “montaria”), resultando em “[...] alianças de estilos, trânsito entre gêneros, interação de usos” (Soares, 2011, p. 31), sem precedentes até então.

As questões materiais relacionadas aos uniformes revelam que, a partir da utilização de novos materiais, aspectos comportamentais surgiram como consequência, proporcionando novas possibilidades no uso do vestuário esportivo. A influência da moda em uniformes de determinadas modalidades tornou-se referência para o modo feminino de se vestir, oferecendo mais conforto e empoderamento. Consequentemente, foi também relevante para repensar o papel da mulher brasileira naquela época (١٩٣٢), que estava expandindo sua participação no mercado de trabalho e havia conquistado o direito ao voto (Mourão, 1998).

Atualmente, observa-se um notável desenvolvimento tecnológico em termos de materiais, cortes e confecções dos uniformes esportivos, acompanhando a crescente profissionalização do setor, que movimenta expressivas somas financeiras. No entanto, simbolicamente, percebe-se uma discussão que poderia parecer ultrapassada, mas não é: a exploração do corpo atlético feminino pela mídia durante o exercício de suas atividades profissionais esportivas (Tavares; Braida, 2022b).

Segundo Frandsen (2015), o interesse midiático pelo esporte expandiu as oportunidades de investimento em diversos setores relacionados, especialmente nos esportes de alto rendimento. A autora denominou esse fenômeno como uma “nova onda” de midiatização, abrangendo um número crescente de organizações e profissionais especializados, que atuam em variadas áreas e níveis, exigindo conhecimentos específicos para realizar a cobertura em diferentes meios de comunicação, como televisão, redes sociais, entre outros.

No entanto, essa cobertura midiática está longe de ser igualitária entre os gêneros ou equivalente nos conteúdos explorados. Romero e Pereira (2014, p. 66) concluem que

[...] inferimos que o sexismo e as hierarquias de gênero estão presentes não só nas desiguais e diferentes formas de representação do masculino e do feminino, como também nos papéis produzidos pela mídia, que legitimam os estereótipos presentes na sociedade.

Portanto, o design de uniformes esportivos abrange questões relevantes do ponto de vista material, isto é, o tecido, a cor e o caimento, tudo se relaciona com o movimento do corpo, especialmente o feminino. Simbolicamente, é correto afirmar que as roupas em geral estão ligadas a instâncias de poder e hierarquias familiares e sociais. Como atesta Soares (2011, p. 130 e 131, grifos do original): “[...] as roupas como objetos culturais prolongam a extensão do corpo, instituem relações duráveis, afirmando seu lugar de mediadoras [...]”, e os uniformes, de diferentes atividades (escola, igreja, esporte), “[...] parecem uniformizar, também, as maneiras de portar-se conforme as circunstâncias, valorizando hábitos e costumes públicos”.

Em conjunto, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos a partir dos uniformes do voleibol feminino, que têm modificado não apenas sua aparência (design), mas também seus significados.

3. METODOLOGIA

A pesquisa que fundamenta este artigo é de natureza básica, exploratória e qualitativa. Conceitualmente, baseia-se em estudos que abordam a discussão de gênero na contemporaneidade, os atributos sociais relacionados ao uso de uniformes e as relações entre esporte e mídia. Destaca-se a experiência da seleção brasileira feminina de voleibol por meio de depoimentos de atletas que participaram dos Jogos Olímpicos, constituindo-se como fonte primária e original da pesquisa.

Após a realização de contatos prévios com pessoas próximas às atletas, ou mesmo diretamente com as atletas de nossa rede de contatos, obtivemos retorno imediato e definimos, como participantes desta etapa da pesquisa, nove atletas, sendo uma de cada edição olímpica: Denise Mattioli (1980); Sandra Lima (1984); Ana Cláudia Ramos (1988); Ana Lúcia Barros (1992); Erikléia Botziak, conhecida como Filó (1996); Janina Conceição (2000); Hélia Souza, conhecida como Fofão (2004); Paula Pequeno (2008); e Fernanda Ferreira (2012).

