v. 1 (2023): Palavras-sopros
A edição propõe encontros com as palavras para compor um dossiê específico de escritas experimentais. Palavras-sopros. Palavras que se querem sopros. Que antes de animar um eu, escapam para o fora, atravessam territórios, possibilitam um nomadismo com e na linguagem, experimentam o corpo e a impermanência antes que os signos; dissolvem as fronteiras entre a palavra e a imagem; produzem faíscas de vida, ventanias nas existências. “As coisas obedecem ao sopro vital. Nasce-se para fruir. E fruir já é nascer” — ecoa Clarice Lispector (2015, p.10). É numa busca pela camada nômade em sua intenção de vitalidade que se propõe o acervo adiante. Enquanto nômade, de um nomadismo praticado e praticável, invocamos esse personagem conceitual do pensamento de Deleuze e Guattari, responsável pela invenção da máquina de guerra com características exclusivas: uma vida nômade enquanto intermezzo, alternância de pontos, abandonos, distribuições em espaços abertos, lisos, em que a floresta recua e a estepe e o deserto crescem. Nômade caracteriza uma qualidade estacionária antes que em movimento: “a pausa como processo” (DELEUZE; GUATTARI, 2012, p.55); um saber da espera, uma ciência vaga, vagabunda, ambulante, itinerante, anexata, e contudo rigorosa, a extrair das coisas uma determinação que é mais corporeidade que coisidade, remetendo mais ao par matéria-forças que ao par matéria-forma das ciências régias. Em suma, um nomadismo em palavras-sopros a projetar sobre espaços vagos e vagantes da escrita-imagem que se faz entre a pele e sua porosidade; “captam ou determinam singularidades da matéria em vez de constituir uma forma geral” (p.38); operam por acontecimentos. Palavrassopros engendram armas e ferramentas, ausências e paisagens.