Foram realizadas sete perguntas abordando o uso de uniformes pelas atletas, como forma de compreender melhor a perspectiva de quem efetivamente os utiliza. As questões foram distribuídas em quatro blocos temáticos: o primeiro, com duas perguntas sobre o uso e a usabilidade do uniforme; o segundo, com duas questões acerca de possíveis interferências no desempenho; o terceiro, com uma pergunta sobre memórias adicionais; e o quarto e último, sobre a percepção dos uniformes como veículo midiático e sua relação com os patrocinadores.

As entrevistas foram gravadas em áudio, transcritas e interpretadas à luz dos fundamentos da história oral temática, técnica que articula os diálogos e narrativas com outros documentos (Meihy, 2005). Foram analisadas com base nas técnicas propostas pelo Museu da Pessoa, que privilegia a fluidez, o ritmo e a compreensão ampliada dos dados coletados (Henriques, 2014; Tavares; Mourão, 2016).

Fotografias do acervo pessoal das jogadoras também foram disponibilizadas pelas entrevistadas, constituindo importante material documental consultado. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e encontra-se registrada na Plataforma Brasil sob o número 4.995.260.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base nas entrevistas conduzidas e no material coletado e selecionado durante a revisão bibliográfica, apresenta-se uma análise dos uniformes sob três perspectivas: os aspectos materiais e técnicos (a prática de vestir o uniforme); os aspectos simbólicos (as interpretações e desdobramentos do uso do uniforme esportivo); e, por fim, os aspectos midiáticos (relacionados às questões comerciais e de patrocínio).

4.1 Uniformes em quadra

O uso de uniformes na sociedade está diretamente relacionado ao próprio ato de se vestir. Portanto, é apropriado considerar que os processos de como nos vestimos irão

especializando-se de maneira profunda, permitindo mesmo distinguir aqueles que se limitam à proteção de outros que vão ao encontro da distinção, do conforto, da eficácia e da performance dos gestos em diferentes esferas da vida em sociedade (Soares, 2011, p. 26).

No esporte, o design dos uniformes deve atentar para aspectos como conforto, sendo adequados às atividades específicas exigidas pelos diversos esportes(Udale; Sorger, 2009). No caso do voleibol, os uniformes nem sempre contaram com um projeto personalizado. Durante muito tempo, houve o uso de uniformes importados e até improvisados (Tavares; Mourão, 2016). Certamente, fazer uma digressão no tempo implica reconhecer também que muito mudou e se avançou no cuidado com os uniformes e com o esporte como um todo.

Nas entrevistas realizadas, as atletas olímpicas de voleibol do Brasil também atentaram para o aspecto do desempenho, quando questionadas se o uniforme poderia interferir positiva ou negativamente durante a partida. Para a levantadora Fernanda Ferreira, nos Jogos Olímpicos de 2012,

[...] um uniforme que prende embaixo do braço, um short que fica subindo ou que fica roçando entre as coxas. Então, não acho que vá influenciar no desempenho, mas incomoda. Menos uma coisa para pensar deixa a jogadora com mais foco na partida. [Deve ser] bom o suficiente para não me fazer pensar sobre ele (Ferreira, 2023).

Conceição (2023), central nos Jogos Olímpicos de 2000, também observa que a chamada “sunga”, que as atletas usaram por muito tempo, era desconfortável e, quando foi substituído por um tipo de “short”, foi melhor, pois “eu me senti mais à vontade por não ficar incomodando e também por não machucar a pele por causa do deslize, quando a gente fazia uma defesa”.

Os uniformes da Seleção Brasileira sempre foram objeto de reflexão para as atletas. Em cada época, adotou-se um modelo de uniforme que era comum em outras seleções mundiais. Os itens básicos de um uniforme esportivo (camisa, shorts, calçado e acessórios específicos) variaram consideravelmente ao longo do tempo.

De acordo com Sandra Lima (2022), atacante nos JO de 1984, as mudanças ocorreram com a utilização cada vez mais difundida de mangas curtas ou “cavadas” e a introdução de um acessório para proteção do antebraço (brac). A atleta também enfatiza que, frequentemente, a opinião das jogadoras tinha pouca influência na decisão sobre o uso do uniforme.

[...] você vê que agora praticamente não tem mais ninguém jogando de manga comprida. Até pelo aparecimento do “brac” do braço, que muita gente já usa e é um acessório que faz o papel da manga comprida [...]. Então, o atleta tem que aceitar usar o uniforme (Lima, 2022).

Indubitavelmente, a falta de discussão nas décadas anteriores sobre os uniformes acarretou algumas questões, conforme destaca Mattioli (2022), atacante nos Jogos Olímpicos de 1980. A atleta menciona a seleção do calçado esportivo, por exemplo, com consequências duradouras: “não tinham plataforma, não tinham amortecedor nenhum [...]. E isso daí interferiu e complicou muito, comprometeu as articulações”.

Segundo Soares (2011), a flexibilidade proporcionada pela vestimenta suscita um deleite feminino no que tange às sensações físicas e à percepção da articulação entre as partes do corpo em movimento, da sutileza e da força dos ossos sob a pele, da alternância rítmica dos deslocamentos e do peso do corpo” (Soares, 2011, p. 31). Evidencia-se, portanto, que o uniforme está intrinsecamente relacionado, dentre outros aspectos, ao bem-estar dos atletas.

Bodziak (2023), atacante nos JO de 1996, recorda que os uniformes mais antigos eram provenientes do Japão, possuíam um tecido de excelente qualidade e durabilidade, porém eram “pesados” e dificultavam os movimentos de ataque, além de serem um tanto apertados para ela, devido à sua elevada estatura (1,92m). Barros (2023), atacante nos Jogos Olímpicos de 1992, associou o “peso” do uniforme à produção de calor, o que a incomodava consideravelmente, questão que aparentemente foi solucionada com o passar do tempo e com o desenvolvimento de tecidos tecnológicos. Conforme destaca Pequeno (2023), atacante e melhor jogadora nos JO de 2008, o uniforme utilizado por ela naquela ocasião já priorizava o conforto, caía muito bem no nosso corpo e absorvia bastante o suor”.

Analisadas em conjunto, é praticamente um truísmo afirmar que as exigências para a criação de uniformes esportivos devem considerar as nuances e particularidades de cada época, modalidade e categoria (masculina e feminina), além de incorporar o que há de mais avançado em termos tecnológicos (Udale; Sorger, 2009).

4.2 Para além do conforto

No esporte e no design de uniformes esportivos, contudo, nem tudo se refere apenas ao conforto e ao aspecto técnico. Os uniformes têm sido tema de debates em razão de algumas modalidades e/ou competições imporem regras que, na maioria das vezes, são direcionadas às atletas mulheres. Durante os JO de 2021, em Tóquio, ocorreram diversos protestos relacionados ao uso de uniformes com atributos sensuais em detrimento do conforto e, principalmente, da liberdade de escolha da atleta sobre o que vestir (Tavares; Braida, 2022b).

Em 2008, aparentemente houve maior consenso acerca das possibilidades para o uniforme da seleção, que consolidou o uso do short e de uma camiseta mais ajustada ao corpo feminino. Conforme menciona Souza (2023),

[...] eu acho que o uniforme da Olimpíada de 2008 foi perfeito. Tanto short quanto a camiseta. Eu destaco esses uniformes por conta do conforto e pelo fato de não expor demais as atletas. Eram roupas que davam segurança para executar qualquer tipo de movimento, principalmente a parte de baixo. E a parte de cima, que era uma camiseta adequada ao feminino, né?

A adoção da bermuda, que perdura até os dias atuais, foi recebida com alívio pelas atletas que sempre consideraram excessivo o nível de exposição do próprio corpo na época do uso recorrente da sunga. Esta última possuía um tecido mais fino e “ marcava muito a calcinha”, especialmente se a atleta “estivesse naqueles dias” [menstruação], conforme comentaram Ramos (2022) e Bodziak (2022). Esta última acrescentou: “na minha opinião, eu gostaria de jogar de bermuda, uma bermuda no meio da coxa, pra você poder se jogar no chão, deslizar e ficar tranquila”.

Para Oliveira, Macedo e Millen Neto (2020, p. 2), existe uma certa objetificação do corpo feminino quando são identificadas “práticas que legitimam a lógica heterossexual como fundamental e natural; marginalizando orientações sexuais e expressões de gênero fora dos seus padrões”.Com base nas concepções teóricas propostas por Foucault (2012), pode-se afirmar que as opiniões femininas, devido às desigualdades de gênero, foram historicamente desconsideradas, especialmente quando se trata da legitimação do saber e do poder hegemônicos.

As entrevistadas expressaram preocupação quanto à escassa atenção dada às opiniões das atletas e aos discursos tendenciosos ou subliminares resultantes da excessiva exposição do corpo feminino. Conforme destacou Conceição (2023), o uniforme pode ser esteticamente agradável nas fotografias, porém não deve ser “invasivo” se, do ponto de vista funcional, “não abranger as necessidades de uma jogadora”.

A questão da exposição do corpo feminino é antiga e tem ainda mais impacto quando se trata do vôlei de praia, no qual as atletas utilizam uniformes diferentes dos usados em quadra, frequentemente tendo seus corpos explorados pela mídia: “as meninas do vôlei de praia sofrem bastante com esse tipo de coisa. As fotos que tiram delas, né?” (Ramos, 2022). Pereira, Pontes e Ribeiro (2015, p. 132) observam em suas pesquisas que os fotógrafos tendem a negar o conteúdo sexista em muitas fotografias jornalísticas de atletas, como as do voleibol feminino:

[...] o retratamento é feito de costas, evidenciando glúteos, e raramente aparecem imagens delas suadas e/ou despenteadas. Já o homem é retratado pondo-se em evidência a agressividade, a competitividade [...],

O que indica a urgência dessa pauta para discussão nos editoriais esportivos.

Hall (2016, p. 85-86) rememora que Michel Foucault encontrava no discurso, sob uma perspectiva semiótica, a concepção mais elaborada para a produção dos objetos do conhecimento. Dessa forma, a atribuição da “verdade” a uma questão social está condicionada a um conjunto de atores em seu contexto histórico. Portanto, a partir do presente artigo, enfatiza-se que a busca pela verdade semântica acerca da representação social dos uniformes do voleibol feminino pode ser obtida, principalmente, por meio da “voz” das atletas, frequentemente negligenciada ou relegada a segundo plano em outros momentos da história esportiva.

Embora a dominação masculina já venha sendo discutida, Bourdieu (1982) argumenta que a sociologia (e podemos acrescentar que o próprio campo da moda, lato sensu) necessita de maior engajamento para denunciar constantemente os mecanismos de uma sociedade injusta e hierarquizada, estruturada conforme uma divisão de poderes dominantes e desiguais.

A questão da exposição do corpo feminino não é menos relevante para as atletas que atuam nas quadras (o denominado voleibol indoor). Hélia Souza, conhecida como Fofão, considera que as atletas em quadra também ficam consideravelmente expostas, de maneira semelhante às que competem na praia (outdoor), devido à natureza dos movimentos exigidos durante as partidas: “às vezes, isso era explorado de uma forma que não era muito legal para o esporte [...], enfim, hoje em dia eu acho que a mídia já entendeu que isso não pode ser uma prioridade” (Souza, 2023).

Os uniformes das seleções têm sido alvo de maior debate e atenção nos últimos anos, com o convite a estilistas renomados para desenharem os trajes de diversas modalidades. Esse processo estabelece uma relação intrínseca entre moda e comunicação (Barnard, 2003). Os uniformes esportivos também possuem atributos lúdicos, que são indubitavelmente cruciais para sua aceitação e afeição. Conforme observa Ferreira (2023), há uma preocupação evidente com o bem-estar e a estética no uso do uniforme: “[...] e também porque deixava a gente mais bonita e mulher é assim. Tinha brilhos e a gente gostava muito!”.

Na década de 1980, quando a seleção feminina começava a se destacar no cenário internacional, Lima (2022) ressalta que as cores do uniforme eram significativas: “a gente tinha essas opções do amarelo, do azul, do branco, e isso realmente marcava que era a seleção brasileira que estava chegando”, ou seja, demarcando um território nas competições por meio das cores-símbolo nacionais. Foi ao assistir aos jogos, encantada com os uniformes, que Ana Cláudia se sentiu motivada para o esporte: “aí que eu falei que eu queria jogar na seleção brasileira” (Ramos, 2022) – e conseguiu.

O esporte de alto rendimento possui um elevado nível de exigências a serem cumpridas, que abrangem recursos financeiros e, sobretudo, humanos. Os uniformes representam símbolos de uma nação, e os atletas tornam-se símbolos por extensão. Indubitavelmente, a relação atleta-uniforme-expressão está intimamente ligada às mensagens que os uniformes evocam, não apenas simbólicas, mas também pragmáticas.

4.3 Mídia e patrocínio esportivo

Um dos fatores que impulsionaram o crescimento do esporte como atrativo para investimentos foi o aumento expressivo da audiência, que se tornou massiva com o advento das novas mídias (Melo Neto, 2020). O voleibol conquistou notável repercussão com a denominada geração dos anos 1980, tanto na categoria masculina quanto na feminina (Tavares; Mourão, 2016). Contudo, já nessa época, uma questão permanecia controversa: a relação entre o patrocínio e os atletas, ou mais especificamente, com as atletas, como evidenciado no emblemático protesto da levantadora Jacqueline, que foi afastada da seleção por vestir a camisa do avesso (Silva, 1985).

Com a progressiva profissionalização do esporte, a entrada de patrocinadores diversificou-se e novos acordos vêm sendo estabelecidos desde os anos 1990, impactando na composição dos uniformes. Lima (2022) recorda que, na década de 1980, as atletas eram obrigadas a usar um tênis fornecido pelo patrocinador, que nem sempre era adequado, embora tivessem acesso a produtos melhores, mas não tinham a opção de substituí-lo. Em outras ocasiões, os produtos eram de boa qualidade, porém não tão apropriados, e as atletas não tinham voz para opinar sobre isso (Mattioli, 2022).

No âmbito do patrocínio, a relação com o esporte exerce forte impacto na mídia, e os acordos costumam ser bastante diretos nesse setor (Sanfelice; Fernandes; Savegnano, 2005). Há a necessidade de divulgar informações com clareza durante as transmissões dos jogos, para que a publicidade surta o efeito desejado (Mazzei, 2018). Atualmente, parece impossível que o esporte de alto rendimento se sustente sem o apoio de patrocínios. Como afirma Ferreira (2023):

Eu acho que são coisas importantes. A relação que eu faria da mídia com os uniformes seria: definição das cores, a clareza da divulgação do patrocinador para favorecer o espectador e o narrador também [...]. É dessa forma que o esporte continua, que o voleibol continua. A relação do uniforme com o patrocinador é fundamental.

Para a concepção do uniforme em parceria com os patrocinadores, contudo, o layout precisa ser bem elaborado, pois há uma relação direta com a mídia, devido à visualização e “da identidade que vai [se] criando com as marcas patrocinadoras” (Pequeno, 2023). Se não for bem planejado, o efeito pode ser contrário, como alerta Ramos (2022): “tem time que tem tanto patrocínio, mas tem tanto patrocínio, que você não sabe nem quem é o patrocinador, não sabe nem qual é o time”, além da questão da localização da marca no uniforme, para que não fique vulgar (Barros, 2023).

A relação dos patrocínios com a mídia abrange aspectos que nem sempre as atletas conseguem administrar, incluindo o uso de imagens e o tempo de exposição midiática. O vínculo entre atleta, patrocinador e mídia também se tornou mais complexo e multifacetado.

[...] é o patrocinador que paga, que investe e às vezes, a gente está concedendo uma entrevista e a nossa imagem é reduzida para que não apareça o patrocinador, sendo que durante o jogo, numa transmissão, você vê o nome do patrocinador o tempo todo (Souza, 2023).

Como bem conclui Bodziak (2022), há muita diferença quando se analisa hoje a relação do voleibol com a mídia, os patrocinadores, entre outros aspectos. “Eu acho que é imprescindível, né? O uniforme, a mídia e o esporte, porque tudo se tornou profissional” (Bodziak, 2022).

Por fim, aspectos materiais, simbólicos e midiáticos adquirem contornos específicos quando analisados em conjunto à luz da experiência de atletas olímpicas do voleibol feminino. A literatura que aborda o tema também indica que, transcorridos mais de 40 anos desde a primeira participação da seleção em Jogos Olímpicos nessa modalidade e categoria, muito se transformou em relação ao design dos uniformes, pois, como bem ressalta Lipovetsky (2009, p. 13), a moda “chegou ao topo de seu poder, conseguiu remodelar a sociedade inteira à sua imagem; era periférica, agora é hegemônica”. Nesse contexto, a emancipação feminina aponta para uma (nova) forma de representação que tangencia a esfera política, “ter voz”, efetivamente, contra a opressão existencial, conforme discute Hall (2016, p. 13).

Indubitavelmente, a maior contribuição da análise retrospectiva é precisamente enxergar o uniforme feminino como um elemento intrinsecamente ligado à concepção de mulher na sociedade contemporânea – por um lado, impregnada de machismo explícito e velado e, por outro, fundamentada em uma compreensão abrangente, crítica e profissional, principalmente da mulher-atleta, que ainda tem participação limitada nos processos decisórios em questões que a afetam e lhe dizem respeito diretamente.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O esporte tem ocupado um lugar cada vez mais proeminente no cotidiano das populações, seja como prática, seja como entretenimento. No Brasil, o voleibol consolidou-se como o segundo esporte em preferência nacional desde a década de 1980. A partir de então, diversas mudanças ocorreram em relação à profissionalização de atletas, patrocínios e midiatização. Como se pode observar, os depoimentos das atletas olímpicas evidenciam de forma abrangente e aprofundada esses temas.

Espera-se que todo uniforme (assim como praticamente toda vestimenta) seja confortável e adequado à prática a que se destina. No entanto, no caso do voleibol feminino, a questão historicamente se apresenta de maneira distinta. Devido a exigências de patrocínio e à frequente negligência em relação à mulher-atleta como profissional, muitos uniformes foram utilizados no passado sem oferecer conforto ou mesmo adequação. Felizmente, essa situação tem se modificado, ao menos no aspecto material.

Contudo, o uniforme como um elemento comunicativo e midiático ainda enfrenta diversos obstáculos para a atleta feminina, e os protestos recentes ocorridos nos JO de 2021 são cruciais para se reconsiderar a imposição de certos tipos e padrões de uniformes para mulheres, seguindo uma lógica nem sempre clara, mas que perpassa questões de exploração midiática dos corpos femininos.

Mídia, patrocínio e esporte têm formado uma tríade fundamental para a profissionalização do esporte de alto rendimento nas últimas décadas, atingindo um nível tão elevado que se torna cada vez mais difícil conceber como os uniformes utilizados por atletas femininas podem evidenciar aspectos tão pouco empáticos.

A possibilidade de incorporar no design dos uniformes femininos um meio para atender às necessidades não apenas materiais, técnicas, comerciais e midiáticas, mas também simbólicas das atletas, revela-se essencial. As estratégias de design mais recentes apontam para a participação indispensável dos agentes diretamente envolvidos no processo de criação e destinação dos produtos. Ao colocar as jogadoras no centro do projeto dos uniformes, adotando estratégias de design centrado no usuário, acredita-se que os uniformes poderão ser desenvolvidos não só com mais criatividade e tecnologia, mas também garantindo uma participação mais ampla de quem não apenas veste, usa, divulga e representa clubes, marcas e nações, mas é profissional do esporte e, principalmente, cidadã.

AGRADECIMENTOS

Os autores expressam sua gratidão às atletas entrevistadas e ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pelo apoio fundamental à realização desta pesquisa.

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